
A imunoglobulina traz anticorpos para v�rias doen�as, como t�tano, rub�ola, gripes e difteria. Na regula��o do sistema imunol�gico, ela � essencial no tratamento de doen�as neurol�gicas, como a s�ndrome de Guillain-Barr�, neuropatias, doen�a de Kawasaki e trombocitopenia imune, entre outras. Mais recentemente, vem sendo usado para tratamentos p�s-COVID.
"O governo federal segue falhando no envio de rem�dios de alto custo ao Estado de S�o Paulo, incluindo a imunoglobulina humana. Nenhum frasco foi recebido para atender pacientes no terceiro trimestre e ainda est� pendente 57% do total requerido para o segundo trimestre. Vieram apenas 61,3 mil unidades, das 142 mil aprovadas pelo pr�prio minist�rio", diz nota da Secretaria da Sa�de
A Anvisa, por sua vez, diz que vai facilitar a importa��o do produto.
"Em face do cen�rio de iminente risco de desabastecimento de imunoglobulina humana regularizada no Brasil, a Anvisa concedeu autoriza��es de importa��o deste produto, em car�ter excepcional, por unidades de sa�de, para seu uso exclusivo", avisou a ag�ncia.
De acordo com a entidade, a autoriza��o excepcional j� foi concedida para o Hospital das Cl�nicas da USP e outros pedidos est�o em an�lise. O governo Doria tem outra vers�o. "O Hospital das Cl�nicas entrou com pedido de importa��o direta do medicamento em car�ter emergencial com fornecedores ainda sem registro na Anvisa, al�m de manter consultas regulares junto a fornecedores nacionais que eventualmente tenham estoque", diz a nota.
Sem estoque
"A situa��o (n�o envio de imunoglobulina) dificulta o abastecimento de servi�os que atendem pacientes graves e grav�ssimos, como o Hospital das Cl�nicas que, no momento, possui estoque para aproximadamente uma semana", diz o Estado.
O problema tem contornos nacionais. A Associa��o Brasileira dos Planos de Sa�de (Abramge) enviou of�cio pedindo medidas para acelerar a importa��o. A inten��o � que o medicamento integre a categoria dos kits de intuba��o de pacientes com COVID.
De acordo com a entidade, que re�ne 170 hospitais ligados a planos de sa�de, a maioria no Nordeste e nos Estados de S�o Paulo e Rio, nenhuma institui��o tem estoque superior a 15 dias. "Esta crise n�o tem a dimens�o da falta dos kits hospitalares. Estamos falando de um tipo mais espec�fico de paciente, mas a situa��o � cr�tica", afirma o presidente da Abramge, Renato Casarotti.
A falta de imunoglobulina vem sendo identificada em outros levantamentos. Pesquisa da Associa��o Nacional de Hospitais Privados (Anahp) com 55 afiliados constatou que 81,48% est�o com grave escassez de imunoglobulina. Mais de 78% deles s� t�m abastecimento para um m�s.
"Trinta dias � um prazo muito apertado para autoriza��o, negocia��o, importa��o e recebimento. A maioria dos hospitais est� com bastante dificuldade", avalia o diretor executivo da Anahp, Ant�nio Britto.
A Confedera��o das Santas Casas de Miseric�rdia, Hospitais e Entidades Filantr�picas realiza um levantamento com os hospitais filantr�picos sobre as dificuldades de compra do produto, a necessidade de estoque e a disposi��o para importa��o.
O objetivo, diz a entidade, seria "obter da Anvisa uma norma ou regula��o que permita ter facilidade ou regras que possam tornar menos oneroso" o processo de importa��o da imunoglobulina.
Entre os fatores que explicam a aus�ncia de imunoglobulina est� o aumento do consumo do produto para tratamento das sequelas de COVID. A informa��o consta no of�cio da Abramge � Anvisa.
O medicamento, afirma, usado em terapia combinada com antibi�ticos ou antivirais para prevenir infec��es bacterianas e virais graves, "mais recentemente, vem sendo usado para tratar complica��es p�s-COVID-19".
A experi�ncia na linha de frente da m�dica Ekaterini Goudouris, coordenadora do setor de Imunodefici�ncias da Associa��o Brasileira de Alergia e Imunologia, comprova a tese. Ela destaca o aumento dos casos de doen�a inflamat�ria sist�mica p�s-COVID, principalmente em jovens. No Hospital Pedi�trico da UFRJ, no Rio, onde trabalha, foram sete casos em agosto.
