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Estado de Minas RAMIRO BATISTA

Artigos falsos em revistas cient�ficas exp�em milit�ncia da universidade

Entenda o esc�ndalo que provou como � poss�vel publicar qualquer bobagem identit�ria na �rea de Ci�ncias Sociais desde que inclua seus chav�es e sua literatura


02/11/2021 07:00 - atualizado 03/11/2021 09:43

Ato do Black Lives Matter em Washington
(foto: Tasos Katopodis/Getty Images/AFP)
Em meados de 2018, uma das publica��es cient�ficas americanas l�deres da geografia feminista, a Gender, Place & Culture, publicou com alta badala��o e destaque entre os 12 melhores de sua edi��o comemorativa de 25 anos o artigo "Parques Caninos".

Uma defesa do adestramento de homens como c�es como forma de combate � cultura do estupro, a partir da observa��o de que parques caninos s�o espa�os de apologia ao estupro. Assentava-se em vasta literatura de estudos de ra�a, g�nero e identidade e um t�tulo prolixo t�pico desse universo: "Rea��es Humanas � Cultura do Estupro e � Performatividade Queer em Parques Urbanos para C�es em Portland, Oregon."

Tinha passado pelos tr�mites longos e rigorosos de aceita��o de artigos cient�ficos, com exame e refuta��o de pares da academia, e colhido pareceres empolgados como o de que significava "contribui��o importante � geografia animal feminista". Ou:

“Este � um artigo maravilhoso, incrivelmente inovador, rico em an�lise e extremamente bem escrito e bem organizado, dados os conjuntos de literatura incrivelmente diversos e quest�es te�ricas postas em quest�o. O desenvolvimento que a autora faz do foco e das contribui��es do artigo � particularmente impressionante. O campo de trabalho desenvolvido contribui imensamente � contribui��o do artigo como um trabalho acad�mico inovador e valioso, que atrair� os leitores de uma ampla gama de disciplinas e forma��es te�ricas.”

Por essa mesma �poca, a n�o menos respeit�vel Sexuality & Culture, publicou outro em defesa da tese de que  o uso de consolos por homens pode ajudar a combater a transfobia e refor�ar valores feministas. T�tulo: "Entrando pela Porta dos Fundos: Desafiando a Homohisteria e a Transfobia de Homens Heterossexuais atrav�s do Uso de Brinquedos Er�ticos Penetrantes". T�o fundamentado, analisado e aprovado quanto:

"Este artigo � uma contribui��o incrivelmente rica e empolgante ao estudo da sexualidade e da cultura, e particularmente da intersec��o entre a masculinidade e a analidade. … Essa contribui��o, por certo, � importante, vem em boa hora e � digna de publica��o."

A Sex Roles publicou sob os mesmos tr�mites outro sobre objetifica��o sexual a partir da an�lise de homens que frequentam restaurantes de gar�onetes de peito semi exposto, os "peitaurantes", como sintoma de heran�a patriarcal e desejo de dar ordens a mulheres atraentes: "Uma Etnografia da Masculinidade de Peitaurante: Temas de Objetifica��o, Conquista Sexual, Controle Masculino, e Firmeza Masculina num Restaurante Sexualmente Objetificador"

E a tamb�m honor�vel Fat Studies publicou sob o mesmo rigor a tese de que "o corpo gordo � um gordo legitimamente cultivado" e que a obesidade m�rbida � um estilo de vida saud�vel, distorcido pelas "normas culturais que fazem a sociedade considerar o cultivo de m�sculos em vez de gordura como algo admir�vel". T�tulo: "Quem S�o Eles Para Julgar?: Superando a Antropometria, e um Arcabou�o para o Fisiculturismo Gordo".

Entre os elogios dos pareceristas, uma restri��o ris�vel, reveladora das obsess�es dessa tribo:

"[O] uso do termo ‘fronteira final’ � problem�tico ao menos de duas formas. Primeira — o termo ‘fronteira’ sugere a expans�o colonial e a posse hostil, e o apagamento genocida dos povos ind�genas. Encontre outro termo.”

