
O presidente americano, Joe Biden, referiu-se no s�bado (24/4) ao massacre de arm�nios pelo Imp�rio Otomano, ocorrido durante a Primeira Guerra Mundial, como um "genoc�dio", em uma declara��o com forte simbolismo e que poder� testar as rela��es entre os Estados Unidos e a Turquia, que rejeita o uso do termo.
"Todos os anos, neste dia, n�s lembramos as vidas de todos aqueles que morreram no genoc�dio arm�nio durante a era otomana e reafirmamos o compromisso de evitar que tal atrocidade jamais ocorra novamente", disse Biden.
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"A partir de 24 de abril de 1915, com a pris�o de intelectuais e l�deres comunit�rios arm�nios em Constantinopla por autoridades otomanas, 1,5 milh�o de arm�nios foram deportados, massacrados ou marcharam para suas mortes em uma campanha de exterm�nio", observou.
"Dos que sobreviveram, muitos foram for�ados a encontrar novos lares e novas vidas ao redor do mundo, incluindo nos Estados Unidos", lembrou o presidente.
"O povo americano honra todos os arm�nios que pereceram no genoc�dio que come�ou 106 anos atr�s", concluiu Biden.
O que � genoc�dio
Com as declara��es, feitas na data marcada pela comunidade arm�nia ao redor do mundo como o in�cio do que consideram o genoc�dio, Biden cumpriu uma de suas promessas de campanha e atende a uma reivindica��o antiga dos arm�nios-americanos e de defensores de direitos humanos.
O �ltimo presidente americano a se referir ao epis�dio como "genoc�dio" havia sido Ronald Reagan, em 1981. Nas d�cadas seguintes, os ocupantes da Casa Branca costumavam mencionar as "atrocidades" cometidas contra os arm�nios no territ�rio que hoje � a Turquia sem usar a palavra "genoc�dio", em uma tentativa de evitar rea��es do governo turco.
A Turquia, um importante aliado da Otan (Organiza��o do Tratado do Atl�ntico Norte) em uma localiza��o estrat�gica entre a Europa e o Oriente M�dio, rejeita o uso do termo "genoc�dio" para descrever os acontecimentos no per�odo da derrocada do Imp�rio Otomano.

"Genoc�dio" � definido pelo artigo n�mero 2 da Conven��o de Viena sobre Genoc�dio, de dezembro de 1948, como atos com o objetivo de "destruir, parcial ou totalmente, um grupo �tnico, racial, religioso ou nacional".
O termo descreve o exterm�nio sistem�tico de um grupo �tnico e a tentativa de destrui��o de sua cultura e � usado para se referir a epis�dios como o exterm�nio de judeus na Alemanha nazista ou o massacre de tutsis em Ruanda nos anos 1990.
O governo turco n�o nega as atrocidades cometidas na �poca, mas rejeita a no��o de que houve premedita��o ou tentativa sistem�tica de destruir o povo arm�nio e ressalta que muitos mu�ulmanos inocentes tamb�m foram mortos durante o conflito.
O que aconteceu?
No in�cio do s�culo 20, os crist�os arm�nios eram uma entre v�rias comunidades religiosas minorit�rias dentro do Imp�rio Otomano. O imp�rio, comandado pelos mu�ulmanos, inclu�a diversos grupos �tnicos e religiosos diferentes.
Em 1908, um movimento encabe�ado por oficiais das For�as Armadas chamados de "Jovens Turcos" tomou o poder prometendo modernizar e fortalecer o imp�rio. Seu grupo, chamado Comit� de Unidade e Progresso (CUP), passou a implementar uma s�rie de medidas nacionalistas, muitas delas afetando os arm�nios.

