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O mundo secreto das confiss�es an�nimas na internet

A internet � frequentemente o lugar onde as pessoas apresentam uma vers�o perfeitamente retocada de si mesmas. Mas e as partes de n�s que normalmente mantemos escondidas? A m�dia social, na forma de "p�ginas de confiss�o" an�nimas, est� assumindo o lugar onde as pessoas podem compartilhar seus segredos mais profundos e sombrios.


05/04/2022 09:17 - atualizado 05/04/2022 12:13


Uma ilustração de alguém olhando para um telefone com olhos assistindo
A popularidade das p�ginas de confiss�o � demonstrada pelo grande volume de seguidores (foto: Getty Images)

N�o h� nada como a sensa��o de jogar para fora algo que est� te sufocando. Mas �s vezes n�o � poss�vel compartilhar um segredo.

Medo, vergonha e estigma podem impedir as pessoas de revelar quest�es profundas e �ntimas. Ou, �s vezes, � uma quest�o de privacidade.

Guardar segredos pode realmente causar danos, "levando � fadiga, isolamento social e uma sensa��o reduzida de bem-estar", de acordo com pesquisadores da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos.

Ent�o, de que outra forma podemos revelar quest�es �ntimas sem ferir a n�s mesmos ou aos outros? Com as redes sociais, surgiram "p�ginas de confiss�es" an�nimas.

'Um espa�o seguro'

Durante s�culos, os humanos se confessam a l�deres religiosos, enquanto nas d�cadas mais recentes programas de r�dio ocuparam esse espa�o, permitindo que as pessoas contem seus segredos de maneira an�nima.

Em 1980, um artista criou a Apology Line ("Linha de Desculpas", em tradu��o literal), que funcionou por 15 anos e permitiu que os nova-iorquinos deixassem mensagens em uma secret�ria eletr�nica. O objetivo era "fornecer uma maneira de as pessoas se desculparem por seus erros contra as pessoas sem se prejudicarem". Recentemente, as fitas foram compartilhadas em um podcast que se tornou popular na cidade, provando que h� um apetite por escutar as confiss�es dos outros.

Agora, em um mundo que busca sempre a perfei��o em contas de Instagram, h� um raro canto da internet onde as pessoas se mostram mais honestas, sem revelar suas identidades: as p�ginas de confiss�o que permitem aos usu�rios compartilhar segredos.


Uma ilustração de uma mulher sentada em um computador parecendo estressada
Manter segredos guardados pode levar a sentimentos de inautenticidade e diminui��o da satisfa��o (foto: Getty Images)

A princ�pio, f�runs e salas de bate-papo formavam o local certo para esse conte�do e, posteriormente, foram desenvolvidos aplicativos dedicados ao assunto.

Mas agora s�o as contas moderadas de rede social que est�o ocupando esse espa�o.

Os segredos compartilhados variam de hist�rias engra�adas a devastadoras - e esse compartilhamento tem uma hist�ria enraizada nas comunidades escolares e universit�rias.

"Se as pessoas puderem se conectar a grupos de apoio na internet, pode ser uma �tima oportunidade para compartilhar segredos anonimamente, sentir-se validado e aprender com outras pessoas que passam por experi�ncias parecidas", diz Zehra Kamal Alam, psic�loga oriunda de Islamabad, no Paquist�o.

"Isso pode ser extremamente �til, especialmente quando se trata de se abrir sobre quest�es tabus de sexualidade, viol�ncia e abuso sexual".

Ela diz que, no espa�o de aconselhamento e terapia, falar sobre problemas � um processo de cura, ent�o n�o � surpresa que as pessoas estejam recorrendo � internet para compartilhar seus segredos.


Uma ilustração de uma mulher sorrindo na tela do telefone
Compartilhar segredos de maneira an�nima cria um senso de comunidade entre leitores e moderadores (foto: Getty Images)

"Nos velhos tempos da internet, voc� podia entrar em um f�rum e gastar seu c�rebro praticamente sem consequ�ncias", diz Rob Manuel, de Londres, o homem por tr�s de uma p�gina de confiss�es chamada Fesshole, bastante popular no Twitter.

"A p�gina n�o � lida por sua fam�lia ou por seu chefe, � apenas um espa�o seguro para descarregar sua mente. Sem ela, com o passar dos tempos, voc� poderia dizer a coisa errada e seu mundo poderia explodir".

"A m�dia social � como um processador de frutas onde, se voc� continuar girando, poder� ganhar milhares de curtidas in�teis e, se parar, pode perder seu emprego."

