
Patr�cia Galvao. No dossi� que consta ao final de “Pagu no metr�”, na reprodu��o da p�gina de um arquivo, chama a aten��o a aus�ncia do acento. O sobrenome grafado sem o til fornece uma pista preciosa para pensar o processo compositivo do quinto romance de Adriana Armony. Ausente dos documentos oficiais franceses, este acento t�o brasileiro, �ndice de nosso falar anasalado, marca a proposta da narrativa: compreender o ano de Pagu passado em Paris, em que Galv�o vira Galvao. N�o se trata de qualquer Pagu, e sim aquela que entre 1934 e 1935 viveu na Fran�a. Armony pesquisa, anota e escreve ao longo do relato na busca de tra�os da artista e militante comunista. O ano vivido por Pagu, o ano narrado por Adriana Armony. Sem acento. E em primeira pessoa.
Desde os diversos pseud�nimos usados (Patsy, Mara Lobo, Solange Sohl) Pagu j� � muitas, ao que se soma aquela projetada por outros – a de Geraldo Ferraz, a de Raul Bopp, a da m�sica de Rita Lee, a do filme de Norma Bengell. Em “Pagu no metr�”, a escritora carioca retoma o fio tecido desde “A fome de Nelson” (2005), em que narra um per�odo da vida do autor de “Vestido de noiva” investigando as possibilidades liter�rias advindas da “trapa�a biogr�fica”, express�o presente no romance. Enquanto l� Nelson Rodrigues se torna personagem, aqui temos uma Pagu plasmada na dobradi�a entre fic��o e realidade. “Quem poder� dizer que o meu � menos ou mais verdadeiro que outros que todos os dias nascem e morrem, nas p�ginas dos livros e nas camas dos hospitais”, indaga o narrador de seu primeiro livro, sinalizando que a no��o de verdade absoluta n�o � objetivo a ser alcan�ado. Importa explorar ficcionalmente aspectos biogr�ficos do personagem escolhido, e nesse sentido a fascinante Pagu � uma aposta e tanto.
Jornalista e escritora, ela foi � R�ssia, China e Jap�o, militou em Paris, foi presa diversas vezes, tentou alfabetizar outras mulheres no pres�dio, passou por in�meras dificuldades financeiras. Politizada em um ambiente machista, se viu diante de uma s�rie de adversidades, como no epis�dio em que foi considerada agitadora individual e inexperiente pelo Partido Comunista. Abortos e tentativas de suic�dio fizeram parte dessa vida intensa e atribulada, que inclui a rela��o com Oswald de Andrade, pai de um de seus dois filhos.
O romance � narrado pela personagem Adriana Armony, outra dobra da escrita a revelar a fronteira t�nue entre fabula��o e biografia. N�o � toa, quando visita a Catedral de Rouen, pintada por Monet nos famosos quadros em diversas horas do dia, a narradora explicita o desejo de tamb�m trabalhar com luz e sombra, ciente da impossibilidade de revelar vis�o �nica de seu personagem: “Gostaria de pintar Pagu assim, n�o apenas com minhas palavras de escritora, mas tamb�m com as hist�rias, as decep��es e esperan�as que a atravessam, como uma leitora”.
Conectar experi�ncias
Na perspectiva de algu�m que l� distintas paisagens, surgem Paris e Rio de Janeiro justapostas, metr�poles que engolem e devolvem milhares de pessoas diariamente de dentro de suas entranhas. No per�odo de perman�ncia da narradora na capital francesa para pesquisar registros e documentos, a greve geral de 2019 se insinua a todo momento, e os protestos da popula��o no presente ecoam muitos dos valores defendidos pela artista modernista: justi�a social e luta pelo pelos direitos dos trabalhadores s�o o grito de uma Paris que ferve e se mobiliza. Ent�o Armony pode conectar experi�ncias, enxergando na inaugura��o do jardim em homenagem a Marielle Franco ecos da mulher libert�ria cuja vida biografa.
