
A Independ�ncia do Brasil completa hoje dois s�culos abrigando personagens bem conhecidos e outros, igualmente not�veis, aos quais a hist�ria ainda n�o fez a devida justi�a. Tr�s deles s�o mineiros, merecendo, em algumas cidades das Gerais, n�o s� permanente culto � mem�ria como estudos sobre vida, obra e participa��o decisiva nos caminhos que levaram � separa��o de Portugal.
Hoje, quando se comemora o bicenten�rio da separa��o do Brasil de Portugal, deve ser reverenciada, entre tantos nomes importantes para esse movimento, a mem�ria do padre Belchior Pinheiro de Oliveira (1775-1856), confessor de Dom Pedro I (1798-1834) e presente no momento do Grito do Ipiranga. Na mesma escala de import�ncia est�o Jos� Teixeira da Fonseca Vasconcelos (1766-1838), o Visconde de Caet�, considerado o “patriarca mineiro da Independ�ncia”, e Joaquina Bernarda da Silva de Abreu Castelo Branco, a Dona Joaquina do Pomp�u (1752-1824), de grande influ�ncia em Minas na segunda metade do s�culo 18 e in�cio do 19, em especial no processo que culminou com a emancipa��o.
Se o paulista Jos� Bonif�cio de Andrada e Silva (1763-1838) � considerado o Patriarca da Independ�ncia, h� uma figura “absolutamente fascinante”, ainda pouco conhecida dos brasileiros, que vem � tona nas comemora��es do bicenten�rio do Grito do Ipiranga. Trata-se de Jos� Teixeira da Fonseca Vasconcelos (1766-1838), o Visconde de Caet�, nascido na Fazenda Santa Quit�ria, hoje parte do munic�pio de Esmeraldas, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte. Ele � alvo de pesquisas do promotor de Justi�a Marcos Paulo de Souza Miranda, associado do Instituto Hist�rico e Geogr�fico de Minas Gerais (IHGMG), que tem v�rios livros lan�ados sobre personagens, fatos hist�ricos e defesa do patrim�nio cultural, sobretudo mineiro.
“Duzentos anos se passaram, mas, ainda hoje, ecoam na mem�ria do nosso povo os ensinamentos e as a��es do c�lebre conterr�neo, sobretudo as que culminaram com a Independ�ncia do Brasil”, diz Souza Miranda. Para refor�ar a import�ncia do personagem, ele cita uma frase do historiador c�nego Jos� Ant�nio Marinho (1803-1853): “Deve ser considerado o patriarca mineiro da Independ�ncia. �mulo digno que foi de Jos� Bonif�cio, o discurso que proferiu na presen�a de Dom Pedro e, sem d�vida, mais vibrante e caloroso que o proferido pelo grande paulista”.
Em 5 de janeiro de 1822, Jos� Teixeira da Fonseca Vasconcelos, ent�o vice-presidente da Junta Governativa de Minas Gerais, vai ao Rio de Janeiro para uma audi�ncia com Dom Pedro I. “� preciso destacar que a Junta Governativa estava cindida, uns defendendo a exig�ncia das cortes de Lisboa, para que o pr�ncipe retornasse a Portugal, outros querendo que ele ficasse”, assinala o promotor de Justi�a.
Jos� Bonif�cio registrou que Vasconcelos estava “com a mesma satisfa��o que n�s estamos e nos mesmos sentimentos; ele se admira de vir achar no pr�ncipe o mesmo sistema e o mesmo plano que foi concebido em Vila Rica, �nico capaz de salvar a exist�ncia do Reino Unido”.
Em 17 de fevereiro, “data marcante”, segundo Souza Miranda, Vasconcelos, pol�tico habilidoso, faz c�lebre discurso, em p�blico e na presen�a de Dom Pedro I, pela perman�ncia do pr�ncipe regente no Brasil. “Dever-se-�o cumprir os dois decretos em que se acha tra�ada a nossa escravid�o, recebendo por excesso da boa-f� n�s mesmos as algemas e grilh�es? N�o por certo; estamos j� prontos a defender os nossos direitos e a derramar a �ltima gota de sangue pela nossa liberdade. Se Portugal � p�tria de her�is, tamb�m o Brasil o deve ser, e tem sido segundo mostra a hist�ria brasiliense. A nossa causa � santa e justa: o c�u a proteger�. N�s, unidos aos nossos briosos paulistas, nossos conjuntos em sangue, amizade, costumes e bravura, nada temos a temer, cooperando de acordo com as mais prov�ncias unidas, igualmente distintas em valor e sentimentos, venceremos”.
