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Estado de Minas

Covid: o que � a 'superimunidade' e como ela nos protege contra infec��es

A imunidade h�brida � adquirida por quem foi vacinado ap�s ficar doente. Isso leva a n�veis maiores de anticorpos e mais diversificados, capazes de achar pontos fracos dos v�rus. Cientistas estudam mecanismo para aprimorar vacinas.


06/03/2022 19:26

células B
(foto: Getty Images)

Em outubro de 2020, uma equipe de virologistas da Universidade Rockefeller de Nova York, nos Estados Unidos, embarcou em um projeto de um ano para tentar antecipar quais formas perigosas de covid-19 poderiam surgir no futuro.

Embora o espectro de novas variantes ainda n�o preocupasse l�deres pol�ticos e cidad�os em todo o mundo, os cientistas estavam bem cientes de que o v�rus quase certamente sofreria muta��es para se tornar mais infeccioso.

O objetivo dos cientistas da Rockefeller era criar uma vers�o artificial da prote�na spike que o coronav�rus usa para penetrar nas c�lulas que pudesse escapar de todos os tipos conhecidos de anticorpos protetores encontrados no sangue de sobreviventes da covid-19.

Nos 12 meses seguintes, eles mexeram com diferentes combina��es de muta��es na superf�cie da prote�na spike at� encontrar um conjunto de 20 que parecia torn�-la particularmente resistente a qualquer coisa que o sistema imunol�gico pudesse lan�ar contra ela.

Para testar este "Frankenspike" cultivado em laborat�rio, eles o inseriram no que os virologistas chamam de pseudotipo de v�rus, que foi projetado para que n�o tenha material gen�tico suficiente para se replicar, permitindo que os cientistas o modifiquem e entendam como ele se comporta sem qualquer risco de ele escapar.

Inicialmente, as coisas evolu�ram como esperado. Quando os virologistas expuseram seu v�rus rec�m-projetado a amostras de sangue retiradas de pessoas que se recuperaram da covid-19 ou foram vacinadas contra a doen�a, ele escapou habilmente de todos os anticorpos.

Mas ent�o uma coisa incr�vel aconteceu. Quando eles testaram a prote�na no sangue de pessoas que se recuperaram de covid-19 em 2020 e tamb�m foram vacinadas muitos meses depois, seus anticorpos conseguiram se ligar ao v�rus e neutraliz�-lo completamente.

"Foi realmente incr�vel", diz Michel Nussenzweig, professor de Imunologia Molecular da Rockefeller e um dos envolvidos no projeto.

"Uma das coisas mais importantes que aprendemos com a pandemia � como a resposta do nosso sistema imunol�gico difere dependendo de termos sido naturalmente infectados, vacinados ou ambos".

(Isso n�o significa que seja uma boa ideia se infectar intencionalmente, pois toda infec��o traz riscos.)

Ao longo dos �ltimos quatro meses, as descobertas da equipe da Rockefeller foram observadas na vida real.

As pessoas que se recuperaram de uma infec��o por covid-19 no passado e foram vacinadas parecem ser mais resistentes a novas variantes, da delta � �micron.

As células B foram descobertas pela primeira vez em galinhas na década de 1960
As c�lulas B foram descobertas pela primeira vez em galinhas na d�cada de 1960 (foto: Getty Images)

Os imunologistas coletaram amostras de sangue desses indiv�duos e descobriram que eles tinham uma esp�cie de "superimunidade", batizada pela comunidade cient�fica de imunidade h�brida.

Essas pessoas n�o apenas produzem n�veis enormes de anticorpos, muito mais do que aqueles que acabaram de receber uma dose dupla e a dose de refor�o, como tamb�m uma gama muito mais diversificada de anticorpos, que t�m maior chance de encontrar pontos fracos virais.

Um estudo recente de cientistas de Boston e da �frica do Sul descobriu que pessoas que haviam sido infectadas anteriormente, antes de receberem duas doses da vacina e um refor�o, tinham maior imunidade contra a variante �micron, a coisa mais pr�xima ao v�rus artificial da Rockefeller que se observou na vida real.

"Uma vez que as pessoas que tiveram covid-19 s�o vacinadas com uma vacina de mRNA, elas produzem uma resposta de anticorpos tr�s vezes maior do que aquelas que receberam a vacina sem infec��o pr�via", explica Nussenzweig.

Mas a raz�o pela qual essas pessoas mostram respostas t�o fortes � devido a uma faceta h� muito negligenciada do nosso sistema imunol�gico, um tipo de gl�bulo branco conhecido como c�lulas B de mem�ria.

Essas c�lulas s�o geradas em resposta a um v�rus e conseguem lembrar disso caso o pat�geno retorne. Por muito tempo, sab�amos relativamente pouco sobre essas c�lulas e como elas se comportavam.

Mas por meio de pesquisas sobre HIV, ebola, doen�as autoimunes e, agora, covid-19, estamos come�ando a entender como elas s�o vitais para determinar nossas respostas a infec��es e vacinas.

