
Diante da crise pol�tica que assola o pa�s, h� pelo menos tr�s anos, lideran�as se antecipam e colocam a campanha presidencial de 2018 nas ruas. A promessa �, basicamente, a mesma: dar o rumo certo para o equil�brio das contas p�blicas.
Entretanto, conforme mostra s�rie de reportagens do Correio, as cifras para sustentar os Tr�s Poderes s�o astron�micas e a solu��o, normalmente, sai do bolso do contribuinte.
No Judici�rio, por exemplo, os sal�rios de parte dos magistrados ultrapassam o teto constitucional de R$ 33.763. No ano passado, a Justi�a brasileira custou R$ 175 bilh�es, quase 270% a mais que em 2015. Segundo o Conselho Nacional de Justi�a (CNJ), o valor � quase todo usado no pagamento de sal�rios.
Desembargadores do Tribunal de Justi�a de S�o Paulo, por exemplo, chegam a ganhar em apenas um m�s quase R$ 100 mil. E mesmo diante de um rombo nas contas p�blicas — estimado em R$ 185 bilh�es em 2017 —, da estagna��o da economia e dos 14 milh�es de desempregados, h� ju�zes que n�o est�o satisfeitos.
As distor��es salariais entre a Justi�a estadual e a Federal estimulam o nivelamento. No ano passado, a Associa��o dos Ju�zes Federais do Brasil (Ajufe) enviou um requerimento ao CNJ pedindo equipara��o das vantagens, com o intuito de uniformizar as mordomias.
O CNJ, no entanto, arquivou o processo em maio deste ano, sob o argumento de que o pleito violaria disposi��es constitucionais e provocaria despesas.
O assunto � sens�vel. Envolve servidores p�blicos de alta qualifica��o que dominam as leis e justificam as benesses com elas. Os megassal�rios s�o consequ�ncia do extrateto, uma s�rie de penduricalhos legalmente institu�dos e trancados a sete chaves.
A prote��o ao sigilo fere determina��es do CNJ sobre as pr�ticas de transpar�ncia e � Lei de Acesso � Informa��o, segundo pesquisadores da Funda��o Getulio Vargas (FGV). Desde 2014, a institui��o pediu dados a 40 tribunais. Apenas 25 responderam e, desses, somente cinco explicaram objetivamente os n�meros.
Rafael Velasco, coordenador do programa de transpar�ncia p�blica da FGV, explica que a pr�tica interfere no controle social sobre os gastos p�blicos. A dificuldade em desvendar benef�cios no setor p�blico � comum em todos os Poderes, destaca Velasco, mas � mais evidente no Judici�rio.
Recentemente, um analista federal identificou que a vi�va de um desembargador do Tribunal Regional do Trabalho (15ª Regi�o), em Campinas, recebeu quase R$ 700 mil de vantagens eventuais em dois anos (2012 e 2013). No per�odo, a benefici�ria embolsou quase R$ 1,2 milh�o.
Al�m de benesses pessoais extrassal�rio, que variam entre R$ 5 mil e R$ 8 mil, desembargadores do TRT15 t�m vantagens eventuais. Em abril deste ano, receberam valores entre R$ 18,3 mil aeR$ 52,8 mil. “Teve desembargador com o total de quase R$ 100 mil. Com os descontos, o rendimento l�quido beirou os R$ 85 mil”, aponta o analista que prefere n�o se identificar.
“Na Justi�a Federal, ningu�m ganha mais do que o permitido e est� tudo definido: sal�rio, gratifica��o, benef�cio. N�o h� qualquer dificuldade em encontrar esses dados”, garante o presidente da Ajufe, Roberto Veloso.
Ele reconhece, no entanto, que h� discrep�ncias nos vencimentos de ju�zes estaduais de S�o Paulo. “Apresentamos o requerimento para informar que n�o estamos recebendo, enquanto os ju�zes do tribunal de S�o Paulo est�o. Que todos recebam, ou ningu�m”, afirma.
A vice-presidente da Associa��o dos Magistrados do Brasil (AMB), Julianne Marques, explica que os sal�rios respeitam o teto constitucional.
“Existem verbas indenizat�rias, di�rias de viagens, aux�lio-moradia.” A magistrada ressalta que a classe � a �nica que n�o teve reajuste salarial. “Do ano passado para c�, n�o tivemos aumentos. O que temos s�o subs�dios previstos em lei. E o resto � indeniza��o”, afirma.
Legisla��o
No Legislativo — que custa R$ 1,16 milh�o por hora aos cofres p�blicos, segundo dados da OnG Contas Abertas —, tramitam diversos projetos para conter os benef�cios extrateto, mas n�o andam.
O deputado Rubens Bueno (PPS-PR) defende que a C�mara vote com urg�ncia o PL 6726/16, aprovado pelo Senado em dezembro de 2016. A proposta est� parada na Comiss�o de Trabalho � espera de um relator.
“� preciso que a Casa enfrente essa quest�o que afronta a sociedade. N�o d� mais para ficar postergando a vota��o de uma mat�ria que vai acabar com essa aberra��o”, diz Bueno.
Gil Castello Branco, secret�rio-geral da Contas Abertas, explica que � dif�cil identificar na lei o conceito de “extrateto”. “Basta uma palavra na lei com um significado d�bio para que tudo v� por �gua abaixo e uma imoralidade poder� se tornar legal.”
A pr�tica de esconder informa��es importantes da popula��o � o reflexo da cultura patrimonialista e autorit�ria dentro do funcionalismo, afirma o economista Jos� Matias-Pereira, da Universidade de Bras�lia (UnB).
“O servidor chega a se ofender quando se exige transpar�ncia ou produtividade”, ironiza. A quest�o do penduricalho � ainda mais grave para ele.
V�rios itens foram dados como incentivos provis�rios e viraram permanentes, por exemplo, o aux�lio-moradia (R$ 4,3 mil), que o magistrado recebe mesmo quando mora no local onde trabalha. “As discrep�ncias s�o evidentes. Os megassal�rios do Judici�rio afetam a imagem da institui��o”, destaca.
Efici�ncia
Segundo levantamento do CNJ, com n�meros de 2015, o Judici�rio demora, em m�dia, quatro anos e quatro meses para proferir uma senten�a de um processo em 1ª inst�ncia.
A mais demorada � a Justi�a Federal, com m�dia de cinco anos e quatro meses. J� os tribunais superiores levam cerca de nove meses. Castello Branco destaca que um dos principais problemas da morosidade � o tr�mite processual, que possibilita muitos recursos.
“O processo n�o se encerra e fica eternamente lotando os escaninhos. Mudar isso deveria ser uma preocupa��o, porque os processos geram cada vez mais custos”, diz. Segundo o especialista, com o grande volume de a��es, f�rias de at� 60 dias para ju�zes “� uma aberra��o”.
Estrutura bilion�ria
Anualmente, cada estrutura do Judici�rio recebe uma porcentagem espec�fica do or�amento. Confira os dados:
Compet�ncia % no or�amento Valor recebido em 2016 (bilh�es)
Estadual 56,4 R$ 98,2
Trabalho 20,8 R$ 36,2
Federal 12,6 R$ 21,9
Eleitoral 5,8 R$ 10,1
Tribunais Superiores 4,2 R$ 7,3
Militar 0,2 R$ 3,4
Dados do Minist�rio do Planejamento mostram que, entre 2014 e 2016, os gastos do Judici�rio cresceram 356%, alta anual de R$ 136,02 bilh�es.
Veja a evolu��o:
2014: R$ 38,1 bilh�es 2015: R$ 39,8 bilh�es 2016: R$ 174,1 bilh�es