(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas

Sistema socioeducativo amedronta jovens; profissionais defendem aprimoramentos


postado em 02/05/2015 18:28

Medo � a primeira palavra usada pelos jovens infratores para definir a experi�ncia com os sistemas Judici�rio e socioeducativo. “Tenho medo, como o medo que estou agora”, revelou Anderson*, de 16 anos, sobre o que sentia em rela��o � possibilidade de redu��o da maioridade penal, de 18 para 16 anos, em discuss�o no Congresso. Era a segunda vez que o tr�fico de drogas o levava a passar por um processo nas varas especiais da Inf�ncia e Juventude da cidade de S�o Paulo. O f�rum, que em 2014 julgou 13,4 mil processos de atos infracionais, � considerado o maior do g�nero na Am�rica Latina.

Acompanhado da m�e, o jovem temia n�o s� as poss�veis repercuss�es da discuss�o na C�mara dos Deputados, mas tamb�m a decis�o do juiz que seria anunciada em breve.

Ele aguardava a audi�ncia em uma fila na porta da 4ª Vara de Inf�ncia e Juventude. O pr�dio, constru�do em 1910, fica no bairro do Br�s, zona leste paulistana. As salas s�o montadas com divis�rias de escrit�rio e os corredores s�o estreitos para o grande fluxo de pessoas. Sem bancos ou cadeiras, os adolescentes e as fam�lias aguardam as audi�ncias em p�.

“Veja esse f�rum, onde n�s tratamos da gera��o futura, que s�o os infratores. Um pr�dio caindo aos peda�os que j� devia ter sido restaurado, reformado, estruturado”, reclama o juiz titular da 4ª Vara e coordenador do f�rum, Raul Khairallah de Oliveira e Silva.

A estrutura f�sica das varas reflete, na opini�o de Khairallah, a falta de prioridades do Poder P�blico no tratamento do jovem infrator. “Vai l� no F�rum Criminal na Barra Funda, veja a estrutura que eles t�m. Parece uma cidade. Um monte de policiais para fazer escolta e tudo mais. Ali voc� est� lidando com criminosos que voc� dificilmente vai ter como ressocializar”, compara o magistrado que tamb�m foi juiz criminal. “Enquanto voc� est� na fase de desenvolvimento, a chance de voc� poder fazer alguma coisa para a ressocializa��o � infinitamente maior”, enfatiza.

Sempre com o olhar baixo e as m�os para tr�s, ainda que n�o estivesse algemado, Anderson relatou que a segunda apreens�o estava relacionada � anterior. “Eu tinha que pagar as drogas que eu perdi na primeira [apreens�o]”, contou o jovem que foi pego novamente vendendo coca�na.

Pelo flagrante, o adolescente estava h� um m�s e seis dias internado provisoriamente, como ele mesmo informou com precis�o. Sobre a passagem pela Funda��o Casa, Anderson tinha cr�ticas. “Tudo errado”, resumiu levantando o rosto pela primeira vez durante a entrevista. “O jeito que nos tratam l�, agredindo e batendo”, detalhou.

Apesar dos problemas, o advogado e membro do Conselho Estadual dos Direitos da Crian�a e do Adolescente de S�o Paulo Ariel de Castro Alves acredita que o sistema socioeducativo ainda possibilita maiores chances de recupera��o para os infratores do que as penitenci�rias. “Em muitas unidades, em v�rios locais do pa�s, inclusive S�o Paulo, existem in�meras den�ncias de maus-tratos, tortura e ociosidade. Mas s�o casos mais pontuais, enquanto o problema � mais generalizado quando n�s tratamos do sistema penitenci�rio”, avaliou.

“Se ocorresse um aprimoramento para cumprir corretamente o Estatuto da Crian�a e do Adolescente e a Lei das Medidas Socioeducativas de 2009, certamente n�s ter�amos muito mais resultados no sentido de reduzir ainda mais a reincid�ncia”, acrescenta Ariel.


