Angel�ndia e Setubinha - Rafael, Samuel, Luciene, Lucimar, Luiz, Ana Luiza e Maria Luiza s�o todos filhos de Ant�nia Luiza Neta, de 35 anos. Os sete tamb�m s�o herdeiros da triste realidade de Setubinha, no Vale do Mucuri, a cidade com o mais baixo �ndice de Desenvolvimento Humano (IDH)de Minas Gerais. Tranformada em munic�pio desde o final de 1995, na �ltima onda de emancipa��es das cidades mineiras, o povoado que era distrito de Malacacheta potencializa um problema comum �s novatas: n�o consegue viabilizar oportunidades para os moradores e se sustenta essencialmente do Fundo de Participa��o dos Munic�pios (FPM).
“Vem um pessoal de Belo Horizonte aqui e faz caridade. Deixam sempre uma cesta b�sica. Eles tamb�m ajudaram a fazer dois c�modos na minha casa”, conta Ant�nia. Os dois primeiros filhos, de 16 e 12 anos, s�o de um casamento j� desfeito. Os outros cinco (9,7,5,2 anos e tr�s meses de idade) s�o filhos do atual marido, Luiz Teixeira Salom�o, de 79 anos. A renda do sal�rio m�nimo da aposentadoria de Luiz � que sustenta os sete filhos. Os outros oito filhos do primeiro casamento de Luiz n�o contam mais com a ajuda do pai, que com problemas de vis�o ficou impedido de fazer as cangaias (artefato usado nos burros para carregar lenha), antes usadas para complementar a renda.
A situa��o da fam�lia de Ant�nia � pior porque Luiz, de 5 anos, teve que fazer uma colostomia. “O que chega do sal�rio do meu marido � R$ 140. Fizemos v�rios empr�stimos para tratar do Luiz e agora � tudo descontado”, lamenta Ant�nia. Mesmo assim ela entende que antes, quando Setubinha era apenas um distrito, a situa��o era pior. “Melhorou porque a cidade tem m�dico. Antes tinha que fazer uma vaquinha para alugar um carro e ir at� Malacacheta”, lembra Ant�nia.
O nome de Setubinha � pomposo. Vem dos colonizadores portugueses, que chamaram um dos rios que cortam a terra que povoaram de Set�bal, homenagem ao distrito portugu�s. A regi�o ficou conhecida como pequena Set�bal e, mineiramente, foi transformada em Setubinha. Por�m, as semelhan�as com a inspiradora europ�ia param a�. Setubinha, no Vale do Mucuri, no limite com o Vale do Jequitinhonha, ostenta o pior �ndice de Desenvolvimento Humano (IDH) entre as 853 cidades mineiras.
O prefeito de Setubinha, Jo�o Barbosa, o Jo�o do T�o (PSDB), recebeu a cidade j� com o fardo do IDH. Mas Jo�o n�o pode colocar a culpa da realidade nos antecessores pol�ticos, pois seu pai, T�o Barbosa, foi o primeiro prefeito da cidade emancipada, ficando no cargo de 1997 at� 2004. O prefeito atual tamb�m n�o pode se gabar de ter experi�ncia para o imenso desafio, pois � o segundo prefeito mais jovem do Brasil, com 26 anos. Quando eleito, tinha 23.
O pai de Jo�o foi tamb�m vereador em Malacacheta, antes da emancipa��o, de 1988 a 1995, e um dos entusiastas para que Setubinha se transformasse em cidade. Os ganhos, segundo o prefeito, foram muitos. “Constru� seis policl�nicas na �rea rural, tenho tr�s equipes do Programa de Sa�de da Fam�lia e tr�s dentistas”, enumera Jo�o, que administra uma cidade com 10,8 mil habitantes, sendo 80% na �rea rural.
Sal�rio de R$ 8 mil
Com um or�amento mensal que varia entre R$ 500 mil e R$ 550 mil, mais de 90% s�o provenientes do FPM. Somente com pagamento dos funcion�rios da prefeitura os gastos chegam a R$ 420 mil. O prefeito tamb�m tem um peda�o farto desse bolo, com o sal�rio de R$ 8 mil. Mas os principais gastos, segundo o prefeito, s�o com a sa�de. “Para conseguir atrair um m�dico para trabalhar aqui preciso pagar um sal�rio de R$ 17 mil”, afirma.