Das galinhas ao HIV

Na d�cada de 1890, o fisiologista alem�o Emil von Behring, um homem que ficou conhecido como "o salvador das crian�as" devido ao seu trabalho vencedor do Pr�mio Nobel sobre tratamentos para t�tano e difteria, prop�s a exist�ncia de c�lulas que pudessem se lembrar de encontros passados com um infec��o espec�fica e gerar anticorpos ao topar com ela novamente.

Levaria mais 70 anos para que se observasse sinais das ideias de von Behring. Na d�cada de 1960, os imunologistas descobriram que as galinhas cuja bursa, um importante �rg�o imunol�gico das aves, havia sido destru�da pela radia��o, n�o possu�am certas c�lulas necess�rias para produzir anticorpos.

Elas ficaram conhecidas como c�lulas derivadas de bursa ou c�lulas B.

Em meados da d�cada de 1970, descobriu-se que essas c�lulas s�o formadas em humanos na medula �ssea, antes de migrar para os g�nglios linf�ticos ou para o ba�o.

Agora sabemos que, ao longo de nossas vidas, estamos constantemente produzindo novas c�lulas B.

O corpo cont�m at� cerca de 10 bilh�es delas, e cada c�lula B cont�m receptores que podem reconhecer diferentes tipos de formas de ant�genos na superf�cie de um v�rus.

Vacina
Evid�ncias sugerem que as vacinas de mRNA provocam uma resposta mais forte das c�lulas B de mem�ria contra a covid-19 do que outros tipos de vacinas (foto: Getty Images)

Isso � importante porque, embora as c�lulas B n�o se liguem aos v�rus, elas podem se transformar em c�lulas plasm�ticas quando detectam uma amea�a.

Essas c�lulas plasm�ticas produzem anticorpos direcionados contra o mesmo ant�geno viral que sua c�lula B nativa.

Um grupo menos diversificado de c�lulas B significa menos anticorpos que podem ser capazes de neutralizar o v�rus.

Uma das coisas que a covid-19 ensinou aos imunologistas � que as pessoas que t�m uma maior diversidade de c�lulas B est�o melhor equipadas para combater um novo pat�geno e, em particular, as variantes em constante evolu��o da covid-19.

Isso � afetado pela idade, por condi��es de sa�de subjacentes e tamb�m simplesmente pela gen�tica.

"Todo mundo ter� um repert�rio diferente de c�lulas B para responder a qualquer infec��o", diz Ali Ellebedy, professor associado de patologia e imunologia da Escola de Medicina da Universidade de Washington.

� medida que envelhecemos, duas coisas acontecem com a resposta das c�lulas B. Primeiro, o corpo come�a a produzir uma variedade menor de c�lulas B, o que significa que � menos prov�vel que elas tenham receptores que reconhe�am ant�genos em uma c�lula.

E, mais importante, elas demoram mais para se mobilizar contra uma amea�a, de modo que pat�genos particularmente letais podem sobrecarregar o sistema imunol�gico antes que ele entre em a��o.

S�o esses mesmos fatores que tornaram as pessoas mais jovens com condi��es de sa�de subjacentes mais vulner�veis � covid-19.

Mas quando seu corpo luta contra uma infec��o ou recebe uma vacina, ele desencadeia um truque imunol�gico inteligente.

Algumas das c�lulas B se tornam as chamadas "c�lulas B de mem�ria", que podem circular na corrente sangu�nea por d�cadas, prontas para serem reativadas e lan�arem uma resposta de anticorpos caso o v�rus retorne.

Esses anticorpos tamb�m desempenham um papel na supress�o de infec��es cr�nicas que permanecem latentes no corpo durante grande parte de nossas vidas, como o v�rus Epstein-Barr.

Parece que esses v�rus s�o capazes de se reativar quando o corpo est� enfraquecido, como parece ser o caso de uma propor��o de pacientes de covid-19 longa.

Mas h� muitas nuances na resposta das c�lulas B de mem�ria. Uma das coisas que os imunologistas aprenderam com estudos de sobreviventes do ebola � que infec��es graves parecem provocar um n�mero muito maior de c�lulas B de mem�ria do que apenas vacinas.

"Quando voc� tem uma infec��o grave, as c�lulas do seu corpo produzem uma grande quantidade de v�rus", diz Nussenzweig.

"Est� em todo o sistema respirat�rio, nariz, pulm�es, vias a�reas superiores, mucosa. Todo o sistema imunol�gico est� envolvido na resposta e est� respondendo a todos os elementos desse v�rus, por isso as infec��es naturais podem levar a uma melhor mem�ria do sistema imunol�gico."

prueba de covid
As pessoas que foram vacinadas contra a covid-19 e expostas ao v�rus podem ter uma "imunidade h�brida" ben�fica (foto: Getty Images)

Nos �ltimos seis meses, Nussenzweig vem estudando as sutis diferen�as entre a infec��o natural por covid-19 e a vacina��o.

Ao isolar centenas de c�lulas B de mem�ria de pessoas que foram infectadas ou vacinadas em v�rios momentos, ele descobriu que a infec��o natural parece resultar em c�lulas B de mem�ria que evoluem continuamente.

