
O volume de importa��o de armas de fogo no Brasil aumentou 33% em 2021 em rela��o a 2020 e chegou a US$ 51,9 milh�es, contra US$ 38,9 milh�es. � o maior valor da s�rie hist�rica produzida pela Secretaria de Com�rcio Exterior do Minist�rio da Economia (Siscomex), que come�a em 1997.
No ano passado, houve um crescimento de 12% no total de rev�lveres e pistolas importadas (sem contar outros tipos de armas de fogo), chegando a 119.147 contra 105.912 em 2020.
Entre fuzis, carabinas, metralhadoras e submetralhadoras houve um aumento de 574%. Em 2020, foram importadas 1.211 armas desse tipo. Em 2021, o n�mero chegou a 8.160. Foi o segundo aumento expressivo consecutivo na importa��o desse tipo de armamento. Entre 2019 e 2020, houve um crescimento de 226% na entrada dessas armas no pa�s, saindo de 371 em 2019 para 1.211 em 2020. Entre 2018 e 2019, o aumento havia sido de apenas 13%.
Especialistas em seguran�a p�blica ouvidos pela BBC News Brasil afirmam que o aumento na importa��o de armas pelo Brasil � resultado das mudan�as feitas pelo governo do presidente Jair Bolsonaro que tornaram mais f�cil comprar armas no Brasil e dizem que esse crescimento pode ter efeitos negativos para a seguran�a p�blica.
O Ex�rcito, respons�vel pelo controle das importa��es de armas no pa�s, informou, por meio de sua assessoria de imprensa, n�o ter estudos sobre as causas desse aumento e que o �rg�o vem executando o rastreio e controle de armas e muni��es de acordo com a legisla��o. Procurados, o Minist�rio da Justi�a e a Presid�ncia da Rep�blica n�o se pronunciaram.
A fonte do levantamento feito pela BBC News Brasil � o sistema de estat�stica alimentado pelo Minist�rio da Economia e que est� dispon�vel na internet. Ele coleta informa��es de importadores e exportadores sobre os produtos que entram e saem do Brasil. Os dados n�o distinguem se as armas foram importadas por �rg�os p�blicos, pessoas f�sicas ou empresas.
O levantamento re�ne dados dos quatro grupos de armas entre as mais comuns e que podem ser adquiridas tanto por for�as de seguran�a como pol�cias e Ex�rcito, quanto por empresas e civis e militares devidamente autorizados.
A �nica exce��o � com rela��o ao grupo que agrega fuzis, carabinas, metralhadoras e submetralhadoras. As duas primeiras podem ser vendidas para pessoas f�sicas, enquanto as duas �ltimas s�o exclusivas para for�as de seguran�a.
Isso ocorre porque a Siscomex agregou esses quatro tipos de armas em um �nico grupo e n�o detalha quantas armas de cada tipo foram importadas.
Rev�lveres, pistolas e fuzis em alta
%u200BO aumento no volume de fuzis importados acontece ap�s o presidente Jair Bolsonaro ter assinado, a partir de 2019, uma s�rie de decretos que facilitaram a aquisi��o desse tipo de armamento.
Antes, cidad�os comuns que quisessem ter um fuzil precisariam ser cadastrados junto ao Ex�rcito como colecionadores, e s� podiam acessar modelos com mais de 70 anos, ou seja, armas efetivamente antigas. Ca�adores e atiradores registrados n�o poderiam ter acesso a esse tipo de armamento.
Com os decretos do presidente, por�m, ca�adores e atiradores tamb�m passaram a ter direito de adquirir fuzis.
Os decretos de Bolsonaro tamb�m aumentaram a quantidade que cada CAC (ca�adores, atiradores esportivos e colecionadores) pode ter acesso.
Colecionadores, que s� poderiam ter um fuzil de cada modelo, agora podem ter at� cinco armas de cada modelo. Ca�adores, que n�o poderiam ter fuzil, agora podem ter at� 15 unidades. Atiradores, que antes tamb�m n�o poderiam ter fuzis, agora podem ter at� 30 armas desse tipo.
Outra categoria de armas que tamb�m registrou crescimento foi a de espingardas e carabinas de tiro ao alvo, que teve alta de 35%, saindo de 4.125 armas importadas em 2020 para 5.572 em 2021.
Somando todos os grupos levantados pela BBC News Brasil, foram importadas 140.559 armas de fogo em 2021 contra 119.335 no ano anterior, um crescimento superior a 17%.
Os dados mostram que a �ustria foi o principal exportador de armas de fogo para o Brasil em 2021. A na��o europeia exportou US$ 11,9 milh�es em armas para o pa�s. Ela � a sede da Glock, uma das maiores fabricantes de armas do mundo.
Em segundo lugar no ranking ficaram os Estados Unidos (US$ 8 milh�es) e em terceiro vem a It�lia (US$ 6,4 milh�es).
