Modernismo contempor�neo

H� 99 anos, em 13 de fevereiro, come�ava a Semana de Arte Moderna, que se tornaria um divisor de �guas na arte brasileira. Apesar do nome semana, foram apenas tr�s dias de eventos, o que mostrava que n�o se queria seguir regras. Agora, um ano antes do centen�rio do movimento revolucion�rio de 1922, 14 artistas-poetas (10 brasileiros e quatro portugueses) lan�am amanh�, com publica��o em redes sociais, revistas e sites, a e-plaquete 2022, segunda denti��o, com trabalhos po�ticos e conceituais de v�rias vertentes, numa homenagem contempor�nea e subversiva � moderna semana de tr�s dias.

Editada pelos mineiros Carlos Barroso e Jairo Far� – autor do projeto visual da e-plaquete – participam da 2022 os poetas Ana Caetano, Ana Hatherly, Carlos Barroso, Fernando Aguiar, Guilherme Mansur, Jairo Far�, Jo�o Diniz, Jo�o Evangelista, Jorge Vicente, Lu�s Turiba, No�lia Ribeiro, Nuno Rau, Silvana Guimar�es e Tchello d’Barros

“A e-plaquete 2022, desde o seu primeiro n�mero, n�o buscou meramente a efem�ride, a simples homenagem ao evento que demarcou o Modernismo no Brasil, e sim a discuss�o po�tica e art�stica por meio da poesia, em formas variadas e acep��es, do tempo em que vivemos – marcado por v�rus, n�o s� sanit�rios e pand�micos, mas tamb�m pol�ticos e sociais. �poca em que a arte, a literatura, a poesia, mesmo sendo colocadas contra a parede, at� vilipendiadas, buscam a criatividade, a irrever�ncia e a criticidade entre outros movimentos demarcados pela est�tica, como poss�veis sa�das ou desafogo”, explica Carlos Barroso. 

Al�m da coincid�ncia programada (13 de fevereiro), “a publica��o tem como proposta se apropriar do esp�rito contestador do Modernismo e de sua principal vertente art�stica, o Movimento Antropof�gico”, lembra Jairo Far�. Relembrar grandes nomes da 1922, como Villa Lobos, Manuel Bandeira, Di Cavalcanti, Anita Malfatti, Vitor Brecheret, Oswald de Andrade e M�rio de Andrade. Agora, homenageados por nomes de 2022, j� em 2021.

Toda obra de arte desenvolve uma lei, mas n�o come�a com uma, n�o come�a conceitualizando-a. Assim podemos pensar essas datas: 1922, 2021, 2022, sequ�ncias fragmentadas da mat�ria textual, um percurso n�o linear e intermitente. O pensamento pl�stico que orienta as composi��es/poemas da Plaquete 2022, segunda denti��o, organizada por Carlos Barroso e Jairo Far�, em aproxima��es temporais el�sticas e antecipat�rias, palavras e linhas s�o (re)organizadas numa arquitetura de concis�o, que valoriza tempo e espa�o em branco da p�gina – heran�a de Mallarm� – e o registro visual do texto como mancha, incis�o, grafia, ru�do. E assim podemos vislumbrar a dimens�o pl�stica da escrita, do pensamento, do d�j�-vu visto de novo, com formas novas.

Percebemos a materialidade das palavras e gestos em paisagem, uma forma c�nica do texto, segundo os poetas que fazem parte desta denti��o, dentes de leite com 100 anos de idade e 100 flores em poemobjetos. A colet�nea, encabe�ada por Ana Caetano, poeta inconteste, permeada por Marcelo Dolabela, uma flor exalada nos textos, desenha uma tend�ncia liter�ria em que h� procedimentos formais compartilhados pelos po- etas, ainda que com diferen�as de dic��o e de mitologia pessoal, trazem o uso constante da elipse, a ruptura sint�tica, o desenvolvimento n�o linear da composi��o, a fragmenta��o do discurso em uma sintaxe do descont�nuo, do simult�neo, do inacabado que engendra tempos e espa�os numa linha que nunca termina.

A maquinaria inventiva, surpresas de imagem, sonora ou sint�tica, novas linhas prosaicas, disson�ncias, tens�es sociais e individuais, em rel�mpagos, em vertigens de den�ncias, sociais ou existenciais, a aproxima��o inusitada de refer�ncias, que podem pertencer a realidades diferentes, como em Lautr�amont em Os cantos do Maldoror, que imagina “o encontro fortuito de um guarda-chuva e uma m�quina de costura sobre uma mesa de disseca��o”, formula��o que descende das met�foras de agudeza da po�tica barroca.

Retratos de artistas quando jovens, quando velhos ou envelhecidos, a poesia modernista de 1922, M�rios e Oswalds, os mais inventivos entre tend�ncias est�ticas – minimalismo, neobarroco, poesia visual, etnopoesia, surrealismo, dolabelismo, entre outras. Nesta Plaquete 2022, segunda denti��o percebemos a poesia que vive em conflito com o tempo e o pensamento, manifestada pela tens�o na linguagem, projetos coletivos e individuais que afirmam uma identidade h�brida como artefato est�tico em m�ltiplas dimens�es sonoras, imag�ticas, verbais, visuais, em muros e extramuros, em poemobjetos em formas c�nicas do texto, em fragmentos que se comp�em em paisagem, um estranho extramuro.

Como continuar sendo vanguardista e moderno numa era na qual as vanguardas viraram per�odo hist�rico e a modernidade virou p�s-modernidade, alter modernidade, modernidade l�quida e contemporaneidade? Existiram os pioneiros vanguardistas avant la lettre, mas continuar sendo um vanguardistas apr�s la lettre, em meio a uma modernidade j� fechada, n�o seria, paradoxalmente, uma forma de conservadorismo d�mod� e ultrapassado? Hal Foster (Funeral para um cad�ver errado) Boris Groys (Sobre o novo), Antoine Compagnon (Cinco paradoxos da modernidade), Peter Burger (Teoria da vanguarda) e muitos outros se depararam, a partir de diversos pontos de vista, sobre esse grande enigma colocado pela esfinge da hist�ria ou, melhor, pelo anjo da hist�ria, para lembrar a Benjamin, um dos ins�gnes her�is/m�rtires dessa rica e fundacional heran�a moderna.

Edi��o: Carlos Barroso e Jair� Far�

Trabalhos: Ana Caetano, Ana Hatherly, Carlos Barroso, Fernando Aguiar, Guilherme Mansur, Jairo Far�, Jo�o Diniz, Jo�o Evangelista, Jorge Vicente, Lu�s Turiba, No�lia Ribeiro, Nuno Rau, Silvana Guimar�es e Tchello d’Barros

Como acessar: https://issuu.com/jairo.faria/docs/plaquete_2020_segunda_denti__o_final