
Existe um prov�rbio que diz: “Filhos das minhas filhas, meus netos s�o. Filhos dos meus filhos, ser�o ou n�o”. Escuto esse prov�rbio desde que era crian�a e sempre me causou estranheza. Claro, � um prov�rbio que justifica o abandono da fam�lia paterna. O filho � da m�e, sempre. Filho s� � do pai se o pai quiser, enquanto o pai quiser. E a fam�lia do pai, na maioria dos casos, tamb�m se torna ex-fam�lia da crian�a.
Os ex-pais n�o existem por acaso. As fam�lias dos pais, em sua maioria, consideram os filhos dele como obra apenas da m�e. Como se os filhos das filhas fossem mais netos do que os filhos dos filhos. Toda a sociedade � condescendente com esse comportamento masculino de irresponsabilidade e abandono. O abandono paterno � normalizado enquanto a maternidade sempre foi compuls�ria.
Eu mesma tenho um primo que nunca fez parte da fam�lia, nunca pode conviver conosco, nunca foi aceito. Desde crian�a eu sabia da exist�ncia dele, sabia que meu tio tinha esse filho, mas que nunca o assumiu. Na �poca em que ele nasceu, na d�cada de 1960, n�o existia teste de DNA, era a palavra da m�e contra a palavra do suposto genitor. E foi assim que ele foi criado apenas pela fam�lia da m�e. Na minha fam�lia, a m�e dele era tratada por mulher da vida como forma de justificar a irresponsabilidade do pai.
Meu primo j� tinha uns 40 anos quando pode exigir o teste de DNA que comprovou a paternidade. A m�e dele j� havia morrido h� muito tempo. H� alguns anos eu procurei por ele no Facebook, achei e mandei uma mensagem. Nos encontramos uma vez, e passamos a trocar mensagens pelo Whatsapp, ele mora no Rio de Janeiro. Ele tem essa falta latente, a falta da fam�lia do pai, a falta da casa da av� do pai, dos primos e tios por parte de pai. Ele foi negligenciado por todos, como tantos outros filhos s�o negligenciados pela fam�lia paterna.
No caso do meu primo, al�m do abandono afetivo, ele tamb�m nunca recebeu nenhuma ajuda financeira da minha fam�lia. Como se n�o fosse merecedor. Hoje existem leis que obrigam os pais a pagarem pens�o, e eles podem at� ser presos no caso de n�o pagamento. Hoje tamb�m cabe indeniza��o para abandono afetivo. Isso � um avan�o, n�o tenho d�vidas. Mas de que adianta o avan�o legal quando culturalmente ainda estamos presos a conceitos do passado?
H� alguns anos uma amiga entrou na Justi�a para pedir pens�o aliment�cia para a filha que teve com um ex-namorado. Ela precisava que amigos dela, que tamb�m eram amigos dele, testemunhassem a favor dela. Ningu�m quis ser testemunha. Nem homem, nem mulher, ningu�m quis se colocar a favor dela e contra o sujeito que havia entrado na categoria ex-pai da filha dela.
Estes s�o s� dois exemplos que ilustram a realidade de uma quantidade enorme de pessoas. O n�mero de crian�as sem o nome do pai na certid�o de nascimento vem crescendo no Brasil. Este ano mais de 60 mil crian�as foram registradas somente com o nome da m�e. Esse fen�meno n�o se d� exclusivamente pela irresponsabilidade dos genitores, mas tamb�m das fam�lias que naturalizam a quest�o.
Eu tenho um filho adolescente e sempre converso com ele para que ele entenda que � respons�vel pelos seus atos e por suas escolhas. Se n�o quiser ter filhos, n�o jogue a responsabilidade na mulher. A contracep��o � responsabilidade do casal. Camisinha evita gravidez, e evita as infec��es sexualmente transmiss�veis (ISTs). Ele j� aprendeu isso em casa, e no col�gio eles j� aprenderam isso, salve as aulas de educa��o sexual!
Para al�m da educa��o sexual, essa quest�o passa pelo car�ter e pela desconstru��o do machismo. Esse papo de “prendam suas cabras que meu bode est� solto” est� muito ultrapassado! Nenhuma mulher faz filho sozinha, ensine seu filho que ele � respons�vel por cada espermatozoide que sair do seu corpinho e encontrar um �vulo desavisado.