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Estado de Minas DIFICULDADES

'Com m�rito', mas sem bolsa: a frustra��o de quem recorre a 'bicos' e ajuda da fam�lia para fazer ci�ncia no Brasil

Corte de verbas para a ci�ncia e tecnologia no pa�s afeta pesquisadores brasileiros e futuro tecnol�gico do pa�s


30/05/2021 17:14 - atualizado 30/05/2021 20:21

Pesquisador Glauco Meireles teve projeto elogiado, mas não conseguiu bolsa do CNPq(foto: Arquivo pessoal)
Pesquisador Glauco Meireles teve projeto elogiado, mas n�o conseguiu bolsa do CNPq (foto: Arquivo pessoal)


O pesquisador Glauco Meireles quer desenvolver um projeto para estudar a aplica��o do estanho em baterias de l�tio. "O Brasil est� entre as maiores reservas de estanho do mundo. Ent�o, eu quero agregar valor tecnol�gico a uma mat�ria-prima nacional para o desenvolvimento de dispositivos tecnol�gicos", explica Meireles � BBC News Brasil.

Ele, que tem mestrado e doutorado na �rea da Qu�mica, inscreveu o projeto no edital de bolsas de doutorado e p�s-doutorado do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cient�fico e Tecnol�gico (CNPq) de 2020.

Para conseguir conduzir o projeto, ele precisaria dedicar, ao menos, oito horas di�rias � pesquisa em laborat�rio durante cinco dias por semana. "Mas na verdade, a gente acaba trabalhando muito mais do que isso", diz.

O comit� que analisou a iniciativa dele apontou que se trata de um tema que colabora para o desenvolvimento da ci�ncia e tecnologia no pa�s. Apesar disso, Meireles n�o esteve entre os aprovados com bolsa pelo CNPq.

Assim como ele, outros milhares de pesquisadores brasileiros inscritos no edital do CNPq de doutorado e p�s-doutorado de 2020 n�o receberam bolsas para conduzir as pesquisas, mesmo tendo seus projetos elogiados pelos pareceristas (especialistas que avaliam a proposta e emitem uma nota t�cnica sobre ela).

Dos 4.279 projetos inscritos na chamada de 2020 para o Brasil, 3.080 foram aprovados com m�rito por pareceristas. Destes, somente 396 foram selecionados para receber bolsas. Para o exterior foram aprovadas 73 propostas com bolsas, entre as pouco mais de 2 mil inscritas — n�o foram divulgadas quantas tiveram boas avalia��es de pareceristas. Ao todo, segundo o CNPq, foram investidos R$ 35 milh�es no edital, que concedeu 469 bolsas.

Enquanto em anos anteriores havia a tradi��o de diferentes cronogramas para distribui��o de bolsas, em 2020 houve somente um. Na chamada de 2019, por exemplo, foram dois cronogramas: o primeiro com 324 bolsas de doutorado e p�s-doutorado, totalizando R$ 24,8 milh�es, e o segundo com 470 bolsas, com mais R$ 35 milh�es.

Nos último anos, CNPq tem perdido recursos e bolsas para as diversas áreas de pesquisa têm diminuído(foto: CNPq)
Nos �ltimo anos, CNPq tem perdido recursos e bolsas para as diversas �reas de pesquisa t�m diminu�do (foto: CNPq)


O CNPq afirma, em nota, que concedeu as bolsas referentes � chamada de 2020 de acordo com o limite de recursos previsto. A entidade argumenta que passa por um per�odo de limita��es e incertezas impostas pela pandemia de covid-19, pois n�o sabe quando haver� retorno "da normalidade das atividades acad�micas e, principalmente, para a mobilidade dos pesquisadores, em especial para o interior".

O n�mero de bolsas frustrou pesquisadores que tiveram avalia��es positivas dos pareceristas, mas n�o conseguiram recursos do CNPq para conduzir seus projetos. Muitos tiveram de recorrer a trabalhos como professores, outros passaram a fazer servi�os pontuais para ter alguma renda e alguns at� precisaram pedir ajuda financeira aos parentes.

Para especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, a distribui��o de bolsas no edital de doutorado e p�s-doutorado de 2020 � um exemplo das dificuldades enfrentadas pelo Minist�rio da Ci�ncia, Tecnologia e Inova��es (MCTI), ao qual o CNPq � vinculado, que sofreu frequentes cortes de recursos nos �ltimos anos.

