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Estado de Minas QUILOMBOLAS

Por que Brasil enfrenta julgamento na Corte Interamericana de Direitos Humanos?

Caso est� relacionado � instala��o do Centro de Lan�amento de Alc�ntara, no Maranh�o, e � remo��o de mais de 300 fam�lias da regi�o.


26/04/2023 08:32 - atualizado 26/04/2023 08:43

A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) inicia nesta quarta-feira (26/4) a audi�ncia p�blica que julgar� o Brasil por poss�veis viola��es de direitos humanos contra as comunidades quilombolas de Alc�ntara, no Maranh�o.

O caso est� relacionado � instala��o do Centro de Lan�amento de Alc�ntara (CLA), base de lan�amentos de foguetes da For�a A�rea Brasileira (FAB), e � remo��o de mais de 300 fam�lias da regi�o onde o projeto foi constru�do na d�cada de 1980, durante o regime militar.

O julgamento deve se estender at� a quinta-feira (27) e acontece ap�s uma den�ncia apresentada por representantes das comunidades afetadas e entidades da sociedade civil em 2001.

A Corte � uma institui��o aut�noma ligada � Organiza��o dos Estados Americanos (OEA), que tem como objetivo aplicar a Conven��o Americana sobre Direitos Humanos, ratificada pelo Brasil em 1992.

� um dos tribunais regionais de prote��o dos direitos humanos, ao lado do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos e da Corte Africana dos Direitos Humanos e dos Povos.

A audi�ncia p�blica acontecer� de forma presencial na sede do Tribunal Constitucional do Chile, em Santiago, mas ser� transmitida pelas redes sociais.

Entenda a seguir quais foram as consequ�ncias do caso, quais s�o as acusa��es contra o Brasil e qual a posi��o oficial do governo.

O que aconteceu?

O conflito na regi�o remonta � d�cada de 1980, quando a base come�ou a ser constru�da durante o governo do general Jo�o Figueiredo.

Munic�pio com 22 mil habitantes a cerca de 100 km de S�o Lu�s, Alc�ntara fica numa pen�nsula com localiza��o privilegiada para o lan�amento de foguetes e sat�lites.

Pr�ximo � linha do Equador, o centro - inaugurado pela For�a A�rea Brasileira (FAB) em 1983 - possibilita uma economia de at� 30% no combust�vel usado nos lan�amentos.

A constru��o, por�m, levou um territ�rio de 52 mil hectares a ser declarado como de “utilidade p�blica”, segundo a CIDH.

Parte dessa �rea era habitada por 32 comunidades quilombolas que foram realojadas em sete "agrovilas" concebidas pelos militares.

E as disputas territoriais seguem at� hoje. Alc�ntara � o munic�pio que tem o maior n�mero de comunidades quilombolas do pa�s, com mais de 17 mil pessoas, distribu�das em quase 200 comunidades.

O quilombola Nonato Masson, advogado do Centro de Cultura Negra do Maranh�o, afirmou � BBC Brasil que os quilombos de Alc�ntara viveram sem interfer�ncias externas de 1700 at� o in�cio da constru��o do centro de lan�amentos.


Base de Alcântara
Localiza��o de Alc�ntara, pr�xima � linha do Equador, permite economia de 30% no combust�vel usado para lan�ar foguetes (foto: MINIST�RIO DA DEFESA)

O que ser� julgado?

A principal viola��o denunciada pelas organiza��es sociais e representantes locais � a remo��o de 312 fam�lias quilombolas para a constru��o da base, a qual a CIDH se referiu como “usurpa��o do patrim�nio coletivo” das comunidades.

A Corte tamb�m analisa a quest�o da titularidade do territ�rio - concess�o do direito de posse de uma �rea - e da repara��o �s comunidades.

A Constitui��o Federal de 1988 assegura o direito aos remanescentes das comunidades quilombolas, que estejam ocupando suas terras, � propriedade definitiva de seus territ�rios. Al�m disso, a Conven��o n° 169 da Organiza��o Internacional do Trabalho (OIT) tamb�m garante o direito fundi�rio dos povos origin�rios a suas terras.

O caso chegou ao tribunal internacional ap�s organiza��es peticionarem a den�ncia na Comiss�o Interamericana de Direitos Humanos, tamb�m ligada � OEA.

O �rg�o recomendou em duas ocasi�es ao Estado brasileiro que fosse feita a titula��o do territ�rio, a repara��o financeira dos removidos e um pedido de desculpas p�blicas.

Em 2008, o Instituto Nacional de Coloniza��o e Reforma Agr�ria (Incra), chegou a publicar um relat�rio apontando que mais de 78 mil hectares deveriam ser titulados em favor dos quilombolas, mas o processo n�o foi encaminhado.

Como as recomenda��es n�o foram cumpridas, a Comiss�o levou o caso � Corte em janeiro de 2022.


Centro de Lançamento de Alcântara
Centro de Lan�amento de Alc�ntara foi inaugurado em 1983, mas muitos afirmam que seu potencial n�o � plenamente aproveitado (foto: FAB)

H� ainda mais um ponto que deve ser discutido: a realiza��o de consultas p�blicas para efetuar novos deslocamentos de comunidades na regi�o ou fazer obras de amplia��o da base a�rea.