Outra raz�o para a escassez � a queda das doa��es de sangue com a pandemia. Segundo a Funda��o Pr�-Sangue, da Secretaria de Sa�de de SP, os estoques est�o extremamente baixos.
A funda��o opera com cerca de 22% da reserva necess�ria para atender a cem institui��es pelo SUS. Leonisa Obrusnik, diretora da cadeia de suprimentos no Hospital Oswaldo Cruz, lembra que a imunoglobulina, n�o sendo produzida no mercado nacional, depende da importa��o.
"Com o aumento do consumo, a quantidade importada n�o est� sendo suficiente".
Embora tenha se agravado na pandemia, a escassez da imunoglobulina � um problema recorrente no Pa�s. Estima-se que estejam sem tratamento 70% dos pacientes com defeitos prim�rios do sistema imunol�gico, que precisam da reposi��o de modo cont�nuo.
Criado em 2017, o grupo "Eu luto pela imuno Brasil" - formado por pacientes para lutar contra a falta de medica��o - tem como uma das fundadoras a funcion�ria p�blica Ju�a�ra Stella Giusti, de 56 anos, de S�o Carlos.
"Vamos lan�ar uma campanha para conscientizar as pessoas sobre a import�ncia da doa��o de sangue para a produ��o de medicamentos", diz a cirurgi� dentista.
Ju�a�ra recebe seu medicamento pelo plano de sa�de. Recentemente, recebeu um comunicado do laborat�rio CSL Behring Brasil, informando "a descontinua��o tempor�ria da importa��o" do produto. Ju�a�ra explica que n�o h� um "gen�rico" da imunoglobulina. No seu caso, um vidro com 4 g custa, em m�dia, R$ 2 mil, valor custeado pelo seu conv�nio m�dico.
Luta por tratamento
Aos 4 anos, Bernardo precisa de aplica��es semanais de imunoglobulina para sair minimamente de casa sem adoecer muito. Diagnosticado com imunodefici�ncia prim�ria e uma cardiopatia cong�nita, o menino ainda passa por exames para saber se tem uma doen�a associada rara chamada S�ndrome de DiGeorge ou outras doen�as gen�ticas.
Em mar�o de 2019, quando tinha 1 ano e 8 meses, os m�dicos solicitaram o tratamento com imunoglobulina humana endovenosa ou subcut�nea a cada 20 dias. Ao longo de dois anos, ele conseguiu poucas sess�es, apenas em momentos de interna��o ou cirurgias.
Em mar�o deste ano, depois de muitas tentativas de tratamento, a m�e, Maressa Pedrosa Silva, solicitou o tratamento via judicial. A Justi�a de S�o Paulo determinou, em primeira inst�ncia, o atendimento integral pela operadora do conv�nio.
"Foram dois anos de luta para garantir o tratamento, que s� veio ap�s liminar e, posteriormente, decis�o judicial", conta a m�e, que tem de 36 anos.
Ap�s a disputa judicial, a fam�lia enfrenta agora a escassez da imunoglobulina. Pesquisa da Associa��o Nacional de Hospitais Privados (Anahp) com 55 afiliados constatou que 81,48% est�o com grave escassez de imunoglobulina.
"Por enquanto, a cl�nica ainda tem estoque de imunoglobulina subcut�nea. Mas j� recebemos o aviso que a imunoglobulina humana endovenosa acabou em v�rios hospitais de S�o Paulo e que a subcut�nea est� sem estoque e sem fornecimento pela farmac�utica", afirma Maressa, que trabalha como doula.
"� uma inc�gnita at� quando meu filho ter� acesso ao tratamento", afirma.
A imunologista Mariana de Gouveia Pereira Pimentel, do Centro de Infus�o e Imuniza��o Bioma, respons�vel pelo tratamento de Bernardo, explica que a escassez de imunoglobulina � mundial.
"Quando soubemos da falta, fizemos uma compra para manter o tratamento dos pacientes. Eu tenho mais tr�s ou quatro meses", explica a especialista, que tamb�m � integrante do departamento cient�fico de Imunodefici�ncias da Associa��o Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai).
Rede p�blica
A especialista afirma que ainda n�o existem impactos do desabastecimento no Sistema �nico de Sa�de (SUS) porque ele utiliza outros fornecedores - e n�o os fabricantes americanos.
"O SUS ainda tem o produto porque faz compra de fabricantes chineses e coreanos. Desde a coleta at� a entrega final, o processo pode durar 18 meses. A expectativa � de que a distribui��o se normalize at� o fim do ano ou come�o do ano que vem", prev�. As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.