Por vezes, a narrativa transita pela via do suspense, ao indagar o que de fato teria acontecido naquele per�odo com a personagem, multiplicando perguntas sobre sua trajet�ria – a d�vida se instala e muitas indaga��es permanecer�o sem resposta. Mas outras descobertas revelam pequenas joias sobre a temporada francesa: al�m de se envolver no corpo a corpo da vida p�blica, Pagu escrevera o romance “�gua”, nunca publicado e enterrado em um terreno em S�o Paulo para evitar a apreens�o da pol�cia. Arte e pol�tica caminham de m�os dadas, e neste momento em que se busca ressignificar os anos modernistas parece ainda mais necess�rio olhar para aquela que acreditou ferozmente no entrela�amento de tais esferas.
O desenlace apresenta uma bela cena autobiogr�fica, em que a narradora vai revelando as pr�prias motiva��es. Essa figura enigm�tica, espectro de uma mulher fragilizada fisicamente pelas tantas dores que atravessaram seu corpo, agora se materializa diante da pesquisadora, transformada pelo gesto da escrita. Dentro da esta��o, em um clima on�rico se d� o encontro das duas. A passagem reverbera “Zazie no metr�” (1959), de Raymond Queneau, mas, ao contr�rio do livro do escritor franc�s, em que a protagonista n�o consegue se deslocar em fun��o de uma greve, Armony ganha Paris pelos caminhos subterr�neos, motivada pelo projeto Pagu. No entanto, ela sempre escapa.
Tempos e espa�os se entrecruzam, e j� n�o importam malogros, arquivos n�o encontrados, listas incompletas. Zazie, Patr�cia, Solange Sohl, Adriana, todas concorrem para formar uma narrativa poss�vel, impulsionada pela procura que n�o se d� apenas entre t�neis e pastas de documentos, mas no embaralhar entre vida e obra. Estar viva � permitir o salto em dire��o ao agora, em que Pagu ainda brilha com for�a descomunal, longe das fichas amareladas. Zazie, menina curiosa que queria conhecer Paris, se desdobra na irreverente Pagu, que por sua vez se v� espelhada em Adriana. Depois da travessia labir�ntica empreendida por elas, Paris n�o ser� a mesma.

TRECHO
(De “Pagu no metr�”, de Adriana Armony)
“Em Paris, aprendo a usar e a amar os dossi�s. Percorro as p�ginas com infinito cuidado, admiro as classifica��es, sua inconst�ncia. Compro pastas, enfileiro pap�is com carimbos como uma colegial esfor�ada. Descobrirei em breve que esta � apenas a pele que recobre os documentos, como o perfume recobre um corpo.
(Existe um verdadeiro livro? Um livro melhor?)”
“Pagu no metr�”
• De Adriana Armony
• Editora N�s
• 144 p�ginas
• R$ 68
A urg�ncia da revolta em “Parque industrial”
Publicado em 1933 com o pseud�nimo de Mara Lobo, “Parque industrial” foi escrito quando Pagu tinha 21 anos. Estruturado em dezesseis cap�tulos curtos, com t�tulos diretos como “Um burgu�s oscila” e “Trabalhadoras de agulha”, o romance se passa no bairro paulistano do Br�s e p�e em cena personagens das classes oper�rias. Engajada no Partido Comunista desde 1930, a autora tem pretens�o did�tica ao nomear a necessidade imperativa da transforma��o da sociedade e de uma a��o pol�tica dos explorados. Pagu cr� fortemente na mobiliza��o: “a satisfa��o intelectual n�o me bastava... As teses isoladas irritavam-me. Era necess�rio concretizar [...]. Tenho muita for�a. Onde irei empregar esta for�a? � preciso dar esta for�a”, afirma em “Autobiografia precoce”, esp�cie de carta escrita em 1940 ao segundo marido, Geraldo Ferraz.
No romance tamb�m surgem in�meras refer�ncias biogr�ficas, como a Escola Normal e o bairro em que viveu, al�m dos sal�es burgueses de uma certa intelectualidade paulistana. Pagu transita por todas essas esferas e com grande perspic�cia estrutura uma narrativa que continua suscitando interesse: “Parque industrial” se sustenta pela qualidade liter�ria, com o predom�nio de uma linguagem telegr�fica, de frases curtas compostas de flashes e cortes cinematogr�ficos: “O bonde se abarrota. De empregadinhas dos magazines. Telefonistas. Caixeirinhos. Toda a popula��o de mais explorados, de menos explorados. Para os seus corti�os na imensa cidade prolet�ria, o Br�s”.