"� a crise mais grave no setor desde as d�cadas de 1950 e 60, quando come�ou o fomento � ci�ncia e tecnologia. Ao longo da trajet�ria, houve um per�odo de altos e baixos, mas nunca houve uma crise como a atual. � um colapso do sistema", afirma o cientista pol�tico Luis Fernandes, ex-presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).

Sem bolsas, muitos pesquisadores precisam reavaliar suas carreiras. "A vida deles � estressante, porque n�o h� recursos. Se voc� olhar a sinaliza��o do futuro para o jovem � p�ssima", diz a vice-presidente da Academia Brasileira de Ci�ncias, Helena Nader.

Em nota, o CNPq afirma que planeja lan�ar uma chamada em 2021 para contemplar R$ 35 milh�es para pesquisas de doutorado e p�s-doutorado no Brasil e no exterior, ap�s recente libera��o de cr�ditos suplementares deste ano (aqueles que precisam de aprova��o do Congresso) para bolsas e projetos. Segundo o CNPq, essa chamada seria uma forma de complementar a de 2020.

'Sem a bolsa n�o tem como sobreviver'

O CNPq pagou, no ano passado, 79,6 mil bolsas em diversas modalidades. O recurso � fundamental para os pesquisadores, pois � a fonte de renda deles. O valor varia conforme a forma��o: para doutorado, por exemplo, corresponde a R$ 2,2 mil, enquanto para p�s-doutorado s�nior pode chegar a R$ 4,4 mil.

Situa��es como demora para o lan�amento de editais, atraso em pagamentos ou pouca concess�o de bolsas s�o consideradas extremamente prejudiciais para o avan�o da ci�ncia, da tecnologia e da inova��o no Brasil.

"Sem a bolsa n�o tem como sobreviver, visto que a dedica��o � exclusiva", explica Glauco Meireles. Se ele conseguisse a bolsa, receberia o valor correspondente ao p�s-doutorado j�nior: R$ 4,1 mil mensais.

A bolsa do CNPq era a prioridade do pesquisador para 2021. "Para fazer um projeto sem bolsa, este precisaria ser dividido em 20 horas semanais no laborat�rio e 20 horas semanais trabalhando. Mas na atual conjuntura � muito dif�cil conseguir um trabalho de 20 horas semanais que pague suficientemente bem. � economicamente invi�vel", explica.


Gabriela Lopes tem feito trabalhos como ilustradora e corrigido textos acadêmicos para garantir renda após não conseguir bolsa(foto: Arquivo pessoal)
Gabriela Lopes tem feito trabalhos como ilustradora e corrigido textos acad�micos para garantir renda ap�s n�o conseguir bolsa (foto: Arquivo pessoal)

O projeto que Meireles inscreveu no edital relaciona dois temas nos quais ele se aprofundou nos �ltimos anos. Entre 2012 e 2017, durante o mestrado e doutorado, ele pesquisou sobre o estanho. Nos anos seguintes, trabalhou com baterias de l�tio, usadas em carros el�tricos, smartphones, notebooks e c�meras digitais.

Por meio do conhecimento adquirido nos �ltimos anos, decidiu estudar uma rela��o entre estanho e baterias de l�tio.

"� um estudo de uma t�cnica de obten��o do �xido de estanho com potencial aplica��o em baterias de l�tio. Essas baterias s�o estudadas pela capacidade de carga que possuem e s�o consideradas a principal alternativa para a aplica��o em baterias de carro el�trico, al�m de ter outras aplica��es, como em rel�gios ou celulares", explica o pesquisador.

O projeto obteve nota final 8,94 e arrancou elogios dos pareceristas.

"Reconheceram como uma iniciativa importante para a ci�ncia, para n�o deixar o Brasil ser apenas um pa�s exportador de commodities", relata.

Em meados de 2020, Meireles, de 31 anos, havia ficado desempregado ap�s finalizar o contrato em uma pesquisa sobre baterias de l�tio. Por alguns meses, ele usou as economias que guardara ao longo dos �ltimos anos. Para reduzir as despesas, deixou a casa em que vivia sozinho em Curitiba (PR) e passou a morar com amigos na mesma cidade.

