Publica��es que acusam o MST, o MTST e o PT de destruir casas em Pernambuco n�o t�m base

No �ltimo 15 de outubro, come�aram a circular publica��es que afirmam que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e o Partido dos Trabalhadores (PT) teriam destru�do casas que “Bolsonaro iria entregar” a moradores de Santa Cruz do Capibaribe, em Pernambuco.

O conte�do superou 3 milh�es de intera��es nas redes sociais. Contudo, a participa��o de partidos pol�ticos ou movimentos sociais n�o foi identificada pela Pol�cia Federal.

As tr�s organiza��es negaram seu envolvimento na ocupa��o, e uma das moradoras que participou contou � AFP que se tratou de uma organiza��o de fam�lias por meio de grupos no WhatsApp: “Ou pagavam o aluguel, ou passavam fome”.

“Veja o que o MST, MTST puxadinho do PT fez com as casas que Bolsonaro iria entregar aos pobres de Santa Cruz do Capibaribe Agora em novembro” , diz a legenda de um dos v�deos publicados no Facebook ( 1 , 2 , 3 ). 

Alega��es similares circularam amplamente no Twitter , no Instagram , no YouTube e no TikTok .

O presidente Jair Bolsonaro, inclusive, publicou um v�deo que dizia: “Lamentavelmente, o MTST, um dos bra�os do Movimento Sem Terra, mostra a sua crueldade e selvageria. Muito provavelmente influenciados por partidos de esquerda, invadiram o residencial que seria entregue � popula��o at� o final do ano”.

As postagens, que at� 21 de outubro somavam mais de 100 mil compartilhamentos nas contas do mandat�rio no Instagram , no Twitter e no Facebook , trazem na legenda os dizeres: “- Marginais depredaram 800 casas que seriam entregues em novembro. - Santa Cruz do Capibaribe/PE, cidade onde estive em 04/setembro �ltimo” .

Mudan�a de prazos

A ocupa��o em Santa Cruz do Capibaribe, em Pernambuco, aconteceu no conjunto habitacional Residencial Cruzeiro , que faz parte do programa Minha Casa Minha Vida, da Caixa Econ�mica Federal. O banco informou que as obras das 500 moradias foram iniciadas em dezembro de 2017, durante a gest�o do ex-presidente Michel Temer (MDB). A previs�o de entrega era para 2019, segundo afirmou a prefeitura da cidade em dezembro de 2018.

Em novo comunicado divulgado em 21 de agosto deste ano, a prefeitura de Santa Cruz do Capibaribe disse que a “estimativa de entrega das casas para os contemplados [era] para o m�s de novembro” de 2021. 

A ocupa��o

Oito dias depois, a �rea foi ocupada, conforme informou a Caixa � AFP: “O Residencial Cruzeiro (...) foi ocupado irregularmente em 29/08/2021” .

O fato foi noticiado pela imprensa local ( 1 , 2 ). O portal Santa Cruz Online e o blog Merece Destaque afirmaram � �poca que “um grupo de pessoas se articulou atrav�s de grupo de WhatsApp” . As reportagens n�o detalham o envolvimento de organiza��es sociais ou pol�ticas.

A Pol�cia Federal em Pernambuco informou � AFP que o inqu�rito sobre o caso est� em andamento, mas que “at� o momento n�o foi identificada a participa��o de partidos pol�ticos e/ou movimentos sociais em qualquer ocorr�ncia sobre esse caso” .

Diante do ocorrido, a Caixa adotou “as medidas judiciais cab�veis para a reintegra��o de posse das unidades” , informou em nota � AFP em 19 de outubro.

Uma decis�o judicial proferida no dia 1º de setembro pelo Ju�zo da 24ª Vara Federal da Justi�a Federal em Pernambuco (JFPE) concedeu “reintegra��o de posse em favor da Caixa Econ�mica Federal contra invasores das obras do Residencial Cruzeiro” .

As casas come�aram a ser invadidas no dia 29 de agosto por 50 pessoas e, segundo consta na decis�o, contava com cerca de 200 fam�lias na data da a��o. 

Em audi�ncia de concilia��o realizada no dia 8 de outubro com a participa��o de oito ocupantes do Residencial Cruzeiro e de institui��es envolvidas como a Caixa, a Pol�cia Federal e o munic�pio de Santa Cruz do Capibaribe, ficou acordado que a popula��o desocuparia o local at� o dia 18 do mesmo m�s. 

Durante o cumprimento da reintegra��o de posse e da desocupa��o volunt�ria, a Justi�a Federal de Pernambuco informou � AFP que o oficial de Justi�a observou que “algumas casas estavam danificadas, com partes do telhado retirado; outras com janelas quebradas, parcialmente incendiadas, em uma das ruas a prote��o das casas foi derrubada” . 

Contudo, o �rg�o acrescentou que “at� o momento, n�o h� a informa��o de comprova��o da autoria do inc�ndio e dos danos �s casas” e que “o MST e MTST n�o integram o polo da a��o, bem como n�o houve representa��o dos mesmos na audi�ncia [de concilia��o] ” .