Dados do Ex�rcito, que usa uma metodologia diferente, tamb�m apontam aumento no volume de pedidos de importa��o de armas de fogo entre 2020 e 2021.
Ex�rcito tamb�m aponta alta

O Ex�rcito � respons�vel por dar autoriza��o � entrada de diversos tipos de armas, entre elas rev�lveres, pistolas e fuzis.
De acordo com o �rg�o, o Ex�rcito autorizou a entrada de 144.992 armas, um crescimento de 111% em rela��o ao ano anterior, quando o �rg�o autorizou a entrada de 68.521.
Segundo nota enviada pela assessoria de imprensa do Ex�rcito, a diferen�a entre os dados do �rg�o e da Siscomex se devem, entre outros motivos, pelo fato de que o Ex�rcito contabiliza as quantidades contidas nas licen�as de importa��o que chegam ao �rg�o, independente de a Receita Federal ter liberado a entrada dos produtos ou n�o.
Os dados do Ex�rcito mostram ainda que a maior parte dos pedidos de importa��o (69,08%) foi feito por empresas. O restante foi feito por �rg�os p�blicos (30,7%) e 0,2% por pessoas f�sicas.
Tend�ncia de alta
O Brasil vem registrando um crescimento no volume de importa��o de armas desde 2015, mas os dados mostram que essa tend�ncia se acentuou durante o governo do presidente Jair Bolsonaro.
Em 2019, por exemplo, primeiro ano do seu governo, as importa��es de armas de fogo aumentaram 46%, bateram recorde e chegaram a US$ 23,8 milh�es. Em 2020, o crescimento foi de 64% e um novo recorde: US$ 38,9 milh�es.
O aumento aconteceu no mesmo per�odo em que o governo federal alterou normas que facilitaram a compra de armas no pa�s, uma promessa de campanha de Bolsonaro.
No Brasil, a posse e o porte de armas s�o regulados pelo Estatuto do Desarmamento, de 2003, e por uma s�rie de portarias e instru��es normativas.
Pessoas f�sicas que queiram adquirir uma arma de fogo precisam cumprir uma s�rie de regras, como comprovar que n�o respondem a inqu�ritos e demonstrar aptid�o psicol�gica.
A legisla��o ainda prev� a possibilidade para que integrantes de algumas categorias, como militares, possam comprar suas pr�prias armas de forma legal. Al�m disso, a lei prev� que ca�adores, atiradores esportivos e colecionadores (CACs) tamb�m podem adquirir armamentos.
Desde 2019, o governo aumentou a quantidade de armas que CACs podem comprar, flexibilizou as regras para apresenta��o de antecedentes criminais e facilitou as exig�ncias para apresenta��o de exames psicol�gicos para quem quiser comprar armas.
Em dezembro de 2020, o governo reduziu de 20% para zero a al�quota de importa��o para rev�lveres e pistolas, o que, em tese, tornaria esses produtos mais baratos no mercado nacional.
A medida, no entanto, foi suspensa por uma decis�o do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF). O caso ainda precisa ser julgado pelo Pleno do tribunal.
Em fevereiro do ano passado, o presidente assinou uma nova s�rie de decretos que aumentava de quatro para seis a quantidade de armas que um civil poderia comprar.
A nova norma tamb�m foi suspensa por uma decis�o do STF, desta vez da ministra Rosa Weber.

Bolsonaro tamb�m assinou decretos que tiravam do Ex�rcito a obriga��o para fiscalizar prensas para recarregar muni��es de diversos calibres e a que ampliava para at� 1 mil o limite de muni��es de calibre de uso restrito por CAC.
As medidas tamb�m est�o suspensas liminarmente pelo STF, que ainda dever� decidir sobre o assunto de forma definitiva.
Em diversas ocasi�es, o presidente defendeu que a popula��o se armasse. Em agosto do ano passado, por exemplo, Bolsonaro incentivou apoiadores a comprarem fuzis.
"Tem que todo mundo comprar fuzil, p�. Povo armado jamais ser� escravizado. Eu sei que custa caro. Tem um idiota: 'Ah, tem que comprar � feij�o'. Cara, se n�o quer comprar fuzil, n�o enche o saco de quem quer comprar", afirmou o presidente.
'Demanda reprimida'
O empres�rio e conselheiro da Associa��o Brasileira de Importadores de Armas e Materiais B�licos (Abiamb), Demetrius Oliveira, afirma que o aumento da importa��o de armas e muni��es no Brasil � resultado da conjun��o entre "demanda reprimida" e medidas tomadas pelo governo nos �ltimos anos.
"H� uma demanda reprimida por variedade e qualidade de produtos nesse segmento. Esses produtos t�m uma forte aceita��o do p�blico no Brasil [...] Os decretos mais recentes deram mais clareza �s pessoas que queriam adquirir suas armas e isso tamb�m pode ter contribu�do", afirmou.
