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Estado de Minas

Covid: O que ci�ncia j� descobriu sobre maior agressividade de variante P.1 em jovens?

Estudos indicam que as taxas de hospitaliza��o e morte por covid-19 aumentaram em indiv�duos com menos de 60 anos e sem doen�as pr�vias. Ser� que a nova cepa descoberta no Brasil no in�cio do ano tem algo a ver com isso?


17/05/2021 11:12

Nas últimas semanas, saíram as primeiras evidências de que a linhagem P.1 seria mais mortal em jovens. Mas diversos fatores confundem e jogam incertezas sobre essas observações(foto: Getty Images)
Nas �ltimas semanas, sa�ram as primeiras evid�ncias de que a linhagem P.1 seria mais mortal em jovens. Mas diversos fatores confundem e jogam incertezas sobre essas observa��es (foto: Getty Images)

Manaus era uma das �nicas cidades do mundo onde se acreditava que o pior j� havia passado.

Ap�s uma onda avassaladora de casos e mortes em 2020, os estudos indicavam que mais de 75% da popula��o da cidade j� havia se infectado com o coronav�rus e, portanto, n�o haveria mais motivos para grande preocupa��o.

Mas o come�o de 2021 provou que essa ideia estava absolutamente errada.

O n�mero de afetados pela covid-19 explodiu de maneira dram�tica, o que desembocou num colapso do sistema de sa�de, na falta de oxig�nio e numa situa��o de calamidade p�blica que causou como��o nacional e internacional.

Enquanto esse drama come�ava a se desenrolar nas ruas da capital do Amazonas, os cientistas faziam uma importante descoberta na bancada dos laborat�rios: Manaus parece ter sido palco do desenvolvimento de uma nova variante do coronav�rus, que passaria a ser conhecida como P.1.

Pelas informa��es dispon�veis naquele momento, tudo levava a crer que essa nova vers�o do agente infeccioso era mais transmiss�vel e teria capacidade de driblar a imunidade obtida anteriormente, o que ajudaria a explicar o quadro cr�tico na capital do Amazonas.

Mas ser� que essa linhagem atualizada do v�rus tamb�m � mais mortal, especialmente entre indiv�duos mais jovens e sem doen�as pr�vias?

Por ora, esse campo ainda est� cheio de perguntas sem respostas. Mas algumas pesquisas publicadas nas �ltimas semanas ajudaram a entender um pouco melhor essa hist�ria.

O ovo ou a galinha?

Para come�o de conversa, � preciso observar que o surgimento de novas variantes est� diretamente relacionado ao comportamento das pessoas e � falta de pol�ticas p�blicas claras e bem definidas.

Em outras palavras, n�o � o surgimento dessas cepas "atualizadas" que gera a piora da pandemia: o problema come�a muito antes, quando as medidas de controle s�o relaxadas e as pessoas come�am a transitar livremente pelas ruas, sem tomar os cuidados b�sicos, como o uso de m�scaras e o respeito ao distanciamento f�sico.

Quanto maior for a circula��o, maior a transmiss�o do coronav�rus e quanto mais o v�rus "pula" de uma pessoa para outra, maior o risco de ele sofrer muta��es vantajosas para sua replica��o e potencialmente danosas e preocupantes para n�s, seres humanos.

E esse fen�meno, por sua vez, agrava ainda mais o problema de sa�de p�blica e contribui para o colapso que vivemos em v�rias cidades brasileiras.

"N�o h� como culpar s� a P.1 por esse grande aumento de casos e mortes que vimos nos �ltimos meses. A variante s� surgiu por causa do descontrole nas medidas restritivas capazes de inibir a transmiss�o", concorda o virologista e pesquisador em sa�de p�blica Tiago Gr�f, do Instituto Gon�alo Moniz, da FioCruz Bahia.

Esse racioc�nio se aplica perfeitamente ao que ocorreu em Manaus: com a no��o de que a cidade j� estava livre da pandemia, as atividades foram retomadas com for�a total a partir de setembro e outubro de 2020.

As aglomera��es fizeram o v�rus circular com grande intensidade novamente e ganhar uma nova vers�o: tudo indica que a P.1 se desenvolveu a partir de novembro do ano passado e, em dezembro, dominou geral.

Em 2021, Manaus voltou a ter dezenas de enterros por causa da covid(foto: Reuters)
Em 2021, Manaus voltou a ter dezenas de enterros por causa da covid (foto: Reuters)

Suspeita confirmada

Esse temor de que a P.1 seria mais transmiss�vel era praticamente um consenso entre os cientistas da �rea logo ap�s a descoberta da nova variante.

Isso porque ela trazia algumas muta��es muito parecidas ao que j� havia sido encontrado com outras cepas novas, especialmente aquelas detectadas no Reino Unido e na �frica do Sul.

Muitas dessas mudan�as gen�ticas mais preocupantes se concentram justamente na esp�cula, estrutura que fica na superf�cie do v�rus e faz com que ele "se grude" nas c�lulas humanas para dar in�cio a uma infec��o.

Essas altera��es no genoma tornaram essa tal de esp�cula ainda mais sofisticada, o que facilita a invas�o viral no nosso organismo.

