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Estado de Minas

Na ONU, Bolsonaro se divide entre tentativa de mudar imagem internacional e acenos a eleitorado fiel

Presidente brasileiro ir� aos EUA pela primeira vez desde que Trump deixou a Casa Branca e expectativa � de discurso mais moderado do que os dois anteriores na Assembleia Geral


19/09/2021 13:06 - atualizado 19/09/2021 13:32

Jair Bolsonaro em discurso na abertura da Assembleia-Geral da ONU em 2019
Jair Bolsonaro em discurso na abertura da Assembleia-Geral da ONU em 2019 (foto: AFP)

�s v�speras de fazer seu terceiro discurso na Assembleia Geral da ONU, onde o mandat�rio do Brasil tradicionalmente abre os trabalhos do maior encontro de l�deres do mundo, Bolsonaro chega a Nova York, nos Estados Unidos, com a miss�o de conciliar duas tarefas quase antag�nicas.

Por um lado, segundo diagn�stico do Itamaraty, o Brasil precisa reverter uma crise de imagem internacional. Para isso, o presidente brasileiro teria que abordar exemplos de avan�os ambientais em sua gest�o, celebrar o aumento da taxa de vacina��o e o recuo da pandemia entre os brasileiros, repetir o mantra da responsabilidade fiscal na economia e reafirmar o compromisso do Brasil com direitos humanos e valores democr�ticos.

Por outro, depois de atrair centenas de milhares de apoiadores �s ruas no �ltimo sete de setembro e recuar de suas pr�prias palavras dois dias depois, Bolsonaro v� no evento espa�o ideal para reafirmar valores caros � sua base eleitoral - e produzir conte�do replic�vel por ela na internet. Um dos temas que ele garante que defender� na ONU � a aprova��o pelo Supremo Tribunal Federal do marco temporal - que limita a demarca��o de terras ind�genas aos territ�rios ocupados pelos grupos em 1988, assunto que entusiasma a fatia ruralista de seu eleitorado.

"Na pr�xima ter�a-feira, estarei na ONU, participando no discurso inicial daquele evento. Podem ter certeza, l� teremos verdades, realidade do que � o nosso Brasil e do que n�s representamos verdadeiramente para o mundo", afirmou o presidente em discurso em Minas Gerais na �ltima sexta, 17.

A pouco mais de um ano da elei��o que tem chamado a aten��o de agentes pol�ticos internacionais, como o ide�logo do trumpismo Steve Bannon ou expoentes da extrema direita alem� AfD, Bolsonaro pretende ainda usar o palco da ONU para se projetar como uma lideran�a da direita global. Ao ex-porta-voz de Trump, Jason Miller, Bolsonaro demonstrou inten��o de fazer a defesa da liberdade de express�o dos conservadores, que ele v� como alvos de censura das grandes redes sociais por defender suas posi��es pol�ticas.

"O discurso que veremos � o resultado da queda de bra�o entre a diplomacia tradicional do Itamaraty e a pol�tica externa bolsonarista", afirma o embaixador Paulo Roberto de Almeida.

Sem Trump, sem Ernesto, sem Olavo

Quando subiu ao palco da Assembleia Geral da ONU pela primeira vez, em 2019, Bolsonaro estava embalado pela chancela das urnas ao projeto de poder que ele pretendia apresentar ao mundo naquele discurso.

Na audi�ncia, contava com a simpatia do l�der mais poderoso do mundo, o ent�o presidente americano Donald Trump.

Ao seu lado tinha o chanceler Ernesto Ara�jo, o assessor internacional Filipe Martins, al�m da presen�a de seu filho Eduardo Bolsonaro, todos seguidores das ideias do ide�logo de direita Olavo de Carvalho, ent�o radicado nos EUA, que ainda dava o tom de boa parte das decis�es da gest�o.

