
Em um debate que se estende por quase tr�s d�cadas, o Supremo Tribunal Federal (STF) inicia nesta quinta-feira, 17, o julgamento de a��es que contestam a possibilidade de pris�o ap�s condena��o em segunda inst�ncia. Essa autoriza��o � considerada um dos pilares da Opera��o Lava Jato e pode abrir margem para a soltura do ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva. Na v�spera da sess�o, o clima na Corte foi marcado por embate entre os ministros, com o presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, pedindo "respeito" a Lu�s Roberto Barroso.
Al�m de Lula, cerca de 4,8 mil presos podem ser beneficiados com uma mudan�a de entendimento do Supremo sobre o tema, de acordo com o Conselho Nacional de Justi�a.
De 2016 para c�, o STF j� entendeu em quatro ocasi�es que � poss�vel a pris�o ap�s condena��o em segunda inst�ncia - a �ltima delas foi na an�lise de um habeas corpus do petista, que acabou negado pelo apertado placar de 6 a 5. Faltava, no entanto, o julgamento de m�rito das tr�s a��es, formando o entendimento que deve ser aplicado para todas as inst�ncias judiciais do Pa�s.
A discuss�o sobre o artigo 5.º da Constitui��o, por�m, come�ou muito antes, em 1991. Na �poca, o tribunal entendeu por unanimidade que o princ�pio da presun��o de inoc�ncia n�o impedia a execu��o antecipada da pena, antes do esgotamento de todos os recursos (o "tr�nsito em julgado", em juridiqu�s).
Isso mudou em 2009, quando o STF passou a permitir a pris�o apenas depois do esgotamento de todos os recursos. Em 2016, a Corte voltou a admitir a medida, considerada fundamental por procuradores e ju�zes na puni��o de criminosos do colarinho branco.
A sess�o desta quinta ser� dominada por sustenta��es orais da Procuradoria-Geral da Rep�blica (PGR), Advocacia-Geral da Uni�o (AGU), de entidades e dos autores das tr�s a��es que pretendem barrar a execu��o antecipada de pena - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Patriota e o PCdoB. O voto do relator, ministro Marco Aur�lio Mello, s� deve ser lido na pr�xima quarta-feira, em sess�o extraordin�ria convocada para o per�odo da manh�. Depois dele, se posicionar�o os outros 10 integrantes da Corte, em uma discuss�o que deve se estender por ao menos tr�s sess�es plen�rias.
Embate
Na v�spera do julgamento, houve embate entre ministros em duas ocasi�es distintas. Durante a an�lise de uma a��o sobre presta��o de contas de partidos, Barroso questionou o posicionamento do ministro Alexandre de Moraes, que foi contra uma resolu��o do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que prev� a suspens�o autom�tica dos diret�rios estaduais e municipais que n�o apresentem as informa��es. Para Moraes, a norma do TSE usurpou uma compet�ncia de legislar sobre o tema que seria do Congresso.
"Essa cren�a de que dinheiro p�blico � dinheiro de ningu�m � que atrasa o Pa�s", disse Barroso, ao interromper a leitura do voto do colega. Moraes rebateu: "Essa cren�a de que o Supremo Tribunal Federal pode fazer o que bem entende desrespeitando a legisla��o tamb�m atrasa o pa�s".
Barroso observou ent�o que a Constitui��o "diz expressamente que h� o dever de prestar contas". "Eu acho que o dinheiro p�blico tem que ter contas prestadas", afirmou Barroso. Foi nesse momento em que Toffoli fez uma interven��o mais contundente: "Mas isso � o que todos n�s pensamos. Vossa Excel�ncia respeite os colegas!".
"Eu sempre respeito os colegas. Eu estou emitindo minha opini�o. Vossa Excel�ncia est� sendo deselegante com um colega que � respeitoso com todo mundo. Eu disse apenas que a Constitui��o imp�e o dever de presta��o de contas", retrucou Barroso.
Depois, em uma sess�o administrativa (que n�o � transmitida ao vivo pela TV Justi�a, mas pode ser acompanhada por jornalistas), houve novo atrito entre os ministros. Foi a vez de o ministro Marco Aur�lio Mello questionar a escolha de Toffoli de contratar um escrit�rio de arquitetura - sem licita��o - para elaborar o projeto do novo museu do Supremo, conforme revelou o jornal O Estado de S. Paulo no m�s passado. "Deveria ser feita mediante licita��o. Em segundo lugar, o momento n�o � prop�cio a esse gasto", criticou Marco Aur�lio. A discuss�o n�o foi conclu�da.
Expectativa
Para Marco Aur�lio, o julgamento sobre a pris�o ap�s segunda inst�ncia n�o deve ser interrompido por pedido de vista (mais tempo para analisar o caso). "Creio que a mat�ria est� muito madura, todos n�s temos concep��o a respeito. Daqui a pouco apodrece. Tarda a palavra final do Supremo", disse o ministro, que chegou a derrubar em uma liminar a execu��o antecipada de pena, em dezembro do ano passado. A decis�o foi cassada por Toffoli no mesmo dia.
A expectativa dentro da Corte � a de que a atual posi��o seja revista, cabendo a Toffoli definir o resultado. O presidente do Supremo j� defendeu a posi��o de que a execu��o de pena deve aguardar uma decis�o do Superior Tribunal de Justi�a (STJ), que funciona como uma esp�cie de terceira inst�ncia.
Na quarta-feira, Barroso e o vice-presidente do Supremo, ministro Luiz Fux, sa�ram em defesa da atual jurisprud�ncia do tribunal, que admite a execu��o antecipada de pena. Os dois s�o considerados votos certos a favor da pris�o ap�s segunda inst�ncia. "De sorte que eu considero realmente um retrocesso se essa jurisprud�ncia (do Supremo) for modificada (no novo julgamento)", disse Fux a jornalistas, ao chegar ao STF.
Para Barroso, a atual jurisprud�ncia "fez muito bem ao Pa�s" no combate � criminalidade. "O mundo nos v� como um para�so de corruptos e acho que n�s temos que superar essa imagem, e n�o h� como superar essa imagem sem o enfrentamento determinado da corrup��o, dentro da Constitui��o e dentro das leis", afirmou.
A decis�o do Supremo em rela��o � autoriza��o para pris�o ap�s segunda inst�ncia gera grande expectativa tamb�m porque pode afetar a execu��o penal do ex-presidente Lula.
A deputada Gleisi Hoffmann, presidente nacional do PT, disse nesta quarta-feira que o mote "Lula Livre" n�o acaba com a decis�o do STF. De acordo com ela, o PT vai continuar mobilizado para que senten�a do ent�o juiz S�rgio Moro - atual ministro da Justi�a, que condenou o petista em primeira inst�ncia - seja anulada e Lula tenha seus direitos pol�ticos de volta, ou seja, posse voltar a se candidatar.
Aproximadamente 100 r�us, entre eles Lula, j� foram condenados pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Regi�o a partir de processos da na Lava Jato em Curitiba. O petista foi condenado tamb�m pelo STJ.
'Convuls�o social'
O ex-comandante do Ex�rcito, general Eduardo Villas B�as, afirmou nesta quarta-feira pelo Twitter que houve "grande esfor�o para combater a corrup��o e a impunidade" e que o Pa�s tem de seguir este caminho, sob risco de ocorrer uma "convuls�o social". Ano passado, v�spera do julgamento do ex-presidente Lula, o general repudiou a impunidade e disse que o Ex�rcito estaria ainda "atento �s suas miss�es institucionais", sem detalhar o que pretendeu com a express�o.