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Estado de Minas GUERRA

Os erros e acertos da estrat�gia de Lula na guerra da Ucr�nia

Analistas e diplomatas consideram positiva a neutralidade brasileira no conflito, mas dizem que presidente erra o tom de algumas declara��es


19/04/2023 08:12 - atualizado 19/04/2023 08:27

Lula discursando no microfone, com bandeira do Brasil atrás
Analistas e diplomatas entrevistados veem com bons olhos a neutralidade brasileira no conflito, mas dizem que Lula erra o tom de algumas declara��es (foto: Andr� Borges/EPA-EFE/REX/Shutterstock )

Declara��es do presidente Luiz In�cio Lula da Silva (PT) de que as pot�ncias ocidentais estariam incentivando a guerra na Ucr�nia — na��o invadida pela R�ssia — provocaram fortes rea��es negativas por parte de Estados Unidos e Uni�o Europeia.

Por um lado, analistas de pol�tica externa e diplomatas ouvidos pela BBC News Brasil consideram que a estrat�gia do governo de manter a neutralidade e tentar contribuir para a paz no conflito � correta e segue a tradi��o brasileira de valorizar o multilateralismo. O pa�s busca, assim, um equil�brio entre as grandes pot�ncias, j� que, de um lado, EUA e Uni�o Europeia t�m apoiado a Ucr�nia, enquanto a R�ssia tem mantido boa rela��o com a China.

"O Brasil � uma pot�ncia m�dia. N�o temos for�a militar nem econ�mica particularmente relevante. Ent�o, precisamos de um mundo, na medida do poss�vel, multipolar, em que haja mais de uma pot�ncia forte, para equilibrar", disse � reportagem uma fonte do Itamaraty, ao explicar a decis�o do Brasil de n�o se alinhar a qualquer lado do conflito.

"N�o interessa ao Brasil um mundo unipolar, em que o pa�s fique � merc� do que os Estados Unidos mandem, nem de que ningu�m mais mande. N�o � uma quest�o contra os Estados Unidos. � uma quest�o sist�mica de evitar que s� um pa�s no mundo mande nas coisas", acrescentou.

Por outro lado, os especialistas criticam o tom das recentes falas de Lula, consideradas pouco diplom�ticas. Parte deles, como o embaixador aposentado Rubens Barbosa, tamb�m questiona se o presidente deveria colocar tanta energia em um tema complexo e distante do Brasil, em vez de concentrar esfor�os em assuntos que o Brasil tem maior potencial de lideran�a, como a agenda ambiental e da seguran�a alimentar.
O estremecimento com as pot�ncias ocidentais, por�m, � visto como "super�vel" pelos entrevistados. Uma visita de Lula ou do assessor especial do presidente, Celso Amorim, a Kiev, seria um gesto interessante nesse sentido, segundo essa avalia��o. O l�der brasileiro j� foi oficialmente convidado pelo presidente da Ucr�nia, Volodymyr Zelensky.

Questionado pela BBC News Brasil, o Itamaraty disse que "o melhor momento para atender o convite est� sendo avaliado".

As falas da disc�rdia

A forte rea��o das pot�ncias ocidentais veio depois de Lula afirmar, durante visita � China na semana passada, que Estados Unidos e Uni�o Europeia estariam incentivando a guerra ao enviar armas para a Ucr�nia. Esses pa�ses, por�m, argumentam que est�o apoiando a defesa ucraniana contra a agress�o da R�ssia, que invadiu o pa�s no in�cio de 2022.

Um porta-voz do governo americano chegou a dizer na segunda-feira (17/04) que a posi��o brasileira “� profundamente problem�tica” e que o pa�s estaria "papagueando (repetindo automaticamente) propaganda russa e chinesa" sobre a guerra.

Ap�s as rea��es negativas, Celso Amorim afirmou que � "totalmente absurdo" dizer que o Brasil papagueia a posi��o russa, em entrevista ao canal Globo News nesta ter�a-feira (18/04).
 
