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Estado de Minas ENTREVISTA

Ministra Anielle Franco: 'Somos a maioria da popula��o'

Ministra da Igualdade Racial falou ao EM sobre a��es da pasta e destaca que comida no prato, sa�de, educa��o e o fim das mortes de pretos s�o prioridades


06/02/2023 04:00 - atualizado 06/02/2023 11:19

 

Comida no prato, sa�de, educa��o e o fim do que considera genoc�dio da popula��o preta brasileira. Essas s�o as miss�es que a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, colocou como prioridades da pasta que comanda h� um m�s. Simb�lico na luta racial no Brasil, o minist�rio vai implementar pol�ticas inclusivas e supervisionar  a ado��o dessas pr�ticas no governo do presidente Luiz In�cio Lula da Silva (PT).

“Completamos 31 dias de governo e viemos trabalhando muito. A gente n�o tem hora para sair do gabinete. Fizemos muitas coisas importantes e, para mim, a primeira foi a de quando Lula assinou, no dia da minha posse, a Lei da Inj�ria Racial, para tipificar esse crime de racismo. Isso (racismo), tem sido t�o comum, tem acontecido tanto… foi muito importante esse ato dele”, disse Anielle Franco em entrevista ao Estado de Minas.

 

Anielle � irm� da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ), assassinada em 2018, no Centro do Rio de Janeiro, um crime que segue sem solu��o depois de cinco anos. Ap�s o epis�dio, ela, que � jornalista de forma��o, criou o Instituto Marielle Franco.

Com experi�ncia e ativista das quest�es de ra�a e g�nero e ap�s os desdobramentos de casos de viol�ncia pol�tica, ela assume o compromisso de lutar pela inclus�o da popula��o preta na pauta do governo federal.

Ministra Anielle Franco
A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco (foto: Jos� Cruz/Ag�ncia Brasil)

“N�s j� tivemos algumas reuni�es muito pontuais e importantes como, por exemplo, com a ministra da Sa�de, N�sia Trindade. Falamos muito sobre a sa�de da popula��o negra, que � uma popula��o que, infelizmente, tem pouco acesso � sa�de p�blica, mas tamb�m tem enfrentado nos �ltimos anos um aumento dr�stico de problemas de sa�de mental”,exemplifica.

 

Anielle tamb�m se reuniu com o ministro Camilo Santana, da Educa��o, e discutiu o uso de dados da Lei de Cotas para a avalia��o do programa de assist�ncia estudantil, incluindo aux�lio-transporte, alimenta��o, moradia e compra de livros e materiais. Al�m disso, a cria��o de um comit� gestor interministerial tamb�m foi pauta de discuss�o entre os ministros.

"Na verdade, ap�s perder a minha irm�, que era a minha melhor amiga, minha confidente, eu fiquei com muita vontade, muita gana de lutar, principalmente pela popula��o negra, mas em momento nenhum passou pela cabe�a virar ministra de Estado"


Esses visam incluir na comiss�o representantes de ambas as pastas que ficariam respons�veis pela integra��o, produ��o e monitoramento de dados.

“Vamos oficializar em poucos dias a cria��o deste GT (grupo de trabalho) para debater n�o s� o fortalecimento dessa lei (de Cotas), mas tamb�m debater no PNLD (Plano Nacional do Livro Did�tico), o livro did�tico, porque as pessoas negras precisam ser representadas tamb�m no material did�tico”, explicou.

Nascida e criada na Mar�, comunidade do Rio de Janeiro, a ministra deseja ser associada � luta da popula��o negra na chegada ao topo. Veja abaixo os principais pontos da entrevista de Arielle Franco.

Inclus�o no governo

“A gente tem feito um movimento estrat�gico, mas tamb�m muito transversal. A transversalidade tem que ser, de fato, concreta. Ela traz paridade de g�nero; ela traz equidade racial; ela traz coisas que as pessoas podem n�o estar muito preparadas para aceitar, como, por exemplo, um letramento racial.

Ent�o s�o movimentos espec�ficos que n�s temos feito de sinalizar a todos os outros minist�rios que a quest�o racial existe, � importante, n�o cabe dentro de uma secretaria, ela realmente merece um minist�rio, porque n�s somos a maioria da popula��o desse pa�s. N�s somos quase 57% (da popula��o), e esses sinais t�m sido desenhados ali quando chegamos na educa��o, na sa�de, na pr�pria cultura, no esporte.