Para ele, a bolsa representaria um al�vio por conduzir um projeto pr�prio e se sustentar por meio disso.

"A gente que faz mestrado e doutorado na �rea de pesquisa cient�fica tem vontade de continuar. Como s�o pouqu�ssimas empresas que reconhecem a import�ncia dessa �rea e investem nela, a gente fica dependente das ag�ncias de fomento estadual e federal, que est�o com or�amento cada vez menor", diz o pesquisador.

Em mar�o deste ano, Meireles come�ou a trabalhar como professor de ensino fundamental e m�dio em uma escola de Curitiba. Caso recebesse bolsa do CNPq, ele teria de abandonar o emprego e se mudar para Florian�polis (SC), pois executaria o seu projeto em um laborat�rio da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

O resultado negativo do CNPq causou frustra��o no pesquisador. Ele teve de abandonar o projeto, ao menos por enquanto, e continuar trabalhando como professor em Curitiba. Agora, afirma que segue � espera de novos editais. "Mas sem muitas expectativas, porque est� grande o corte no or�amento destinado � pesquisa."

Enquanto Meireles se sustenta como professor, outros pesquisadores t�m dificuldades adicionais.

"A minha �ltima bolsa acabou em dezembro de 2020. Consegui dar apenas um curso online em mar�o. Portanto, dependo dos recursos economizados ao longo dos anos, al�m do apoio familiar e do companheiro. Por�m, aos 50 anos, convenhamos que isso � humilhante", desabafa Luiza Alvim. Ela estuda a rela��o entre a m�sica e o cinema e tem p�s-doutorado na �rea. Mesmo com parecer positivo no edital de 2020 do CNPq, n�o conseguiu bolsa.

Gabriela Lopes, que tem doutorado em literatura e cultura, faz trabalhos informais de ilustra��o digital e corrige trabalhos acad�micos. Ela avalia que consegue, no m�ximo, R$ 1 mil por m�s com essas ocupa��es. "Mas n�o � (um valor) certo", diz.


Vice-presidente da ABC, Helena Nader afirma que autoridades brasileiras enxergam a área da ciência e tecnologia como gasto, não como investimento(foto: Divulgação)
Vice-presidente da ABC, Helena Nader afirma que autoridades brasileiras enxergam a �rea da ci�ncia e tecnologia como gasto, n�o como investimento (foto: Divulga��o)


Em 2020, ela trabalhou como professora substituta na Universidade Federal da Bahia (UFBA). Neste ano, retornou para a casa da m�e, em Minas Gerais, ap�s o fim do contrato como docente. "Infelizmente, ainda que meu projeto tenha sido elogiado e aprovado fora do or�amento, sem a bolsa eu continuo em uma situa��o de definhar financeiramente", diz a pesquisadora, de 29 anos.

Os problemas pela falta de bolsa, diz Gabriela, afetaram a sua sa�de f�sica e mental. "Infelizmente, pela condi��o dos meus pais (que t�m problemas de sa�de), n�o posso ter como estrat�gia procurar oportunidade fora do pa�s, como j� pude antes", comenta.

"Para mim, fica evidente que a falta de investimento em pesquisa e no ensino p�blico deixar� a classe trabalhadora cient�fica, principalmente doutoras e doutores, que n�o s�o absorvidos pelo mercado, fadados ao descaso e ao desemprego", declara Gabriela.

A reportagem apurou que entre os projetos elogiados por pareceristas, mas que n�o conseguiram recursos do CNPq, est�o iniciativas de diferentes �reas, como f�sica, astronomia, qu�mica, literatura, comunica��o, entre outras.

O CNPq afirma que os resultados de todas as chamadas passam por v�rias etapas at� a defini��o das propostas contempladas. Segundo o �rg�o, "h� desde avalia��o da documenta��o, quanto ao atendimento dos requisitos previstos na chamada at� o julgamento do m�rito cient�fico de cada proposta, feito pelos comit�s".

De acordo com o CNPq, a �ltima etapa � a sele��o das propostas avaliadas com m�rito, dentro dos recursos previstos em cada chamada.

