Bras�lia - Os abrigos que acolhem crian�as e adolescentes no pa�s est�o cheios, mas ainda assim fam�lias esperam anos na fila para adotar um filho. A demora nos processos de destitui��o do poder familiar, em que os pais perdem a guarda e a crian�a pode ser encaminhada � ado��o, explica em parte esse fen�meno. Outro motivo � a discrep�ncia entre o perfil das crian�as dispon�veis e as expectativas das fam�lias.
Quase mil crian�as e adolescentes j� foram adotados por meio do cadastro, criado em 2008. Antes da ferramenta, que � administrada pelo Conselho Nacional de Justi�a (CNJ), as unidades federativas tinham bancos de dados pr�prios, o que dificultava a troca de informa��es e a ado��o interestadual.
Para o juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justi�a Nicolau Lupianhes Neto, � poss�vel perceber uma mudan�a na postura das fam�lias pretendentes, que t�m flexibilizado o perfil buscado. A principal delas diz respeito � faixa et�ria: antes a maioria aceitava apenas beb�s, mas hoje a ado��o de crian�as at� 4 ou 5 anos de idade est� mais f�cil.
“A gente observa que isso tem mudado pelos pr�prios n�meros do cadastro, mas essa transforma��o n�o vai acontecer da noite para o dia porque faz parte de uma cultura”, aponta o magistrado. Uma barreira dif�cil de ser superada ainda � a ado��o de irm�os. Apenas 18% aceitam adotar irm�os e 35% dos meninos e meninas t�m irm�os no cadastro. A lei determina que, caso a crian�a ou adolescente tenha irm�os tamb�m dispon�veis para ado��o, o grupo n�o deve ser separado. Os v�nculos fraternais s� podem ser rompidos em casos excepcionais, que ser�o avaliados pela Vara da Inf�ncia.
Outros fatores s�o entraves para que uma crian�a ou adolescente seja adotado, entre eles a presen�a de algum tipo de defici�ncia f�sica ou doen�a grave, condi��o que atinge 22% dos inclu�dos no cadastro. Bianca* tem 5 meses de idade e chegou com poucos dias de vida ao Lar da Crian�a Padre C�cero, em Taguatinga, no Distrito Federal. A m�e, usu�ria de crack, tentou fazer um aborto e Bianca ficou com sequelas em fun��o das agress�es que sofreu ainda na barriga. Ela tem paralisia cerebral parcial. Apesar da defici�ncia, � uma menina esperta, ativa e muito carinhosa. Os m�dicos que acompanham o tratamento de Bianca no Hospital Sarah, em Bras�lia, est�o animados com a sua evolu��o, segundo a assistente social Renata Cardoso. “Mas a gente sabe que no caso dela a ado��o vai ser dif�cil”, diz.
Aos 37 anos, Renata sabe muito bem como � a realidade das crian�as que vivem nos abrigos, mas t�m poucas chances de ser adotada. Ela chegou ao Lar da Crian�a Padre C�cero aos 7 anos de idade, com tr�s irm�os. �rf�os de m�e, eles n�o podiam morar com o pai, que era alco�latra. Houve uma tentativa de reintegra��o quando o pai se casou, mas ela e os irm�os passaram poucos meses na casa da madrasta e logo retornaram para a institui��o. “N�o deu certo”, lembra. Dois de seus irm�os sa�ram do abrigo ap�s completar 18 anos e formaram suas pr�prias fam�lias. Renata quis continuar o trabalho de Maria da Gl�ria Nascimento, a dona Glorinha, diretora do lar. Ela nunca foi adotada oficialmente por Glorinha, mas ela e os irm�os s�o tratados como se fossem filhos biol�gicos.
“Com o tempo, a gente sentiu que ela ia cuidar da gente como filho. N�o tive vontade de ir embora, nunca vi aqui como um abrigo, sempre vi como minha casa e ela [Glorinha] como minha m�e. Ela sempre ensinou que n�s ir�amos crescer para cuidar dos menores e foi assim”, conta.