
Criada no governo Fernando Henrique Cardoso como forma de reconhecer v�timas do regime, localizar corpos desaparecidos e indenizar suas fam�lias, a comiss�o foi extinta no final do ano passado, no apagar das luzes do governo Jair Bolsonaro (PL), defensor dos militares na repress�o.
Procurado, o governo Lula (PT) mant�m a promessa de recriar o colegiado e reconduzir titulares que haviam sido dispensados por Bolsonaro, como mostrou reportagem da Folha de mar�o. O que, at� o momento, n�o ocorreu, apesar de ser uma pauta importante para a esquerda brasileira.
Segundo integrantes do governo, h� preocupa��o em n�o criar uma nova crise com militares em torno de um tema que � considerado sens�vel por eles.O ministro Jos� M�cio (Defesa) tem acompanhado a recria��o do colegiado e j� se reuniu com Silvio Almeida (Direitos Humanos) para tratar do tema --haver� nova reuni�o nas pr�ximas semanas. Familiares de v�timas j� se queixaram ao governo da demora na recria��o do colegiado.
O Minist�rio dos Direitos Humanos, sob o qual deve ficar a comiss�o, disse � reportagem que j� encaminhou toda a documenta��o e a proposta de decreto para a recomposi��o da comiss�o para a Casa Civil. Al�m disso, disse que o or�amento do grupo ser� de R$ 1,1 milh�o, ante R$ 300 mil na gest�o Bolsonaro.
Mas os minist�rios da Justi�a e da Defesa tamb�m pediram para referendar a comiss�o, o que teria retardado mais um pouco a recria��o. "O MDHC tamb�m se empenhou em garantir as condi��es or�ament�rias", disse a pasta dos Direitos Humanos.
A militante Diva Santana, que integrava a comiss�o na �poca do seu desmantelamento, questiona as dificuldades e a demora para a recria��o do �rg�o.
"Estamos enfrentando dificuldades para que essa comiss�o seja reeditada. Por qu�? A lei existe, est� a�, n�o acabaram com a lei. Para acabar com uma lei tem que passar pelo Congresso, ter discuss�o. Ent�o, n�o tem peso nenhum, na minha opini�o, voc� reeditar uma comiss�o que � da lei", afirma.
Irm� de Dinaleza Santana, uma desaparecida pol�tica, a militante afirma que a paralisa��o prejudica os trabalhos, al�m de prolongar a expectativa dos familiares, que n�o conseguem respostas sobre o paradeiro de seus entes.
"A gente vem enfrentando todas essas dificuldades, passa por governo autorit�rio, passa por governo que faz apologia a torturador, passa por governos democr�ticos, e continua sempre passando por essa dificuldade do n�o reconhecimento", diz.
Al�m da recria��o da comiss�o, a militante espera que haja uma a��o que resulte na abertura dos arquivos militares sobre o per�odo da repress�o.
A recria��o da comiss�o ocorre ainda num momento em que o governo Lula busca pacificar e normalizar a rela��o com as For�as Armadas, ap�s quatro anos de Bolsonaro.
Lula iniciou seu terceiro mandato com uma demiss�o do ent�o comandante do Ex�rcito, ap�s crise de confian�a. Semanas antes, manifestantes golpistas que estavam acampados em frente a quarteis invadiram e depredaram a sede dos tr�s Poderes, ampliando a tens�o.
O tema da ditadura militar e, sobretudo, das v�timas do regime � sempre sens�vel aos fardados.
Na �ltima gest�o do colegiado, antes do desmonte no governo Bolsonaro, uma das principais miss�es era a de retificar atestados de �bito, incluindo como causa da morte "morte violenta causada por persegui��o do Estado".
Foi justamente em uma dessas retifica��es, em 2019, que o ent�o presidente resolveu desmontar o colegiado.
� �poca, no primeiro ano de governo, a comiss�o tinha determinado a corre��o do atestado de �bito de Fernando Santa Cruz, que desapareceu junto com o amigo Eduardo Collier Filho em 1974, depois de serem presos por agentes da repress�o.
O objetivo da medida era que o atestado registrasse que Santa Cruz foi v�tima da viol�ncia de Estado. Mas, como resposta, Bolsonaro trocou 4 dos 7 integrantes do grupo. Entrou, por exemplo, Marco Vinicius Pereira de Carvalho, que � ligado a Damares Alves, hoje senadora pelo Republicanos-DF e ex-ministra de Bolsonaro.
Santa Cruz e Collier Filho fazem parte de uma lista de 243 desaparecidos pol�ticos feita pela Comiss�o Nacional da Verdade. A busca pelo paradeiro dos corpos ainda n�o localizados tem v�rias frentes inconclusas --inclusive por entraves que antecedem a gest�o Bolsonaro.
A procuradora federal Eug�nia Gonzaga estava � frente dos trabalhos na �poca, e integrantes do governo Lula sinalizaram sua recondu��o ao cargo, ap�s ter sido afastada em 2019.
A exemplo dela, outros integrantes daquela forma��o tamb�m devem ser reconduzidos. Com isso, a ideia, segundo interlocutores, � repor o que fora desfeito.
Quando reinstalada, os trabalhos da comiss�o devem dar sequ�ncia �s retifica��es de atestados de �bito e continuar com os trabalhos na vala clandestina de Perus, descoberta na zona norte de S�o Paulo nos anos 1990.
O conjunto encontrado em Perus � composto por 1.049 caixas com ossadas, hoje sob os cuidados do Centro de Antropologia e Arqueologia Forense (Caaf) da Unifesp, que capitaneia as pesquisas.
Quando Bolsonaro trocou a procuradora federal pelo aliado de Damares � frente do colegiado, esse foi praticamente o �nico trabalho que teve continuidade, porque o caso estava judicializado.
O colegiado deve ainda abrir frente para novos reconhecimentos, como de camponeses e de ind�genas, at� hoje n�o reconhecidos individualmente como v�timas do estado.