
H� pouco mais de cinco anos, a quase metade do pa�s identificada com o governo Dilma Rousseff, sua milit�ncia e certa imprensa de esquerda, n�o abria m�o de que ela fosse chamada de "presidenta".
Achava por bem e afirmativo dispensar a muito competente express�o neutra, comum de dois g�neros, "presidente", que identificou homens e mulheres no comando de organiza��es desde a exist�ncia do portugu�s.
Em t�o pouco tempo, depois de contaminar o pa�s e muito jornal, revista e literatura com a ideia de que n�o havia outra alternativa, a milit�ncia que restou desse tempo deve achar agora que ela deveria ser chamada de… "presidente".
Para n�o dar o bra�o a torcer, talvez "presidentx", igual a outras anomalias que essa milit�ncia d� o nome de linguagem neutra ou "n�o bin�ria", com que pretende outra vez dobrar a sociedade a suas cren�as, como costuma fazer a cada cinco anos.
S� o fato de mudar de projeto em t�o pouco tempo, como se n�o houvesse outra alternativa para a l�ngua desde a chegada de Pero Vaz de Caminha, � para desconfiar por que suas tenta��es de mudar a sociedade � sua imagem e semelhan�a n�o devem ser levadas a s�rio.
A linguagem neutra � um dialeto de uma minoria que, como toda ela, herda ou elege seus pr�prios c�digos para se dar bem e ser melhor entendida entre os da tribo, como o pessoal da inform�tica, os publicit�rios, os surfistas e os patax�s.
Nem por isso, nunca, nem em sonhos, se aventou a possibilidade de que fossem impostos em sala de aula para corrigir diferen�as hist�ricas contra a estrutura lingu�stica da maioria, a que chamam com alta desonestidade intelectual de "linguagem opressora".
A onda � a filha mais nova do politicamente correto, uma milit�ncia de forte voca��o totalit�ria que, oriunda da esquerda americana de j� uns 30 anos, for�a altera��es na linguagem para induzir mudan�as no pensamento e, em seguida, no comportamento.
Come�ou como norma de etiqueta social para proteger minorias de condi��es que n�o podiam alterar, ra�a e cor, que se sentiriam ofendidas por express�es que remetessem a algum tipo de cr�tica � sua condi��o.
A express�o "a situa��o est� preta", por exemplo, que traduz um estado de escurid�o sem sa�da, deveria ser banida. N�o por designar o oposto de uma situa��o de claridade, tranquila, mas porque se constituiria a partir da� em racismo, ofensivo a uma ra�a.
A partir da�, foram ampliando o repert�rio de palavras e express�es proibidas, a n�o ser em seu sentido restrito, como se ressuscitassem o Index Prohibitorum da Idade M�dia, de publica��es proibidas pela Igreja.
Da� para a tentativa de banir todas as palavras e tratamentos que poderiam afetar todas as minorias, n�o s� pela condi��o com que nasceram como pela op��o social que fizeram depois disso. Que, ali�s, nem pode mais ser chamada de "op��o". � "orienta��o", segundo o novo Index.
At� chegar � elabora��o sofisticada de que todas as palavras que definem categorias consolidadas pela tradi��o, como homem e mulher, masculino e feminino, deveriam ser banidas em nome da igualdade.
Era a den�ncia do linguajar estabelecido como forma de corrigir desequil�brios sociais e econ�micos. Seria derivado de preconceitos cristalizados pela linguagem dos dominadores, opressora, a� entendido como o restante da sociedade fora de seu c�rculo.
Onde que express�es como "todes" ou "iles" ou "amigues" devem substituir as express�es "todos ou todas", "eles ou elas", "amigos ou amigas". "Todos" n�o pode expressar um conjunto de pessoas, de qualquer sexo, como veio do latim, porque seria opressor.
Poderia parar por a�, at� como curiosidade inocente de tribos minorit�rias, n�o fosse alavancada na tese de que o sexo — e n�o s� as palavras — � uma constru��o social que pode ser modificado. E que a fam�lia, formada por homem e mulher, � mera conven��o.