Ressaltando a “figura fascinante” do Visconde de Caet�, Souza Miranda o destaca com o um dos filhos mais ilustres de Minas Gerais, pela “intelig�ncia, erudi��o, probidade, sensibilidade pol�tica, patriotismo e amor ao bem coletivo”.
O AMIGO E CONFESSOR
S�tima Vila do Ouro, Pitangui ter� comemora��o nesta quarta-feira (7/9) para reverenciar a mem�ria do Padre Belchior, natural do antigo Arraial do Tijuco, atual Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, e morador do munic�pio do Centro-Oeste mineiro durante 42 anos. No Instituto Hist�rico de Pitangui (IHP), instalado em imponente casar�o do s�culo 18, no Centro Hist�rico, est� muito bem guardado o invent�rio e o testamento do religioso. “O documento � de 1856, ano da morte dele”, mostra o presidente da institui��o, Vandeir Alves dos Santos, ao lado do estudante de hist�ria Israel Jesus Borges Almeida. No museu hist�rico, no andar superior (n�o aberto � visita��o), h� um desenho do padre, de perfil e chap�u.
J� na Rua Padre Belchior (diante da casa onde o religioso morou e hoje � ocupada pela prefeitura local), a professora Helo�sa Helena Valladares Viegas Lopes, secret�ria do IHP, conta a hist�ria do sacerdote que estudou no semin�rio de Mariana, ordenou-se em S�o Paulo e cursou direito can�nico em Coimbra, Portugal. Na cidade europeia, conheceu o paulista Jos� Bonif�cio de Andrada e Silva (1763-1838), denominado Patriarca da Independ�ncia.
Nomeado para a par�quia de Pitangui, que assumiu em 1814, Padre Belchior era ma�om, tendo sido esse um dos pontos de aproxima��o com Dom Pedro I, conta Helo�sa Helena, professora aposentada de hist�ria e moral e c�vica e descendente de Joaquina de Pomp�u. “Como era amigo e confessor do pr�ncipe regente, e tamb�m pol�tico, Padre Belchior teve influ�ncia no processo da Independ�ncia, inclusive estava ao lado de Dom Pedro I no momento do Grito do Ipiranga. Antes de chegar a Pitangui, que tem 307 anos de hist�ria, ficou no Rio de Janeiro.”
Sobre 7 de setembro de 1822, Padre Belchior deixou registrado, em carta, um di�logo com Dom Pedro I, palavras hoje eternizadas no t�mulo do religioso, na escadaria da Igreja Matriz Nossa Senhora do Pilar, em Pitangui. “E agora, Padre Belchior?”, perguntou o pr�ncipe regente, �s margens do Rio Ipiranga, ao receber as cartas de sua esposa, Leopoldina, de Jos� Bonif�cio, do seu pai, Dom Jo�o VI, de Lisboa, com as cortes exigindo seu regresso imediato a Portugal, e do amigo de confian�a Chamberlain.
Padre Belchior registrou: “E eu respondi prontamente. Se Vossa Alteza n�o se faz rei do Brasil, ser� prisioneiro das cortes e talvez deserdado por elas. N�o h� outro caminho sen�o a independ�ncia e a separa��o”. Dom Pedro I arrematou: “Eles querem e ter�o sua conta. As cortes me perseguem, chamam-me com desprezo de ‘rapazinho brasileiro’. De hoje em diante, est�o quebradas as nossas rela��es. Nada mais quero do governo portugu�s, e proclamo, para sempre, o Brasil separado de Portugal”.
A DAMA DO SERT�O
Ainda no Instituto Hist�rico de Pitangui, h� um quadro ilustrativo sobre a participa��o de Joaquina de Pomp�u na Independ�ncia do Brasil, com enfoque nas grandes doa��es de gado para abastecimento das tropas no per�odo que antecedeu o Grito do Ipiranga. “A comarca de Pitangui era muito vasta, por isso temos documentos de v�rios munic�pios, incluindo Pomp�u”, afirma o presidente do IHP, Vandeir Alves dos Santos.
