"N�o d� para voc� colocar toda a carga em cima do governo, do presidente", disse Marcos Rog�rio (foto: Jane de Ara�jo/Ag�ncia Senado)
No in�cio de uma semana dura para o governo no �mbito da Comiss�o Parlamentar de Inqu�rito (CPI) da COVID-19, com previs�o de depoimento do ex-ministro da Sa�de Eduardo Pazuello na pr�xima quarta-feira (19), o senador Marcos Rog�rio (DEM-RO) disse nesta segunda-feira (17/5) que quem usou e recomendou a cloroquina para combater a doen�a foram os estados e munic�pios, e n�o o governo federal.
A fala do parlamentar, que est� entre os quatro que integram a linha de frente de defesa do governo na CPI, mostra a estrat�gia do governo de tentar tirar o foco da comiss�o sobre o Pal�cio do Planalto para colocar sobre os estados. “Est�o falando na cloroquina s� na perspectiva do governo (federal), mas quem usou a cloroquina e quem recomendou foram os estados”, disse, em entrevista ao Correio.
O governo tem tentado se distanciar, h� meses, da cloroquina. Em janeiro deste ano, o general Pazuello chegou a dizer que n�o autorizou o minist�rio a produzir protocolos indicando medicamentos contra COVID-19. Em maio do ano passado, entretanto, assim que assumiu a pasta como ministro interino, o minist�rio elaborou um protocolo que indicava uso de cloroquina contra a COVID-19, procedimento que n�o tem comprova��o cient�fica.
O senador pontuou que o presidente Jair Bolsonaro era, e �, “em certa medida”, um defensor da cloroquina. “Mas a quest�o � que os estados fizeram uso, distribu�ram. Quem pediu para o minist�rio, na �poca, colocar no protocolo nacional foi algu�m que nem era do governo. Isso na hora certa vai ter que ser encarado”, disse.
Ele afirmou que tanto os estados quanto os munic�pios distribu�ram o chamado 'kit COVID'. “A gente tem que ver o que vem, como vem, e a� ter a linha de argumenta��o em cima dos fatos. Agora, n�o d� para voc� colocar toda a carga em cima do governo, do presidente, em cima de algo que quem deu maior fluxo de uso foram os estados e munic�pios”, sustentou.
Marcos Rog�rio pontuou, ainda, que o governo “n�o indica medicamento”. “Medicamento � indicado por m�dico. Ou voc� tem uma diretriz do Minist�rio da Sa�de ou da OMS (Organiza��o Mundial da Sa�de), ou a� � cada um. Se o m�dico quer indicar cloroquina, ok. Quem indica medicamento para o paciente � o m�dico”, argumentou.
De acordo com ele, "a oposi��o tem que parar de ser seletiva". "Quando � contra o governo (federal), ela vai pra cima. Quando � os estados, ela tira o corpo fora. N�o pode ser assim. A investiga��o tem que ser completa. Que instigue o Minist�rio da Sa�de, o Distrito Federal, os estados e os munic�pios”, disse.
Na verdade, a cloroquina foi amplamente difundida por Bolsonaro ao longo da pandemia, tendo sido um dos motivos que levaram o ex-ministro da Sa�de Nelson Teich a deixar a pasta com menos de um m�s de atua��o. Durante o caos de Manaus no in�cio do ano, na imin�ncia de falta de oxig�nio, Pazuello lan�ou um aplicativo que incentivava o uso de rem�dio sem efic�cia comprovada contra COVID-19.
Al�m disso, o governo federal gastou dinheiro com compra de cloroquina para o combate � pandemia. No in�cio do ano, por exemplo, foi divulgado que o Minist�rio da Sa�de usou a Funda��o Oswaldo Cruz (Fiocruz) para produzir quatro milh�es de comprimidos de cloroquina com dinheiro destinado ao combate da pandemia de COVID-19. O Tribunal de Contas da Uni�o (TCU) j� chegou a pedir explica��es para a pasta, apontando que a aquisi��o de cloroquina contra COVID-19 via Sistema �nico de Sa�de (SUS) era ilegal.
O que � uma CPI?
As comiss�es parlamentares de inqu�rito (CPIs) s�o instrumentos usados por integrantes do Poder Legislativo (vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores) para investigar fato determinado de grande relev�ncia ligado � vida econ�mica, social ou legal do pa�s, de um estado ou de um munic�pio. Embora tenham poderes de Justi�a e uma s�rie de prerrogativas, comit�s do tipo n�o podem estabelecer condena��es a pessoas.
Para ser instalado no Senado Federal, uma CPI precisa do aval de, ao menos, 27 senadores; um ter�o dos 81 parlamentares. Na C�mara dos Deputados, tamb�m � preciso aval de ao menos uma terceira parte dos componentes (171 deputados).
H� a possibilidade de criar comiss�es parlamentares mistas de inqu�rito (CPMIs), compostas por senadores e deputados. Nesses casos, � preciso obter assinaturas de um ter�o dos integrantes das duas casas legislativas que comp�em o Congresso Nacional.
