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Estado de Minas

Regi�o Amaz�nica tem perigos no ar, na terra e no rio

Para prestar assist�ncia a �ndios e a comunidades isoladas na selva, profissionais de sa�de convivem com os riscos de cortar os c�us e rios da Amaz�nia em pequenos avi�es e barcos


postado em 18/03/2015 06:00 / atualizado em 18/03/2015 08:25

Daniel Camargos (texto)
Alexandre Guzanshe (fotos)
Enviados Especiais


Os moradores da Região Norte do Brasil dependem de vários tipos de embarcações para se locomover. Somente no ano passado, no Rio Amazonas, o maior do país, aconteceram 86 acidentes com 31 mortes (foto: Alexandre Guzanshe/Em/D.A Press)
Os moradores da Regi�o Norte do Brasil dependem de v�rios tipos de embarca��es para se locomover. Somente no ano passado, no Rio Amazonas, o maior do pa�s, aconteceram 86 acidentes com 31 mortes (foto: Alexandre Guzanshe/Em/D.A Press)

Santar�m (PA) – A met�fora que a t�cnica em enfermagem Jos�lia Maia Barros encontra para definir como se sente voando em pequenos avi�es pela regi�o amaz�nica � a de estar dentro de uma caixa de f�sforos: “Pega uma caixinha e balan�a. � essa a sensa��o”. Jos�lia trabalhou por seis anos, entre 2004 e 2010, para a Secretaria Especial de Sa�de Ind�gena (Sesai), �rg�o vinculado ao Minist�rio da Sa�de, atendendo a popula��o da terra ind�gena Nhamund� Mapuera, que abriga 11 etnias, com predomin�ncia dos Wai-Wai, na divisa do Par� com Roraima. Como ela, um verdadeiro ex�rcito de profissionais da �rea de sa�de corta os c�us da Amaz�nia em pequenas aeronaves para levar o m�nimo de assist�ncia � popula��o ribeirinha e para tribos isoladas. Jos�lia era amiga de Rayline Sabrina Brito Campos, a t�cnica de enfermagem morta h� exatamente um ano em acidente a�reo que deixou mais quatro v�timas.

Na edi��o dessa ter�a-feira (17), o Estado de Minas reconstituiu os dias que antecederam o desastre, o drama pela busca dos corpos e a alegria da fam�lia Brito pelo nascimento da sobrinha de Rayline, batizada em homenagem � tia. O acidente que matou cinco pessoas n�o representa uma exce��o no padr�o das viagens pela maior regi�o do Brasil. De acordo com dados do Centro de Investiga��o e Preven��o de Acidentes Aeron�uticos (Cenipa), vinculado � For�a A�rea Brasileira (FAB), somente no ano passado, no Par�, foram 10 acidentes a�reos, 21 nos estados da Regi�o Norte.

Depois de passar por v�rios sustos nas viagens de avi�o entre Oriximin� e Cachoeira Porteira, Jos�lia desistiu de viajar nos avi�es. A alternativa escolhida foi subir o Rio Trombetas em pequenas embarca��es guiadas pelos �ndios. A viagem que durava menos de duas horas de avi�o poderia chegar at� a tr�s dias, parando em aldeias �s margens do rio para dormir. “O que eu envelhecia viajando 1h45m de avi�o eu n�o envelhecia passando tr�s dias subindo o rio de barco”, compara.

Jos�lia recorda a ocasi�o em que estava num avi�o monomotor de cinco lugares a caminho da reserva Nhamund� Mapuera e quase aumentou a estat�stica de acidentes. “Foi um temporal muito forte e o avi�o come�ou a 'jogar' bastante. Subiu, subiu, subiu e de uma hora para outra come�ou a descer”, descreve a t�cnica em enfermagem. “S� n�o morremos porque teve a m�o de Deus”, acredita. Al�m da interven��o divina, ela atribui a sobreviv�ncia ao piloto, que, com habilidade, conseguiu evitar a trag�dia. “Quando encontro ele na rua, nos abra�amos como se f�ssemos da mesma fam�lia”, conta.

O emprego atual de Jos�lia na Casa de Sa�de Ind�gena (Casai), em Santar�m, cidade com 300 mil habitantes no Oeste do Par�, � o mesmo a que Rayline se candidatou tr�s dias antes da trag�dia, quando estava voando de Itaiatuba para Jacareacanga a caminho da tribo mundurucu Sai Cinza, onde atenderia os ind�genas. Foi o chefe da Casai, o bi�logo Joaquim Martins da Silva, que recebeu o pedido de emprego. Joaquim disse que faria tudo para ajud�-la, mas foi surpreendido pela trag�dia.