Surge no relato a dimens�o coletiva do proletariado, observada pelo olhar atento � dimens�o feminina, de m�es oper�rias que n�o tem o direto de estar com os filhos, sem nenhuma folga e trabalho dominical, de criadas humilhadas conspirando nas cozinhas, mas tamb�m de intelectuais e feministas da elite de S�o Paulo. Comparecem personagens como a costureira negra Corina, gr�vida do amante e abandonada pelo homem que a seduziu. Despedida, termina em um bordel barato junto a tantas outras mulheres em situa��o vulner�vel como a dela. Integram esse painel a normalista Eleonora e a oper�ria Ot�via, al�m da imigrante Rosinha Lituana, trabalhadora da f�brica de tecidos desde os doze anos. Em contraponto, Alfredo Rocha, burgu�s fanfarr�o que l� Marx de pijama de seda em seu apartamento no hotel Esplanada, poss�vel alus�o a Oswald de Andrade, financiador da primeira edi��o do livro.
No romance, a autora satiriza a hipocrisia de uma sociedade que sustenta muitas rela��es de fachada, disparando frases cruas como “A burguesia tem sempre filhos leg�timos. Mesmo que as esposas virtuosas sejam ad�lteras comuns”. Amor, sexo e dinheiro surgem entrela�ados, � semelhan�a de “Amar: verbo intransitivo” (1927), de M�rio de Andrade, romance protagonizado pelo pai de fam�lia que contrata os servi�os de uma preceptora alem� para iniciar sexualmente o filho Carlos – um “burgu�s chat�ssimo”, segundo o pr�prio autor.
� �poca, Pagu tinha d�vidas sobre a qualidade do livro, mas a leitura hoje revela que n�o estamos diante de um panfleto, pois a autora foi al�m da propaganda pol�tica t�o cara aos seus ideais. � not�vel sua capacidade de perceber detalhes reveladores: muitos dos personagens se notabilizam pelas bocas maltratadas, com dentes cariados, uma gente que come “na pausa para o almo�o p�o com carne e banana ou um ovo duro”. A precariedade da vida prolet�ria surge com for�a nesse �ndice de pertencimento social e se op�e ao sorriso dos que ostentam bocas perfeitas. Vale lembrar que o protagonista de “O cobrador”, de Rubem Fonseca, quase cinquenta anos depois, inicia o c�lebre conto em um consult�rio de dentista, na tens�o de uma cena entre o profissional e o protagonista sem dinheiro para tratar o dente que d�i. O abismo entre as classes sociais deflagra violenta cobran�a de quem decide cessar a corrente de explora��o.
“Parque industrial” revela uma Pagu revoltada pela injusti�a e fala de um cen�rio generalizado no mundo capitalista, em que o suor dos oper�rios “se transforma no champanhe jogado fora por seus patr�es”. Patr�cia Galv�o soube transformar em palavra a urg�ncia da revolta, construindo um romance que n�o envelheceu – a precariza��o do trabalho, a fome das bocas banguelas e a desigualdade social gritam no Brasil de agora. Menos musa a inspirar docemente os poetas, mais uma voz potente a retratar as dores de nosso tempo.

TRECHO
(De “Parque industrial”, de Patr�cia Galv�o)
Os dentes orgulhosos de outros tempos sorriem falhos e amarelos num carinho. A menina foge. Mergulha as m�os na tina de espuma. A mulata friorenta ajeita o casaco levantando a gola alta at� o nariz. Observa parada as lavadeiras de c�coras e ajoelhadas, trabalhando. Nunca mais trabalhara. Quando tem fome abre as pernas para os machos. Sa�ra da cadeia. Quisera fazer nova vida. Procurara um emprego de criada no Di�rio Popular. Est� pronta a fazer qualquer servi�o por qualquer pre�o. Fora sempre repelida. Entregara-se de novo � prostitui��o.
