
A primeira vez que vi uma foto do Dem�trio Campos foi em 2019 e, logo em seguida, fui buscar mais informa��es sobre essa pessoa que j� era uma refer�ncia para a comunidade negra e trans. Dan�arino, pintor, produtor e modelo, era muito bom acompanhar pelas redes sociais seus m�ltiplos talentos e compet�ncias.
'E essas persegui��es, abusos, a falta de oportunidade de trabalho, acesso a servi�os de sa�de, as transfobias e o racismo di�rio foram devastadoras para a sa�de mental de Dem�trio. Aos 23 anos, no dia 17 de maio de 2020, Dia Internacional de Combate � LGBTfobia, ele cometeu suic�dio.'
Ele sentia o peso dos olhares de julgamento e de preconceito. Olhares que constrangiam e que tentavam tirar sua humanidade. Dem�trio tamb�m denunciou as diversas agress�es que sofreu durante revistas policiais, falava sobre sua viv�ncia na periferia e tamb�m sobre o apagamento e a invisibilidade dos homens negros trans. Ele tamb�m questionava as expectativas e exig�ncias que s�o geradas pela masculinidade t�xica.
E essas persegui��es, abusos, a falta de oportunidade de trabalho, acesso a servi�os de sa�de, as transfobias e o racismo di�rio foram devastadoras para a sa�de mental de Dem�trio. Aos 23 anos, no dia 17 de maio de 2020, Dia Internacional de Combate � LGBTfobia, ele cometeu suic�dio.
Infelizmente, a hist�ria de Dem�trio n�o � um caso isolado. Uma
pesquisa
realizada em 2015 pelo N�cleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT e pelo Departamento de Antropologia e Arqueologia da UFMG ouviu 28 homens trans e constatou que 24 deles, o equivalente a 85,7%, j� cogitaram ou tentaram o suic�dio.
Al�m disso, um estudo do National Center for Transgender Equality revela que 40% das pessoas trans tentaram autoexterm�nio. J� a pesquisa da Universidade da Calif�rnia, em Los Angeles, aponta para o fato de essa comunidade pensar em suic�dio 14 vezes mais em compara��o � popula��o geral.
'De acordo com o estudo, quem pode usar o nome escolhido em mais ambientes apresenta at� 71% menos sintomas de depress�o, pensa 34% menos em suic�dio e tem o risco de tirar a pr�pria vida reduzido em 65%, em compara��o aos entrevistados que s�o constantemente chamados de outras formas.'
Outra pesquisa, realizada em 2018 e publicado no site
Journal of Adolescent Health
, mostra que respeitar nome social reduz riscos de suic�dio e depress�o. Os pesquisadores conversaram com 129 jovens transexuais, incluindo n�o-binares e g�nero fluido. A pergunta principal era relativa a quais contextos o nome social � aceito na vida dessas pessoas, por exemplo: elas s�o chamadas como gostariam em casa, no trabalho, na escola e com os amigos?
De acordo com o estudo, quem pode usar o nome escolhido em mais ambientes apresenta at� 71% menos sintomas de depress�o, pensa 34% menos em suic�dio e tem o risco de tirar a pr�pria vida reduzido em 65%, em compara��o aos entrevistados que s�o constantemente chamados de outras formas.
Mas, na pr�tica, o nome social das pessoas trans ainda s�o desrespeitados cotidianamente. J�
relatei em um dos meus artigos a luta que travei para utilizar meu nome no ambiente de trabalho
. Nesta semana, publiquei um v�deo em minhas redes sociais explicando porque n�o � interessante perguntar qual � o “nome antigo” de uma pessoa trans e recebi as seguintes mensagens transf�bicas de uma determinada pessoa.
Quase a totalidade da popula��o trans (94,8%) afirma ter sofrido algum tipo de viol�ncia motivada por discrimina��o devido � sua identidade de g�nero, segundo o
Assassinato de Travestis e Transexuais Brasileiras em 2020
. Encarar essas situa��es, coment�rios, “piadas”, julgamentos e preconceitos todos os dias � muito desgastante, machuca, cria um sentimento de n�o pertencimento e leva nossa sa�de mental � exaust�o. N�o � a toa que estudos sobre sa�de de pessoas transg�neros, da revista The Lancet, revelou, em 2018, que aproximadamente 60% da popula��o transg�nero sofre de depress�o.
Suic�dio � um comportamento multifatorial, ou seja, n�o � um fen�meno apenas individual ou ps�quico. As diferentes formas de exclus�o social tamb�m podem ser gatilho para o autoexterm�nio.
'Sabe os coment�rios transf�bicos que recebi nesta semana? Tenho certeza que Dem�trio tamb�m recebeu v�rios semelhantes, v�rias perguntas e %u201Cpiadas%u201D invasivas e agressivas. Sei que v�rias viola��es de direitos atravessaram a vida do filho da dona Ivoni Campos e tudo isso � um grande absurdo.'
Como j� falei em outros artigos, para muitas pessoas, nossos corpos e viv�ncias negras e transexuais s�o uma porteira aberta. Ou seja, podemos ser perseguidos, tocados, questionados e agredidos. Al�m disso, para muitos, nossa exist�ncia pode ser alvo de piadas e coment�rios vexat�rios, como se nossa vida s� servisse como entretenimento ou chacota.
Sabe os coment�rios transf�bicos que recebi nesta semana? Tenho certeza que Dem�trio tamb�m recebeu v�rios semelhantes, v�rias perguntas e “piadas” invasivas e agressivas. Sei que v�rias viola��es de direitos atravessaram a vida do filho da dona Ivoni Campos e tudo isso � um grande absurdo. Dem�trio nunca ser� apenas um n�mero. Ele tinha hist�ria, sonhos, direitos, uma fam�lia, uma m�e, irm�s, irm�os e amigues. Ele foi e sempre ser� uma das nossas maiores refer�ncias.
N�o faltavam empatia e senso cr�tico em Dem�trio. Al�m disso, dona Ivoni, segue fortalecendo o legado do seu filho. Hoje ela faz parte da frente LGBT do Rio de Janeiro e faz servi�o social, encaminhando pessoas trans que s�o expulsas de casa pelas fam�lias. E apesar de tanto dor que carrega pela partida de Dem�trio, Dona Inovi � uma das nossas Ilhas de Acolhimento.
A "piadinha" transfobia, o isolamento e a evas�o escolar, as perguntas inconvenientes e maldosas, o olhar zool�gico, a falta de respeito com o nome social e pronomes, a falta de dados oficiais sobre a comunidade, a falta de acesso ao mercado de trabalho e todas as outras viol�ncias e neglig�ncias do estado, tudo isso somado � uma grande bomba prestes a explodir. O Setembro Amarelo pode ser um bom momento para ressaltar ainda mais a import�ncia da cria��o de pol�ticas p�blicas eficazes para atender as demandas da popula��o trans, entre elas, a��es de preven��o ao suic�dio.
Mas al�m do comprometimento do poder p�blico, voc� que est� lendo esse artigo tamb�m pode contribuir. A sociedade precisa ter no��o de como essas e outras exclus�es sociais s�o devastadoras para a sa�de mental da comunidade trans. Al�m disso, quantas vezes voc� praticou a transfobia e nem percebeu? Aprenda a ser
Ilha de Acolhimento
.