Luiz Inácio Lula da Silva e Xi Jinping caminhando em pátio durante cerimônia
Durante visita � China, Lula (na foto, ao lado de Xi Jinping) afirmou que EUA e Uni�o Europeia estariam incentivando a guerra ao enviar armas para a Ucr�nia (foto: Reuters/Reprodu��o)
Lula, por�m, parece ter recalibrado o tom. Depois de encontrar em Bras�lia com o presidente da Rom�nia, Klaus Werner Iohannis, cujo pa�s faz fronteira com a Ucr�nia, voltou a criticar a invas�o russa, sem afirmar que o governo ucraniano tamb�m teria responsabilidade no conflito, como fez em algumas falas nas �ltimas semanas.

"Ao mesmo tempo em que meu governo condena a viola��o da integridade territorial da Ucr�nia, defendemos uma solu��o pol�tica negociada para o conflito", disse o presidente.

O presidente tamb�m voltou a defender a cria��o de "um grupo de pa�ses que tente sentar-se � mesa tanto com a Ucr�nia como com a R�ssia para encontrar a paz".

O cientista pol�tico Hussein Kalout, pesquisador em Harvard e conselheiro do Centro Brasileiro de Rela��es Internacionais (Cebri), n�o v� falas recentes de Lula "como um alinhamento autom�tico � China e � R�ssia".

"O Brasil n�o � um pa�s que admite subordina��o objetiva de interesses. Nem o Itamaraty admite isso, e nem o governo atual admite isso", disse � reportagem.

No entanto, Kalout considera que algumas declara��es podem afetar a "credibilidade e a confiabilidade" das pot�ncias ocidentais no Brasil.

"Acho que talvez o Brasil deveria apresentar uma abordagem mais propositiva no sentido de conclamar os parceiros hist�ricos e amigos do Brasil, como europeus e Estados Unidos, a trabalharem juntos pela paz, e n�o inferir ou aludir a quem est� alimentando ou n�o o conflito", afirmou ainda.

O delicado equil�brio brasileiro

A invas�o russa � Ucr�nia come�ou em 24 de fevereiro de 2022. Um dos argumentos usados pelo lado russo para tentar justificar o ataque seria impedir o que classifica de cerco � sua fronteira com a poss�vel ades�o da Ucr�nia � Otan — alian�a militar de 30 pa�ses liderada por pot�ncias ocidentais, que se expandiu pelo Leste Europeu, incluindo hoje 14 pa�ses do ex-bloco comunista.

Putin acusa ainda, sem provas, o governo ucraniano de genoc�dio contra ucranianos de origem �tnica russa que vivem nas regi�es separatistas de Donetsk e Luhansk. Ele alega que a invas�o tenta "desmilitarizar e desnazificar" a Ucr�nia.

Por outro lado, a Ucr�nia e outros observadores veem na guerra uma tentativa da R�ssia restabelecer a zona de controle e influ�ncia da antiga Uni�o Sovi�tica, algo visto como desrespeito � soberania da Ucr�nia, que deveria ter o direito de decidir seu destino e suas alian�as.

Passado mais de um ano do conflito, o governo russo � acusado de ter cometido crimes de guerra, incluindo a deporta��o ilegal de crian�as da Ucr�nia para a R�ssia. Por causa disso, o Tribunal Penal Internacional (TPI) emitiu em 17 de mar�o um mandado de pris�o contra o presidente da R�ssia, Vladimir Putin.

Em meio a esse delicado conflito, que divide grandes pot�ncias, o Itamaraty tem mantido equil�brio em suas posi��es na ONU. O Brasil apoiou, por exemplo, duas resolu��es das Na��es Unidas contra a a��o russa. A mais recente, de fevereiro, condenava a invas�o territorial ucraniana e exigia a imediata retirada das tropas russas.

