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Estado de Minas RAMIRO BATISTA

Pesquisa eleitoral � outra das institui��es abatidas pelo bolsonarismo

Bolsonaro ajudou a internet a derrubar institui��es como imprensa, partidos e formadores de opini�o


04/10/2022 06:00

Bolsonaro
O fiasco dos meios tradicionais de forma��o de opini�o p�blica coincide com a for�a de Jair Bolsonaro (foto: EVARISTO SA / AFP)
Foi em 2016, na elei��o de Donald Trump, que os institutos de pesquisa tradicionais levaram a primeira grande traulitada da era da internet. Por unanimidade, tinham cravado a vit�ria da advers�ria Hillary Clinton at� a noite da v�spera.

O poder das redes sociais de virar o jogo � �ltima hora explicava o vexame que foi se aprofundando nas elei��es seguintes, como o da indica��o de Dilma Rousseff para o Senado em Minas, em 2018. Mas nada que se aproxime e explique o das elei��es de 2022 no Brasil, com ares de esc�ndalo.

Fora o erro de quase 10 pontos entre o que indicaram e o resultado para presidente da Rep�blica (de 15 para 5 pontos a diferen�a pr� Lula), erraram a ponto de apontar o inverso em dist�ncias escandalosas de at� 20 pontos nas elei��es estaduais.

Os casos mais emblem�ticos, entre tantos, foram os de Tarc�sio de Freitas para o governo e do astronauta Marcos Pontes para o Senado, em S�o Paulo, e de Hamilton Mour�o para o Senado no Rio Grande do Sul. Estavam 10 pontos atr�s dos favoritos e apareceram quase 10 � frente. Cl�udio Castro, no Rio, teve 14 a mais do previsto.

Terem errado a vota��o de candidatos da direita em sua maioria, � que foi, entretanto, a grande novidade. � dado novo que pode explicar o fiasco e sinaliza uma avaria grave e talvez definitiva na credibilidade, porque destruiu o pr�prio m�todo com que trabalham.

H� uma possibilidade n�o desprez�vel de que o eleitor de direita, massacrado pela prega��o de Bolsonaro contra os institutos de pesquisa, tenha passado a boicot�-los. Ao inv�s de declarar o voto para fortalecer seu candidato, como era de se esperar, deixou de responder ou respondeu errado.

Diante disso, � quase imposs�vel que eles acertem os pr�ximos resultados. Por mais que estruturem bem a amostra e os question�rios, como confiar numa base que � movedi�a ou de alto poder de mobiliza��o para desmoralizar seus resultados?

Passar�o a ser mais uma fonte de informa��o para alimentar as conversas nas v�speras das elei��es e divertir, um pouco mais do que antes. 

Nada parece agora mais divertido do que as declara��es de luminares dos institutos tradicionais dando como definida a elei��o algumas semanas ou meses antes, como a de Carlos Augusto Montenegro, fundador do ex-Ibope, hoje Ipec, no in�cio de setembro:

— A campanha demorou quase dois anos. Mas acabou. Falta o eleitor p�r o voto na urna.

Deveria, com seus amigos na imprensa, pedir desculpas aos institutos menos votados, ignorados ou mesmo achincalhados, como PoderData, MDA, FSB, MDA ou Paran�, que vinham identificando a tend�ncia de crescimento de Bolsonaro e chegaram �s v�speras mais distante do vexame.

Varrendo as institui��es

Elei��es em geral desmoralizam algumas verdades, tradi��es e institui��es de forma��o de opini�o, mas a de 2022, sob a for�a da internet, impressiona por varrer algumas das que pareciam mais consolidadas at� os pleitos passados.  Al�m dos institutos de pesquisa, pela ordem:

1 - A grande imprensa, que n�o conseguiu em nenhum momento impactar os resultados das pesquisas, com not�cia, an�lise e fatos como sabatinas e debates. Ela produz a not�cia, mas n�o tem mais qualquer poder sobre sua repercuss�o e seu uso. Alguns podcasts t�m mais audi�ncia e influ�ncia, em determinados momentos, que o Jornal Nacional. 


2 - A pajelan�a de artistas e celebridades, os outrora conhecidos "formadores de opini�o", em favor de um candidato. Minha opini�o � que atrapalha. Inclusive sobre uma sociedade conservadora que os acha vinculados a conceitos mais el�sticos de fam�lia, religi�o e comportamento. Um an�nimo reacion�rio na internet pode ter tanto ou mais poder que qualquer deles. Caetano Veloso e Chico Buarque soam anacr�nicos. 

3 -  Os sindicatos e partidos pol�ticos de milit�ncia tradicional. O PSDB virou p� e n�o s� porque seu candidato em Minas teve menos de 1% dos votos e luminares como Jos� Serra em S�o Paulo e Jo�o Leite em Minas n�o se elegeram. (Pelos sindicatos, Paulinho da For�a n�o se elegeu em S�o Paulo.) O PT se arrasta, com seus candidatos mal posicionados na maioria das disputas pelos governos estaduais, com raras exce��es no Nordeste. Seu expoente, Fernando Haddad, � uma bola de ferro.