Demetrius diz ainda acreditar que a posi��o pol�tica do governo Bolsonaro tamb�m contribuiu para o aumento das importa��es de armas no Brasil.
"Esse fen�meno se acentuou (importa��o de armas) talvez porque a gente tenha um governo de direita que olha pro cidad�o dentro do seu direito constitucional � liberdade e fizeram com que tiv�ssemos uma mudan�a desse paradigma", afirmou.
Especialistas alertam para riscos � seguran�a p�blica
Para o gerente do Instituto Sou da Paz e autor de um livro sobre o mercado de armas no Brasil, Bruno Langeani, a quebra do monop�lio das empresas nacionais e facilita��o das regras para Ca�adores, Atiradores e Colecionadores (CACs) impulsionaram o aumento da entrada de armas estrangeiras no Brasil.
"Antes, havia uma norma que impedia a importa��o de armas a menos que n�o houvesse similar no mercado nacional. Essa mudan�a foi pensada antes, mas entrou em vigor no atual governo. Depois disso, houve uma s�rie de facilita��es para que os CACs pudessem comprar armas e muni��es. Tudo isso fez as importa��es aumentarem", afirma.
Na avalia��o de Langeani, a facilidade para a importa��o tende a aumentar a quantidade de armas que podem chegar ao crime organizado.
"Antigamente, no mercado ilegal, fuzis custavam entre R$ 40 mil e R$ 50 mil. Agora, com as novas regras, esse pre�o pode chegar a R$ 20 mil. Quando voc� aumenta a quantidade de armas pesadas que civis podem comprar, voc� est� aumentando a quantidade de armas que pode acabar abastecendo as quadrilhas e isso � ruim para a seguran�a p�blica", explica.
Para Langeani, um exemplo disso aconteceu na ter�a-feira (25/01), quando a Pol�cia Civil e o Minist�rio P�blico do Rio de Janeiro (MPRJ) apreenderam 26 fuzis, 21 pistolas, tr�s carabinas e muni��o para fuzil em uma casa na Zona Norte da capital fluminense. De acordo com as investiga��es, o material havia sido adquirido por um traficante de armas que tinha uma licen�a de CAC. De acordo com a pol�cia e o MPRJ, o traficante comprava as armas de forma legal e repassaria os produtos a fac��es do crime organizado.

"Essa apreens�o � um exemplo do que a gente tem alertado. Essas mudan�as criaram um acesso legal a um n�mero alto de armas e muni��es de calibre restrito. Agora, traficantes de armas podem receber em casa esses produtos feitos no Brasil ou no exterior com um verniz de legalidade e depois repassar essas armas ao crime organizado", afirmou.
Para o pesquisador em seguran�a p�blica da International Action Network on Small Arms (Rede de A��o Internacional Sobre Armas Pequenas), Ivan Marques, as mudan�as na legisla��o e a propaganda pr�-armamentista feitas pelo presidente Jair Bolsonaro impulsionaram a importa��o de armas no Brasil nos �ltimos anos.
"O que levou a esse crescimento foi essa combina��o entre flexibiliza��o das normas e a propaganda feita pelo presidente que, publicamente, defende que as pessoas se armem", afirma.
Segundo ele, as consequ�ncias da entrada de cada vez mais armas no pa�s s�o negativas.
"H� uma clara liga��o entre os mercados legal e ilegal de armas. Armas que inicialmente s�o destinadas a um propriet�rio leg�timo e que comprou dentro da lei acabam indo parar nas m�os de criminosos. Isso pode levar mais ou menos tempo, mas essa conex�o � real", explica.
Demetrius Oliveira, que defende a importa��o de armas, disse que esse argumento n�o considera a rigidez do sistema de registro e monitoramento de armas.
"O sistema brasileiro � muito r�gido e n�o � t�o f�cil assim para as armas compradas legalmente serem usadas no crime. Na minha empresa, por exemplo, n�o tenho nenhum registro de arma que eu importei e que tenha ido parar nas m�os de criminosos. O crime organizado n�o � clientes de importadores legais. Eles trazem armamento ilegal da mesma forma que a droga entra no pa�s", diz.
Procurado, o Ex�rcito disse em nota que o �rg�o n�o tem estudos sobre o aumento das importa��es de armas. A nota diz ainda que o Sistema Nacional de Rastreamento de Produtos Controlados pelo Ex�rcito (Sisnar), que faz o controle e rastreio de armas de fogo e muni��es, "vem sendo executado de forma eficiente".
O Minist�rio da Justi�a e Seguran�a P�blica (MJSP) e a Presid�ncia da Rep�blica foram procurados pela reportagem, mas n�o enviaram respostas.
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