Tr�s outras grandes publica��es analisavam empolgadas, pela ordem, 

- um artigo sobre a masturba��o masculina como ind�cio de viol�ncia sexual contra a mulher, mesmo que ela n�o consinta ou saiba, 

- um outro sobre o risco de a intelig�ncia artificial se transformar numa constru��o masculinista e 

- um terceiro, uma vers�o feminina de Mein Kampf de Hitler ("Minha Luta � Nossa Luta").

At� saberem que, como os quatro primeiros, se tratavam de um embuste, uma fraude monumental, produzidos com metodologias question�veis, estat�sticas implaus�veis, alega��es n�o sustentadas pelos dados e an�lises qualitativas motivadas puramente por ideologia.

Foram perpetrados sob pseud�nimo por um professor de filosofia, um doutor em matem�tica e uma pesquisadora de textos medievais escrito por e sobre mulheres. Dispostos a provar, como provaram, que � poss�vel publicar qualquer bobagem da moda na pol�tica em publica��es cient�ficas respeit�veis de estudos de g�nero, desde que cheia de clich�s ideol�gicos e envernizada por cita��es da literatura da �rea.

— Conforme progred�amos, come�amos a perceber que mais ou menos qualquer coisa poderia funcionar, contanto que ficasse dentro da ortodoxia moral da �rea e demonstrasse um entendimento da literatura existente — escreveram na s�ntese do trabalho a que chamaram "Estudos de Ressentimento", neste site, traduzida pelo bi�logo geneticista Eli Vieira. 

Peter Boghossian, Helen Pluckrose e James A. Lindsay produziram em um ano 20 artigos totalmente fraudulentos, mas dentro dos c�nones exigidos pelo meio acad�mico, com ampla fundamenta��o da literatura da �rea e submiss�o ao escrut�nio de seus pares, al�m dos clich�s e do t�tulo rebuscado, claro.

Conseguiram publicar sete, um �ndice alt�ssimo em t�o pouco tempo no meio, e andavam com outros sete em corre��o, na imin�ncia de publica��o, quando foram denunciados por um curioso de rede social (Real Peer Review) e expuseram em longa entrevista ao Wall Street Journal o prop�sito da empreitada.

Denunciar o ativismo predat�rio dentro das �reas de Ci�ncias Sociais e Humanidades das universidades, menos preocupado em descobrir a verdade do que em denuncismo social, um tipo de curandeirismo que nega a ci�ncia e a raz�o em nome de outras formas de saber n�o comprov�veis. 

Desqualifica como problem�tica a verdade produzida pelo m�todo cient�fico, a que d�o nome de "constru��o social", que n�o passaria de maquina��o intencional ou inadvertida de "grupos poderosos para manter seu poder sobre os grupos marginalizados."  E "problematiza aspectos da cultura nos m�nimos detalhes para tentar diagnosticar desequil�brios de poder e opress�o com raiz na identidade". Ou seja, conforme escrevem:

"Para os acad�micos dos estudos de ressentimento, a pr�pria ci�ncia e o m�todo cient�fico s�o profundamente problem�ticos, se n�o flagrantemente racistas e sexistas, e devem ser refeitos para avan�ar a pol�tica identit�ria baseada em ressentimento acima da busca imparcial da verdade. Alega-se que esses saberes, dependendo do ramo de “teoria” invocado, pertencem �s mulheres e �s minorias raciais, culturais, religiosas e sexuais. N�o apenas isso, s�o considerados inacess�veis a castas mais privilegiadas de pessoas, como homens brancos heterossexuais."

Em linhas gerais, na pr�tica, negam como "constru��es sociais" cristalizadas que 

- haja diferen�as cognitivas e psicol�gicas entre homens e mulheres, 

- a medicina tradicional seja superior a pr�ticas de cura tradicionais ou espirituais, 

- as normas culturais do ocidente que deram �s mulheres e aos LBGT direitos iguais sejam superiores a normas religiosas ou culturais n�o ocidentais e

- ser obeso n�o seja um problema de sa�de limitante.

