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Estado de Minas COMPORTAMENTO

A transfobia promovida por parte da comunidade LGB

Quando a comunidade LGBTQIAP+ ser� de fato uma ilha de acolhimento?


20/04/2023 11:30 - atualizado 20/04/2023 12:11
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Três pessoas transgênero se reúnem para tirar uma foto com uma câmera polaroid
(foto: Vice/Reprodu��o)

Uma vez, minha esposa e eu est�vamos esperando um �nibus em uma longa fila na Avenida Oleg�rio Maciel, pr�ximo ao Mercado Novo. Isso aconteceu bem no in�cio da minha transi��o de g�nero. A alguns passos de n�s, estavam dois rapazes, um casal homoafetivo. Um deles (branco) come�ou a me encarar, me olhando de cima a baixo com uma cara fechada, fazendo sinal de reprova��o com a cabe�a. O outro rapaz (negro), percebeu a situa��o e, muito sem gra�a, pediu que parecesse. 

Naquele momento, senti um misto de constrangimento e raiva. Por dias fiquei pensando: ‘N�o somos da mesma comunidade? Por que ele me tratou com tanto desd�m e preconceito?”

Depois desse dia, comecei a observar mais como a comunidade LGB olha e trata pessoas trans. N�o demorei muito para perceber que pessoas trans s�o uns dos grupos que mais sofrem com estigmas, falta de visibilidade e representatividade dentro e fora da pr�pria comunidade LGBTQIAP+. 

J� escutei frases do tipo: “Eu sou um cara gay, mas n�o vejo a necessidade dessa tal ‘mudan�a de g�nero’, acho isso uma palha�ada.”

S� para voc� ter uma ideia, quase toda a popula��o trans (94,8%) afirma ter sofrido algum tipo de viol�ncia motivada por discrimina��o devido � sua identidade de g�nero em 2020, segundo o levantamento Assassinato de Travestis e Transexuais Brasileiras.

Encarar essas situa��es, coment�rios, “piadas”, julgamentos e preconceitos todos os dias � muito desgastante, machuca, cria um sentimento de n�o pertencimento e leva nossa sa�de mental � exaust�o. Como falei, essas situa��es infelizmente tamb�m s�o rotineiras dentro da comunidade LGBTQIAP . 

N�o � � toa que estudos sobre sa�de de pessoas transg�nero, da revista The Lancet, revelaram, em 2018, que aproximadamente 60% da popula��o transg�nero sofre de depress�o.   

Esse desd�m e preconceito promovido por parte da popula��o LGB contra a popula��o trans � de longa data. Voc� pode observar isso ao assistir o document�rio “A Morte e a Vida de Marsha P. Johnson”. Essa obra mostra como foi a trajet�ria de Marsha P. Johnson, transexual negra, ativista e drag queen. Ela foi uma das pioneiras pela luta a favor dos direitos da comunidade LGB . Tanto que teve participa��o ativa durante a Rebeli�o de Stonewall de 1969. O document�rio tamb�m mostra como o protagonismo de pessoas trans na luta por direitos foi apagado e tamb�m oferece excelentes provoca��es de como a  comunidade LGBTQIAP , ainda hoje, se mobiliza por algumas demandas, mas quando se trata das demandas da popula��o trans, isso � jogado para escanteio. 

Em um determinado momento, o document�rio apresenta cenas do Com�cio do Dia da Liberta��o de Christopher Street, em 1973, e Sylvia Rivera sobe ao palco. Ela tamb�m foi uma das protagonistas da Rebeli�o de Stonewall. Sob vaias e xingamentos de homens gays, lesbicas e bisexuais,  Sylvia Rivera faz um inflamado discurso: "Passei o dia todo tentando subir aqui [no palco], por seus irm�os e irm�s gays na cadeia, eles me escrevem toda maldita semana pedindo ajuda! E voc�s n�o fazem nada por eles! Mas voc�s me dizem para sair [do palco], com o rabinho entre as pernas. Eu n�o vou tolerar essa m…! Eu j� fui espancada, j� quebraram meu nariz. J� fui presa. Perdi meu emprego. Perdi meu apartamento por causa da liberdade dos gays. E voc�s me tratam assim? Qual � a p… do problema de voc�s?”. 

Marsha P. Johnson e Sylvia Rivera, marcaram a luta pelos direitos LGTBQIAP (quando ainda nem existia essa sigla). 

Em julho do ano passado escrevi o artigo ‘Como � ser uma pessoa negra e LGBTQIAP no Brasil?’ e fiz algumas perguntas. Agora vou fazer algo semelhante que pode te ajudar a perceber como a popula��o trans ainda enfrenta muitas barreiras para ser acolhida de fato dentro da pr�pria comunidade LGBTQIAP . Vamos l�: 
  • Quantas pessoas trans ocupam posi��es de lideran�a em eventos importantes promovidos pela pr�pria comunidade LGBTQIAP , como paradas e marchas ?
  • Qual � o tamanho da representatividade e visibilidade que pessoas trans t�m em palestras, rodas de conversa, webinars e workshops sobre a tem�tica LGBTQIAP ? Essas pessoas t�m protagonismo nesses eventos? 
  • Quantas pessoas trans est�o � frente de empresas que t�m como foco promover diversidade e inclus�o?  

Seja por meio de “piadas”, “brincadeiras”, apelidos, desd�m, falas ofensivas,  estigmas, humilha��o e estere�tipos, j� perdi as contas de vezes que sofri transfobia de pessoas que integram a comunidade LGBTQIAP , sobretudo de homens brancos gays. E tenho certeza que tudo isso n�o acontece s� comigo. 

A transfobia se manifesta dentro da comunidade LGBTQIAP   tamb�m por meio da nega��o do afeto. Muitas pessoas trans n�o se relacionam romanticamente com ningu�m. E muitas vezes isso n�o por escolha. Para muitas pessoas que integram a comunidade LGBTQIAP , a pessoa trans pode at� ser uma “aventura sexual” feita no “sigilo”, mas nunca a pessoa amada.

Ou seja, travestis, mulheres trans, homens trans, trans masculinos, n�o-bin�ries, g�nero fluido, entre outras tantas identidades de g�nero,  ainda s�o invisibilizadas de diferentes formas pela sociedade, inclusive dentro da pr�pria comunidade LGBTQIAP .
 
Quando as pessoas trans ser�o abra�adas, inclu�das, amadas, valorizadas e respeitadas  dentro da comunidade LGBTQIAP ? Quando ser� de fato uma ilha de acolhimento? 

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Quer conversar mais sobre diversidade e inclus�o? Meu nome �  Arthur Bugre, sou homem negro retinto, trans e neurodiverso. Tamb�m sou jornalista e palestrante sobre Diversidade e Inclus�o por meio da Bugre: Diversidade e Inclus�o


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