A� � que a porquix torce o/a rabix. Um ponto de inflex�o filos�fico que, em bom portugu�s da norma culta, significa a impossibilidade pr�tica de que um su�no do g�nero feminino possa torcer a protuber�ncia a partir do c�ccix que nos quadr�pedes se d� o nome de cauda.
Ao impor o seu dialeto como condi��o de mudar a forma de falar, depois de pensar e, em seguida, de agir, o movimento trai uma inten��o mais cavilosa de fazer engenharia social de baixo para cima, totalitariamente.
Arrebentar a porta, como digo neste artigo sobre o movimento LGBT. E utilizando a escola, o centro irradiador de saber, como aparelho de luta.
Que � o primeiro motivo pelos quais a escola n�o deve embarcar nessa, sobretudo porque h� uma linha muito segura onde ela n�o deve ultrapassar, que � na educa��o sexual de nossos filhos.
O segundo � que essa reengenharia social pugna por destruir a norma culta, da mesma forma que, no passado, ao modo Paulo Freire de aproveitar a experi�ncia, ensinava para os alunos que "n�is vai" n�o � necessariamente errado.
Se a escola quer ensinar a pensar e raciocinar com independ�ncia, ela deve mais do que nunca se atracar � norma culta. N�o s� obrigat�ria por lei, mas porque � o caminho mais seguro de dar a seus educandos compet�ncia para elaborar pensamentos mais sofisticados.
E terceiro porque tem mais o que fazer, outros dialetos a estudar, como ali�s j� fazem, com o de �ndios, e linguagens mais urgentes a cuidar, como tamb�m j� fazem, para incluir pessoas de fato necessitadas de aten��o, como cegos, surdos, mudos e autistas.
Que, sintomaticamente, n�o � objeto de preocupa��o do projeto de inclus�o desses novos engenheiros sociais do novo index proibitivo, engajados no prop�sito de dobrar a sociedade a seu dialeto. (Como explicar em linguagem de libras de quem se est� falando com o "ile"?)
C�ntia Chagas, uma professora de portug�s brilhante que est� bombando em entrevistas nas redes sociais com muito dos argumentos que desenvolveu num artigo para o Estado de Minas, que aproveito aqui, lembrou muito bem que defender cegos, surdos e mudos "n�o engaja", como � o fim �ltimo dessa milit�ncia.
Ela delimita muito bem o campo em que atuam. Que n�o �, como em geral se generaliza, "coisa da esquerda", nem de pessoas de carne, osso e orienta��es sexuais diversas que est�o perto de n�s, mais preocupadas com sua vida do que com pol�tica.
Para ela, toda a onda � criada por pol�ticos que manipulam minorias em busca de voto e, como sempre, fomentada pelas �reas de Ci�ncias Sociais da universidade, que desde os anos 80 vem fazendo milit�ncia identit�ria para for�ar a igualdade pela mudan�a da linguagem.
N�o quero dizer — e quem sou para isso? — que a escola n�o deva tratar dos novos dialetos, como tamb�m trata de outros, g�rias, neologismos, estrangeirismos, que s�o fen�menos que, mais cedo ou mais tarde, ser�o incorporados � norma culta.
E nem que v� subtrair dos jovens as discuss�es da tal "constru��o social". Que, ali�s, j� parece meio tarde. Converse com seus filhos no caf� da manh� para saber que s�o da gera��o mais despreconceituosa, da hist�ria, em rela��o a gays, negros e fam�lias n�o tradicionais.
Mas que mantenha dist�ncia. Acho altamente inadequado um professor saudar os alunos com "Bom dia a todes", como sei que existe, ou a dire��o da faculdade mandar um email com "amigues", que tamb�m ocorre.
N�o � uma bobagem ou um fato isolado. � uma distor��o no lugar inadequado. Uma a��o de agente de milit�ncia metido a moderninho que pode estar consciente ou inconscientemente atuando para dizer aos alunos que a escola chancela a nova onda. Chancela?