O Fesshole come�ou h� dois anos e meio e possui mais de 325 mil seguidores. Centenas de confiss�es an�nimas s�o enviadas a Rob todos os dias, e ele seleciona apenas 16 para compartilhar com o p�blico.

"Estou funcionando como uma esp�cie de editor", explica. "Eu n�o vou compartilhar coisas que s�o obviamente falsas, ou que n�o s�o consensuais. H� algumas coisas que s�o apenas sombrias e eu n�o gostaria de incentiv�-las", explica.

As confiss�es de Fesshole incluem a hist�rias banais de um professor que xinga os alunos por tr�s de sua m�scara e uma pessoa que inventa palavras para completar palavras cruzadas.

Outra pessoa escreveu: "Meu padrasto faleceu no ano passado e minha m�e estava com o cora��o partido. Precisei vasculhar as coisas dele e encontrar suas senhas. Acontece que ele estava tendo casos em v�rios sites de namoro. Eu nunca disse a ela, isso partiria seu cora��o ainda mais."

Rob quer que a p�gina seja principalmente c�mica, mas inclui hist�rias mais complexas para dar aos relatos um "alcance emocional".

Combatendo a vergonha e o estigma

Outras p�ginas, como The Secret Keepers, que opera no Instagram, se voltaram para "confiss�es pessoais mais intensas".

"Vivemos em um mundo desprovido de nuances e pode ser dif�cil falar sobre quest�es pessoais intensas com amigos e familiares", diz Olivia Petter, uma das pessoas por tr�s de The Secret Keepers, com sede no Reino Unido.


Uma ilustração de duas mulheres em telefones, uma chorando e outra confortando
Na �ltima d�cada, v�rios aplicativos de confiss�o n�o moderados foram fechados por alega��es de cyberbullying (foto: Getty Images)

"Se voc� se sente sens�vel sobre algo, talvez n�o queira se expor. Parece mais seguro e menos aberto a julgamentos quando voc� � an�nimo, na internet. � por isso que as pessoas t�m terapeutas: voc� diz a eles coisas que nunca diria a seus amigos", diz Petter.

The Secret Keepers fornece um f�rum aberto para apoio e discuss�o sobre as confiss�es compartilhados na p�gina, que incluem uma mulher que se arrepende da maternidade e outra que ama seu parceiro, mas acha sua vida sexual terr�vel.

Os seguidores da conta, que incluem muitos terapeutas e psic�logos, escrevem incentivos e d�o conselhos �s pessoas que fazem as confiss�es.

"Compartilhar segredos pode fazer com que as pessoas se sintam menos sozinhas e mais conectadas quando j� est�o isoladas, al�m de lidar com a vergonha de muitos desses problemas", diz Olivia.

"A p�gina est� realmente repercutindo entre o p�blico, e � ador�vel ver que ela est� realmente ajudando. Esperamos que The Secret Keepers possa ajudar a combater um pouco do estigma em torno dos problemas, mostrando que os sentimentos s�o v�lidos".

Cyberbullying

No entanto, h� um lado ruim nas plataformas de confiss�o, especialmente quando elas n�o s�o controladas.

Embora o anonimato possa incentivar uma discuss�o honesta, tamb�m pode fornecer espa�o para coment�rios imprudentes e cru�is.

O aplicativo Sarahah foi removido das lojas do Google e da Apple em 2018 ap�s acusa��es de que estava facilitando o bullying.

O aplicativo - cujo nome � uma refer�ncia � palavra �rabe para honestidade - foi criado para que empregadores recebam feedback an�nimo e honesto de colegas.

Em vez disso, os usu�rios usavam a plataforma como um dispositivo para praticar cyberbullying.

Aplicativos como Whisper, Secret e Ask.fm fecharam ao longo dos anos depois que os desenvolvedores n�o conseguiram conter o uso indevido e o abuso.

"Os f�runs online tamb�m podem ser explorados por pessoas com outros motivos e podem colocar em risco a seguran�a de alguns grupos vulner�veis", diz Zehra.

"Se eles n�o s�o regulamentados, n�o t�m qualquer forma de estrutura e fiscaliza��o para os usu�rios, pode ser mais prejudicial do que ben�fico. As pessoas podem acabar se sentindo mais sobrecarregadas, recebendo mensagens ruins e ainda mais confusas sobre como lidar com quaisquer desafios de sa�de mental" diz.

Confiss�es em todo o mundo

Mas a tend�ncia das p�ginas de confiss�o � um fen�meno global que continua evoluindo.