“O principal problema na cidade � moradia, principalmente na �rea rural, e banheiro. Muitas fam�lias n�o o tem dentro de casa”, detalha o prefeito. � o que ocorre na casa de Geraldo Rodrigues Marques, de 51 anos. Morador da Zona Rural, do local conhecido como Promot�rio, Geraldo tem nove filhos, sendo que o mais velho tem 18 anos e o mais novo 6. “Planto mandioca, abacaxi, milho e feij�o. Tiro parte para alimenta��o e vendo o resto”, explica Geraldo, que consegue cerca de R$ 100 por m�s e conta para a sobreviv�ncia com o Bolsa-Fam�lia, que garante mais R$ 268 por m�s.
IDH revela pobreza
Ferramenta usada pelas Na��es Unidas para avaliar o grau de desenvolvimento dos pa�ses, estados e cidades, o �ndice de Desenvolvimento Humano (IDH) ajuda a entender que a emancipa��o nem sempre � sin�nimo de desenvolvimento. Setubinha tem IDH de 0,568, o mais baixo do estado, bem inferior ao cidade que lhe deu origem, Malacacheta (IDH de 0,653). O mesmo acontece com Angel�ndia (IDH de 0.635) e Capelinha (0.673). Quanto mais pr�ximo de 1, maior o grau de desenvolvimento da cidade. O melhor IDH de Minas Gerais � de Po�os de Caldas, na Regi�o Sul: 0,841. O IDH da Noruega, o mais alto do mundo, � 0,943. O do Congo, na �frica, 0, 286.
Fuga de divisas e empregos
Angel�ndia, no Vale do Jequitinhonha, tamb�m foi emancipada na mesma �poca de Setubinha, no final de 1995. Antigo distrito de Capelinha, inicialmente chamada de Vila dos Anjos, a cidade n�o sofre com a mis�ria de Setubinha, mas sofre do mesmo problema: a depend�ncia do FPM. A prefeita Z�lia Cardoso de Souza (PSDB) explica que dos R$ 500 mil de receita por m�s mais de 80% v�em do FPM, sendo que o restante � proveniente do Imposto de Circula��o sobre Mercadoria e Servi�os (ICMS).
“Somos grandes produtores de caf�, mas o caf� n�o � faturado aqui. Vai todo para Capelinha, que fica com o ICMS”, reclama a prefeita, que diz pleitear a instala��o de um posto da Receita Estadual na cidade para evitar a fuga de divisas. Outro problema, t�pico das cidades jovens, � o grande compromisso do or�amento com o pagamento dos funcion�rios p�blicos. “Tenho 49% do dinheiro comprometido com o funcionalismo. Estou pr�xima do limite permitido pela lei, que � de 54%”, lamenta a prefeita.
Para n�o ficar totalmente dependente do FPM, o desejo da prefeita � conseguir atrair uma ind�stria para a cidade, aumentando assim a arrecada��o do ICMS e a disponibilidade de empregos. “S�o pouco mais de 8 mil habitantes aqui. Por�m, muita gente saiu da cidade para trabalhar. � gente que gosta da cidade e que, se tivesse emprego, continuaria aqui”, entende a prefeita. Estimativas da prefeitura calculam que 2 mil pessoas vivem e trabalham em Nova Serrana, no Centro-Oeste do estado, onde a ind�stria de cal�ados � forte em Conchal (SP), nas lavouras, principalmente de cana-de-a��car.
Elis�ngela Fagundes de Oliveira, de 27 anos, � vi�va e tem tr�s filhos. Conseguiu um emprego de bab�, gosta da vida em Angel�ndia e � justamente a pouca oferta de empregos o que a desagrada na cidade. “Tem pouca oportunidade. A maioria trabalha na prefeitura ou em algum com�rcio, mas n�o tem para todo mundo”, entende Elis�ngela. (DC)