“Parque industrial”
• De Patr�cia Galv�o
• Companhia das Letras
• 112 p�ginas.
• R$ 49,90
ENTREVISTA/Adriana Armony
“� quase tudo verdade em ‘Pagu no metr�’”
Qual foi o impulso inicial para “Pagu no metr�”? O que a moveu a escrever o livro?
H� muito tempo eu achava Pagu uma figura fascinante. Em torno dela desenvolveu-se todo um imagin�rio. Ela encarna o mito da mulher pol�mica, irreverente, engajada e emancipada, mas � muito mais complexa do que se costuma imaginar. Meu primeiro arrebatamento se deu com a leitura da extensa carta que Patr�cia escreveu na pris�o a Geraldo Ferraz, e que mais tarde viria a ser publicada com o t�tulo “Autobiografia precoce”. Ali se revela uma mulher inteligente, sens�vel, cr�tica, cheia de contradi��es at� hoje presentes na condi��o feminina, assim como na milit�ncia pol�tica. �cone da hist�ria cultural e liter�ria brasileira, feminista avant la lettre, mulher, m�e e profissional, a trajet�ria de Pagu reflete n�o apenas desejos e contradi��es de uma �poca, mas de toda uma luta. Porque se nenhuma vida pertence inteiramente a si mesma, existem aquelas que se tornam um emblema. A carta confiss�o de Patr�cia abriu para mim um mundo de possibilidades, de leituras e releituras. Pude perceber a for�a do seu livro “Parque industrial”, qualificado como primeiro romance prolet�rio brasileiro, mas que, pelo protagonismo e for�a das personagens femininas, poder�amos ler tamb�m como um romance feminista. Li com admira��o seus poemas, escritos sob pseud�nimos como Solange Sohl, e percorri suas in�meras cr�nicas e ensaios, que revelam uma intelectual atuante e madura. Sua pr�pria hist�ria pode ser lida e reescrita de m�ltiplas formas. Muito mais do que um mito, Patr�cia era uma escritora, uma intelectual e uma militante pela arte. Foi depois da leitura da carta confiss�o que decidi me aprofundar na vida e na obra de Pagu. E notei uma lacuna: quase n�o se encontram textos da autora entre os anos de 1933, data de publica��o de “Parque industrial”, e 1942, quando publicou cr�nicas no jornal “A Noite” sob o pseud�nimo de Ariel. Sabe-se, por�m, que, entre 1934 e 1935, morou em Paris, onde militou no Partido Comunista Franc�s sob o pseud�nimo de L�onie, frequentou os meios surrealistas e foi redatora da revista L’ Avant-Garde. Mas tamb�m os dados biogr�ficos desse per�odo eram escassos. Havia ainda um fato intrigante: a longa carta confiss�o dirigida a Geraldo Ferraz se interrompia imediatamente antes da sua chegada em Paris, sem uma conclus�o, sem uma despedida. Por qu�? Assim, em fevereiro de 2019, pedi uma licen�a de um ano do Col�gio Pedro II, onde trabalho, e viajei a Paris para pesquisar, para um p�s-doutorado, este per�odo praticamente intocado: a temporada de Pagu em Paris, entre os anos de 1934 e 1935. Das descobertas da pesquisa, reflex�es sobre Pagu e andan�as por Paris nasceu esse romance h�brido, narrativa-pesquisa-ensaio-del�rio, que � “Pagu no metr�”.
O que foi mais importante para o seu trabalho? A pesquisa ou a inven��o?
Ambos est�o indissoluvelmente ligados: sem um n�o haveria outro. Sendo romancista, tenho uma inclina��o especial pela fabula��o liter�ria. E, como no caso da autora e a personagem, a fabula��o cont�m a pesquisa. Mas, para ser bem exata, em “Pagu no metr�” a inven��o est� mais no campo do trabalho liter�rio do que nos fatos e no enredo. Em “Pagu no metr�” � (quase) tudo verdade, dos acontecimentos aos pensamentos e del�rios. Foi um livro escrito praticamente em tempo real, com apenas pequenas altera��es nos nomes ou caracter�sticas dos personagens.
