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Estado de Minas ONDE EST� O LIMITE?

Hostiliza��o a pol�ticos e artistas exp�e debate �tico e legal

Onda de ofensas por posicionamento pol�tico levanta discuss�o sobre liberdade de express�o e sa�de da democracia no Brasil


04/12/2022 11:17 - atualizado 04/12/2022 13:05

Manifestantes posam para foto ao lado de boneco de Lula enforcado
Professor aponta que protestos pelo impeachment de Dilma Rousseff, em 2014 e 2015, impulsionaram cen�rio de ofensas pol�ticas (foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A.Press - 15/11/2015)
Que pol�tico ou artista que se posiciona politicamente pode entrar hoje em um avi�o ou um restaurante com a tranquilidade de que n�o ser� ofendido? No Brasil, poucos.

A onda de hostiliza��o a personalidades de diferentes espectros ideol�gicos abriu um debate no pa�s sobre liberdade de express�o, crimes contra a honra e a sa�de da democracia.


Para coibir casos do tipo, pol�ticos cobram a responsabiliza��o dos autores das ofensas, inclusive com a avalia��o de novos tipos penais ou buscando enquadr�-los no crime de stalking (persegui��o), sancionado em 2021.

Estudiosos, por�m, avaliam que a criminaliza��o pode n�o resolver e, se abrangente demais, arrisca penalizar manifesta��es leg�timas. 

Uma lista concisa de insultados s� nos �ltimos dois meses inclui o cantor Gilberto Gil em um est�dio no Qatar; Ciro Gomes (PDT) em um aeroporto nos EUA; Rodrigo Maia (PSDB) em um resort na Bahia; ministros do STF em Nova York; Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Lindbergh Farias (PT-RJ) em um restaurante em Bras�lia; a atriz Regina Duarte em um teatro em S�o Paulo, entre outros.

 


A concentra��o de casos pode parecer fruto do acirramento de �nimos da elei��o, mas a verdade � que o fen�meno j� vinha acontecendo antes.


Para o professor do curso de gest�o de pol�ticas p�blicas da USP Pablo Ortellado, os epis�dios tiveram impulso a partir de 2014 e 2015, com as movimenta��es pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT).


Em sua vis�o, elas escancaram a polariza��o pol�tica no pa�s e, com isso, a ideia de que o advers�rio � um inimigo a ser atacado.

Em 2015, diversos pol�ticos petistas foram intimidados em momentos privados, como Guido Mantega no hospital Albert Einstein ao acompanhar a esposa em tratamento de c�ncer.


Mas a mira n�o se restringiu a um lado. No ano seguinte, a organiza��o de esquerda Levante Popular da Juventude realizou a a��o "escrache um golpista", em que militantes foram �s casas de uma s�rie de pol�ticos que endossaram a deposi��o de Dilma, como o ent�o vice-presidente Michel Temer (MDB).


O mesmo grupo j� havia promovido escrachos contra agentes acusados de colabora��o com a ditadura. Procurado pela reportagem, o Levante n�o respondeu aos contatos.

O termo remete aos "escraches", atos na Argentina organizados por filhos de desaparecidos ou presos pol�ticos nos arredores das casas de agentes respons�veis por viola��es de direitos humanos durante a ditadura militar de 1976 a 1983.


A "puni��o social" � uma forma de justi�a muito ruim, porque sum�ria, sem contradit�rio e sem mecanismos de defesa, diz Ortellado.


Para Debora Diniz, antrop�loga e professora da UnB (Universidade de Bras�lia), a hostiliza��o a pessoas n�o responsabilizadas em um regime ditatorial � diferente da intimida��o em uma sociedade democr�tica.


Fora do pa�s ap�s uma s�rie de ofensas e amea�as em raz�o de seu ativismo pela descriminaliza��o do aborto, ela diz ver o escracho como uma "t�tica de desaparecimento".

"O risco dessas pr�ticas � que elas ativam efeitos de manada, cujo resultado � a restri��o das apari��es, principalmente para quem tem menos condi��o de se defender. O que est� em disputa � o direito de existir sem intimida��o."


Um dos influenciadores que popularizou o questionamento de pessoas p�blicas com uma c�mera na m�o, o ex-deputado Arthur do Val, o Mam�e Falei, diz ser contra a hostiliza��o e afirma que essa n�o era sua pr�tica.


"Ir atr�s de alguma figura p�blica e fazer um questionamento, ainda que inc�modo, � bem-vindo, faz parte da democracia. Xingar � outra coisa. Mas uma lei para proibir pode gerar efeitos colaterais muito piores", diz ele.


O estabelecimento de limites n�o � consenso nem entre os dois protagonistas do debate pol�tico no pa�s.


Em abril, o ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva (PT) defendeu que a milit�ncia sindical procurasse deputados e seus familiares na casa deles para pressionar a favor de propostas que interessam ao setor.


O presidente Jair Bolsonaro (PL), por sua vez, disse em diversas ocasi�es que o petista n�o podia sair na rua no pr�prio pa�s.


Depois de ter sido alvo de um bolsonarista, no �ltimo dia 18, no aeroporto do Cairo, a equipe do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) chegou a rascunhar um projeto para criar o crime de "ass�dio ideol�gico".


O crime consistiria em "assediar algu�m publicamente, de forma violenta ou humilhante, premido por inconformismo pol�tico, partid�rio ou ideol�gico".

