A vida e a for�a de vontade de Alexandra dos Santos Rocha, 23 anos, fazem a diferen�a para os moradores do quilombo Lagoa do Gaud�ncio. Mesmo sem concluir o ensino m�dio, Alexandra � a respons�vel pela alfabetiza��o de dezenas de crian�as quilombolas de sua comunidade, localizada no munic�pio de Lap�o, a cerca de 10 quil�metros de Irec�, em pleno Sert�o da Bahia. O curso de pedagogia ainda � um sonho distante. A �nica escola pr�xima com o curso de magist�rio fechou h� 3 anos. A institui��o era particular e ficava em Aguada Nova, uma comunidade a cerca de 5 quil�metros do quilombo.
%u201CSeria muito bom se a gente tivesse por aqui uma escola e uma creche para que as mulheres pudessem tamb�m estudar%u201D, diz a agricultora rural que espera tra�ar um destino diferente do de centenas de mulheres da regi�o que se casam e depois disso n�o conseguem outro of�cio a n�o ser o de cuidar da casa e dos filhos.
O marido de Alexandra, Erisvaldo Afro dos Santos, 29 anos, tamb�m se ressente de mais oportunidades para as mulheres. %u201CAqui, as mulheres se casam com seus 14 ou 15 anos e, a partir da�, n�o conseguem mais estudar. Temos dificuldades de tudo: de escola de 5� a 8� s�rie para as crian�as, de ensino m�dio para os adultos, de creches para deixar as crian�as%u201D, refor�a o marido que, ao lado de Alexandra tamb�m � respons�vel pela alfabetiza��o de crian�as.
Os dois esperam o primeiro filho para daqui a dois meses. As consultas de pr�-natal est�o em dia, mas o exame de ultra-som n�o permitiu ver o sexo da crian�a. %u201CO beb� estava virado e por isso n�o deu pra ver se � menino ou menina. Vai ser surpresa%u201D, conta Alexandra.
O que impressiona qualquer visitante de Lagoa do Gaud�ncio � perceber que onde falta o academicismo, sobra sabedoria, consci�ncia ecol�gica e humana, que permitem uma conviv�ncia cada dia mais exitosa com o dif�cil Semi�rido nordestino.
H� dois anos, o quilombo, que conta com aproximadamente 200 fam�lias, passou a comemorar o Dia da Consci�ncia Negra, no dia 20 de novembro. Com capoeira, reisado [festa popular em que se lembra o nascimento de Jesus e tem in�cio no Dia de Reis], e at� discuss�es sobre mudan�a do nome do quilombo, os moradores de Lagoa do Gaud�ncio exibem com orgulho um fato que os homens trazem no sobrenome: o de ser um afro brasileiro.
%u201CMeu av� dizia que, antes, nosso quilombo era conhecido como Fazenda do Alto. Depois, mudou de nome para Lagoa do Gaud�ncio e nessa �poca, o preconceito fez com que as pessoas come�assem a chamar o local de Lagoa dos Pretos. Era comum ouvir goza��es em cima do caminh�o do tipo: 'fulano vai descer na Lagoa dos Pretos'. A gente agora quer mudar o nome. Queremos colocar Lagoa Afro%u201D, conta Erisvaldo, que tamb�m estuda inserir no nome das mulheres a refer�ncia afro. %u201CS� n�o sabemos se vamos colocar 'Afro' ou '�frica', afirma. %u201CO que ficar mais bonito a gente deixa%u201D, brinca.
A fam�lia � benefici�ria do programa Bolsa Fam�lia. S� no munic�pio de Irec�, mais de 7 mil fam�lias s�o atendidas pelo programa. Alexandra tamb�m recebeu uma cisterna que permite captar a �gua da chuva, armazenar, alimentar a cria��o de cabras e irrigar os diversificados canteiros de agricultura org�nica. No fim de semana, Erisvaldo e Alexandra vendem verduras, frutas e temperos em uma feira de Aguada Nova. %u201CN�o usamos veneno%u201D, orgulha-se a agricultora.
%u201CQuando n�o t�nhamos a cisterna, a gente sofria com os animais%u201D, conta Alexandra, que acredita que, para sua vida no Sert�o, t�m mais efici�ncia as pequenas a��es governamentais do que as grandes obras estruturais que demoram anos entre o an�ncio e a entrega. %u201CPrecisamos de coisas simples, baratas para o governo, e que adiantariam muito a nossa vida. Precisamos de uma escola, de creche, de cisternas%u201D, reclama.
O munic�pio de Irec� foi o escolhido pela presidenta Dilma Rousseff para lan�ar as comemora��es do m�s de maio, dedicado �s mulheres. Foi l� que a presidenta anunciou o reajuste no Bolsa Fam�lia.
Cidade polo de uma regi�o de mais de 27 mil quil�metros quadrados de Semi�rido baiano, na d�cada de 90, a cidade chegou a ficar conhecida como a capital do feij�o devido a uma pol�tica governamental de incentivo ao plantio da leguminosa. A irregularidade das chuvas, as pr�ticas agr�colas n�o sustent�veis e o consequente endividamento dos produtores fizeram essa cultura declinar.
A �rea que envolve o munic�pio � tratada pelo governo federal como um dos Territ�rios da Cidadania. S�o 26 quilombos espalhados pela regi�o que congrega 20 munic�pios menores: Central, Gentio do Ouro, Itagua�u da Bahia, Jo�o Dourado, Xique-Xique, Am�rica Dourada, Barra do Mendes, Barro Alto, Cafarnaum, Canarana, Ibipeba, Ibitit�, Ipupiara, Irec�, Jussara, Lap�o, Mulungu do Morro, Presidente Dutra, S�o Gabriel e Uiba�.
A popula��o total do territ�rio � de mais de 400 mil habitantes. Desses, mais de 160 mil vivem na �rea rural, o que corresponde a 40,03% do total. O �ndice de Desenvolvimento Humano da regi�o � baixo: 0,610.