"O CNPq respeita integralmente o ranking estabelecido pelos comit�s, contemplando, em um processo competitivo, historicamente entre 10% a 20% dos projetos da demanda qualificada, em observ�ncia aos recursos dispon�veis em cada chamada, em um cen�rio de excel�ncia reconhecida na ci�ncia, com pesquisadores de alt�ssima qualidade", afirmou o presidente do CNPq, Evaldo Vilela, em recente comunicado do �rg�o.


Atuando como pesquisadora aos 50 anos, Luiza Alvim precisou recorrer aos familiares e a economias que juntou nos últimos anos por não ter conseguido bolsa do CNPq(foto: Arquivo pessoal)
Atuando como pesquisadora aos 50 anos, Luiza Alvim precisou recorrer aos familiares e a economias que juntou nos �ltimos anos por n�o ter conseguido bolsa do CNPq (foto: Arquivo pessoal)

Cortes de recursos para a ci�ncia e tecnologia

As dificuldades para concess�o de bolsas s�o explicadas por uma situa��o que se tornou recorrente nos �ltimos anos: o corte de recursos do Minist�rio da Ci�ncia, Tecnologia e Inova��es (MCTI).

Em 2021, os recursos discricion�rios (que n�o s�o obrigat�rios, dependem da disponibilidade de verbas e s�o usados para �reas como as pesquisas) do minist�rio correspondem a R$ 2,8 bilh�es, sendo que 49% desse valor depende de cr�ditos suplementares (que precisam de aprova��o do Congresso). Em 2020, a pasta tinha verba de R$ 3,6 bilh�es.

Os n�meros mais recentes representam uma forte queda na pasta quando comparados a 2014, per�odo em que esses recursos discricion�rios do MCTI correspondiam a R$ 8,7 bilh�es — nos anos seguintes o pa�s reduziu cada vez mais o investimento em ci�ncia, tecnologia e inova��o.

O or�amento do CNPq para este ano � de R$ 1,2 bilh�o — 55% dependentes de cr�ditos suplementares. Para bolsas de pesquisas ser�o destinados R$ 944 milh�es, valor 12% menor que o do ano passado. Conforme levantamento da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ci�ncia, o recurso total destinado ao �rg�o em 2021 � cerca de 8% menor que o do ano passado, que j� era inferior aos per�odos anteriores.

Disputa por verbas

A principal expectativa do MCTI para amenizar o cen�rio de redu��o de verbas e cortes de bolsas � a libera��o de R$ 5,1 bilh�es referentes a cerca de 90% do Fundo Nacional de Desenvolvimento Cient�fico e Tecnol�gico (FNDCT), uma das principais fontes de recursos da ci�ncia e tecnologia no pa�s.

O FNDCT � obtido por meio de impostos e tributa��es de setores que exploram recursos naturais e outros bens da Uni�o.

Cerca de 90% do recurso do FNDCT deste ano foi colocado em uma reserva de conting�ncia por determina��o do governo federal. A principal alega��o do Minist�rio da Fazenda � de que a libera��o desse montante estoura a regra do teto de gastos.

Em mar�o deste ano, o Legislativo proibiu, por meio de uma Lei Complementar, o contigenciamento do FNDCT e apontou que o fundo deve ser encaminhado ao MCTI.

Por�m, o Congresso Nacional aprovou a Lei Or�ament�ria Anual (LOA) 2021 um dia antes da publica��o da Lei Complementar sobre o FNDCT no Di�rio Oficial. Desta forma, a proibi��o do contigenciamento n�o foi inclu�da na LOA.


Meireles trabalha como professor e não consegue tocar projeto por não ter recebido bolsa(foto: Arquivo pessoal)
Meireles trabalha como professor e n�o consegue tocar projeto por n�o ter recebido bolsa (foto: Arquivo pessoal)


Especialistas da �rea da ci�ncia e tecnologia, o MCTI e o CNPq cobram o repasse do FNDCT.

Em carta divulgada nesta semana, entidades da �rea de Ci�ncia, Tecnologia e Inova��o pediram que os R$ 5,1 bilh�es "sejam imediatamente e integralmente liberados para a fun��o estabelecida em lei, que � o financiamento da pesquisa cient�fica e tecnol�gica".