Ernesto era o chanceler do Brasil em 2019
Ernesto era o chanceler do Brasil em 2019 (foto: Ricardo Moraes/Reuters)

O resultado foi um discurso que apresentava o Brasil como um pa�s que "ressurge depois de estar � beira do socialismo", "ideologia" que teria se infiltrado "no terreno da cultura, da educa��o e da m�dia, dominando meios de comunica��o, universidades e escolas". Bolsonaro ainda atribu�a os problemas ambientais do pa�s a "queimadas praticadas por �ndios e popula��es locais" e a den�ncias "fantasiosas e sensacionalistas" feitas pela imprensa e por lideran�as ind�genas "usadas como massa de manobra por governos estrangeiros".

"Em 2019, Bolsonaro converteu o discurso da ONU num momento simb�lico de reafirma��o do projeto bolso-olavista. Numa fala anti-diplom�tica, ele dava as bases populistas da sua narrativa. Agora, dada a mudan�a de contexto, ele ter� que recalibrar a narrativa", avalia Guilherme Casar�es, professor de rela��es internacionais da Funda��o Get�lio Vargas.

Dois anos mais tarde, quando subir � tribuna da ONU no pr�ximo dia 21, Bolsonaro n�o contar� com a presen�a de Trump. O atual ocupante da Casa Branca � o democrata Joe Biden, contra quem o presidente brasileiro torceu abertamente nas elei��es de 2020. Tamb�m j� n�o est�o no poder outros l�deres simp�ticos ao bolsonarismo, como o ex-primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu ou mesmo o ex-presidente argentino Maur�cio Macri.

"Bolsonaro est� muito mais isolado agora do que em 2019. Vai ter que moderar ao menos um pouco o que diz porque j� n�o tem Trump pra servir como escudo. E deve ter poucos encontros bilaterais, porque os chefes de Estado est�o cautelosos em se associar a ele. O que sobrou pra ele, o Victor �rban, da Hungria?", questiona o brasilianista Brian Winter, editor-chefe da revista America Quartely.

Winter nota que desde a posse, Biden conversou diretamente com mais de tr�s dezenas de l�deres ao redor do mundo, mas Bolsonaro n�o foi um deles. "At� mesmo com o presidente da Est�nia Biden falou", diz Winter. N�o h� previs�o de encontro bilateral entre Biden e Bolsonaro, mas o Itamaraty espera que haja um contato r�pido e amistoso entre eles j� que o presidente americano discursar� no mesmo local imediatamente ap�s o brasileiro. O �nico encontro bilateral com chefe de Estado confirmado at� o �ltimo s�bado, 18, ser� com o primeiro-ministro brit�nico Boris Johnson. Bolsonaro tamb�m se encontrar� com o Secretario Geral da ONU Antonio Guterres.

No plano dom�stico, a situa��o tamb�m est� muito diferente do que era h� dois anos. Ernesto Ara�jo j� n�o est� mais na chancelaria - nem mesmo no Itamaraty, licenciado por raz�es pessoais. Foi substitu�do pelo diplomata discreto e tradicional Carlos Fran�a, cujas prioridades s�o vacina, meio ambiente e economia. O assessor Filipe Martins foi afastado de assuntos internacionais depois de sofrer processo por suposto ato supremacista branco no Congresso. Martins sequer embarcou para Nova York na numerosa comitiva presidencial, que inclui at� os ministros da Justi�a, Anderson Torres, e do Turismo, Gilson Machado.

E Olavo de Carvalho convalesce em um hospital p�blico de S�o Paulo e, conforme afirmou h� seis dias, no Twitter, "mal tenho conseguido me manter bem informado sobre o estado de coisas no Brasil".

Meio ambiente e vacina

Em vez de se apresentar, como fez em 2019, Bolsonaro, que tem sido chamado de "Trump dos Tr�picos" tanto por apoiadores quanto por cr�ticos internacionais, ter� o desafio de reapresentar o Brasil, alvo de desconfian�a de investidores internacionais, que t�m hesitado em trazer seu dinheiro ao pa�s.