"A variante P.1 necessita de uma quantidade menor de v�rus para causar uma infec��o", explica Gr�f.

Ou seja: se antes a pessoa precisava ter contato com uma boa quantidade de coronav�rus para desenvolver um quadro de covid-19, a nova linhagem passa a exigir uma carga bem menor, o que facilita as coisas (pelo menos do ponto de vista do v�rus).

Essas observa��es iniciais ganharam mais exatid�o no dia 14 de abril, ap�s a publica��o de um estudo na revista Science que envolveu mais de 30 institui��es e dezenas de pesquisadores, muitos deles brasileiros.

Ap�s uma vasta an�lise dos dados, os autores conclu�ram que a P.1 � de 1,7 a 2,4 vezes mais transmiss�vel e um quadro de covid-19 pr�vio, causado por outra linhagem, d� uma prote��o de 54 a 79% em rela��o a uma probabilidade de reinfec��o por essa nova variante.

Diante dos achados, os autores refor�am a necessidade de uma "vigil�ncia gen�mica global aprimorada sobre as novas variantes de preocupa��o", como � o caso da P.1, e entendem que essa a��o � "cr�tica para acelerar a capacidade de resposta � pandemia".

O surgimento de novas variantes do coronavírus ajuda a explicar o colapso, mas essas novas versões não são as principais culpadas pela crise(foto: Getty Images)
O surgimento de novas variantes do coronav�rus ajuda a explicar o colapso, mas essas novas vers�es n�o s�o as principais culpadas pela crise (foto: Getty Images)

Essa maior "gan�ncia" do v�rus � f�cil de ser observada num acompanhamento que � feito pelo time da Rede Gen�mica da Fiocruz, do qual Gr�f faz parte: segundo as an�lises do grupo, a P.1 rapidamente se tornou a linhagem dominante em todas as regi�es do pa�s.

No m�s de abril de 2021, ela estava presente em 92% de todas as amostras colhidas de pacientes com covid-19 confirmada.

Tr�s meses antes, ela representava apenas 29% do total das an�lises.

Subida nos �bitos

Mas ser� que essa maior virul�ncia e a capacidade de driblar a resposta imune pr�via contribuiriam para o aumento da mortalidade por covid-19?

Por aqui, as respostas s�o um pouco mais nebulosas.

"J� temos dados robustos na Inglaterra demonstrando que a letalidade da variante B.1.1.7 � maior. A gente pode imaginar que a P.1 tamb�m seja mais letal, mas ainda precisamos de estudos", analisa o virologista Fernando Spilki, professor da Universidade Feevale, no Rio Grande do Sul.

Um trabalho, ainda em pr�-print (que ainda n�o foi revisado por outros especialistas e publicado num per�odo cient�fico), aponta que a P.1 est� relacionada a uma maior taxa de �bitos, especialmente em indiv�duos mais jovens e sem doen�as pr�vias.

Para chegar a essas conclus�es, os cientistas compararam os dados das notifica��es de casos de covid-19 no Rio Grande do Sul em dois momentos: entre novembro e dezembro de 2020 e em fevereiro de 2021.

Os especialistas selecionaram justamente esses dois per�odos (dezembro de 2020 e fevereiro de 2021) para entender como a evolu��o da crise de sa�de p�blica pode ter impactado nos n�meros de acometidos em diferentes faixas et�rias.

"N�s pegamos os dados da primeira onda e comparamos com fevereiro de 2021, num momento em que ainda n�o tinha acontecido o colapso do sistema de sa�de no estado ga�cho", diz o m�dico Andr� Ribas Freitas, professor de epidemiologia e bioestat�stica da Faculdade S�o Leopoldo Mandic, em Campinas.

"Ao compararmos o total de casos com aqueles que evolu�ram para �bito, � poss�vel notar um aumento na propor��o de mortalidade em faixas et�rias mais jovens", resume o especialista, que tamb�m � consultor cient�fico do HubCovid.

No trabalho, a propor��o de indiv�duos com menos de 60 anos internados com covid-19 que morreram saltou de 18% em novembro e dezembro para 28% em fevereiro de 2021.

O aumento tamb�m ocorreu em indiv�duos sem doen�as pr�-existentes: nos n�meros do ano passado, 13% deles morreram. Neste ano, a taxa ficou em 22%.

Maior taxa de mortalidade por covid-19 entre indivíduos abaixo dos 60 anos e sem doenças prévias chamou a atenção de pesquisadores brasileiros(foto: Getty Images)
Maior taxa de mortalidade por covid-19 entre indiv�duos abaixo dos 60 anos e sem doen�as pr�vias chamou a aten��o de pesquisadores brasileiros (foto: Getty Images)

Na conclus�o, os autores da pesquisa entendem que a culpa por essa mudan�a est� diretamente relacionada � P.1.

"At� onde sabemos, essas s�o as primeiras evid�ncias de que essa variante pode aumentar desproporcionalmente a gravidade e a taxa de mortalidade entre a popula��o sem doen�as pr�vias e os mais jovens, sugerindo um aumento no perfil de virul�ncia", escrevem.