Homem observa prédios parcialmente queimados e destruídos por bombardeios
Pr�dios em Irpin, perto de Kiev, afetados por bombardeios russos (foto: Sergey Dolzhenko/EPA-EFE/REX/Shutterstock )
Essa resolu��o obteve 141 votos a favor, sete contra e 32 absten��es entre os 193 Estados-membros da ONU. Os pa�ses que votaram contra o texto foram R�ssia, Belarus, S�ria, Coreia do Norte, Eritreia, Mali e Nicar�gua. Entre os que se abstiveram estavam China, �ndia, Mo�ambique, Angola e Cuba.

Segundo os especialistas ouvidos, a posi��o brasileira foi coerente com sua tradi��o de seguir os princ�pios previstos na Carta da ONU, de respeito � integridade territorial dos pa�ses, de promo��o � paz e de evitar agress�es entre as na��es. O documento, assinado pelo Brasil em 1945, � o tratado que estabeleceu as Na��es Unidas.

Por outro lado, o respeito � Carta tamb�m explica a decis�o do Brasil de n�o apoiar as san��es impostas pelas pot�ncias ocidentais � R�ssia. Segundo a interpreta��o do Itamaraty sobre esse documento, san��es internacionais s� s�o legais se aprovadas pelo Conselho de Seguran�a da ONU.

Pa�ses desenvolvidos, por�m, discordam dessa interpreta��o e lembram que n�o seria poss�vel aprovar san��es no Conselho de Seguran�a contra a R�ssia porque o pa�s � membro permanente e tem poder de veto.

"Ao Brasil interessa que san��es sejam limitadas ao mecanismo de seguran�a coletiva porque n�o tem capacidade de aplicar san��es unilaterais e teme ser alvo desse tipo de medida. J� os pa�ses poderosos n�o temem ser alvos e s�o capazes de aplicar san��es dolorosas aos demais", nota um diplomata ouvido pela reportagem.

'Falas de Lula destoam da posi��o oficial'
Para o diplomata aposentado Rubens Barbosa, ex-embaixador em Londres e Washington, "a posi��o de equidist�ncia (no conflito) � a �nica poss�vel para o Brasil".

"Levando em conta que o Brasil � um pa�s ocidental, com rela��o muito estreita com os Estados Unidos, mas que hoje tem grande interesse na �sia. Levando em conta tamb�m a depend�ncia que n�s temos de importa��o de fertilizantes da R�ssia, a exporta��o de produtos agr�colas para a China", ressaltou.

Na sua vis�o, o problema de algumas falas de Lula � que elas est�o destoando da neutralidade oficial brasileira.

"Quer dizer, voc� tem uma posi��o do Itamaraty, que define a posi��o do governo brasileiro na vota��o da ONU condenando a R�ssia por causa da invas�o, e agora voc� tem umas frases do presidente que est�o sendo interpretadas como uma mudan�a de posi��o, como fazia (o ex-presidente Jair) Bolsonaro", comparou.

"Ele (Bolsonaro) falava uma coisa e o Itamaraty fazia outra. No meio ambiente, na (rela��o com a) R�ssia, na (rela��o com) China. Ent�o o Lula est� repetindo o Bolsonaro", disse ainda.

'Estremecimento � super�vel'
Apesar de considerar as falas negativas, Rubens Barbosa n�o acredita que as declara��es feitas at� o momento sejam suficientes para causar algum dano relevante na rela��o com Estados Unidos e Uni�o Europeia, tendo em vista a boa rela��o hist�rica do Brasil com esses pa�ses e o fato de a posi��o oficial do pa�s na ONU n�o ter mudado.

Outro fator que pode contribuir para superar o epis�dio � o desejo das pot�ncias ocidentais de refor�ar essa boa rela��o hist�rica com o Brasil, ap�s algumas tens�es durante o governo de Jair Bolsonaro, nota Hussein Kalout.

Na sua vis�o, Lula tem a seu favor o fato de ser visto internacionalmente como um democrata, em contraste com seu antecessor.

"Esse momento de aparente estremecimento � absolutamente super�vel porque h� uma converg�ncia maior de agenda e complementaridade mais aguda de interesses entre Lula e Europa e o governo (americano de Joe) Biden", disse.


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