Mortes relacionadas ao �lcool dispararam durante a pandemia

O primeiro ano da pandemia de covid-19 foi marcado por um salto no n�mero de mortes relacionadas ao abuso de �lcool nos Estados Unidos.

Segundo pesquisadores do Instituto Nacional sobre Abuso de �lcool e Alcoolismo (NIAAA, na sigla em ingl�s), divis�o dos Institutos Nacionais de Sa�de, ag�ncia de pesquisa biom�dica do governo americano, o n�mero de mortes envolvendo �lcool passou de 78.927 em 2019 para 99.017 em 2020, um aumento de 25,5%. Isso inclui desde casos de intoxica��o pelo consumo excessivo de �lcool at� casos de fal�ncia hep�tica relacionada � bebida.

Quando considerada a taxa por 100 mil pessoas, o aumento foi 25,9%, passando de 27,3 mortes em 2019 para 34,4 em 2020. Nos 20 anos anteriores, de 1999 at� 2019, a m�dia de crescimento foi de 2,5% por ano.

Os dados foram apresentados em um estudo publicado em 18 de mar�o no Journal of the American Medical Association (JAMA), revista cient�fica da Associa��o M�dica Americana, e refletem um fen�meno tamb�m registrado em outros pa�ses, como o Brasil.

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De acordo com um levantamento divulgado no ano passado pela organiza��o independente de sa�de p�blica Vital Strategies, com base em dados Minist�rio da Sa�de brasileiro, de 2019 para 2020 houve aumento de 18,4% em mortes no Brasil relacionadas a "transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de �lcool".

O levantamento no Brasil usou crit�rios diferentes do estudo americano, mas o salto no primeiro ano da pandemia tamb�m ficou muito acima da m�dia da d�cada anterior, quando foram registrados aumentos pequenos ou at� queda em alguns anos.

Tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, o aumento desses n�meros pode estar relacionado ao estresse gerado pela pandemia, na qual muitas pessoas enfrentaram isolamento e mudan�as abruptas na rotina, no trabalho e nos h�bitos de consumo, al�m de adiarem tratamentos de sa�de f�sica e mental.

"Maior consumo de �lcool para enfrentar fatores de estresse relacionados � pandemia, mudan�as de pol�ticas relacionadas ao �lcool e interrup��es no acesso a tratamento s�o poss�veis fatores que contribu�ram (para o aumento)", dizem os pesquisadores americanos.

Aumento no consumo

O principal autor do estudo americano, o neurocientista Aaron White, que � conselheiro cient�fico s�nior do diretor do NIAAA, diz � BBC News Brasil que n�o esperava ver um salto t�o grande nos �bitos.

"Est�vamos preocupados com a possibilidade de um aumento grande nas mortes, porque sabemos que as pessoas tendem a beber mais quando est�o sob estresse, e a pandemia � uma enorme fonte de estresse", observa White.

"Mas n�o antecip�vamos que fosse ser uma mudan�a t�o grande. At� ent�o, nos �ltimos 20 anos, o maior aumento anual havia sido de cerca de 5%", ressalta.

Os pesquisadores decidiram medir o aumento no n�mero de mortes por �lcool depois que estudos indicaram um salto no consumo de bebidas alc�olicas para lidar com o estresse durante a pandemia.

Outros estudos mostravam que, no per�odo, houve crescimento no n�mero de visitas a hospitais por conta do consumo de �lcool e tamb�m nos transplantes por causa de doen�as do f�gado relacionadas ao �lcool.

Homens e mulheres de todas as idades

Para chegar aos resultados, White e seus colegas analisaram certid�es de �bito de pessoas com 16 anos ou mais em que o �lcool foi listado como causa principal ou fator que contribuiu para a morte.

Est�o inclu�das mortes resultantes de doen�as do f�gado associadas ao �lcool, de transtornos mentais e de comportamento relacionados ao consumo de �lcool e de overdose de drogas envolvendo tamb�m �lcool, entre outras causas.

O estudo revelou aumento nos �bitos por �lcool de homens e mulheres de todas as idades, com os maiores saltos nas faixas et�rias de 35 a 44 anos (39,7%) e de 25 a 34 anos (37%).

Os pesquisadores ressaltam que, em 2020, um total de 2.042 certid�es de �bito listaram tanto �lcool como covid-19 entre as causas de morte, sendo que em 1.475 delas a causa principal era covid-19.

"Apenas uma pequena propor��o do aumento de mortes relacionadas ao �lcool envolve covid-19 diretamente", afirmam os cientistas.

