
Piolhos fazem pessoas se co�arem h� milhares de anos. Eles aparecem na B�blia, se espalharam durante o Imp�rio Romano, causaram epidemias de tifo, ilustram diversas pinturas do s�culo 17 e oferecem at� pistas de como viviam m�mias de quase 2 mil anos.
Tentativas de acabar com os piolhos humanos (Pediculus humanus) tamb�m come�aram l� atr�s. Foram usados p� de cris�ntemo, papoula, artem�sia, �leo de cedro, pomada mercurial, pomada de enxofre e banha, al�m de outros exemplos bastante t�xicos e perigosos.
Hoje, h� tratamentos seguros e eficazes para acabar com piolhos, que t�m se tornado mais resistentes aos tratamentos tradicionais. Em geral, � poss�vel usar rem�dios como cremes ou lo��es com inseticidas piretr�ides, sabonetes criados para combater piolhos, uso de pente fino todos os dias e uma receita caseira com �gua e vinagre (misturados na mesma quantidade) para retirar os ovos.
Mas h� alguns desafios envolvidos para evitar que eles acabem voltando logo depois, j� que uma f�mea adulta pode gerar centenas de piolhos em um m�s. Isso porque os piolhos podem aparecer em fases diferentes ao mesmo tempo: ovos (l�ndeas) e os piolhos adultos.
�s vezes, � preciso adotar um tratamento diferente para cada uma dessas fases diferentes. Por exemplo, uma aplica��o do rem�dio para matar os piolhos, pente fino para tirar os ovos e as l�ndeas, e uma nova aplica��o do rem�dio. Mas m�dicos dermatologistas afirmam que cabe somente aos profissionais de sa�de especializados definir qual � o tratamento correto para cada caso.
As pessoas mais afetadas pelos piolhos costumam ser crian�as de 3 a 11 anos que frequentam escolas, principalmente as meninas — pelo h�bito de, em geral, usarem cabelos mais longos —, explica a m�dica Vania Oliveira de Carvalho, presidente do departamento cient�fico de dermatologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
� poss�vel prevenir a transmiss�o com medidas como evitar compartilhar objetos (como pentes, chap�us e toalhas) ou tratar corretamente todas as pessoas afetadas do entorno. E diferentemente do que diz o senso comum, a presen�a de piolhos n�o tem liga��o com a falta de higiene. Pelo contr�rio, o inseto prefere cabelos limpos, afirma a Fiocruz.
Al�m do inc�modo, do risco de infec��es secund�rias (por bact�rias) e de anemia por causa de piolhos, essa doen�a tamb�m gera problemas de sociabilidade, estigma, estresse e preconceito.

Como o piolho humano vive e se reproduz
Os cientistas estimam que existam quase 3 mil esp�cies de piolho, mas apenas tr�s delas afetam os humanos. Uma delas afeta o couro cabeludo (pediculose da cabe�a), outra atinge o corpo (pediculose do corpo, conhecida como muquirana) e outra a regi�o pubiana (pediculose do p�bis, conhecida como chato, que afeta os pelos pr�ximos ao p�nis ou � vagina).
Estima-se que elas tenham surgido h� milhares de anos, quando os piolhos humanos se separaram dos piolhos que afetam os chimpanz�s. Os piolhos humanos foram identificados e nomeados em 1758 pelo explorador e bot�nico sueco Carl Linnaeus, considerado o pai da taxonomia (parte da biologia que se dedica a identificar, classificar e nomear os seres vivos).
Esses insetos afetam pessoas de todas as rendas e de praticamente todos os pa�ses do mundo. E ningu�m est� imune: eles afetam crian�as, adultos e idosos.
O piolho resiste bem � temperatura do ambiente (mas costuma ceder �s temperaturas mais altas de secadores e "chapinhas"). Ele se gruda ao couro cabeludo para colocar seus ovos, que s�o fixados por uma subst�ncia grudenta, como uma cola, que solidifica o ovo no lugar.
Segundo cientistas, o piolho se alimenta do sangue humano (por isso a coceira) e se instala pr�ximo ao couro cabeludo, por exemplo, porque as condi��es ambientais (como temperatura) s�o melhores para sua reprodu��o.
Normalmente, os piolhos "est�o presentes em pequeno n�mero, em geral menos de 10 piolhos vivos ao mesmo tempo no couro cabeludo, t�m vida curta e podem n�o ser facilmente observados", diz Carvalho, da Sociedade Brasileira de Pediatria.