Ap�s a coleta de assinaturas, o pedido de CPI � apresentado ao presidente da respectiva casa Legislativa. O grupo � oficialmente criado ap�s a leitura em sess�o plen�ria do requerimento que justifica a abertura de inqu�rito. Os integrantes da comiss�o s�o definidos levando em considera��o a proporcionalidade partid�ria — as legendas ou blocos parlamentares com mais representantes arrebatam mais assentos. As lideran�as de cada agremia��o s�o respons�veis por indicar os componentes.
Na primeira reuni�o do colegiado, os componentes elegem presidente e vice. Cabe ao presidente a tarefa de escolher o relator da CPI. O ocupante do posto � respons�vel por conduzir as investiga��es e apresentar o cronograma de trabalho. Ele precisa escrever o relat�rio final do inqu�rito, contendo as conclus�es obtidas ao longo dos trabalhos.
Em determinados casos, o texto pode ter recomenda��es para evitar que as ilicitudes apuradas n�o voltem a ocorrer, como projetos de lei. O documento deve ser encaminhado a �rg�os como o Minist�rio P�blico e a Advocacia-Geral da Uni�o (AGE), na esfera federal.
Conforme as investiga��es avan�am, o relator come�a a aprimorar a linha de investiga��o a ser seguida. No Congresso, sub-relatores podem ser designados para agilizar o processo.
As CPIs precisam terminar em prazo pr�-fixado, embora possam ser prorrogadas por mais um per�odo, se houver aval de parte dos parlamentares
O que a CPI pode fazer?
chamar testemunhas para oitivas, com o compromisso de dizer a verdade
convocar suspeitos para prestar depoimentos (h� direito ao sil�ncio)
executar pris�es em caso de flagrante
solicitar documentos e informa��es a �rg�os ligados � administra��o p�blica
convocar autoridades, como ministros de Estado — ou secret�rios, no caso de CPIs estaduais — para depor
ir a qualquer ponto do pa�s — ou do estado, no caso de CPIs criadas por assembleias legislativas — para audi�ncias e dilig�ncias
quebrar sigilos fiscais, banc�rios e de dados se houver fundamenta��o
solicitar a colabora��o de servidores de outros poderes
elaborar relat�rio final contendo conclus�es obtidas pela investiga��o e recomenda��es para evitar novas ocorr�ncias como a apurada
pedir buscas e apreens�es (exceto a domic�lios)
solicitar o indiciamento de envolvidos nos casos apurados
O que a CPI n�o pode fazer?
Embora tenham poderes de Justi�a, as CPIs n�o podem:
julgar ou punir investigados
autorizar grampos telef�nicos
solicitar pris�es preventivas ou outras medidas cautelares
declarar a indisponibilidade de bens
autorizar buscas e apreens�es em domic�lios
impedir que advogados de depoentes compare�am �s oitivas e acessem
documentos relativos � CPI
determinar a apreens�o de passaportes
A hist�ria das CPIs no Brasil
A primeira Constitui��o Federal a prever a possibilidade de CPI foi editada em 1934, mas dava tal prerrogativa apenas � C�mara dos Deputados. Treze anos depois, o Senado tamb�m passou a poder instaurar investiga��es. Em 1967, as CPMIs passaram a ser previstas.
Segundo a C�mara dos Deputados, a primeira CPI instalada pelo Legislativo federal brasileiro come�ou a funcionar em 1935, para investigar as condi��es de vida dos trabalhadores do campo e das cidades. No Senado, comit� similar foi criado em 1952, quando a preocupa��o era a situa��o da ind�stria de com�rcio e cimento.
As CPIs ganharam estofo e passaram a ser recorrentes a partir de 1988, quando nova Constitui��o foi redigida. O texto m�ximo da na��o passou a atribuir poderes de Justi�a a grupos investigativos formados por parlamentares.
CPIs famosas no Brasil
1975: CPI do Mobral (Senado) - investigar a atua��o do sistema de alfabetiza��o adotado pelo governo militar
1992: CPMI do Esquema PC Farias - culminou no impeachment de Fernando Collor
1993: CPI dos An�es do Or�amento (C�mara) - apurou desvios do Or�amento da Uni�o
2000: CPIs do Futebol - (Senado e C�mara, separadamente) - rela��es entre CBF, clubes e patrocinadores
2001: CPI do Pre�o do Leite (Assembleia de MG e outros Legislativos estaduais, separadamente) - apurar os valores cobrados pelo produto e as diretrizes para a formula��o dos valores
2005: CPMI dos Correios - investigar den�ncias de corrup��o na empresa estatal
2005: CPMI do Mensal�o - apurar poss�veis vantagens recebidas por parlamentares para votar a favor de projetos do governo
2006: CPI dos Bingos (C�mara) - apurar o uso de casas de jogo do bicho para crimes como lavagem de dinheiro
2006: CPI dos Sanguessugas (C�mara) - apurou poss�vel desvio de verbas destinadas � Sa�de
2015: CPI da Petrobras (Senado) - apurar poss�vel corrup��o na estatal de petr�leo
2015: Nova CPI do Futebol (Senado) - Investigar a CBF e o comit� organizador da Copa do Mundo de 2014
2019: CPMI das Fake News - dissemina��o de not�cias falsas na disputa eleitoral de 2018
2019: CPI de Brumadinho (Assembleia de MG) - apurar as responsabilidades pelo rompimento da barragem do C�rrego do Feij�o