"Novos estudos ainda precisam confirmar e aprofundar esses achados", concluem.

Mais transmiss�vel ou mais transmitido?

Essas observa��es de maior mortalidade relacionadas � P.1, por�m, s�o vistas com reservas por outros especialistas.

Eles entendem que s�o necess�rios novos estudos para ratificar esses achados iniciais e determinar realmente se essa linhagem � mais mortal mesmo.

"Precisar�amos replicar essas investiga��es em laborat�rios, com material de necr�psia e comparar como as diferentes variantes se comportam no organismo das pessoas", aponta o virologista Paulo Eduardo Brand�o, da Faculdade de Medicina Veterin�ria e Zootecnia da Universidade de S�o Paulo.

O especialista acredita que existem outros fatores que contribuem para o cen�rio que vivemos.

"Todas as pesquisas sobre a P.1 ou qualquer outra variante sempre esbarram na mesma d�vida: ser� que elas s�o mais transmiss�veis ou foram mais transmitidas?", questiona.

"Por ora, tudo nos indica que o nosso comportamento � preponderante para isso. Quanto mais pessoas vulner�veis, sem os cuidados preventivos b�sicos e sem vacina��o, maiores as chances de as novas linhagens se espalharem pela comunidade", conclui Brand�o.

E esse maior espalhamento, por sua vez, gera uma verdadeira bola de neve: mais transmiss�o significa mais gente infectada, novas cadeias de cont�gio, maior procura por atendimento, falta de leitos em ambulat�rios e UTIs, cuidados inadequados, aumento de mortes...

A m�dica Suzane Lobo, diretora-presidente da Associa��o de Medicina Intensiva Brasileira concorda e detalha os ingredientes extras desta equa��o: o colapso do sistema de sa�de e a falta de vagas para atender a enorme demanda de novos infectados.

"Como � que eu posso dizer que a variante � mais letal se h� outros fatores envolvidos? Demora no atendimento, falta de leitos", pensa.

"Se tiv�ssemos leitos para os pacientes e todos eles fossem atendidos rapidamente, seria poss�vel dizer que existe uma grande chance de a linhagem ser mais letal do ponto de vista epidemiol�gico", completa a especialista.

N�o � exagero afirmar que, nos �ltimos meses, muita gente morreu no Brasil � espera de um atendimento adequado: com os servi�os de sa�de absolutamente abarrotados, n�o existiam as condi��es m�nimas para prestar socorro adequado a todo mundo que chegava nos hospitais.

E esse colapso, claro, influencia nos n�meros de hospitaliza��o e de mortalidade por covid-19.

Ser� que pacientes mais jovens e com mais chance de sobreviver n�o foram privilegiados quando abriam novas vagas na UTI? Ser� que os mais velhos n�o foram mandados para casa, onde se recuperaram ou morreram sem entrar para as estat�sticas oficiais?

Outro ponto fundamental: ser� que a faixa et�ria de 20 a 59 anos n�o � mais afetada atualmente por se expor mais ao risco?

"Os mais jovens est�o se encontrando mais e muitas vezes sem respeitar as medidas n�o-farmacol�gicas, como o uso de m�scaras. Isso aumenta o risco de ter contato com o v�rus", raciocina Brand�o.

Avanço da vacinação ajudou a proteger os mais velhos. É necesssário que a campanha avance mais rápido para evitar o espalhamento ou o surgimento de novas variantes(foto: Getty Images)
Avan�o da vacina��o ajudou a proteger os mais velhos. � necesss�rio que a campanha avance mais r�pido para evitar o espalhamento ou o surgimento de novas variantes (foto: Getty Images)

Por fim, � preciso considerar que a vacina��o contra a covid-19 no Brasil j� cobriu uma boa parcela da popula��o idosa que, portanto, est� protegida das formas mais graves da doen�a.

"E a mensagem de que a infec��o costuma ser grave neles, que eles constituem um grupo de risco, fez com que indiv�duos mais velhos se cuidassem mais quando chegou a segunda onda", diz Gr�f.

Essas e outras d�vidas permanecem sem respostas e podem "poluir" as conclus�es que foram acumuladas sobre o impacto que a variante P.1 teve no Brasil durante os �ltimos meses.

Ent�o, o que fazer?

Enquanto a ci�ncia evolui e conhece mais a fundo os detalhes da P.1 e de outras linhagens que se desenvolvem em todo mundo, uma coisa continua igual: os cuidados necess�rios para prevenir a covid-19.

"O v�rus n�o liga para frio, calor, umidade Ele gosta mesmo � de proximidade entre as pessoas", ensina Brand�o.

"E, para qualquer variante, o uso de m�scaras, o distanciamento f�sico e a limpeza das m�os seguem v�lidos e efetivos", orienta.

Para evitar que as variantes se espalhem mais (ou surjam outras linhagens que tragam um perigo ainda maior), � essencial acelerar tamb�m a vacina��o.

"Quanto mais gente vulner�vel, maior o risco de prolifera��o do v�rus, o surgimento de novas linhagens e todos os problemas relacionados a isso", completa o virologista.

Colaborou Matheus Magenta, da BBC News Brasil em Londres


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