Esse t�pico tem rela��o principalmente com um projeto de expans�o da CLA, incentivado por um acordo entre Brasil e Estados Unidos assinado em 2019.

Apoiadores da proposta afirmam que seria de grande import�ncia para ampliar o aproveitamento da base, que no passado foi pouco utilizada, e desenvolver o setor no pa�s - mais recentemente o centro passou a negociar a opera��o de lan�amentos comerciais.

Mas segundo Servulo Borges, militante do movimento quilombola de Alc�ntara afirmou � BBC, a amplia��o estudada desde os anos 2000 poderia levar ao despejo de mais de 40 comunidades da regi�o.

Na audi�ncia p�blica ser�o ouvidos representantes quilombolas e moradores da regi�o, al�m de especialistas na �rea, indicados tanto pelos denunciantes como pelo Estado brasileiro.

O que dizem os quilombolas?

Segundo as organiza��es que apresentaram a den�ncia � Comiss�o, a instala��o da base alterou intensamente o modo de vida e as pr�ticas culturais das comunidades.

“Nas sete agrovilas nas quais as comunidades foram reassentadas, elas sofreram uma altera��o dos costumes e pr�ticas atuais e s�o at� os dias atuais privadas de condi��es adequadas de vida, com a falta de saneamento b�sico e de pol�ticas p�blicas de educa��o, transporte e sa�de, de liberdade perante o territ�rio e de organiza��o social”, afirmaram as institui��es quilombolas e de outros setores da sociedade civil em um comunicado divulgado � imprensa.

Os denunciantes tamb�m se queixam da falta de iniciativas de repara��o ou reconhecimento da propriedade do territ�rio. “O governo brasileiro teve diversas oportunidades de reconhecer e reparar as viola��es, mas n�o o fez. Os Quilombos de Alc�ntara ainda n�o contam com t�tulos de propriedade coletiva sobre os seus territ�rios tradicionais”, dizem.


Comunidades quilombolas
Alc�ntara � o munic�pio brasileiro com maior n�mero de comunidades quilombolas, segundo lideran�as locais (foto: CONAQ)

Danilo Serejo, quilombola e representante do Movimento dos Atingidos pela Base Espacial de Alc�ntara (MABE), uma das organiza��es envolvidas no processo, afirma tamb�m que mesmo as fam�lias que n�o foram deslocadas em um primeiro momento tiveram suas vidas afetadas. Por isso a compensa��o buscada � para todas as comunidades locais.

“A �rea desapropriada alcan�a mais de 150 comunidades. Mas al�m das pessoas deslocadas na d�cada de 1980, outras muitas perderam os direitos sobre suas terras e vivem h� mais de 40 anos em uma situa��o de incerteza, sempre com o temor de serem despejadas”, afirmou � BBC Brasil.

Serejo explica ainda que o objetivo das institui��es denunciantes n�o � encerrar as opera��es da base ou obrigar o centro a se retirar da regi�o, mas garantir o direito de propriedade e que as comunidades quilombolas tenham voz em projetos futuros envolvendo suas terras.

“Ningu�m est� pedindo que a base seja retirada do munic�pio, mas � preciso que se discuta formas de compensa��o. Nosso entendimento � de que a base est� no nosso territ�rio e n�o o contr�rio”, diz.

E o que diz o governo brasileiro?

Em nota enviada � reportagem, a For�a A�rea Brasileira (FAB), respons�vel pela base, afirmou que h� no caso uma “sobreposi��o geogr�fica de duas pol�ticas p�blicas”.

“Uma voltada ao atendimento do direito constitucional relacionado ao reconhecimento de propriedade e titula��o das comunidades remanescentes de quilombos, e outra voltada �s demandas por um espa�o-porto brasileiro”.


Jovem da comunidade quilombola São Raimundo, em Alcântara, colhe frutos em árvore
Segundo as organiza��es que apresentaram a den�ncia, a instala��o da base alterou o modo de vida e as pr�ticas culturais das comunidades (foto: Getty Images)

A Aeron�utica afirmou ainda que o assunto foi objeto de concilia��o na C�mara de Concilia��o da Administra��o Federal (AGU) em 2009, por�m o resultado desse trabalho n�o foi implementado at� a presente data. “A demora do Estado Brasileiro nesse processo ensejou a submiss�o das reivindica��es da comunidade supostamente afetada �quela egr�gia Corte”, diz.

“A For�a A�rea Brasileira, enquanto Institui��o que comp�e a Rep�blica Federativa do Brasil, est� trabalhando conjuntamente com as demais Institui��es envolvidas (MRE, AGU, MDHC, MIR) no processo de defesa do Estado Brasileiro perante � Corte IDH e reitera o firme prop�sito de alcan�ar um resultado que atenda, de forma equilibrada, os direitos das comunidades quilombolas de Alc�ntara e as necessidades do Programa Espacial Brasileiro, o qual certamente trar� benef�cios socioecon�micos para todo o munic�pio de Alc�ntara e regi�o.”

A BBC Brasil tamb�m entrou em contato com o Minist�rio de Povos Ind�genas e o Minist�rio da Defesa, mas n�o obteve resposta at� a publica��o desta reportagem.


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