Hoje se nota uma forte presen�a da autoria feminina na literatura, bastante diferente do momento em que Pagu atuou. A massa ainda h� de comer o biscoito fino fabricado por Pagu?
Curioso que essa frase de Oswald de Andrade apare�a em 1935, em uma carta do escritor publicada no primeiro n�mero da revista modernista Ritmo, portanto, depois da convers�o pol�tica do escritor por Pagu e da viagem dela a Paris. A frase s� poderia ser dita por algu�m que tem a ambi��o de atingir um p�blico mais amplo e popular, embora sem abrir m�o do que entende por qualidade e refinamento da literatura. � uma frase pol�mica. Enquanto Silviano Santiago v� nela uma postura elitista dos modernistas quanto � forma de conceber a educa��o do povo brasileiro, ao postularem que a “massa” incorporasse um conhecimento que lhe seria alheio e inoculado de cima para baixo, Jos� Miguel Wisnik, simp�tico � frase, destaca o trocadilho entre “massa” e “biscoito”, que indicaria a intera��o entre ambos, na linha antropof�gica. Tamb�m vejo desta forma. Quanto � massa, comer o biscoito fino fabricado por Pagu e outras mulheres, certamente j� est� comendo! Obst�culos que antes eram naturalizados ou pareciam intranspon�veis, como a desvaloriza��o da literatura escrita por mulheres, a imposi��o de limita��es tem�ticas, a premia��o quase inexistente e a exclus�o de escritoras do c�none t�m se reduzido significativamente. Acredito que Pagu, como tantas outras escritoras redescobertas, faz parte dessa f�brica coletiva. H� ainda, � claro, o problema das circunst�ncias que afetam o livro e a todos os escritores no Brasil: os problemas de distribui��o em um pa�s de dimens�es continentais e com uma prec�ria rede de livrarias; a m� qualidade e a pequena quantidade de bibliotecas p�blicas; o pre�o dos livros; a educa��o prec�ria que pouco forma leitores; as leituras de mundo padronizadas por algoritmos; enfim, a aus�ncia de pol�ticas p�blicas voltadas � leitura. Tor�amos para que essas pol�ticas sejam recriadas e expandidas em breve e possam proliferar biscoitos de todos os tipos.
Qual Pagu mais importa, a autora ou a personagem?
A personagem, porque cont�m tamb�m a autora! A personagem de “Pagu no metr�” foi imaginada a partir de leituras de textos da autora, da pesquisa que realizei e da proje��o de experi�ncias, minhas e de outras mulheres. A personagem engloba tanto autora e quanto a pessoa Pagu; abrange a cole��o de heter�nimos de Patr�cia, a que veio se somar, com emo��o, a autora e personagem Adriana.
Pagu era considerada por muitos uma mulher � frente do seu tempo. Esse tempo chegou?
Pagu n�o era apenas � frente do seu tempo: era tamb�m fora do tempo. Avessa � hipocrisia, corajosa e aut�ntica num momento hist�rico em que as mulheres praticamente n�o tinham voz, o que mais desejava era se entregar a um ideal, mesmo que tivesse de sofrer consequ�ncias terr�veis. Nesse sentido, para essa “militante do ideal”, como a definiu uma vez o companheiro Geraldo Ferraz, esse tempo nunca poder� chegar integralmente. Por outro lado, esse desejo de liberdade, essa luta pela pr�pria voz, n�o s� da parte de Pagu mas de tantas outras mulheres, impulsionou mudan�as sociais e culturais important�ssimas, conquistas do feminismo, apesar de toda a resist�ncia e viol�ncia do patriarcado que subsiste. Ent�o, a resposta �: esse tempo est�, sim, mais pr�ximo; e n�o.
* Stefania Chiarelli � professora e pesquisadora de literatura brasileira na Universidade Federal Fluminense (UFF)
* Stefania Chiarelli � professora e pesquisadora de literatura brasileira na Universidade Federal Fluminense (UFF)