Isso significa que elas produzem anticorpos com maior probabilidade de proteger contra novas variantes do v�rus.

A principal revela��o para os imunologistas � que esse efeito ocorre mais fortemente quando as pessoas foram infectadas e vacinadas depois.

Os cientistas est�o agora procurando entender se podemos ajustar os regimes de vacina��o de tal forma que os imunizantes sozinhos possam provocar essa resposta de imunidade h�brida.

Caso seja poss�vel, isso poderia fornecer uma arma crucial contra novas variantes da covid-19 e futuras pandemias.

A pr�xima pandemia

Em 2007, um grupo de pesquisadores da Universidade de Sa�de e Ci�ncia do Oregon, nos Estados Unidos, embarcou em uma miss�o para tentar entender por que algumas respostas imunes a certas infec��es ou vacinas parecem durar mais do que outras.

Eles compararam os anticorpos produzidos por v�rias tecnologias de vacinas comuns, desde a contra o sarampo, que � administrada a pessoas com uma forma enfraquecida do v�rus completo, at� as contra t�tano e difteria, que cont�m ant�genos virais, junto com anticorpos gerados por pat�genos comuns, como Epstein-Barr ou citomegalov�rus.

O artigo resultante mostrou que a vida m�dia dos anticorpos varia drasticamente dependendo do tipo espec�fico de v�rus ou vacina.

Embora os anticorpos gerados para suprimir o citomegalov�rus pudessem permanecer no corpo quase indefinidamente, a resposta ao t�tano diminuiu ap�s alguns anos.

"Isso nos mostrou que a programa��o celular que d� origem �s c�lulas B de mem�ria � muito diferente, dependendo da natureza da infec��o ou do imun�geno", diz John Wherry, diretor do Instituto de Imunologia da Universidade da Pensilv�nia, nos Estados Unidos.

Agora, a covid-19 proporcionou uma oportunidade �nica de comparar diferentes tecnologias de vacinas para o mesmo v�rus para tentarmos entender o que leva � resposta imune mais duradoura e eficaz, observando como as c�lulas B de mem�ria respondem ao longo do tempo.

At� agora, parece que as vacinas de RNA mensageiro, como as feitas por Pfizer, Moderna e Novartis, parecem funcionar melhor, embora os pesquisadores ainda estejam tentando descobrir exatamente o porqu�.

"Estas vacinas produzem uma resposta de c�lulas B de mem�ria muito mais robusta", explica Ellebedy. "Se voc� compar�-las com a vacina da gripe, por exemplo, a resposta � pelo menos dez vezes maior."

Vacinação
Os cientistas est�o trabalhando em uma nova gera��o de vacinas que geram c�lulas B de mem�ria (foto: Getty Images)

A intrigante descoberta da imunidade h�brida nos �ltimos meses levou os cientistas a analisar diferentes regimes de vacinas contra covid-19 para descobrir se misturar e combinar v�rias inje��es pode provocar uma resposta imune igualmente poderosa.

Nussenzweig observa que os primeiros dados concretos sobre isso come�ar�o a surgir no final de 2022 e podem nos ajudar a entender a melhor forma de usar vacinas e doses de refor�o contra outros v�rus, da gripe ao HIV.

"Teremos muitos dados cl�nicos e imunol�gicos que nos informar�o sobre as melhores pr�ticas", diz ele.

"Por exemplo, se dermos uma inje��o de refor�o a pessoas que n�o foram infectadas, isso fortalece suas c�lulas B de mem�ria em cima dos anticorpos que j� est�o circulando? Essas pessoas ser�o mais capazes de lidar com uma infec��o subsequente por covid-19?"

Wherry prev� que a crescente compreens�o das c�lulas B em geral por meio da covid-19 tamb�m pode levar a benef�cios no campo da imunoterapia contra o c�ncer.

Ele explica que agora sabemos que as c�lulas B produzem anticorpos contra certas partes de tumores, assim como fazem contra um v�rus.

As c�lulas B tamb�m trabalham em conjunto com outros atores do sistema imunol�gico, como c�lulas T e c�lulas dendr�ticas, para criar um ambiente ben�fico para atacar o tumor, e um dos objetivos das futuras imunoterapias � estimular a intera��o entre essas c�lulas.

"Essa pequena intera��o de tr�s c�lulas est� associada a um melhor resultado para todas as terapias contra o c�ncer", observa ele. "Toda vez que isso acontece, a resposta � melhor."

Saber a melhor forma de ativar nosso sistema imunol�gico tamb�m desempenhar� um grande papel em permitir que os sistemas de sa�de respondam rapidamente e reduzam a mortalidade quando a pr�xima pandemia ocorrer, algo que a maioria dos cientistas acredita ser inevit�vel.

"Haver� uma pr�xima vez", diz Nussenzweig. "Tr�s v�rus da SARS surgiram nos �ltimos 20 anos e causaram grandes problemas. N�o sabemos o que acontecer� a seguir, ent�o, temos que estar preparados."


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