
Da� que qualquer um que aceitasse a miss�o de substituir Ney Franco precisaria estar bem consciente do desafio. Pronto para encarar chuvas e trovoadas. Disposto a ouvir cr�ticas, por causa da press�o por resultados, e confiante de que � poss�vel tornar o terreno f�rtil e colher frutos, apesar das muitas adversidades.
Talvez em tudo isso resida a maior vantagem de Luiz Felipe Scolari. Ele foi o escolhido e, principalmente, escolheu.
Em um espa�o de tr�s dias, recusou oferta celeste, viu outros treinadores muito menos gabaritados (em termos de t�tulos no curr�culo e prest�gio) declinarem convite para comandar o time, mas acordou nesta quinta-feira (15) propenso a topar a parada – sob certas condi��es, claro. Uns t�picos extras no contrato permitiram o acerto.
De todos os nomes, Felip�o � o que tem o couro mais curtido para esse tipo de situa��o. Isso n�o � garantia de nada, mas assegura a ele alguns privil�gios que seus antecessores e at� os que tamb�m foram convidados pela diretoria n�o teriam.
O ga�cho � o tipo de t�cnico que dirigente respeita. N�o descarta depois de sete ou oito jogos, como ocorreu com Enderson Moreira e Ney Franco.
Curtas passagens de treinadores – como t�m ocorrido com o Cruzeiro desde a sa�da de Mano Menezes, no ano passado – dizem mais sobre quem os contrata do que sobre os profissionais em si. Nesse departamento, o clube celeste anda meio perdido em suas escolhas, sem mostrar muita convic��o nos trabalhos.
Felip�o � uma cartada que serve at� como escudo para a presid�ncia, num momento t�o conturbado como o atual. O americano Lisca; Umberto Louzer, da Chapecoense; e Marcelo Chamusca, do Cuiab�, encontrariam um cen�rio bem parecido ao que foi oferecido a Enderson e Ney: ou emplaca uma sequ�ncia vitoriosa logo de cara ou ser� mais um a receber o bilhete azul em tempo recorde. Isso � bem claro.
Com Felip�o � frente do time, � dif�cil imaginar a diretoria cruzeirense estabelecendo metas curtas. Colocando uma contagem regressiva na testa do treinador. Os t�tulos na galeria, o temperamento, os trabalhos anteriores, enfim, o conjunto da obra o credencia a esse patamar.
Nessa conta, entra tamb�m a rela��o carinhosa que o ga�cho sempre teve com o Cruzeiro, desde que deixou o clube para formar a pentacampe� Fam�lia Scolari na Sele��o.
Apesar da cara fechada quase que constantemente e os arroubos de raiva � beira do campo, Felip�o � conhecido por seus jogadores pelo estilo paiz�o. Protege os dele e fecha o grupo em torno de um objetivo.
Tenho uma lembran�a at� doce do treinador, se comparada a algumas respostas atravessadas que ele andou distribuindo a rep�rteres nos �ltimos anos.
Meu relato data de 2001, quando Felip�o estava em sua primeira passagem pelo Cruzeiro. Os treinos ainda eram na Toca da Raposa I, e eu, jovem rep�rter do Estado de Minas; e Roberto Neri, experiente jornalista do Di�rio da Tarde; est�vamos na portaria do CT, � espera do carro da empresa, depois de acompanhar a atividade comandada pelo t�cnico.
Eis que Felip�o, em seu ve�culo importado verde folha, passa pelo port�o e para pr�ximo ao local onde est�vamos. Ele abre a janela e nos pergunta, com o forte sotaque ga�cho: “Est�o � espera de carro? Para onde v�o? Posso lhes dar carona”.
Foi meio inesperado aquele gesto. Agradecemos a gentileza e dissemos que �amos aguardar, porque o carro do jornal j� estava chegando. Ele ent�o sorriu, acenou e seguiu seu caminho.
Em 2014, eu estava, j� como colunista do EM, no fat�dico 7 a 1 da Alemanha em cima do Brasil, de Felip�o, no Mineir�o. A coletiva de imprensa, p�s-jogo, foi uma das situa��es mais surreais que presenciei.
Um Felip�o sem ter muito o que dizer. “O respons�vel sou eu”, afirmou mais de uma vez.
Desde ent�o, aquela derrota vem sendo sempre lembrada, remo�da. A capacidade de se reerguer, de seguir em frente virou a t�nica da vida dele. E hoje Felip�o tem a miss�o de reerguer o Cruzeiro.