No Facebook, existem contas de confiss�o de universidades em todo o mundo, fornecendo uma comunidade aos estudantes por meio de p�ginas moderadas

Em Hong Kong existem contas no Instagram, como Sticky_Rice_Love e Couple.Murmur, que fornecem conselhos sobre sexo e relacionamento aos seguidores atrav�s do formato de confiss�es e respostas.

No Paquist�o, existe uma tend�ncia no Twitter conhecida como "gham hour", no qual os usu�rios tuitam pensamentos e emo��es ap�s a meia-noite. Embora nem sempre an�nimos, os coment�rios apontam para a forma��o de uma comunidade confessional compartilhada.

J� na Cor�ia do Sul esses tipos de sites s�o conhecidos como "florestas de bambu" - isso por causa de uma f�bula em que um homem com um segredo sobre um rei n�o conseguiu guard�-lo para si mesmo e, em vez disso, gritou para uma floresta. A partir de ent�o, conta a f�bula, sempre que o vento soprava, a floresta repetia o segredo do rei.


Uma ilustração de duas mulheres se estendendo de dentro de laptops com um coração entre elas
As p�ginas forneceram uma comunidade inesperada para quem compartilha segredos (foto: Getty Images)

Os benef�cios de confessar tudo

Para muitas pessoas, confessar segredos de forma an�nima pode ser algo muito terap�utico.

Estima-se que at� 75% das pessoas em pa�ses de baixa renda, que est�o enfrentando problemas de sa�de mental, n�o t�m acesso a profissionais de sa�de mental, de acordo com o Programa de A��o de Lacunas de Sa�de Mental da Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS).

"Isso significa que a lacuna de tratamento � enorme", diz Zehra.

"Indisponibilidade de profissionais treinados, foco limitado em atividades preventivas, alcance limitado de servi�os para grupos rurais e de baixa renda e tabus em torno da sa�de mental s�o alguns dos fatores que contribuem".

Zehra tem visto uma tend�ncia crescente de pessoas que acessam cuidados de sa�de mental, no entanto, isso tende a ocorrer em ambientes urbanos.

Embora sua pr�pria experi�ncia de presta��o de cuidados psicol�gicos seja em um ambiente profissional, ela diz que criar um espa�o seguro para compartilhar segredos � essencial para p�ginas de confiss�o na internet.

"Falar sobre problemas pode ser curativo, mas �s vezes tamb�m pode desencadear as pessoas e trazer de volta emo��es negativas", diz ela.

"� importante que as pessoas se sintam seguras e criem seguran�a no processo, para ajudar a gerenciar a experi�ncia se as pessoas ficarem excessivamente ansiosas ou sobrecarregadas".

J� o psicoterapeuta Angelo Foley, que administra uma conta no Instagram na Fran�a chamada Balance Ta Peur ("exponha seu medo", em tradu��o livre), vai ainda mais longe.

Ele diz que h� um benef�cio genu�no tanto para quem confessa, quanto para os leitores que consomem essas postagens an�nimas.

"Ler as confiss�es de outras pessoas � como ler um romance", diz ele. "N�s nos projetamos nele, nos identificamos, as hist�rias dos outros ativam nosso pr�prio processo ps�quico e emocional."


Uma ilustração de uma mulher angustiada em um sofá falando com um homem com uma prancheta
Fornecer um espa�o seguro � essencial para confiss�es, seja em um ambiente terap�utico ou de maneira an�nima (foto: Getty Images)

Ele usa sua conta na rede social para compartilhar anonimamente os medos mais profundos de seus colaboradores para 70 mil seguidores, na esperan�a de que eles se sintam menos sozinhos.

"A p�gina alimenta a curiosidade insaci�vel, um voyeurismo presente em todos os seres humanos", diz Angelo. "Gostamos de saber o que est� acontecendo com os outros por instinto de sobreviv�ncia, para saber se estamos do lado certo ou errado. Acho que o anonimato nos d� a ilus�o de prote��o, seja do julgamento dos outros, seja de nossos entes queridos descobrindo nossos mundos �ntimos."

Angelo foi a primeira pessoa a compartilhar seus medos no Balance Ta Peur, e acredita que seu treinamento como psicoterapeuta lhe deu as habilidades para criar um espa�o seguro para as pessoas confessarem seus segredos

"O medo est� presente em todas as nossas experi�ncias de vida, nossas crises tempor�rias, nossos traumas, nossos sofrimentos, nossos questionamentos existenciais", diz.

"N�o havia espa�o para nos expressarmos essas quest�es. Ajudei a tornar o Instagram algo al�m de uma vitrine das vidas perfeitas e falsas das pessoas".

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