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Estado de Minas ABORTO

'Bolsa estupro': entenda como o PL�5.435/2020 fere o direito da mulher

O projeto ganhou repercuss�o nas redes sociais por meio da hashtag #Gravidezfor�ada�Tortura. Especialistas explicam as armadilhas do PL


23/03/2021 18:30 - atualizado 24/03/2021 13:37

(foto: pixabay/ reprodução)
(foto: pixabay/ reprodu��o)
Criticado por defensores dos direitos das mulheres, o  Projeto de Lei (PL) 5.435/2020, de autoria do senador Eduardo Gir�o (Podemos-Cear�), deve ganhar um texto substitutivo apresentado pela senadora Simone Tebet (MDB-MS). Mas, ainda assim, � importante entender o que � a proposta do "Estatuto da Gestante." O projeto, segundo Gir�o, serviria para proteger integralmente as gestantes desde o momento da concep��o. Entretanto, advogadas, coletivas feministas, juristas e a sociedade contestam sobre o real objetivo do projeto.


Isso porque, segundo especialistas ouvidas pelo Estado de Minas, apesar de n�o tratar de um projeto que fale sobre a interrup��o da gravidez de forma direta, ele restringe a possibilidade de aborto mesmo nos casos legais, ao incluir a prote��o de direito � vida "desde a concep��o".

"Embora a palavra 'aborto' n�o tenha sido mencionada no projeto de lei, com uma leitura atenta percebemos que a verdadeira inten��o do legislador � impedir o aborto mesmo nos casos em que a legisla��o brasileira j� o permite", disse Melissa Santana, advogada do projeto N�o Era Amor, especialista em Direito das Mulheres.

 

Em fevereiro deste ano, o senador disse em entrevista ao portal de not�cias do Senado que "nenhuma proposta favor�vel � pr�tica de aborto ser� aprovada pelo Congresso Nacional." Ele ainda assumiu que a PL 5.435/2020, "pode ajudar a p�r um ponto final na discuss�o sobre o assunto no pa�s, ao criar o Estatuto da Gestante e resguardar os direitos da gestante e a vida da crian�a."
 

Fab�ola Amaral Ladeira, integrante da GARRa feminista – coletiva de Belo Horizonte –, ainda aponta que o projeto � uma c�pia direta de outro PL apresentado em 2007, o projeto 478/07, conhecido como Estatuto do Nascituro. "A diferen�a entre esse de 2020 e o anterior � a retirada dos artigos que previam a ilegalidade da pesquisa com c�lulas tronco e congelamento de embri�es. Mas, fora isso, o conte�do � igual", disse.

Ela pontua que o projeto � um ataque direto �s mulheres, � autonomia enquanto seres humanos. "Esse PL � apenas mais um no meio de 60 projetos apresentados desde 2011 que visam retirar direitos das mulheres", acrescentou. 

Para Camila Rufato Duarte, advogada, ativista da causa feminista e cofundadora do Direito Dela, o principal ponto, que faz desta PL um retrocesso nefasto, � o fato de ela ser estritamente fruto de conservadorismo e n�o de uma an�lise social e de sa�de p�blica que � como dever-se-ia tratar o aborto.



O assunto ganhou repercuss�o nas redes sociais por meio da hashtag #Gravidezfor�ada�Tortura. Isso depois que a mat�ria ganhou relat�rio favor�vel da senadora Simone Tebet para vota��o esta semana. Nesta ter�a-feira (23/03), ap�s press�o feita pelo movimento de mulheres, a senadora disse que vai excluir "bolsa-estupro" e restri��o a aborto legal do projeto de Estatuto da Gestante.No site do senado, 53.716 pessoas votaram contra a proposta at� �s 18h. 

Entretanto, conforme especialistas, o parecer n�o impede a vota��o. A senadora apenas antecipou uma mudan�a.

Entenda os pontos do projeto 


No documento de oito p�ginas, chama a aten��o o fato de o senador descrever pontos que j� s�o previstos em leis, como o atendimento pelo SUS, pol�ticas p�blicas de assist�ncia social, pens�o aliment�cia e prote��o da crian�a. Especialistas apontam que n�o h� necessidade de criar uma nova lei para tratar desses assuntos.

"A �nica conclus�o poss�vel � a de que esses direitos foram colocados no projeto novamente para 'florear' o ataque a mais um direito das mulheres: o aborto legal", aponta Melissa.

Para Camila, a reda��o do PL � confusa. "Creio que isto n�o � acaso, mas uma forma de abrir brechas para interpreta��es ainda mais absurdas" no futuro. 

S�o tr�s as situa��es em que o aborto � legalizado no Brasil.  Al�m da gravidez que decorre do estupro, a interven��o pode ser realizada quando n�o h� outro meio de salvar a vida da gestante ou o feto � anenc�falo.

Mulher v�tima de estupro perde o direito ao aborto

Melissa explica que o art. 1º diz que a vida do feto dever� ser garantida desde a concep��o, enquanto o art. 8º pro�be que “particulares causem danos � crian�a por nascer em raz�o de ato ou decis�o de qualquer de seus genitores”, o que, traduzido para uma linguagem leiga, significa que m�dicos ficam proibidos de realizar o aborto.

