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Estado de Minas

"O fogo � sagrado e n�o pode ser usado de forma errada", diz educadora patax�

Maria Aparecida Oliveira, ind�gena e cientista social alerta para o perigo das queimadas, cujo avan�o pretende denunciar ao Minist�rio P�blico e defende a educa��o contra as chamas


15/09/2020 06:00 - atualizado 15/09/2020 08:55

Desde 2013, Maria Aparecida Oliveira se dedica a palestras em espaços de educação para todo tipo de público e faixas etárias(foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)
Desde 2013, Maria Aparecida Oliveira se dedica a palestras em espa�os de educa��o para todo tipo de p�blico e faixas et�rias (foto: Ed�sio Ferreira/EM/D.A Press)


L�grimas n�o apagam inc�ndios, mas podem muito bem clarear ideias, irrigar consci�ncias e abrir espa�o at� entre pedras brutas para buscar a preserva��o ambiental. � pensando assim que Maria Aparecida Costa de Oliveira n�o tem poupado o choro para lutar contra uma amea�a, o fogo, que j� a surpreendeu v�rias vezes no s�tio onde vive, no Bairro Bonanza, localizado a 5 quil�metros do Centro Hist�rico de Santa Luzia, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte. Reclusa devido � pandemia do novo coronavirus, ela usa as redes sociais para pedir que as pessoas parem de maltratar a natureza, deixem os bichos em paz e sepultem de vez a pr�tica de queimar o mato. “O fogo � sagrado, n�o pode ser usado de forma errada”, acredita.

Bem na entrada do s�tio, numa rua “coincidentemente” chamada Amazonas, o convite para entrar est� na l�ngua patxoh�, falada pelo povo patax� ao qual Maria pertence. “Acho que tenho 54 anos. N�o sei direito, pois fui registrada com 'nome de branco' aos 10. Meu nome ind�gena � Txah� Xoh�, que significa Flor Guerreira. Ent�o, pode me chamar de Maria Guerreira”, diz a mulher de voz firme e suave, dando as boas vindas – Taput� Tomet� – � “minha casa” ou Kijeme. No espa�o dom�stico, tudo � aproveitado e reaproveitado, do pequenino galho que despenca da �rvore �s folhas transformadas em adubo. N�o � � toa que ela mesma fez o estrado da sua cama com madeira do quintal. “Pode levantar o colch�o para voc� ver”, indica ao rep�rter.

Com a m�scara protetora feita � m�o contra o novo coronav�rus e com penas no cabelo, um costume do qual nunca se separou, Maria faz quest�o de mostrar cada palmo do seu ch�o, onde viveu com o marido Saulo Filardi, falecido em 2012, e criou dois filhos, Saulo e Edson Augusto. “Chegamos h� quase 40 anos, gosto muito daqui e da cidade. Conhe�o o angico, o cedro, o jequitib�-rosa, o ip�-amarelo. Tudo faz parte da nossa hist�ria. Vejo o sol, a lua, as estrelas, as borboletas, os passarinhos. Quer riqueza maior?”, conta ao percorrer o terreno. No passeio pelo quintal, no entanto, sobressaem v�rios troncos queimados, marcas que ficaram e preocupam. “H� seis anos, o fogo alastrou e chegou aqui no quintal. Foi um horror.”

Nos �ltimos dias, a dor de ver as labaredas dominando a terra voltou redobrada. “Fiquei com vontade de ir embora, procurar outro lugar. Mas a� penso que tenho tanto amor pelo bairro, pelas �rvores que vi crescendo em muitas avenidas, pela cidade que se transformou em quase 40 anos e acho melhor ficar. E lutar com as armas que tenho, as palavras, e da forma que possa ser ouvida, as redes sociais”, explica. Entre os planos de agora, est� uma representa��o no Minist�rio P�blico para denunciar as queimadas, que podem come�ar no lixo do quintal e se propagar bairro adentro, “ainda mais neste m�s que venta mais”.

Tra�os
Enquanto conversa e vai contando sua hist�ria, Maria solta os cabelos muito pretos e coloca sobre eles um cocar de penas de papagaio e arara. Depois, pinta o rosto de vermelho, real�ando os olhos com urucum e trazendo � flor da pele os tra�os de identidade de seu povo. Depois, tomada pela emo��o, ela segue em sil�ncio at� uma frondosa sete cascas e abra�a ternamente o tronco queimado. As m�os ficam marcadas pelo carv�o, e Maria leva os dedos ao rosto misturando as cores. “� sinal de luto”, resume, antes de fazer um carinho no cedro, tamb�m com a casca queimada.

Natural de Medeiros Neto, no Sul da Bahia, Maria nasceu “no mato”, conforme diz, e depois foi com os pais percorrer fazendas para o trabalho nas lavouras. Pelas voltas que o mundo d�, veio para Belo Horizonte, casou-se e foi morar no s�tio em Santa Luzia. “Um dia, meu marido falou que eu n�o precisava estudar, pois ele sabia o suficiente pra n�s dois”, conta a ind�gena patax� que, fazendo valer o significado do seu nome, Maria Guerreira, deu a resposta passando no vestibular da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e cursou ci�ncias sociais, dedicando-se, a partir da gradua��o em 2013, a dar palestras em espa�os de educa��o para todo tipo de p�blico e faixas et�rias. Com um sorriso discreto, lembra que depois o marido se redimiu e deu for�a aos estudos.

Na tarde de ontem, com o belo p�r- do-sol colorindo o contorno da paisagem num tom rosa forte, era poss�vel sentir o cheiro de queimado no ar. E, assim, um post da ind�gena patax�, serviu de legenda perfeita para o cen�rio. “Quem ama a vida e quer deixar uma heran�a para seus filhos e netos cuida da natureza e n�o faz queimada. Quem faz queimada n�o passa de um desgra�ado ego�sta, desalmado, ignorante, que n�o compreende que a queimada deixa a terra est�ril, destr�i a vegeta��o, � prejudicial a toda a esp�cie de vida, inclusive para a nossa. As part�culas de fuma�a emitidas prejudicam a vida”.

Depois de apresentar o quintal, Maria mostra que sua cultura est� sempre viva no corpo e no cora��o. Ainda com o cocar do povo patax�, ressalta que fala sempre pelo celular ou pela internet com os amigos patax�s de Carm�sia, no Vale do Rio Doce, e de Barra Velha (BA). “Fico feliz ao saber que a produ��o agr�cola est� indo bem, que h� troca de produtos entre ind�genas e pescadores baianos e sobre a presen�a de muitos professores ind�genas nas aldeias”. A visita ao s�tio de Txah� Xoh�, a Flor Guerreira, � boa oportunidade para conhecer mais sobre os ind�genas de Minas.

Campanhas


Segundo a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Agricultura e Abastecimento, a Prefeitura de Santa Luzia realiza, de forma rotineiras, campanhas educativas para conscientizar a popula��o, em especial durante o per�odo de seca. Algumas dessas a��es s�o feitas em parceria com a Defesa Civil Municipal e o Instituto Estadual de Florestas (IEF). Em nota, a assessoria da prefeitura informa que, quando identificada uma queimada de pequeno porte, como por exemplo, uma queima de lixo, o autor � notificado e autuado, de acordo com o C�digo de Posturas do munic�pio.



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