Liliana German-Castelan, Marco Prado e Vania Prado no laboratório da pesquisa

Liliana German-Castelan, Marco Prado e Vania Prado: conforme o ensaio, o Alzheimer afeta de forma desproporcional as mulheres, que s�o dois ter�os dos pacientes diagnosticados com a patologia quando tem o in�cio tardio

Western University/Divulga��o


Um ensaio liderado pela Universidade Western, no Canad�, demonstra que o estradiol, um dos principais horm�nios sexuais femininos, desempenha papel significativo na forma como a doen�a de Alzheimer se manifesta no c�rebro, com uma poss�vel fun��o protetora. Esse tipo de estrog�nio costuma ser prescrito justamente para atenuar sintomas da menopausa — considerada um marco do envelhecimento das mulheres. Para os autores do estudo — detalhado, nesta ter�a-feira (17/10), na revista Alzheimer & Dementia —, esse cen�rio indica a import�ncia do desenvolvimento de estrat�gias terap�uticas contra a dem�ncia focadas em quest�es hormonais.

Conforme o ensaio, o Alzheimer afeta de forma desproporcional as mulheres, que s�o aproximadamente dois ter�os dos pacientes diagnosticados com a patologia quando tem o in�cio tardio. Pesquisas anteriores mostraram que a doen�a tamb�m � mais grave e progride rapidamente nessas pacientes, que passam por um decl�nio cognitivo mais acentuado, em compara��o aos homens. Para compreender melhor as bases biol�gicas dessas diferen�as, os investigadores canadenses apostaram na an�lise de uma poss�vel influ�ncia dos horm�nios.

Uma das estrat�gias adotadas foi imitar a menopausa em cobaias. "Para reproduzir de forma mais fiel o que vemos em humanos, as f�meas de camundongo deveriam ter n�veis mais baixos de estradiol, semelhantes �s mulheres no p�s-menopausa, quando normalmente desenvolvem a doen�a de Alzheimer", detalha Marco Prado, um dos autores.

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Observando os animais, a equipe constatou que a qu�mica cerebral de ratos machos e f�meas regula a prote�na beta-amiloide de diferentes maneiras, e que o horm�nio estradiol contribui para essa varia��o. O ac�mulo dessa prote�na no c�rebro � um dos principais biomarcadores do Alzheimer e est� ligado aos preju�zos cognitivos.

Prado enfatiza que ainda n�o � certo dizer que a influ�ncia do horm�nio nesse mecanismo de regula��o da beta-amiloide colabora para uma maior ou uma menor incid�ncia de Alzheimer em mulheres, mas � poss�vel que haja uma influ�ncia, avalia. "� dif�cil dizer que contribui, mas pode ser uma possibilidade. Ainda s�o necess�rias mais pesquisas", afirma o pesquisador.

Antioxidante

Segundo Iron Dangoni Filho, neurologista do Instituto de Neurologia de Goi�nia, atualmente, a ci�ncia sugere que o estrog�nio consegue interferir em fun��es neuronais e cognitivas, contribuindo para o retardo da evolu��o da doen�a de Alzheimer. "Os efeitos relatados do estrog�nio no c�rebro incluem propriedades antioxidantes, reduzindo os efeitos neurot�xicos da beta-amiloide. Ele tamb�m age no aumento da utiliza��o de glicose e do fluxo sangu�neo cerebral e tem efeito ben�fico na resposta ao estresse."


 Estudos anteriores mostraram que, em ratos e em pessoas mais velhas com maior risco para a neurodegenera��o, as c�lulas cerebrais que produzem o mensageiro qu�mico acetilcolina, conhecidas como neur�nios colin�rgicos, s�o danificadas pelo ac�mulo prejudicial de beta-amiloide. A acetilcolina � importante para a mem�ria e a cogni��o. Quando a prote�na se acumula no c�rebro, afeta a produ��o de acetilcolina, e a perda subsequente desse mensageiro qu�mico agrava a progress�o do Alzheimer, criando um ciclo prejudicial.

No experimento, a equipe observou que, nas cobaias em uma fase semelhante � menopausa, quando horm�nio sexual estradiol estava presente, a rela��o entre a acetilcolina e a amiloide t�xica era perdida. O resultado � semelhante ao visto em humanos — o grupo tamb�m analisou imagens de resson�ncia magn�tica cerebral de homens e mulheres mais velhos e saud�veis.

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Karen Socher, especialista em cogni��o e membro da Academia Brasileira de Neurologia, explica que, at� o momento, os horm�nios masculinos n�o est�o relacionados com uma maior carga de ac�mulo de prote�nas ligadas ao Alzheimer. "Com novos estudos esperamos que o foco terap�utico seja individualizado de acordo com o sexo da pessoa, podendo ter como foco terapias espec�ficas", afirma a neurologista cl�nica. "Vale lembrar que os estudos atuais com tratamento de reposi��o hormonal nas mulheres s�o inconclusivos em rela��o a sintomas de mem�ria."

Por�m, para o neurologista Amauri Godinho J�nior, essa alternativa n�o pode ser descartada. "Alguns estudos populacionais mostram que pacientes que n�o fazem reposi��o hormonal na senilidade t�m um risco maior de desenvolver Alzheimer. Pesquisas mostram que mulheres que fazem a reposi��o hormonal desenvolvem a doen�a mais tarde, e aquelas submetidas � reposi��o respondem melhor aos medicamentos usados para o Alzheimer", justifica. "Se o homem est� protegido devido a algum horm�nio sexual, � uma coisa especulativa, n�o d� para saber."

Em nota, Vania Prado, orientadora da pesquisa, pondera que esse � apenas um dos crit�rios a serem considerados ao analisar a rela��o do horm�nio sexual e a ocorr�ncia da neurodegenera��o. "Mulheres e homens respondem de maneira diferente aos medicamentos e t�m uma jornada um pouco diferente na doen�a de Alzheimer. Para desenvolver uma terap�utica mais eficaz, precisamos estudar modelos animais que possam reproduzir diferentes aspectos dessa viagem. Os horm�nios sexuais e os n�veis de estradiol s�o apenas um desses fatores."

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Carlos Uribe, neurologista do Hospital de Base, em Bras�lia, refor�a a necessidade de aprofundar o entendimento da doen�a. "� importante continuar estudando os mecanismos porque n�o se sabe exatamente o que a provoca. A nossa melhor hip�tese, at� agora, � o ac�mulo dessa prote�na t�xica, que acaba provocando a morte de neur�nios, mas n�o se sabe exatamente o que acontece. Tamb�m parecem existir outros mecanismos associados que poder�o ser alvos de tratamento", diz.

A equipe canadense planeja, agora, aprimorar os modelos em camundongos para imitar completamente os fatores de risco da doen�a de Alzheimer e o status hormonal. "Tamb�m queremos testar diversos novos medicamentos em potencial para prevenir a degenera��o dos neur�nios que produzem acetilcolina", completa Prado.