Camila ainda pontua que a utiliza��o de "crian�a por nascer" � mais uma forma de refor�ar a reprovabilidade do aborto induzindo a compreens�o de que estar-se-ia matando uma crian�a.

"Se aprovado, o art. 8º entrar� em conflito com o C�digo Penal, que garante o direito ao aborto em caso de gravidez resultante de estupro (art. 128, inciso II). Isso pode gerar muita confus�o, porque existir�o duas leis v�lidas, mas contradit�rias. N�o haver� seguran�a jur�dica", acrescentou a advogada.

Na vis�o de Camila, a afirma��o ''se a mulher for estuprada, n�o pode abortar’’ n�o se sustenta – pelo menos n�o juridicamente –, uma vez que o C�digo Penal prev� em seu Art. 128 que n�o se pune o aborto quando a gravidez for resultante de estupro.

"O PL 5435, caso se torne lei, n�o teria o cond�o de impedir a aplicabilidade do chamado 'aborto legal', no entanto, iria, sem d�vidas, coibir o aborto autorizado por lei", afirmou. 




O direito � paternidade ao estuprador 


As advogadas chamam a aten��o para ponto grav�ssimo � paternidade do estuprador. No projeto, a inten��o � “obrigar” o genitor a cuidar do feto e tamb�m da gestante (art. 4º, §2º), e garantir que ele, al�m de pagar a pens�o aliment�cia, tenha o direito de conviver com a crian�a ap�s o nascimento (art. 10º).

"Por�m, quando a gravidez � resultante de estupro, esse genitor � o estuprador. Isso � absurdo, surreal, inaceit�vel. O legislador desconsiderou absolutamente qualquer consequ�ncia do estupro para a mulher. Relevou os traumas que ela pode sofrer. Ignorou que estupro � um crime hediondo e uma grave viola��o aos direitos humanos da mulher", afirma Melissa.

J� na vis�o da advogada Camila, o direito � paternidade ao estuprador deveria ser algo impens�vel, uma vez que se trata de um agressor. Mas o art. 10º do PL desconsidera todo o sofrimento da v�tima de estupro e objetiva for��-la a ter que, al�m de lidar com as lembran�as e os danos psicol�gicos da viol�ncia, conviver com seu abusador. "� um absurdo sem precedentes", pontuou. 


"Bolsa estupro": a crian�a ganha aux�lio 


Na hip�tese de a gestante v�tima de estupro n�o dispor de meios econ�micos suficientes para cuidar da vida, da sa�de, do desenvolvimento e da educa��o da crian�a, o projeto prop�e que o Estado arque com os custos respectivos de um sal�rio-m�nimo at� a idade de 18 anos da crian�a, "ou at� que se efetive o pagamento da pens�o aliment�cia por parte do genitor ou outro respons�vel financeiro especificado em lei, ou venha a ser adotada a crian�a, se assim for a vontade da gestante, conforme regulamento", afirma o senador, na justificativa da proposta.

Melissa aponta que quanto ao benef�cio para a crian�a, j� consegue imaginar as acusa��es: “mentiu que foi estuprada s� para ficar com o dinheiro”; “saiu com essa roupa e bebeu todas s� pra ser estuprada, porque sabia que ia ganhar dinheiro depois”.

"Se hoje as v�timas de estupro j� s�o t�o desacreditadas, imagina se houver uma “bolsa-estupro”? E que provas ser�o exigidas para a concess�o do benef�cio, j� que esse � um crime geralmente sem testemunhas e com poucas provas? Como encontrar o estuprador para fazer um teste de DNA? A que humilha��es essa mulher ter� que se submeter para receber o benef�cio?", questionou.

Camila avalia que o �uxilio seria uma forma de coagir e comprar a v�tima do estupro, "claramente uma vitimiza��o secund�ria."


As barreiras ao direito reprodutivo


O aborto legal � uma das principais pautas do direitos das mulheres. Enquanto a Argentina aprovou, no fim do ano passado, o projeto de lei para legalizar o aborto no pa�s, a realidade das mulheres no Brasil que tem o direito ao aborto legal sofre diversas barreiras. Mas por que?

Fab�ola Amaral Ladeira, integrante da GARRa feminista - coletiva de Belo Horizonte - esclarece "a nossa sociedade � patriarcal, ou seja, os homens se colocaram no poder, e det�m esse poder colocando as mulheres em estado de subalternidade. A nossa capacidade reprodutiva tem sido o centro das nossas viol�ncias, temos os piores postos de trabalho, sofremos com a imposi��o do trabalho dom�stico e com a viol�ncia por causa da nossa biologia."

Leia tamb�m: Do estupro ao aborto: a dif�cil jornada da mulher v�tima de viol�ncia sexual em Minas

Ela ainda pontua que o controle das mulheres pelos homens ainda � importante para nos manter dentro de casa fazendo um trabalho �rduo, mas que n�o � remunerado - como a cria��o das crian�as, e todo o trabalho de cuidado da casa.


"E a melhor maneira de nos controlar tem sido impedir a nossa autonomia reprodutiva. Quando uma adolescente engravida, fruto de um estupro por um familiar, que s�o metade dos casos de estupro no Brasil, essa adolescente entrar� em um ciclo de pobreza e se sujeitar� a sub-empregos para manter essa crian�a", disse. 


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