O ciclo de vida do piolho funciona mais ou menos assim: eles vivem em torno de um m�s. Por dia, cada f�mea coloca quase 10 ovos, chamados de l�ndeas. De 7 a 10 dias depois esses ovos dar�o origem �s ninfas (piolho na fase inicial). De 9 a 12 dias depois, essas ninfas chegam � fase adulta, per�odo em que podem acasalar e dar in�cio ao ciclo de novo, explica a Funda��o Oswaldo Cruz.
Ainda segundo a funda��o, essa prolifera��o acontece mais no ver�o porque "quanto maior a temperatura, mais acelerado � o desenvolvimento do piolho dentro do ovo".
Como identificar as l�ndeas? "S�o forma��es ovaladas (como um ovo), amareladas, aderidas firme e lateralmente na haste do cabelo. Quanto mais pr�xima da raiz dos cabelos maior ser� a probabilidade de ser uma l�ndea da qual o piolho ainda ir� sair", explica Carvalho.
A m�dica dermatologista Fabiane Andrade Mulinari Brenner, coordenadora do departamento de cabelos e unhas da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), afirma que "os piolhos ficam na cabe�a, mas os ovos s�o colocados rente ao cabelo no caso de infesta��o do couro cabeludo. Por isso, � medida que o cabelo vai crescendo, esses ovos v�o sendo vistos mais longe do couro cabeludo, como se fosse um colar de contas, um ros�rio no fio de cabelo".
Como tratar e acabar com o piolho?
O tratamento contra piolhos � indicado apenas para pessoas com infesta��o ativa.
Como dito no in�cio do texto, h� diversas formas de combater o piolho humano. A mais tradicional � usar um pente bem fino desde o couro cabeludo para retirar todas as larvas e todos os ovos.
A Fiocruz afirma que uma mistura de �gua com vinagre (com a mesma quantidade das duas subst�ncias) pode ajudar a combater os piolhos e n�o � t�xica (ou seja, n�o faz mal � sa�de). O vinagre aqui tem o papel de amolecer os ovos (ou l�ndeas).
Segundo a Sociedade Brasileira de Dermatologia, deve-se colocar essas escovas de cabelos (e outros objetos contaminados) dentro da �gua por 10 minutos para matar o piolho.
Os tratamentos mais modernos incluem sabonetes, lo��es e outros tipos de rem�dios. Carvalho, da Sociedade Brasileira de Pediatria, afirma que o "ideal � procurar um m�dico pediatra que indicar� o melhor tratamento para cada faixa et�ria".
Brenner, da Sociedade Brasileira de Dermatologia, explica que o uso de inseticidas como os piretr�ides sint�ticos pode ser t�xico para crian�as com menos de cinco anos. Por isso, os m�dicos podem requisitar formula��es diferentes (com enxofre) para essa faixa et�ria.
Essa contamina��o por rem�dio pode acontecer com crian�as mais novas porque o couro cabeludo � muito grande em rela��o ao tamanho do corpo e o couro cabeludo "funciona como uma esp�cie de esponja que absorve o que � aplicado na cabe�a", explica a Fiocruz.
Mas e no restante da popula��o? O rem�dio mais comum � a permetrina.
"Na maioria das vezes, o que a gente precisa de uma lo��o para tratar o couro cabeludo, voc� vai passar uma lo��o que precisa ficar umas 6 a 8 horas no couro cabeludo e ser lavada no dia seguinte", conta Brenner. "N�o recomendo tratamentos de pouca dura��o, �s vezes o sabonete e o shampoo acabam irritando o couro cabeludo, e n�o tratando adequadamente."
E como se funciona o tratamento mais comum?
"Quando se faz o tratamento, a gente j� programa: voc� vai tratar pelo menos 3 dias, vai dar um intervalo de 7 dias e vai tratar de novo. Tecnicamente, esses inseticidas piretr�ides s�o larvicidas e ovicidas. Ent�o, eles pegariam todas as formas do piolho, mas na pr�tica a gente muitas vezes v� recidiva (ressurgimento da doen�a) se voc� fizer tratamento uma vez", explica Brenner, da Sociedade Brasileira de Dermatologia.