Em mar�o de 1914, o CUP entrou na Primeira Guerra Mundial ao lado da Alemanha. Os arm�nios foram convocados pelo governo otomano a lutar. Mas tamb�m havia arm�nios nacionalistas cooperando com os inimigos russos.
Depois de derrotas em uma campanha contra as for�as russas, os Jovens Turcos passaram a culpar os arm�nios da regi�o e a descrev�-los como uma "quinta coluna" pr�-R�ssia e uma amea�a.
No dia 24 de abril de 1915, mais de 200 intelectuais e l�deres comunit�rios arm�nios foram presos pelo governo otomano e posteriormente executados.
Essa data � marcada como o in�cio do que a comunidade arm�nia considera o genoc�dio, apesar de outros massacres contra essa popula��o terem ocorrido na regi�o deste os anos 1890.
No per�odo que se seguiu � pris�o dos intelectuais, centenas de milhares de homens, mulheres e crian�as arm�nias foram mortos. Muitos morreram massacrados em suas cidades, de exaust�o, fome e sede em marchas for�adas ao longo de regi�es des�rticas no que hoje � a S�ria e em campos de concentra��o.
As propriedades dos arm�nios foram confiscadas e oferecidas a mu�ulmanos, e muitos �rf�os foram adotados por fam�lias mu�ulmanas.
Pol�mica

Os c�lculos sobre o n�mero exato de v�timas variam, mas historiadores estimam que entre 600 mil e 1,5 milh�o de arm�nios tenham perecido.
Mas enquanto muitos historiadores e governos concordam que houve, de fato, um exterm�nio calculado dos arm�nios, outros questionam o uso do termo "genoc�dio" para se referir ao epis�dio e dizem que n�o h� evid�ncias de premedita��o.
Quando o massacre ocorreu, termo "genoc�dio" ainda n�o havia sido cunhado. Foi em 1944 que o advogado judeu polon�s Raphael Lemkin usou a palavra pela primeira vez.
Mas Lemkin disse que foi a matan�a de arm�nios pelos otomanos que o levou, anos antes de cunhar o termo, a refletir sobre maneiras de impedir a destrui��o intencional de grupos nacionais, �tnicos, raciais ou religiosos.
Mais de 20 pa�ses reconhecem formalmente o massacre de arm�nios como um "genoc�dio", mas o tema costuma provocar condena��es da Turquia.
Em 2015, �s v�speras do centen�rio do epis�dio, o governo turco convocou seu embaixador no Vaticano para consultas depois que o papa Francisco classificou o epis�dio como "o primeiro genoc�dio do s�culo 20".
Na �poca, o governo turco afirmou que o Papa "negligenciou as atrocidades que os turcos e os mu�ulmanos sofreram na Primeira Guerra Mundial e somente chamou aten��o para o sofrimento dos crist�os, especialmente o do povo arm�nio".
No mesmo ano, o governo turco tamb�m convocou para consultas seu ent�o embaixador em Bras�lia depois que o Senado brasileiro aprovou uma mo��o de solidariedade ao povo arm�nio que reconhecia o "genoc�dio" e, na pr�tica, pressionava o governo federal brasileiro a fazer o mesmo.
"Condenamos a resolu��o do Senado brasileiro sobre os eventos de 1915, que distorce as verdades hist�ricas e ignora a lei, e a consideramos um exemplo de irresponsabilidade", dizia um comunicado do Minist�rio das Rela��es Exteriores da Turquia.
Uma d�cada antes, em 2006, o pa�s chegou a suspender rela��es militares com a Fran�a depois que o Parlamento franc�s votou um projeto que tornaria crime negar que os arm�nios sofreram "genoc�dio".
Como reagiu a Turquia?
O tema do massacre dos arm�nios continua sendo tabu na Turquia, onde o c�digo penal prev� pena de at� dois anos de pris�o para quem insultar "a qualidade do ser turco". V�rios intelectuais turcos de renome que chamaram a aten��o para o exterm�nio j� foram processados com base na lei.
Mas, at� o momento, a Turquia n�o respondeu �s declara��es de Biden. Na quinta-feira (22/4), quando ficou sabendo dos planos do l�der americano, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, disse que seu pa�s iria "defender a verdade contra a mentira do suposto genoc�dio arm�nio".
Um dia depois, na sexta-feira, Biden conversou por telefone com Erdogan e, segundo a imprensa americana, comunicou o l�der turco sobre a declara��o que faria neste s�bado.
Mas, em nota divulgada ap�s a conversa, o governo turco disse apenas que ambos os l�deres concordaram com a "import�ncia de trabalhar juntos". Em sua vers�o sobre a conversa, a Casa Branca disse que Biden e Erdogan concordaram com "uma gest�o efetiva de discord�ncias".
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