Na verdade, a hist�ria da Dama do Sert�o, como era chamada a fazendeira, confunde-se com a da Regi�o Centro-Oeste de Minas. “A trajet�ria dela � pouco divulgada no pa�s, mas aqui na nossa cidade o Centro Cultural se chama Joaquina do Pomp�u. A cada 20 de agosto, entregamos uma medalha tamb�m com seu nome”, ressalta o presidente do Instituto Hist�rico e Geogr�fico de Pomp�u, Hugo de Castro Machado, tamb�m curador do Museu Geneal�gico e Hist�rico da cidade, que programa um desfile c�vico para festejar o bicenten�rio da Independ�ncia.
Pesquisador contumaz, Hugo de Castro conta que, em 9 de abril de 1822, a fazendeira se encontrou com Dom Pedro I, em Ouro Preto – a viagem do pr�ncipe regente � vista como o primeiro “brado retumbante” da emancipa��o, por ele anunciar ao povo “que os la�os do despotismo n�o prevaleceriam sobre os anseios de liberdade e independ�ncia”. Conforme relatos da �poca, Dona Joaquina chegou � ent�o Vila Rica com grande comitiva, em mais de 10 mulas. De t�o patri�tica, usava roupas com fitas nas cores verde e amarelo, conforme registrou o escritor Agripa Vasconcellos (1896-1969).
“O papel dela foi preponderante nas batalhas que sucederam ao 7 de Setembro, especialmente em 1823, quando da expuls�o do general portugu�s In�cio Lu�s Madeira de Melo do Rec�ncavo Baiano. Naquele per�odo, Pitangui n�o uniu for�as e Dona Joaquina tomou a frente como guardi� e protetora da regi�o, enviando dinheiro, gado e mantimentos para ajudar na luta contra o �ltimo reduto oponente � Independ�ncia”, relata Hugo de Castro.
Nascida em Mariana, na Regi�o Central de Minas, a Dama do Sert�o era filha do portugu�s Jorge de Abreu Castello Branco, que, depois de ficar vi�vo, ordenou-se padre. Ela se casou aos 12 anos com o capit�o In�cio de Oliveira Campos e foi morar na Fazenda de Nossa Senhora da Concei��o. “O casal teve 10 filhos, que geraram 87 netos, 333 bisnetos e 1.108 trinetos. O n�mero de descendentes chega a 80 mil, com pessoas espalhadas pelo Brasil e documentadas em livro”, diz o presidente do Instituto Hist�rico e Geogr�fico de Pomp�u. “Ela colocou os bens da fam�lia e seus descendentes pela causa da separa��o do Brasil de Portugal.”
Independ�ncia e vidas
Tr�s mineiros fundamentais para escrever a hist�ria que completa 200 anos

O conselheiro
Padre Belchior (1775-1856) - Natural de Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, estudou em Coimbra, Portugal, e viveu 42 anos em Pitangui, na Regi�o Centro-Oeste de Minas, onde foi p�roco. Amigo e confessor de Dom Pedro I, estava com ele durante o Grito do Ipiranga. Est� sepultado em Pitangui, cidade que preserva a mem�ria do ilustre mineiro e mant�m restaurado o casar�o onde ele morou, hoje sede de prefeitura.

A patriota
Dona Joaquina de Pomp�u (1752-1824) - Natural de Mariana, a fazendeira da Regi�o Centro-Oeste se empenhou nas lutas pela Independ�ncia com vultosas doa��es. Encontrou-se com Dom Pedro I em Ouro Preto, em abril de 1822, durante a hist�rica visita do pr�ncipe regente, tida como pren�ncio da Independ�ncia. Est� sepultada em Pomp�u. N�o se sabe a fisionomia da fazendeira, que s� “ganhou” um rosto em 1956, no desenho do artista pl�stico, escultor e designer gr�fico mineiro Amilcar de Castro (1920-2002).

O patriarca
Jos� Teixeira da Fonseca Vasconcelos, o Visconde de Caet� (1766-1838) - Considerado o patriarca mineiro da Independ�ncia, nasceu em Esmeraldas. Estudou matem�tica, direito e filosofia em Coimbra. J� como vice-presidente da Junta Governativa de Minas, fez caloroso discurso diante de Dom Pedro I. Foi o primeiro presidente da Prov�ncia de Minas e est� sepultado na Matriz do Sant�ssimo Sacramento, em Taquara�u de Minas, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte. Infelizmente, n�o h� placa indicativa no interior do templo, apenas algarismos romanos gravados no assoalho.