A proposta recebeu cr�ticas pelo risco de cercear a liberdade de manifesta��o, e Randolfe acabou desistindo de protocolar o projeto. Procurado pela Folha, ele n�o respondeu.


O deputado Kim Kataguiri (Uni�o-SP), que foi empurrado por um manifestante durante um debate na Universidade Federal de S�o Paulo, no �ltimo dia 25, ironizou: "Se essa lei tivesse valendo [...] ia uns 15 'estudantes' em cana ou ser� que s� valer� quando � ao contr�rio?".


J� Rodrigo Maia assinou a pol�cia e a Justi�a para enquadrar o casal que o hostilizou nos crimes de stalking, inj�ria e difama��o.


A advogada Ariane Nery afirma que � preciso analisar as caracter�sticas particulares de cada situa��o para entender qual lei eventualmente pode ser aplicada a um caso ofensivo.


No epis�dio com Gilberto Gil, por exemplo, ela diz entender que a men��o do torcedor � Lei Rouanet n�o configura crime, mas o xingamento dirigido no final do v�deo que circulou se enquadraria como inj�ria.


Outra sa�da poderia ser uma a��o civil com pedido de indeniza��o por danos morais, por exemplo.


Segundo Nery, que � integrante do Pleb (grupo de pesquisa sobre Liberdade de Express�o da PUC-Rio), o fato de a v�tima da hostiliza��o ser pessoa p�blica � entendido de maneiras diversas na Justi�a.


Alguns ju�zes consideram que pessoas p�blicas est�o mais sujeitas a cr�tica, outros, ao contr�rio, que s�o mais prejudicadas pelas ofensas por dependerem da imagem.

Nery diz ver com preocupa��o a cria��o de um novo tipo penal para evitar casos do tipo, bem como o enquadramento no recente crime de stalking.


"Toda vez que uma lei � criada em um momento de clamor popular, resulta em uma norma sem consist�ncia, que, al�m de n�o resolver o problema, produz distor��es."

O advogado Victor Leahy, tamb�m membro do Pleb, diz ver com ressalvas novas propostas para coibir essa pr�tica.


"H� quem defenda, hoje, uma necessidade de maior prote��o � honra e reputa��o dessas figuras p�blicas. Argumenta-se que, com o avan�o da tecnologia e dos meios de comunica��o, os ataques s�o mais frequentes e coordenados", diz.


Mas ele pontua que, embora haja discursos que n�o s�o protegidos pela Constitui��o (como cal�nias, amea�as, desacato e incita��o � viol�ncia, por exemplo), � preciso "ter cautela ao definir os casos em que a resposta estatal ser� a mais apropriada", pois h� risco de legitimar a censura e de que novas leis sejam aplicadas de forma arbitr�ria. 

Quando a abordagem pode virar crime

Quem ofende personalidades p�blicas por raz�es pol�ticas pode ser responsabilizado na Justi�a?

 

Sim, mas depende do conte�do. Cr�ticas e opini�es desfavor�veis s�o protegidas pela liberdade de express�o, desde que n�o se enquadrem em algum crime previsto no C�digo Penal ou se entenda que justifiquem indeniza��o por dano moral.


Em quais crimes pode ser enquadrado o cidad�o que ataca verbalmente um pol�tico?

- Cal�nia: imputar falsamente a algu�m fato definido como crime

- Difama��o: imputar a algu�m fato ofensivo � sua reputa��o

- Inj�ria: ofender a dignidade ou o decoro de algu�m


Quais s�o os agravantes para esses crimes?

Se houver viol�ncia (o que acrescentaria tamb�m a pena da viol�ncia); se a inj�ria usar a ra�a, cor, etnia, religi�o, origem ou a condi��o de pessoa idosa ou portadora de defici�ncia; se dirigida a funcion�rio p�blico no exerc�cio da fun��o, ao presidente do Brasil ou de outro pa�s ou aos presidentes do STF, Senado e C�mara; na presen�a de v�rias pessoas ou por meio que facilite a divulga��o, como v�deo; se atingir crian�a, adolescente, pessoa com defici�ncia ou com 60 anos ou mais; se cometido ou divulgado em redes sociais


E se h� troca de ofensas?

No caso de inj�ria, o C�digo Penal prev� que o juiz pode deixar de aplicar a pena se "o ofendido, de forma reprov�vel, provocou diretamente a inj�ria" ou retrucou com outra inj�ria


O autor da ofensa pode ser condenado a pagar indeniza��o?

Sim. A Constitui��o diz que "s�o inviol�veis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas" e prev� indeniza��o por dano moral ou � imagem em caso de viola��o. Caber� � Justi�a avaliar se isso ocorreu, e muitas vezes os crit�rios s�o subjetivos.


E quem divulga ofensa feita por outro est� sujeito a puni��o?

Quem divulga cal�nia, mesmo sabendo ser falsa, est� sujeito � mesma pena de quem a comete.


O que � o crime de stalking? Ele se aplica a esses casos?

Desde 2021, o C�digo Penal prev� pena de 6 meses a 2 anos de reclus�o a quem "perseguir algu�m reiteradamente e por qualquer meio, amea�ando-lhe a integridade f�sica ou psicol�gica, restringindo-lhe a capacidade de locomo��o ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade". Para enquadrar algu�m no crime, � preciso provar o car�ter reiterado da conduta. H� discuss�o se a divulga��o na internet de um epis�dio pontual seria suficiente para essa caracteriza��o.


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