A taxa geral de �bitos por 100 mil pessoas, quando levadas em conta todas as causas de morte, aumentou 16,6% de 2019 para 2020.

Crescimento sem precedentes

Os impactos da pandemia de covid-19 nos Estados Unidos s�o vistos n�o apenas nos �bitos diretamente causados pela doen�a, que j� deixou quase 1 milh�o de mortos no pa�s, mas tamb�m podem estar ligados a aumentos hist�ricos em diversos outros tipos de mortes.

O pa�s enfrenta um crescimento sem precedentes na taxa de homic�dios, com salto de 29% de 2019 a 2020 segundo o FBI (a pol�cia federal americana), maior aumento de um ano para o outro desde que dados nacionais come�aram a ser coletados, em 1960.

Apesar de ressaltarem que o aumento da viol�ncia � resultado de uma combina��o de diversos fatores e que as causas ainda n�o est�o claras, alguns analistas citam o estresse e o isolamento provocados pela pandemia, que tamb�m levou � interrup��o de programas de preven��o de viol�ncia e aconselhamento.

Segundo o Departamento de Transportes dos Estados Unidos, o n�mero de mortes no tr�nsito de janeiro a setembro de 2021 foi o maior j� registrado nos primeiros nove meses de um ano desde 2006.

O salto em rela��o ao mesmo per�odo de 2020 foi de 12%, maior percentual de crescimento nos primeiros nove meses de um ano desde pelo menos 1975. Entre as causas citadas por especialistas em tr�nsito est� um aumento no n�mero de acidentes envolvendo motoristas embriagados.

Em seu estudo, White identificou aumento de 14% em mortes no tr�nsito relacionadas a �lcool no per�odo analisado. Mas o cientista desconfia que o n�mero pode ser bem maior, j� que muitas vezes o �lcool n�o � listado como fator nesse tipo de morte.

Overdoses

Durante a pandemia tamb�m houve nos EUA uma explos�o nas mortes por overdose de drogas, que de abril de 2020 a abril de 2021 ultrapassaram pela primeira vez a marca de 100 mil v�timas em um ano, aumento de 30% sobre os 12 meses anteriores.

Segundo o CDC (Centros de Controle e Preven��o de Doen�as, ag�ncia de pesquisa em sa�de p�blica ligada ao Departamento de Sa�de), a pandemia e as medidas adotadas para conter a covid-19 tiveram papel no crescimento. "O aumento nas mortes por overdose de drogas parece ter sido acelerado pela pandemia de covid-19", diz a ag�ncia.

White destaca que o �lcool teve influ�ncia em cerca de uma a cada cinco mortes envolvendo overdoses de outras drogas.

O professor Sean Esteban McCabe, que � diretor do Centro para o Estudo de Drogas, �lcool, Fumo e Sa�de da Universidade de Michigan e n�o participou do estudo, diz � BBC News Brasil que o salto nas mortes relacionadas ao �lcool durante a pandemia � consistente com o aumento de overdoses de outras drogas.

"Infelizmente, para n�s que trabalhamos com os indiv�duos mais afetados por dist�rbios no uso de subst�ncias, os resultados n�o surpreendem, e refor�am o que estamos vendo em nossas comunidades", afirma.

"A pandemia representou a tempestade perfeita, aumentando fatores de estresse e desmontando redes de apoio social, especialmente para aqueles em recupera��o (da depend�ncia)", salienta McCabe.

Futuro

Apesar de ter sido exacerbado durante a pandemia, o abuso de �lcool j� havia come�ado a aumentar nos anos anteriores nos Estados Unidos.

"J� est�vamos escrevendo sobre esse grande crescimento em danos relacionados ao �lcool e como isso parece ser parte de um aumento geral em problemas de sa�de mental", diz White.

"Mesmo antes da pandemia, havia uma grande �nfase nas chamadas 'mortes de desespero', que envolvem suic�dio, overdoses e doen�as do f�gado, e nas quais o �lcool tem um papel importante", ressalta o cientista.

Dados preliminares dos primeiros seis meses de 2021 indicam que o n�mero de mortes relacionadas ao �lcool permaneceu alto no segundo ano da pandemia.

"Acho que os n�meros para 2021 ser�o ainda mais preocupantes", afirma White, lembrando que, em 2020, os Estados Unidos enfrentaram a pandemia por apenas nove dos 12 meses, j� que os casos de covid-19 e as medidas para conter a doen�a come�aram a ganhar for�a somente a partir de mar�o daquele ano.

"Precisamos de um esfor�o muito maior para ajudar uns aos outros a desenvolver estrat�gias saud�veis e sustent�veis de lidar com o estresse", afirma.

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