"Os avan�os da ci�ncia, tecnologia e inova��o t�m se mostrado imprescind�veis para a supera��o da crise sanit�ria, econ�mica e social, em raz�o da pandemia de covid-19", diz trecho da carta.

"O sistema nacional de ci�ncia e tecnologia, consolidado nas �ltimas d�cadas, est� em vias de colapso. Os sucessivos cortes or�ament�rios precarizam universidades e institutos de pesquisa, afetando seriamente a pesquisa realizada nessas institui��es e a forma��o adequada de profissionais. O investimento escasso em P&D (pesquisa e desenvolvimento) prejudica a inova��o e a recupera��o da economia".

O cientista pol�tico Luis Fernandes avalia a atual situa��o da ci�ncia e tecnologia no Brasil como dram�tica e aponta que o principal impacto desse cen�rio � que o pa�s deixa de construir o pr�prio futuro.

"O que caracteriza uma sociedade e o conhecimento �, cada vez mais, a gera��o de valor. Se n�o investirmos em capacidade cient�fica para inova��o aut�noma, o pa�s fica condenado a se inserir na economia mundial sem capacidade de gerar empregos mais capacitados", declara o ex-presidente da Finep.

O especialista diz que um dos agravantes para o atual cen�rio foi a falta de preocupa��o do governo Jair Bolsonaro com a ci�ncia e a tecnologia. Mas Fernandes avalia que um fator j� prejudicava duramente o segmento no pa�s na gest�o anterior: a regra do teto de gastos governamentais adotada durante o governo Michel Temer (MDB).

"Esse estabelecimento de um teto define que a expans�o de gastos governamentais sempre � condicionada ao limite da infla��o, mas libera o pagamento da d�vida p�blica. Com isso, transfere recursos do setor produtivo e de servi�os do pa�s para remunerar aplica��es de d�vidas p�blicas nacionais", diz Fernandes.

"Como o teto de gastos � muito baixo, existe uma disputa por recursos extremamente escassos. Normalmente, o atendimento � emergencial e n�o estruturante para o futuro do pa�s. Assim, ci�ncia e tecnologia s�o sacrificadas duramente", acrescenta o especialista.

Segundo Fernandes, duas mudan�as s�o fundamentais: o governo federal enxergar a �rea da ci�ncia e tecnologia como motor do desenvolvimento do pa�s e uma revis�o do Poder Legislativo ao teto de gastos.

"Essa emenda constitucional do teto de gastos p�blicos vai contra o futuro do Brasil, porque imp�e meta de estabiliza��o a curto prazo. Isso prejudica projetos a longo prazo para o desenvolvimento do pa�s", opina.

Fernandes afirma que a libera��o integral de recursos do FNDCT nos pr�ximos anos n�o ser� suficiente para superar a crise do setor se n�o houver recomposi��o dos or�amentos do MCTI e do Minist�rio da Educa��o.

"Os recursos captados pelos Fundos Setoriais (base do FNDCT) se destinam a investimentos em a��es estrat�gicas complementares �s linhas or�ament�rias regulares e cont�nuas do governo. Eles n�o se destinam a cobrir cortes do CNPq ou da Coordena��o de Aperfei�oamento de Pessoal de N�vel Superior (Capes, vinculada ao Minist�rio da Educa��o)", detalha o cientista pol�tico.

Extremamente importante para o fomento da pesquisa no pa�s, a Capes tamb�m enfrenta muitas dificuldades financeiras em meio a cortes do governo relacionados � Educa��o.

Um levantamento recente do G1 apontou que o or�amento do Minist�rio da Educa��o destinado �s despesas discricion�rias das universidades federais em 2021 teve redu��o de 37% se comparadas �s de 2010 corrigidas pela infla��o. A situa��o torna a �rea de ci�ncia cada vez mais prec�ria, pois afeta laborat�rios, equipamentos e bolsas para pesquisadores.

Somente neste ano, segundo a Associa��o Nacional dos Dirigentes das Institui��es Federais de Ensino Superior (Andifes), houve corte de R$ 1 bilh�o no repasse �s universidades federais do pa�s.