E acrescenta: "�s vezes, voc� trata o piolho e voc� ainda fica com a l�ndea vis�vel. Normalmente, a gente faz um tratamento para tratar esses piolhos que est�o no couro cabeludo e repete o tratamento em 7 dias, para que aqueles ovos possam ser tratados com um novo tratamento."
Carvalho diz que atualmente h� outros rem�dios que podem ser usados contra os piolhos, como a deltametrina e a dimeticona.
As especialistas entrevistadas pela BBC News Brasil alertam para os riscos graves � sa�de de se usar solu��es caseiras, plantas, tinturas e produtos para tratar parasitas em animais dom�sticos, al�m do uso de rem�dios sem orienta��o de profissionais de sa�de.
Uma medida fundamental tamb�m � investigar se quem convive com a pessoa infectada tamb�m foi afetado, como familiares e colegas de escola, para evitar reinfec��o.
"Existe uma justificativa epidemiol�gica para isso: ou porque a gente faz uma resist�ncia imunol�gica (de defesa do corpo humano) ao piolho ou porque ele se dissemina historicamente. Ent�o, voc� trata, vem um surto, voc� trata e �s vezes passam 6 ou 8 anos sem surtos de pediculose. Isso vai diminuindo a imunidade e a aten��o do m�dico, da escola e vem a� novamente um surto. Historicamente, h� surtos de pediculose a cada 6 ou 8 anos, explica Brenner.
Quais s�o os sintomas de uma infesta��o de piolho?
O principal sintoma de uma pediculose � a coceira, que pode fazer com que as pessoas afetadas causem les�es na regi�o afetada. Mas a doen�a pode ser descoberta tamb�m ao se notar presen�a do piolho ou da l�ndea no couro cabeludo.
Brenner, da Sociedade Brasileira de Dermatologia, afirma que a coceira acontece nas regi�es com mais vasos sangu�neos, como a nuca e o pesco�o. Ela lista outros sintomas, como descama��o do couro cabeludo, pontos brancos no cabelo e aparecimento de �nguas atr�s das orelhas e na nuca.
Costuma ser mais f�cil achar as l�ndeas, que s�o os ovos (aqueles pontinhos brancos grudados nos fios de cabelo), do que o piolho em si, que percorre o couro cabeludo e se esconde entre os milhares de fios.
"Se os pais est�o desconfiados, podem olhar cuidadosamente os cabelos � procura das l�ndeas, ou passar um pente fino e observar se caem os piolhos em uma toalha branca, que ajuda a visualizar o agente", afirma Carvalho, da Sociedade Brasileira de Pediatria.

Quais s�o as causas do piolho e como preveni-lo?
H� duas maneiras fundamentais de se prevenir a infesta��o de piolho: evitar compartilhar objetos pessoais e analisar e tratar todas as pessoas que acabam se infectando.
Bon�s, len�os, capacetes e chap�us, por exemplo, podem dificultar a contamina��o de quem usa, mas podem tamb�m ajudar a espalhar piolhos se eles forem compartilhados com outras pessoas. Outros objetos podem colaborar com a transmiss�o, como pentes, travesseiros, prendedores de cabelo e toalhas, al�m do contato de uma cabe�a com outra.
"Crian�as brincam de uma forma muito pr�xima. Isso facilita a transmiss�o", explica Brenner, da Sociedade Brasileira de Dermatologia. Mas sal�es de beleza sem a higiene adequada podem tamb�m ajudar a transmiss�o de piolhos em adultos.
Vale lembrar que os piolhos n�o t�m capacidade de voar nem de pular.
Para Carvalho, da Sociedade Brasileira de Pediatria, a maior forma de preven��o passa pelo tratamento de todos os infectados. "Campanhas nas escolas esclarecem que devem ser procuradas l�ndeas no caso de coceira na cabe�a. Avisar aos pais que h� casos na escola ajudam a efetivar o tratamento de todos os casos, reduzindo assim, a contamina��o."
E quais s�o as causas de uma infesta��o de piolho? A transmiss�o de uma pessoa para outra.
Especialistas lembram que n�o h� qualquer rela��o com a higiene das pessoas, classe social ou h�bitos. "Um mito hist�rico associa a pediculose (infesta��o de piolho) � baixa renda ou � promiscuidade, sem qualquer comprova��o cient�fica", afirma a Fiocruz.
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/geral-61985456
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