
Previsto na Constitui��o, o chamado "abate-teto" � um mecanismo que inibe o recebimento de "supersal�rios" na administra��o p�blica. Na pr�tica, ele funciona como uma linha de corte que reduz a remunera��o de servidores para limit�-la ao valor m�ximo permitido, que equivale aos vencimentos de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). S� algumas verbas escapam, os chamados penduricalhos, como os jetons por participa��o em conselhos de estatais, aux�lio-moradia, entre outros.
Com o argumento de que corrigiria distor��es de militares da reserva que exercem cargos no governo sem receber o sal�rio ou em troca de apenas uma parte, o Minist�rio da Defesa fez uma consulta � Advocacia-Geral da Uni�o (AGU) se poderia aplicar um entendimento diferente para a regra. A pasta argumenta, com apoio dos comandos de Aeron�utica, Ex�rcito e Marinha, que o abate-teto deveria limitar cada sal�rio isoladamente. Assim, caso nenhuma das remunera��es atinja o teto, o militar poderia receb�-las integralmente.
O ministro da Ci�ncia, Tecnologia e Inova��es, Marcos Pontes, por exemplo, vem tendo o sal�rio bruto do cargo, de R$ 30,9 mil, cortado mensalmente em R$ 14,7 mil por causa do abate-teto. Isso porque ele j� recebe como tenente-coronel da reserva da For�a A�rea Brasileira cerca de R$ 21 mil. Se o novo entendimento estivesse em vigor, Pontes poderia acumular as duas remunera��es integralmente e, ao fim do m�s, passaria a receber cerca de R$ 52 mil.
E ele nem � o que mais ganha. Bento Albuquerque, ministro de Minas e Energia, poder� acumular quase R$ 65 mil brutos apenas com as remunera��es b�sicas. O militar ainda faz parte dos conselhos de administra��o da Itaipu Binacional e da Empresa de Pesquisa Energ�tica (EPE) - os jetons geram, respectivamente, mais R$ 14,9 mil e R$ 3,2 mil mensais.
Aval
Oficiais das For�as Armadas comandam nove minist�rios e s�o maioria no Pal�cio do Planalto, de onde atuam nos bastidores na articula��o com o Legislativo e o Judici�rio, al�m dos �rg�os de controle.
A AGU concordou com os argumentos da Defesa em abril. Em parecer, o �rg�o jur�dico do governo citou entendimentos do STF e do Tribunal de Contas da Uni�o sobre o abate-teto. O caso base foi o de dois servidores do Mato Grosso que acumulavam cargos e tiveram aval da Justi�a para que o redutor fosse aplicado separadamente e n�o nos vencimentos acumulados.
Por�m, a pasta da Economia diz que essas decis�es n�o s�o aplicadas automaticamente a todo o funcionalismo federal. E tamb�m n�o serviria de base, pois os ministros julgaram casos espec�ficos.
Por causa dos gastos com a pandemia da covid-19, que levou o presidente Jair Bolsonaro a decretar estado de calamidade p�blica, o aval da AGU dado em abril deste ano pelo ent�o ministro Andr� Mendon�a, atual titular da Justi�a e Seguran�a P�blica, foi suspenso em maio pelo seu sucessor, o atual advogado-geral da Uni�o, Jos� Levi. Mas, na pr�tica, outros minist�rios, como o da Cidadania, j� formularam consultas ao �rg�o sobre como proceder os pagamentos. Isso porque o parecer da AGU beneficia n�o s� os militares, mas todos os servidores do governo que recebem sal�rios de duas fontes diferentes.
Agora, t�cnicos da Economia pressionam Levi para que reveja a autoriza��o dada por Mendon�a. Eles argumentam que "n�o se pode flexibilizar o 'teto' para atender uma pequena classe da sociedade brasileira". E alertam: "O j� combalido Or�amento P�blico Federal ter� de arcar com o aumento ilegal do pagamento de remunera��es provenientes de acumula��o de cargos, at� mesmo em casos n�o permitidos pela Constitui��o".
Os t�cnicos ressaltam que n�o h� dota��o or�ament�ria espec�fica bancar esse aumento na despesa Or�amento de 2020 e que ela tampouco foi prevista na Lei de Diretrizes Or�ament�rias de 2021, dois impeditivos legais. A Secretaria de Gest�o e Desempenho de Pessoal pediu o "reexame" do parecer pela AGU. "O entendimento proposto pela Advocacia-Geral da Uni�o acarretar� elevado impacto financeiro", diz o �rg�o.
O governo tem at� hoje para enviar ao Congresso Nacional a proposta or�ament�ria do ano que vem. Como revelou o Estad�o, a previs�o � de o Minist�rio da Defesa ter mais recursos que o da Educa��o, o que n�o acontece desde 2010.
Por enquanto, o abate-teto continua a descontar o somat�rio das remunera��es de servidores quando h� ac�mulo de cargos, empregos, pens�es e fun��es.
Pastas n�o se pronunciam
O Estad�o encaminhou perguntas por escrito aos �rg�os envolvidos na discuss�o sobre as mudan�as no abate-teto. O Minist�rio da Economia n�o respondeu aos questionamentos. Tampouco o Minist�rio da Defesa, que alegou ser compet�ncia da Advocacia-Geral da Uni�o (AGU) se pronunciar.
A AGU, por sua vez, disse apenas que o parecer que permite a aplica��o do abate-teto separadamente em cada vencimento "segue suspenso".
Nenhum dos tr�s �rg�os deu esclarecimentos sobre impactos financeiros, quantidade de servidores civis ou militares beneficiados, nem justificativas para a mudan�a de entendimento da regra constitucional que evita o pagamento de "supersal�rios", a suspens�o do parecer e previs�o de quanto ser� retomado ou reavaliado. As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.