Diante da falta de investimento na ciência no Brasil, muitos pesquisadores têm buscado oportunidades em outros países(foto: Getty Images)
Diante da falta de investimento na ci�ncia no Brasil, muitos pesquisadores t�m buscado oportunidades em outros pa�ses (foto: Getty Images)

O futuro da ci�ncia no Brasil

A queda nos n�meros de bolsas de pesquisa no pa�s representa um duro retrocesso que levar�, ao menos, 10 anos para ser revertido, avalia Celso Pansera, ex-ministro de Ci�ncia e Tecnologia no governo Dilma Rousseff (PT), durante o fim de 2015 e abril de 2016.

"Digamos que comecem a recuperar os investimentos [do governo federal] no ano que vem. Levar� pelo menos uma d�cada para recuperar o n�vel que t�nhamos em anos anteriores, [quando havia crescimento no setor]", afirma Pansera � BBC News Brasil.

"Em 2015, a execu��o para bolsas, pesquisas e desenvolvimento era de R$ 1,6 bilh�o. Em 2020 caiu para R$ 1,1 bilh�o. Agora, em 2021, � de pouco mais de R$ 900 milh�es. Essa queda � enorme. Programas de p�s-gradua��o foram abandonados, bolsas n�o foram renovadas e n�o foram lan�ados editais para novas bolsas. Isso vai minguando o sistema", acrescenta.

Ele destaca que enquanto o CNPq atualmente possui pouco menos de 80 mil bolsas, em 2014 eram quase 105 mil. "O setor vai paralisando e morrendo por inani��o. Os alunos que n�o t�m bolsa, e n�o conseguem se sustentar sem elas, v�o sendo expulsos desse sistema", declara.

Com poucas oportunidades no Brasil, muitos cientistas decidem ir para outros pa�ses em busca de oportunidades na �rea da ci�ncia e tecnologia.

Em grupos de pesquisadores brasileiros, � comum que eles troquem dicas para que possam deixar o pa�s. "Recentemente me candidatei a duas vagas no exterior e estou aguardando se recebo algum retorno", conta o pesquisador Glauco Meireles.

Pa�ses da Organiza��o para Coopera��o e Desenvolvimento Econ�mico (OCDE) — como Alemanha, Fran�a, It�lia, Estados Unidos, Reino Unido, entre outros —, da qual o Brasil almeja fazer parte, investem, em m�dia, mais de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) em pesquisa e desenvolvimento. J� pa�ses reconhecidamente inovadores, como Coreia do Sul e Israel, investem mais de 4% na �rea.

O Brasil, conforme a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ci�ncia (SBPC), investiu pouco mais de 1% do PIB em pesquisa e desenvolvimento em 2018. Em 2020, estima-se que o investimento tenha sido ainda menor.

"O Brasil usou em torno de 0,5% a 0,7% do PIB nessa �rea no ano passado. Isso n�o � investimento, porque n�o d� nem para a sobreviv�ncia", declara Helena Nader, da Academia Brasileira de Ci�ncias (ABC).

"O problema do Brasil � que nos �ltimos anos, n�o apenas no governo Bolsonaro, h� uma cultura de que Educa��o, Ci�ncia, Tecnologia e Inova��o s�o gastos. Outras na��es encaram isso como investimento", completa Helena.

"O grosso do investimento nas universidades dos Estados Unidos ou na Europa � de dinheiro p�blico. O investimento do setor privado nas universidades e institutos diz respeito a perguntas e interesses da pr�pria ind�stria, que ainda assim recebe incentivo (dos governos locais) para investir em inova��o. Inova��o � atividade de risco, os pa�ses desenvolvidos sabem disso e por isso investem", diz.

"O investimento em ci�ncia, tecnologia e inova��o leva tempo, � uma forma de olhar para o futuro. N�o � como uma estrada, que come�a e acaba em um prazo. O Brasil est� na contram�o nesse sentido", acrescenta a vice-presidente da ABC.

Nesse cen�rio, Helena afirma que � comum que muitos pesquisadores optem por deixar o Brasil quando conseguem oportunidades. "Conhe�o quatro brilhantes cientistas que foram embora para os Estados Unidos ou para a Inglaterra nos �ltimos anos", declara.

"Com essa falta de vis�o sobre a ci�ncia e a educa��o no Brasil, vai acontecer muita fuga de c�rebros, porque os nossos estudantes s�o muito bons e ganham bolsa no exterior facilmente."

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