— O problema � epistemol�gico, pol�tico, ideol�gico e �tico, est� corrompendo profundamente o trabalho acad�mico nas ci�ncias sociais e humanidades e se espalhando para a cultura. O cerne do problema � formalmente chamado de “construtivismo social”, uma ideia perigosa de que devemos, com bases morais, rejeitar em grande parte a cren�a de que o acesso � verdade objetiva existe (objetividade cient�fica).

Esperavam que a den�ncia desse �s pessoas — "especialmente �s que acreditam no liberalismo, no progresso, na modernidade, na investiga��o aberta e na justi�a social — um motivo evidente para ver a maluquice identit�ria vindo da esquerda acad�mica e ativista e dizer 'n�o, n�o vou me juntar a isso. Voc�s n�o falam por mim'”.


Boghossian despertou para o problema em 2012, diante do aumento de agressividade em sala de aula na Portland State University, do Oregon, onde lecionou por mais de dez anos, dos 25 de sua carreira, filosofia, �tica e pensamento cr�tico.

De repente percebeu que estava ficando problem�tico apresentar argumento contr�rio a uma cren�a da moda, "que � o que se faz em filosofia: analisa duas opini�es contrastantes, pontos fracos e fortes, e tira a sua conclus�o". Porque � como se constr�i racioc�nio cr�tico e � papel da universidade oferecer, n�o s� para combater preconceitos como para orientar devidamente pol�ticas p�blicas com dados objetivos.

Opini�o sem dados � preconceito, disse numa entrevista em que exemplificou: se voc� diz que a pol�cia americana para ou mata mais negros que brancos, � preciso ir l� e medir para ver se � verdade e encarar verdades inconvenientes. 

N�o teorizar a priori que � racismo estrutural ou resqu�cio de domina��o ancestral branca, acrescento. Se a pol�cia tem uma larga faixa de negros e certamente por isso negros tamb�m matam negros, como no Brasil, como fica a teoria?

Foi agredido de diferente formas quando tentou explicar o que acreditam as pessoas que defendem fechamento de fronteiras, que h� diferen�as f�sicas entre homens e mulheres e o problema do islamismo radical. Um aluno o acusou de racista e se retirou da sala quando ele tentou explicar o b�sico de que Isl� n�o � ra�a, � religi�o, e que ra�a n�o se escolhe.

Num primeiro momento, ele come�ou a acreditar que a contamina��o ideol�gica e a intimida��o de estudantes, administradores e outros departamentos atingiam “um n�mero razo�vel de pessoas”, mas “em um pequeno n�mero de faculdades”. 

Mais tarde, quando testou sua hip�tese num artigo em uma revista de baixo prest�gio que o p�nis era um "conceito constru�do socialmente”, que chegam a “muita gente em um pequeno n�mero de faculdades”. At� concluir, depois do est�ndalo, que eram comuns a “quase todas as pessoas nas universidades”.

At� o ponto em que foi demitido — ao inv�s de promovido — da Portland, no rastro da pol�mica, depois de ouvir do reitor o disparate de que a fun��o da universidade era fazer justi�a racial. N�o produzir conhecimento independente, como deve ser.

E tomar consci�ncia de que o sistema todo estava infectado, como disse em entrevista recente � Gazeta do Povo, de Curitiba, onde previu que a doen�a que chegou ao estado atual de cancelamento e lacra��o, para n�o ouvir o outro lado, vai piorar ainda muito antes de melhorar.

— A cultura woke est� piorando porque as universidades continuam a formar gente com essa bobagem, nesse sistema de cren�as doentio e perigoso.

Vai melhorar um dia porque, segundo ele, "criamos uma cultura em que as pessoas fingem acreditar no que de fato n�o acreditam. Isto n�o � sustent�vel. Ningu�m aguenta viver assim".

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