Luiz Ribeiro
Enviado especial

Berilo e Itinga – Falta �gua. E, al�m da �gua, faltam a��es efetivas para combater o agravamento da escassez de recursos h�dricos no Vale do Jequitinhonha. Cursos d’�gua da regi�o que j� correram o ano inteiro hoje est�o por um fio. A cada ano, diminui o volume de c�rregos e pequenos rios, sem que nada – ou quase nada – seja investido em a��es que poderiam salv�-los, como a prote��o de nascentes. Promessas de constru��o de barragens, que enfeitam os discursos pol�ticos, viram p�. Para piorar, at� iniciativas levadas adiante terminaram dando errado, provocando desperd�cio de recursos p�blicos. O resultado � um c�rculo vicioso: para matar a sede, centenas de comunidades rurais dependem de caminh�es-pipa das prefeituras, que, combalidas pela falta de recursos, permanecem � merc� da ajuda dos governos estadual e federal, muitas vezes transformada em isca para angariar votos.
A pen�ria vivida pela popula��o, submetida a uma crise h�drica eterna em meio � pobreza extrema, foi constatada pela equipe do Estado de Minas ao longo dos 1.500 quil�metros percorridos na regi�o nesta s�rie sobre o Vale do Jequitinhonha. Em todo o percurso, a reportagem encontrou somente uma barragem de maior express�o conclu�da nos �ltimos cinco anos e funcionando a contento, a do Rio Set�bal, no munic�pio de Jenipapo de Minas, inaugurada em fevereiro de 2010 pelo ent�o presidente Luiz In�cio da Lula da Silva (PT), em solenidade que contou com a presen�a de sua afilhada pol�tica Dilma Rousseff – � �poca ministra da Casa Civil –, que disputaria as elei��es presidenciais naquele ano. Antes dela, a a��o mais importante foi a constru��o da barragem da Usina de Irap�, pela Companhia Energ�tica de Minas Gerais (Cemig). Inaugurada em 2006, ela tem ajudado a controlar o volume do combalido Rio Jequitinhonha, impedindo que a situa��o piore.
Outros mananciais da regi�o, entretanto, n�o tiveram a mesma sorte. Em Berilo, munic�pio de 12,4 mil habitantes, praticamente todos os c�rregos e pequenos rios est�o secos. Segundo a prefeitura local, 3,5 mil fam�lias moradoras da zona rural t�m que recorrer aos caminh�es-pipa para obter �gua. Um cen�rio que poderia ter sido evitado por meio da constru��o, na d�cada de 1990, de cinco pequenas barragens, nas comunidades de �gua Limpa, Mamonas, C�rrego do Bem-Querer e C�rrego do Buraco. Entretanto, somente a �ltima tem alguma serventia hoje, acumulando �gua que � aproveitada para matar a sede de animais, ainda assim depois de passar por reforma, afirma a prefeitura.
Emerg�ncia
Implantados por meio do Programa Emergencial contra a Seca, coordenado pela Copasa, os barramentos foram assoreados pouco depois da conclus�o das obras, devido a um suposto erro de projeto, e hoje acumulam mais terra e areia do que �gua, conta o secret�rio de Obras e Desenvolvimento Rural e Urbano de Berilo, Jo�o Nelson Pinto. Segundo a prefeitura, as obras teriam sido constru�das entre 1995 e 1998. Segundo nota da Copasa, os projetos foram feitos em parceria com o Instituto Mineiro de Gest�o das �guas (Igam), que teria sido “respons�vel pela escolha dos locais e fiscaliza��o das obras”. A companhia afirma ainda que cabia aos munic�pios “a opera��o e a manuten��o dessas barragens”.
Dif�cil acesso
Uma delas foi feita na comunidade de �gua Suja, em c�rrego de mesmo nome, a nove quil�metros da sede do munic�pio, em um local de dif�cil acesso. O agricultor Ad�o Fernandes Rodrigues, de 47 anos, que mora a 200 metros da barragem, conta que, na �poca da constru��o, percebeu o erro no projeto. “Eu disse que daquele jeito, sem deixar um vertedouro, a barragem iria se encher de terra e areia. Mas o engenheiro n�o quis me ouvir”, afirma Ad�o.
Como a obra praticamente nunca funcionou, mesmo morando perto da barragem, o agricultor, casado e pai de dois filhos, continua na depend�ncia do caminh�o-pipa da prefeitura, levado � comunidade somente a cada tr�s meses. Nesse meio-tempo, os gastos s�o inevit�veis. Ad�o afirma que, �s vezes, para n�o ficar com sede, vai “at� a rua” (�rea urbana) e compra �gua, pagando R$ 150 pelo caminh�o-pipa de 7,5 mil litros.
A situa��o piorou ainda mais nos �ltimos tr�s anos, quando houve redu��o do volume de chuvas. Neste ano, segundo o secret�rio de Obras de Berilo, a estiagem foi t�o intensa que muitas das cisternas para a capta��o da chuva (com capacidade para 16 mil litros), instaladas nas casas da zona rural dentro de programa do governo federal j� estavam praticamente vazias em mar�o.
Moradores da zona rural do munic�pio passaram a usar as pr�prias cisternas para armazenar a �gua do caminh�o-pipa da prefeitura. “A demanda � muito grande e a gente n�o consegue atender todo mundo. Alguns choram de alegria no dia que o caminh�o-pipa chega �s casas deles”, conta Jo�o Nelson.
A reportagem acompanhou a chegada de caminh�o-pipa na casa do lavrador Adilson Ferreira, na comunidade rural de Brejo, a oito quil�metros da �rea urbana de Berilo. O nome indica que o lugar j� teve muita �gua, que, com o passar do tempo e a degrada��o ambiental, desapareceu completamente. “�gua aqui � muito dif�cil. Quando o caminh�o-pipa demora a chegar, temos que pegar �gua emprestada, na casa da minha m�e, de balde”, relata Adilson, casado com Adriana Gomes da Cruz, com quem tem dois filhos.
Rio sob amea�a de morte em cinco anos

Berilo e Itinga – A �gua levada pelos caminh�es-pipa a comunidades de Berilo � captada no Rio Ara�ua�, que est� com a vaz�o reduzida e ainda sofre com os efeitos da minera��o. O secret�rio municipal de Administra��o e Planejamento, Charles Amaral, calcula que, no ritmo que se encontra e se nada for feito, o curso d’�gua vai secar de vez dentro de cinco a seis anos. Ele lembra que h� pelo menos oito anos se ouve falar na regi�o de projetos de constru��o de barragens dos governos estadual e federal (Cemig e Furnas), nas localidades de Santa Rita, no munic�pio de Chapada do Norte, e de Funil, na divisa de Berilo e Virgem da Lapa. “O problema � que as barragens nunca saem do papel e o povo continua passando sede”, protesta Amaral.
A constru��o de barragens tamb�m � o sonho de Itinga. No munic�pio, o Rio Itinguinha se resume hoje a um largo leito cheio de areia, cercado de mata ciliar, ind�cio de que, no passado, foi caudaloso. “Hoje, o rio s� corre mesmo quando chove”, conta o pequeno agricultor Jos� da Rocha Teixeira, de 58 anos.
Segundo o prefeito de Itinga, Adhemar Marcos Filho (PSDB), a constru��o de uma barragem vem sendo prometida h� mais de 10 anos pela Funda��o Rural Mineira (Ruralminas ) e beneficiaria tamb�m o munic�pio de Comercinho. Procurada, a dire��o da Ruralminas disse que aguarda verbas para a elaborar o projeto executivo da obra.