N�s entregamos, sim, essa lista em apoio com uma organiza��o chamada Elas No Or�amento. N�s entregamos, tamb�m, 41 nomes ao presidente da Embratur, Marcelo Freixo. Mas para al�m disso, o Minist�rio da Igualdade Racial tem hoje um banco de curr�culo de 5.300 pessoas negras espalhadas pelo pa�s inteiro para justificar, fortalecer e fazer com que todos entendam que as pessoas negras est�o aptas, preparad�ssimas, prontas para entrarem em qualquer lugar.

"N�s somos quase 57% (da popula��o), e esses sinais t�m sido desenhados ali quando chegamos na educa��o, na sa�de, na pr�pria cultura, no esporte"


N�s lan�amos tamb�m um banco de curr�culos para pessoas trans e travestis em parceria com a Associa��o Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), que nos solicitou. Todos os ministros e ministros que nos perguntam e falam conosco sobre indica��es, a gente tem. Ent�o isso � importante, esse di�logo.

A gente precisa naturalizar a entrada dessas pessoas negras em lugares de poder que historicamente nos foram negados. A gente est� aqui para provar o contr�rio e vamos continuar, se Deus quiser.”

Inspira��o na irm� 

“Acho que muita coisa que aconteceu ap�s a morte da Mari (Marielle Franco), jamais imaginei que eu pudesse passar o que eu fosse passar. Na verdade, ap�s perder a minha irm�, que era a minha melhor amiga, minha confidente, eu confesso a voc�s que eu fiquei com muita vontade, muita gana de lutar, principalmente pela popula��o negra, mas em momento nenhum passou pela cabe�a virar ministra de Estado.

A Mari era a pessoa respons�vel por mim quando meus pais n�o podiam, por exemplo, ir � escola me buscar ou me levar. Ela come�ou a ter muita responsabilidade muito nova. Ela engravidou num per�odo que eu estava para completar meus 15 anos – e eu vou para os Estados Unidos um pouco depois disso, eu vou com 16 para 17 anos.

Ela conversava assuntos comigo que, �s vezes, eu tinha um pouco de vergonha e era acanhada de falar com a minha m�e e com meu pai. Acho que todo adolescente tem essa pessoa, e que bom que eu tinha minha irm�. Ent�o, ela me moldou como m�e, como mulher, como irm�, como tia.

A gente dividia muita coisa: desde roupa a confid�ncias de namorados de adolesc�ncia. Eu diria que ela me influenciou e influencia em tudo. Se eu sou, hoje, a mulher que eu sou, eu devo muito a ela e � minha m�e porque foram as mulheres que me moldaram, que me criaram, que me ensinaram a n�o abaixar a cabe�a, nunca desistir dos meus sonhos e a lutar pelos meus ideais.

"Eu diria que ela me influenciou e influencia em tudo. Se eu sou, hoje, a mulher que eu sou, eu devo muito a ela e � minha m�e porque foram as mulheres que me moldaram, que me criaram, que me ensinaram a n�o abaixar a cabe�a"


E foi com elas, tamb�m, que eu ganhei o amor pela educa��o, e com elas que eu coloquei na minha cabe�a que o meu conhecimento ningu�m tira.”

Lula pela igualdade 

“A gente tem trabalhado muito e n�o tem hora para sair daqui do gabinete. Vou tentar resumir as pautas priorit�rias que n�s j� fizemos nesse primeiro m�s de governo. Acho que tiveram ali coisas muito pontuais e importantes, como, por exemplo, no dia da nossa posse, que o Lula assina a Lei de Inj�ria Racial para tipificar esse crime de racismo, porque isso tem sido t�o comum, tem acontecido tanto, ent�o foi muito importante esse ato dele.

Para al�m disso, n�s j� tivemos algumas reuni�es muito pontuais e importantes como, por exemplo, com a ministra da Sa�de, N�sia Trindade. Falamos muito sobre a sa�de da popula��o negra, que � uma popula��o que, infelizmente, tem pouco acesso � sa�de p�blica, mas tamb�m tem enfrentado a� nos �ltimos anos um aumento dr�stico de problemas de sa�de mental.

"A gente tem trabalhado muito e n�o tem hora para sair daqui do gabinete"


Ela se mostrou extremamente favor�vel a isso. Acho que, paralelo � inj�ria e paralelo � sa�de, n�s tivemos tamb�m uma reuni�o important�ssima que eu, como professora, vou sempre pautar com o ministro da Educa��o, Camilo Santana, para falarmos do fortalecimento da Lei de Cotas, pra falar, mudar a aplica��o das leis de ensino de hist�ria da �frica na educa��o b�sica.