Osélia Barros (d), técnica em enfermagem:
Os�lia Barros (d), t�cnica em enfermagem: "Foi um temporal muito forte e o avi�o come�ou a 'jogar' bastante. Subiu, subiu, subiu e de uma hora para outra come�ou a descer" (foto: Alexandre Guzanshe/Em/D.A Press)

O medo de que perderia a vida em um acidente foi um dos motivos que levou Jos�lia a deixar de atender os �ndios na aldeia. Ela conta que adorava o emprego e chegou, inclusive, a aprender a l�ngua nativa waiwai, mas os temores da locomo��o e tamb�m o fato de ter uma filha que exige cuidados de sa�de a levaram a trocar de fun��o. “O sal�rio n�o paga o esfor�o, mas a recompensa � ver a assist�ncia que prestamos a pessoas que necessitam na sociedade”, avalia a t�cnica em enfermagem. Al�m do sal�rio pouco motivador (R$ 2.006 por m�s), a falta de estrutura tamb�m � um problema enfrentado. “Uma �ndia precisava ser levada para um hospital, pois estava com problemas para fazer o parto. N�o pod�amos chamar a aeronave, pois havia um problema no conv�nio entre a empresa e o governo”, recorda Jos�lia. O atraso deixou a crian�a com sequelas.

DESAFIOS DA FLORESTA O piloto de avi�o Fabricyo Sardinha, de 33 anos, � de Santar�m e trabalha para uma empresa de t�xi a�reo da cidade desde 2001. Para ele, o grande desafio de quem sobrevoa a regi�o � o clima, com muita chuva e temporais constantes. Outro problema, segundo o piloto, � a grande quantidade de pistas que n�o s�o homologadas. A alternativa, ele detalha, � voar pr�ximo �s margens dos rios, onde a possibilidade de resgate � maior. “O problema de voar sobre a floresta s�o os animais caso consiga sobreviver em um pouso for�ado. Al�m disso, tem que dar a sorte de conseguir ser resgatado”, explica.

O ex-garimpeiro Natanael Alves de Souza tamb�m se considera um sobrevivente. No dia 31 de janeiro de 1973 um avi�o em que estava com o filho de 4 anos e a esposa gr�vida caiu na floresta, no Sudoeste do Par�, pr�ximo � divisa com o Amazonas. “O avi�o queimou todo e s� sobrou a biquilha”, recorda. Ele, a fam�lia e o piloto conseguiram escapar antes da explos�o. “Fraturei as costelas e todo mundo levou golpes por causa da queda”, detalha. O dia � lembrado com precis�o por Natanael pois � a mesma data que o cantor Evaldo Braga, o �dolo Negro, morreu em um acidente automobil�stico, em Tr�s Rios, no Rio de Janeiro.

Durante os anos em que viajou pela regi�o, Natanael passou outros apertos. Estava a bordo de um pequeno avi�o quando o trem de pouso n�o funcionou;  em outra situa��o, sobreviveu a uma aterrissagem for�ada na �gua. Depois do acidente com a fam�lia, o susto foi grande e Natanael deixou o garimpo – e as viagens temerosas de avi�o -, chegou a ser presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santar�m e h� alguns anos trabalha para o projeto Sa�de e Alegria, uma ONG que atua na regi�o do Rio Tapaj�s e atende a cerca de 30 mil pessoas em 150 localidades.

A arte-educadora Elis Lucien Rodrigues precisa viajar constantemente de barco pelo Rio Tapaj�s para chegar at� as comunidades ribeirinhas atendidas pela ONG. “Tem que saber navegar, pois o rio parece um mar. As mulheres ficam nervosas, sofrem 'passamentos' como n�s dizemos por aqui, mas n�o tem alternativa”, explica. Elis lembra de uma viagem que fez acompanhando uma equipe de televis�o, quando estavam no barco e uma tempestade os surpreendeu no meio rio. “A onda estava assim”, diz acompanhando um gesto mostrando algo enorme. “Fiquei apavorada e p�lida”, descreve. De acordo com a Marinha, somente no Rio Amazonas, o maior do pa�s, aconteceram 86 acidentes no ano passado, sendo 31 pessoas morreram e outras 35 ficaram feridas. O n�mero foi maior do que o de 2013 (25 mortes, 22 feridos).

Os riscos para quem vive no Norte do pa�s est�o em todos os tipos de transporte. Mineira de Belo Horizonte, a indigenista da Funai, Isabel Saraiva vive no Par� desde 2010. Primeiro morou em Itaituba e depois em Santar�m, onde permanece atualmente. Quando morou em Itaituba e precisava ir para Jacareacanga, regi�o com ind�genas da etnia munduruku, fazia o trajeto de �nibus, pois � �poca a Funai, segundo ela, n�o podia fretar aeronaves. Percorria 420 quil�metros na Transamaz�nica. “Quando chovia, o �nibus deslizava demais. Uma vez tive vontade de descer e ficar esperando na estrada”, recorda. Os desafios d�o medo, segundo ela, mas o trabalho a motiva. “� um p�blico com muita vulnerabilidade”, pondera. “Mas ter�amos que ter mais estrutura”, destaca.

Na edi��o dessa ter�a-feira (17), o Estado de Minas reconstituiu em reportagem especial os �ltimos dias de vida de Rayline Campos, t�cnica em enfermagem que morreu em acidente a�reo com mais quatro pessoas em 18 de mar�o de 2014. A hist�ria comoveu o Brasil pelas mensagens desesperadas que a jovem enviou ao tio pelo celular, poucos minutos antes de morrer: "T� em temporal e um motor parou, avisa a m�e que amo muito todos...", escreveu Rayline. Um ano depois da trag�dia, as investiga��es sobre as causas da queda do avi�o ainda n�o foram conclu�das. 

 


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