Alargar a tenda

Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte

Presidente da Confer�ncia Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)

“Alargar a tenda” � um precioso conselho do profeta Isa�as, para arquitetar a esperan�a na vida de um povo que se encontra necessitado de clarear seus rumos e superar descompassos. A imagem po�tica constru�da pelo profeta abre caminhos para um entendimento que coloca a fraternidade como meta principal. A fraternidade precisa ser cultivada como amizade social. O conselho do profeta �, pois, essencial para a constru��o de um novo tempo, superando a esterilidade que contamina o povo. Comprometida a fraternidade, tudo mais entrar� em processo de colapso. A chamada do profeta � inspiradora e indica uma sa�da iluminada pela luz da esperan�a: “Alarga o espa�o da tua tenda, estende as peles de tua barraca – nada poupes – estica as cordas, finca bem as estacas”. A indica��o � a de buscar condi��es para cultivar mais proximidade, reunir mais gente, vencendo o veneno da discrimina��o e da exclus�o social.  Um convite prof�tico que ressoa forte neste tempo do Advento, que pede ao cora��o humano para ser “tenda bem alargada”, forrada pela for�a da fraternidade universal, morada de Deus.

A “tenda” do pr�prio cora��o, de estacas bem fincadas e de cordas bem esticadas, deve ter em seu centro o pres�pio – todos fixem o olhar no Menino Salvador, aconchegado no colo da M�e Maria e protegido pelo zelo do pai Jos�. As li��es aprendidas com a simplicidade do pres�pio guardam o “ouro” para a nova humanidade, capacitando-a para viver a fraternidade, princ�pio essencial de uma sociedade congregada como povo – especialmente como povo de Deus. Na verdade, o convite-convoca��o vindo do profeta � caminho �nico para iluminar um mundo de sombras e romper com as portas fechadas de uma humanidade que padece com a sua pr�pria mesquinhez e indiferen�a. Uma civiliza��o que prioriza somente o bem de alguns, isolada em um tipo de poderio que inevitavelmente leva ao fracasso e � desola��o. Assim, os crist�os s�o interpelados a oferecer uma contribui��o inovadora para transformar a realidade, buscando efetivar um estilo de viver com o sabor do Evangelho de Jesus, o Menino Deus.

Deve-se reconhecer o valor da simplicidade e cultivar a alegria para dissipar todo o �dio do cora��o – livr�-lo das disputas, polariza��es e inimizades que est�o enchendo de escurid�o os dias da sociedade, com perdas irrepar�veis. Vidas j� foram perdidas para o �dio nascido de diverg�ncias pol�ticas. Um sentimento que deturpa a vis�o, contaminando atitudes, com preju�zos para todos, especialmente para aqueles que s�o mais pobres e indefesos. Por isso mesmo, � preciso, no horizonte luminoso deste tempo do Advento, prepara��o para o Natal do Senhor da vida, cuidar do pr�prio cora��o, fazendo dele uma “tenda alargada”, promover o di�logo, com a preciosidade da sabedoria que reconhece a riqueza nas diferen�as.

Urgente � “alargar a tenda” do pr�prio cora��o e romper, decisivamente, com as din�micas do �dio. Assim, contribuir para iluminar a escurid�o de um mundo fechado. Cuidar muito para n�o alimentar sentimentos que justificam a imposi��o de doutrinas, ao inv�s de se priorizar a comunica��o do amor de Deus. Considerada a “tenda” do cora��o, operar uma varredura para expulsar ressentimentos e tudo aquilo que alimenta o vazio existencial. O profeta Isa�as, proclamado especialmente neste tempo, apresenta o desafio de ser erguida uma tenda sem fronteiras, capaz de superar dist�ncias. Uma tenda que remete � capacidade de contemplar o mundo com o olhar compassivo de Deus. Isto significa distanciar-se de perspectivas pouco nobres, que alimentam disputas, enjaulam pessoas no ego�smo e no ressentimento, na �nsia de querer impor a pr�pria l�gica nos debates sobre a vida social, pol�tica e, particularmente, na sele��o do que habita a tenda do pr�prio cora��o. � preciso deixar-se iluminar pela presen�a do sol nascente, Cristo Jesus Salvador. Assim, “alargar a tenda” do cora��o para acolher a sabedoria que faz desaparecer sentimentos que adoecem, vis�es da realidade que levam somente � lamenta��o. Seja dado mais espa�o � a��o do amor, a partir do exerc�cio da reconcilia��o e do perd�o.

� hora de superar a “cara feia”, tornar-se capaz de sair da bolha onde habitam somente aqueles com as mesmas perspectivas, reunidos para calcular engenharias de destrui��o de quem pensa diferente. Em Cristo, o Menino Deus, est� a possibilidade �nica de contemplar a sabedoria divina, com for�a para modificar cora��es, alargando-os, com incid�ncias na sociedade e no exerc�cio das pr�prias responsabilidades. Todos possam reconhecer que cuidar do mundo � zelar pelo bem de cada ser humano, indistintamente. Uma atitude sapiencial, que cura as feridas da alma, enquanto se encanta cora��es pela for�a inigual�vel da fraternidade. Cora��es fraternos, sem preconceitos, livres de ressentimentos s�o essenciais para inaugurar um novo tempo para a sociedade. Os votos natalinos, seus festejos, signifiquem, como aug�rio e preces, o convite – e a sua aceita��o – para se alargar o pr�prio cora��o, fazendo-o “tenda da fraternidade”.