Opini�o que coincide com a do vice-presidente do Movimento do Minist�rio P�blico Democr�tico, Tiago Rodrigues. “Se n�s n�o utilizamos todas as ferramentas, todos os recursos que a lei j� nos disp�e, de que adianta ampliar isso?”, questiona o promotor que atua na �rea da Inf�ncia e Juventude da capital paulista sobre a proposta de reduzir a maioridade penal.

Entre as medidas que Rodrigues considera subutilizadas est� a semiliberdade, quando o jovem trabalha e estuda durante o dia, retornando para a unidade de interna��o para dormir. “De modo que o assistente social, o psic�logo e toda a equipe t�cnica envolvida no processo de reeduca��o possa observar um comportamento muito mais natural desse adolescente e verificar, com precis�o, se ele est� preparado para voltar ao conv�vio comunit�rio.”

Segundo um levantamento feito com os 3,36 mil casos que passaram pela promotoria da Inf�ncia e Juventude entre agosto de 2014 e mar�o de 2015, apenas 271 adolescentes, dos 1.232 que passaram por interna��o no per�odo, progrediram para a semiliberdade. “Os demais foram direto da interna��o para o meio aberto”, destacou.

O Estatuto da Crian�a e do Adolescente (ECA) prev� seis medidas socioeducativas que podem ser aplicadas a adolescentes a partir dos 12 anos: advert�ncia, obriga��o de reparar o dano, presta��o de servi�os � comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e interna��o. A medida � aplicada de acordo com a capacidade de cumpri-la, as circunst�ncias do fato e a gravidade da infra��o.

Ap�s um m�s de interna��o provis�ria, o adolescente Gustavo* passou a cumprir liberdade assistida. Sobre o per�odo na Funda��o Casa, o jovem, hoje com 17 anos, lembra da rela��o dif�cil com os funcion�rios da institui��o. “Eles n�o passam confian�a. Passam medo”, lembra. “Se voc� n�o faz o que eles mandam, eles d�o tapa na cabe�a. D�o chutes”, conta.

O receio tamb�m vinha das incertezas do jovem sobre os desdobramentos do processo por roubo. “Eu n�o sabia se ia ficar fichado. N�o sabia o que ia acontecer. Eu tinha esse medo de n�o poder arrumar emprego, n�o poder ter cargo p�blico”, acrescenta.

Hoje, Gustavo avalia que a experi�ncia acabou tendo pontos positivos, principalmente a participa��o em atividades culturais e rodas de conversa – que faziam parte das medidas socioeducativas cumpridas no per�odo de liberdade assistida no Centro de Defesa dos Direitos da Crian�a e Adolescente (Cedeca) em Sapopemba, zona leste paulistana.

Segundo ele, essas atividades acabaram despertando o seu interesse pela pol�tica e pelo funcionamento institucional do pa�s. “Tem uma parte da sociedade que tem todos os seus direitos. J� tem uma que tem os seus direitos negados. Principalmente os adolescentes que est�o dentro da funda��o, esses n�o t�m direito nenhum. Mal sabem dos seus direitos”, analisa o jovem que, al�m de estudar para concursos p�blicos, pretende cursar dois cursos universit�rios: psicologia e ci�ncias sociais. “A Fuvest [vestibular da Universidade de S�o Paulo] n�o � um bicho de sete cabe�as”, conclui otimista.

Sobre as den�ncias de supostos desrespeitos aos jovens, a Funda��o Casa, por meio de sua assessoria, disse que leva em considera��o os direitos humanos dos adolescentes e n�o tolera qualquer tipo de pr�tica de viol�ncia nos centros socioeducativos. “A institui��o pauta seu atendimento pelas diretrizes do Estatuto da Crian�a e do Adolescente (ECA) e do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), com respeito � integridade f�sica e psicol�gica dos jovens”, disse em nota.

A institui��o destacou ainda que aplica san��es administrativas, por meio da corredegoria-geral, aos funcion�rios que participam de epis�dios identificados de viol�ncia. Essas medidas podem ir de suspens�o � demiss�o por justa causa.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)