"H� uma �bvia crise de imagem, especialmente por conta da quest�o ambiental, e essa seria uma �tima oportunidade de come�ar a resolver isso. Em 2019, tivemos aquele discurso bem fora do esperado pela comunidade internacional, em 2020 foi um pouco melhor e agora seria a chance pra retomar uma normalidade e adotar uma fala mais pragm�tica", afirma um embaixador, que falou � BBC News Brasil reservadamente.

Na �ltima semana, o chanceler Fran�a esteve no gabinete de Bolsonaro ao menos quatro vezes, para alinhavar o discurso. O Itamaraty defende que o presidente apresente em detalhes os esfor�os para combater os problemas de desmatamento, que bateram recorde nos �ltimos dois anos.

Al�m de destacar que o Brasil � o pa�s em desenvolvimento com metas mais ambiciosas, tanto no combate ao desmatamento (zerar at� 2030) quanto � emiss�o de gases do efeito estufa (alcan�ar a neutralidade at� 2050) e relembrar que o Brasil det�m mais de 80% de sua matriz energ�tica de fonte limpa, os diplomatas brasileiros querem que Bolsonaro anuncie em plen�rio o cumprimento de uma promessa que fez em abril, na C�pula do Clima de Joe Biden.

Na ocasi�o, o brasileiro havia dito que dobraria a verba de fiscaliza��o para coibir a devasta��o ambiental. Em meados de agosto, o governo anunciou incremento de 118% nos recursos de �rg�os como o Ibama. E ainda no m�s passado, os dados apontaram uma queda no desflorestamento, interrompendo uma tend�ncia de aumento dos �ndices pelo terceiro ano consecutivo.

Em outra frente, Fran�a defende que Bolsonaro explore o bom momento do pa�s na pandemia. O Brasil rec�m-ultrapassou os EUA em propor��o de cidad�os vacinados com uma dose, embora esteja muito distante em rela��o � taxa dos vacinados com duas doses. Possivelmente pelo avan�o na imuniza��o, a m�dia m�vel de casos e mortes por covid-19 recuou para patamares inferiores ao verificado ao longo do �ltimo ano.

A ret�rica costurada pelo Itamaraty, no entanto, encontra limites na condi��o pessoal do presidente brasileiro, que oficialmente n�o est� vacinado. Na semana passada, o presidente da Assembleia Geral Abdulla Shahid enviou carta aos Estados-membros em que dizia endossar a obrigatoriedade de apresenta��o de certificados de vacinas pelos l�deres para acessar o pr�dio da ONU. A regra seria a mesma imposta pela prefeitura de Nova York aos habitantes da cidade que querem frequentar um Centro de Conven��es.

Se fosse institu�do, o protocolo poderia barrar Bolsonaro e gerar constrangimento ao Brasil. Mas a decis�o dependia dos estados-membros, que decidiram deixar em vigor apenas o "sistema de honra", no qual os mandat�rios declaram, sem checagens, se est�o com sintomas ou tiveram contato direto com a infectados. Ainda assim, a vacina��o universal dever� ser o grande mote da Assembleia Geral em 2021.

Sobre o assunto, na �ltima live semanal antes do discurso, Bolsonaro questionou a necessidade do imunizante e voltou a lan�ar d�vidas sobre sua efic�cia. "O que acontece, voc� vai tomar vacina para que? Para ter anticorpos. A minha taxa de anticorpos est� l� em cima. Eu te apresento o documento, estou com 991 (no exame m�dico IgG). Ent�o eu estou bem. Vou tomar vacina CoronaVac, por exemplo, que n�o vai chegar a essa efetividade, para que eu vou tomar? Agora, todo mundo j� tomou vacina no Brasil? Depois que todo mundo tomar, eu vou decidir meu futuro a�", afirmou o presidente, ao lado do ministro da Sa�de, Marcelo Queiroga, que tamb�m comp�e a comitiva a Nova York. Bolsonaro � o �nico entre os l�deres do G-20 que afirma n�o ter se vacinado.

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