Imagem 3D de células

Pesquisadores da USP e colaboradores internacionais compilaram dados de 195 ensaios cl�nicos feitos em 30 pa�ses entre janeiro de 2020 e dezembro de 2021. Apesar dos dados promissores, os autores ressaltam a necessidade de maior controle na elabora��o dos produtos usados nesse tipo de tratamento

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O uso de terapias celulares em pacientes com COVID-19 reduziu em 60% o risco de morte pela doen�a. A conclus�o, divulgada na revista Frontiers in Immunology, � de um estudo de revis�o conduzido por pesquisadores da Universidade de S�o Paulo (USP) em parceria com cientistas alem�es e norte-americanos. O artigo compila dados de 195 ensaios cl�nicos feitos em 30 pa�ses, entre janeiro de 2020 e dezembro de 2021.

Nos �ltimos anos, as chamadas terapias celulares avan�adas t�m ganhado espa�o no combate a diversas doen�as, sobretudo o c�ncer. Basicamente, as t�cnicas consistem em repor c�lulas saud�veis no organismo do paciente, de forma a restaurar ou alterar determinados conjuntos celulares. Outra estrat�gia � modular a fun��o de um conjunto de c�lulas doente pela inje��o de novas c�lulas (ou produtos celulares).

Nessas diferentes t�cnicas, podem ser usadas c�lulas-tronco (ou suas derivadas) do pr�prio paciente (aut�logas) ou de um doador (alog�nicas), que s�o cultivadas ou modificadas fora do corpo antes de serem administradas. De acordo com o estudo, os tipos celulares mais utilizados nos ensaios cl�nicos para tratamento da COVID-19 foram as c�lulas estromais ou tronco mesenquimais multipotentes (oriundas do tecido conjuntivo), c�lulas natural killer (provenientes de linfoblastos) e c�lulas mononucleares (derivadas do sangue), respondendo por 72%, 9% e 6% dos estudos, respectivamente.

"As terapias celulares t�m avan�ado muito nos �ltimos anos e t�m sido usadas para tratar c�ncer, doen�as autoimunes, card�acas e infecciosas. Durante a pandemia, elas foram utilizadas para o tratamento de COVID-19 em diversos ensaios cl�nicos. Nosso trabalho � o primeiro a juntar todos esses dados espalhados pelo mundo e a verificar, por meio de uma meta-an�lise [m�todo estat�stico que permite agregar dados de diversos estudos independentes], o funcionamento dessas terapias no combate � nova doen�a, assim como para os problemas de sa�de desencadeados pela COVID-19", afirma Ot�vio Cabral-Marques, professor da Faculdade de Medicina da USP e coordenador da pesquisa.



O pesquisador lembra que, desde o come�o da pandemia, a terapia com c�lulas-tronco e os modelos de organoides derivados de c�lulas-tronco receberam ampla aten��o como um novo m�todo de tratamento e estudo da COVID-19.

Isso porque c�lulas-tronco, em especial as c�lulas-tronco mesenquimais, t�m apresentado um significativo poder de regula��o imune e fun��es de reparo de dano tecidual. Em rela��o ao pulm�o, por exemplo, os ensaios cl�nicos mostram – em menor ou maior grau – que as terapias celulares avan�adas podem limitar a resposta inflamat�ria grave em pacientes infectados pelo SARS-CoV-2, reduzindo a les�o pulmonar. Dessa forma, o esperado com essas terapias � que ocorra a melhora da fun��o pulmonar, desempenhando um papel positivo contra a fibrose, por exemplo.

A despeito da aten��o que esse tipo de abordagem ganhou, Cabral-Marques avalia ser importante refor�ar os reais efeitos protetores da vacina��o. "Embora os resultados dos estudos mostrem que as terapias celulares avan�adas possam vir a se estabelecer como um tratamento adjuvante importante para pacientes afetados pela COVID-19, em um futuro pr�ximo, a preven��o da doen�a por meio da vacina��o ainda continua sendo a melhor prote��o", alerta.

Padroniza��o dos dados

Os ensaios de terapia celular avan�ada para COVID-19 foram conduzidos em 30 pa�ses, com destaque para Estados Unidos, China, Ir� e Espanha. No entanto, eram estudos muito heterog�neos, n�o s� com n�mero de participantes muito variado, como tamb�m com desenhos e metodologias diferentes.

Dessa forma, para a realiza��o da meta-an�lise, a equipe de pesquisadores fez a curadoria dos dados a serem analisados pelo banco de dados Cell Trials Datae inclu�ram informa��es sobre dados nacionais, al�m de excluir informa��es como falsos positivos e contagens duplas, por exemplo.

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Os autores ressaltam que houve tamb�m varia��o em rela��o �s etapas da pesquisa. Em muitos pa�ses, sobretudo na Europa, h� uma regulamenta��o r�gida sobre terapia celular humana, que limita o n�mero de produtos de terapia celular. Dessa forma, 56% dos estudos nem sequer atingiram a fase 2 da pesquisa cl�nica – que abrange pacientes com a doen�a e tem o objetivo de estabelecer a seguran�a no curto prazo, a dose-resposta e a efic�cia do produto. Outro limitador foi o fato de que 31% dos ensaios cl�nicos analisados n�o contavam com grupo-controle.

"Para chegar a esse valor de redu��o do risco de morte foi preciso levar em considera��o os achados e caracter�sticas dos diferentes estudos, al�m de fazer algumas corre��es e estimativas", explica o doutorando Igor Salerno Filgueiras, coautor do artigo de revis�o.
"Existem t�cnicas para padronizar esses dados, eliminar vieses e ter uma vis�o imparcial. Isso permite chegar a conclus�es que muitas vezes passam despercebidas em um estudo espec�fico, mas, quando refor�adas por outras an�lises, ganham uma vis�o cient�fica interessante", avalia Dennyson Leandro M. Fonseca, bolsista de doutorado da FAPESP que integra a equipe.

O artigo ressalta ainda que os estudos que utilizaram c�lulas mesenquimais apresentavam m�todos de fabrica��o e entrega cl�nica extremamente heterog�neos. "Os resultados destacam o importante papel que os produtos de terapia celular podem desempenhar como terapia adjuvante no manejo da COVID-19 e suas complica��es relacionadas. Mas � preciso ainda controlar os principais par�metros de fabrica��o desses produtos para garantir a comparabilidade entre os estudos", afirma Cabral-Marques. (Maria Fernanda Ziegler)