Ap�s a viraliza��o do conte�do, o MST se posicionou : “Sem Terra visitar�o conjunto habitacional na sexta-feira (22) para desmentir boato compartilhado por Bolsonaro” . Em resposta aos questionamentos do Checamos sobre o caso, o diretor do MST em Pernambuco, Paulo Mansan, disse que a organiza��o n�o estava nesse espa�o: “N�s somos a favor de luta, de ocupa��es, inclusive para denunciar o abandono e o descaso do governo Bolsonaro, mas em hip�tese alguma vamos depredar um habitacional que vai servir para quem estava mais precisando” . 

O MTST compartilhou uma resposta ao presidente, afirmando que Bolsonaro “requentou not�cia falsa” . A organiza��o disse ao Checamos que n�o tem “qualquer rela��o com as acusa��es” das publica��es viralizadas e que “inclusive n�o possui atua��o na regi�o” . 

O PT, tamb�m mencionado nos v�deos, disse � AFP, por meio de sua assessoria de imprensa, que “institucionalmente, n�o esteve envolvido com a ocupa��o” , acrescentando que “logicamente existem militantes do partido participando de v�rios movimentos e frentes populares, mas n�o representam a dire��o” .

Grupos do WhatsApp

Em document�rio produzido pelo canal no YouTube Slam & Balai� Caruaru , uma lideran�a disse que a ocupa��o “foi coisa de hora, de momento” , explicando que mora em Santa Cruz do Capibaribe e que n�o tem tido sucesso em sorteios de moradias anteriores, assim como outras fam�lias que ali estavam. “Por onde eu ando nessas ruas, o que eu vejo � muita fam�lia necessitada, muito pai de fam�lia, muita crian�a” , contou. 

Quando estiveram no local em setembro passado, os diretores do document�rio disseram que viram pessoas compartilhando velas, produtos de higiene e comida, e cozinhando � �lcool no local. 

Em entrevista ao Checamos, uma moradora que participou da ocupa��o contou que soube que as casas estavam sendo invadidas por meio de grupos no WhatsApp. Ela disse que n�o tem envolvimento com nenhum movimento, como o MST ou MTST, e que se juntou a outras fam�lias que ocuparam as casas pois “n�o tinham para onde ir. Ou pagavam o aluguel, ou passavam fome” . 

Ao longo dos quase 15 minutos do document�rio, o Checamos n�o identificou qualquer bandeira ou cartaz do MST ou do MTST. Os diretores afirmaram que a impress�o passada no local era a de que a a��o n�o era organizada pelos movimentos.
Jaime Amorim, diretor nacional do MST, disse ao Checamos que a organiza��o assume a autoria de suas ocupa��es: “� f�cil identificar onde o MST est�: a gente bota a bandeira e fica claro para todo mundo. L� n�o tinha bandeira e n�o foi uma a��o organizada pelo MST” .

Repercuss�o

Com a viraliza��o das publica��es, pol�ticos se posicionaram nas redes sociais, endossando o conte�do dos v�deos, como o presidente, Jair Bolsonaro, e recha�ando, como feito pela deputada federal e presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann , que disse em seu perfil em 18 de outubro: “A fake news viralizou essa manh� depois que Bolsonaro e deputados bolsonaristas compartilharam a mentira na internet” . 

Para ilustrar, Hoffmann usou a imagem de um v�deo publicado por Abimael Santos , blogueiro, que em sua p�gina com 14 mil seguidores se intitula “crist�o, patriota, bolsonarista, defensor da fam�lia e do bons costumes” .

No mesmo dia, Santos rebateu a deputada, usando como argumento um suposto �udio de Jarciane Maria dos Santos Silva, a quem credita como “voz da suposta l�der do MST” .

Jarciane, conhecida como Jaci, realmente se colocou como lideran�a da ocupa��o em entrevista ao Slam & Balai� Caruaru , mas no document�rio disse n�o ter “envolvimento com pol�ticos” , e que estava l� porque “� um esporte” pelo qual tem amor, pelos pobres, sendo uma delas.

No �udio divulgado, contudo, ela diz que � “dirigente regional dos Sem Teto no Brasil” .

O MTST de Pernambuco filiado ao MTST Brasil informou � AFP que n�o h� em seu quadro integrante de nome Jarciane Maria dos Santos Silva. 

H�, em Pernambuco, outro MTST, filiado � Uni�o Nacional por Moradia Popular em Pernambuco . Um de seus coordenadores, Marcos Cosmos, disse ao Checamos que h� cerca de 18 mil pessoas filiadas ao movimento, e que Jarciane n�o est� entre elas. Ele reiterou que a organiza��o apoiou a constru��o das casas e, portanto, jamais faria “uma malvadeza terr�vel dessa com essas fam�lias” .

O diretor do MST de Pernambuco, Paulo Mansan, disse n�o conhecer Jarciane e afirmou que “ela n�o fala em nome do MST” . 

A��o jur�dica conjunta

Representantes das tr�s entidades anteciparam em um dia a visita prevista para 22 de outubro e estiveram no Residencial Cruzeiro na manh� do dia 21.

Segundo Cosmos, ficou acordado que eles v�o “entrar com uma a��o jur�dica conjunta contra quem fez a fake news” , apontando Abimael Santos como uma das pessoas que as difundiu.

Essa alega��o tamb�m foi verificada pela Lupa , Boatos.org e Aos Fatos .