N�s j� tiramos dessa reuni�o a cria��o de um GT (grupo de trabalho), para debater n�o s� o fortalecimento dessa lei, mas tamb�m no PNLD debater o livro did�tico, porque as pessoas negras precisam ser representadas ali tamb�m no material did�tico. N�s tivemos tamb�m algumas reuni�es aqui que foram important�ssimas, para al�m de deputados e movimentos.

A gente est� escutando todo mundo. E falta s� agora a reuni�o com o ministro Wellington (Dias, ministro do Desenvolvimento e Assist�ncia Social) para o combate � fome. O povo negro est� ali, 70% com fome nesse pa�s. Eu preciso, neste momento, pautar a fome desse povo, ent�o isso � primordial.

Al�m da sa�de, a educa��o e o genoc�dio. A gente precisa; s�o quatro coisas. E � muito dif�cil de eu tirar e medir qual � mais importante do que outra. � por isso que a gente est� se empenhando tanto.”

A��o dos extremistas 

“O que aconteceu no �ltimo dia 8 de janeiro foi muito grave. Foi muito grave, a gente precisa responsabilizar. Aquilo ali foi de um extremismo enorme. A gente n�o pode, em hip�tese alguma, pensar que ideologia pol�tica tem que ser maior do que valores humanos. Eu repito essa frase literalmente desde 2018, quando mataram a minha irm� e cuspiram na minha cara com a minha filha de 2 anos no colo.

Ent�o, assim, aquele dia para mim, eu pensei: 'Gente, pensar diferente da outra pessoa, ok. Eu posso acreditar em A e voc� pode acreditar em B, mas da� para agress�es, viol�ncia, o desrespeito � maneira de pensar, eu acho que j� � um patamar elevad�ssimo. A gente precisa falar, a gente precisa defender a democracia, a gente precisa trazer essas pautas para dentro de todos os �mbitos poss�veis de debate.

"O que aconteceu no �ltimo dia 8 de janeiro foi muito grave. Foi muito grave, a gente precisa responsabilizar. Aquilo ali foi de um extremismo enorme"


� inadmiss�vel que no Brasil, na diversidade que temos dentro desse pa�s, a gente ainda precise explicar o �bvio. E o respeito, a empatia, isso faz parte do �bvio. Depois que tomei posse, desde o dia primeiro, eu tenho repetido que todos os dias s�o dias que eu literalmente sinto um sentimento de elei��o.

A gente sabe que est� lidando com pessoas que pensam diferente, a gente sabe que vai ter um Congresso muito dif�cil tamb�m, desafiador, mas eu acredito no di�logo. Eu acredito que a gente vai conseguir. O m�nimo que seja. Sentar, dialogar, conversar, propor, pensar junto. �bvio, se houver um respeito. Se houver ali uma articula��o onde a gente possa entender o ponto do outro sem transpassar o limite do respeito e da empatia.

Desde que assumi, eu n�o recebi nenhuma amea�a. At� o dia 1º, eu recebi algumas coisas bem racistas, algumas frases que n�o vale nem a pena repetir, me xingando. Tamb�m se referindo � cor da pele, � minha irm�, mas nenhuma amea�a.”

Legado da mulher negra 

 

“Acho que se conseguir alcan�ar 50% de todos os meus sonhos aqui, eu vou estar satisfeita. Mas eu quero que seja um legado deixado, principalmente, para as meninas jovens, de favela, negras, pobres, de olharem e entenderem que atrav�s do estudo, atrav�s da luta, a gente consegue estar em lugares que n�s nunca imagin�vamos. Eu poderia estar aqui ap�s a morte da Mari, mas eu n�o estaria aqui do jeito que eu estou hoje se n�o fosse pela minha fam�lia.

"Quero deixar um legado onde a gente possa fazer com que posses, como a minha e da S�nia (Guajajara), sejam a��es recorrentes nesse pa�s"


Ent�o, eu espero que o meu legado seja o legado de luta, um legado de uma pessoa que fez muito pela popula��o negra, um legado que deixe marcas hist�ricas agora, tanto aqui, quanto no mundo afora; de como �, de fato, a gente transformar um luto em luta, e do que a gente precisa deixar para as pr�ximas gera��es: para as minhas filhas, para as minhas netas.

Que seja de uma vez por todas um entendimento de que a pauta racial � crucial nesse pa�s, que ela precisa ser respeitada. Eu quero deixar um legado de muita luta, de muita for�a. Quero deixar um legado onde a gente possa fazer com que posses, como a minha e da S�nia (Guajajara, ministra dos Povos Origin�rios), sejam a��es recorrentes nesse pa�s, e que, quem sabe, dentro dos pr�ximos, anos, a gente consiga fortalecer para descobrir quem foi que mandou matar a Marielle.”


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