N�o � nenhuma coincid�ncia que campe�es de carro�ada de votos sejam tipos ex�ticos que passam longe de partidos e do radar das m�dias tradicionais. Como os Janones, Joices e os Bolsonaros sem partido em 2018, agora Cleitinho e Nikolas, deputado e vereador de primeiro mandato, eleitos respectivamente senador e deputado federal mais votado do pa�s.

O radar baixo de Bolsonaro

O fiasco dos meios tradicionais de forma��o de opini�o p�blica coincide com a for�a de Jair Bolsonaro, se n�o for ele causa e consequ�ncia. Foi o fundador no Brasil da a��o pol�tica fora do radar dos meios tradicionais, a ponto de conseguir a m�gica inacredit�vel de parecer anti-sistema, sem s�-lo.

Seu eleitorado vota plenamente convencido de que � o messias contra a conspira��o dos outros poderes. Os institucionais, como o Congresso e o Judici�rio. Ou os informais, imprensa, sindicatos, ind�stria cultural. �, para ele, o grande defensor da Tradi��o, da Fam�lia e da Propriedade.

A elei��o de primeiro turno provou sua for�a avassaladora, n�o por acaso na classe m�dia para cima, de celular � m�o. Comeu parte do Norte e arrastou do Centro-oeste ao Sul, passando pelo Sudeste. S� n�o entrou na 
muralha lulista que � o Nordeste
 
 
Fez os governadores dos estados mais importantes, um bloco de 270 deputados da direita (incluindo 99 s� do seu partido) na C�mara e uma impressionante bancada de 20 senadores altamente afinados com suas cren�as. Seus inimigos disfar�ados ou nem tanto, Rodrigo Pacheco e STF, que se cuidem.

� t�o forte que n�o perdeu nada ao deixar aliados bons de voto pelo caminho (os campe�es de 2018, Joice Hasselmann e Alexandre Frota, viraram p�) e se dar ao luxo de trabalhar contra seus pr�prios favoritos. Quase atrapalha o jogador Rom�rio de levar o Senado pelo Rio de Janeiro ao pedir voto para o brucutu Daniel Silveira, como provoca��o ao STF que o prendeu. 

Quem n�o estava com ele, teve que estar com ele se n�o quisesse afundar. Emblem�tico o caso de S�rgio Moro no Paran�, amea�ado pelo favoritismo de �lvaro Dias e o potencial do bolsonarista Paulo Martins. Salvou-se por ter engolido o orgulho e se vinculado a ele na reta final, como s�mbolo de interesses comuns contra o petismo.

� um reflexo incontroverso de uma for�a de centro direita que est� devidamente instalada sob sua lideran�a indiscut�vel, agora com status de fen�meno social. Vai ter peso consider�vel nos rumos do pa�s, ajudando ou atrapalhando os pr�ximos governos.

� quase certo que, se eleito, Lula ter� mais dificuldades com essa base do que Bolsonaro teria, ainda que n�o se despreze sua capacidade de articula��o. Muito da nova base � mais ideol�gica que fisiol�gica. Pode n�o decidir voto, mas tem alta capacidade, inclusive online, de fazer barulho.

Independer� da lideran�a de Bolsonaro, caso perca e se candidate a um Donald Trump sem partido, assombrando como ele as pr�ximas elei��es. Essa base e sua base, j� org�nica na sociedade, ganhou for�a pr�pria que conv�m respeitar.

Mais bala no segundo turno

Em favor de Bolsonaro se diz que segundo turno � outra elei��o. Em favor de Lula, que o segundo turno � sempre continua��o do primeiro. Que o favoritismo de Lula, a 1,5% de metade mais um dos votos no primeiro, dentro da previs�o dos institutos tradicionais, � meio indicativo de sua vit�ria a 30 de outubro.

Mas, a considerar que seja continua��o, � preciso colocar tamb�m na conta que houve/h� uma onda por Bolsonaro que virou a elei��o em seu favor em S�o Paulo e arrancou os palanques de Lula em Minas e no Rio de Janeiro. Justamente nos tr�s estados do perigoso tri�ngulo das bermudas das elei��es presidenciais brasileiras.

Lula vai ter que ampliar seu leque de apoios, sabe-se l� onde, depois de ter arrastado todo o centro influente, mas n�o o Centr�o que pode continuar com Bolsonaro diante dos novos dados. Fazer mais do que os artistas cantarem o Lula-l� na propaganda eleitoral.

Precisar� ressuscitar a propaganda que mais funcionou no primeiro turno, a negativa que real�a o pior da personalidade agressiva de Bolsonaro. Com mais compet�ncia, por�m, porque uma das m�gicas do segundo turno � tornar superadas as m�gicas do primeiro.

N�o � dif�cil que consiga mobilizar a parte das classes m�dia e alta que lhe � hostil, mas n�o se desconsidere que Bolsonaro tamb�m ter� mais tempo de conversar com as mais pobres, como j� anunciou que far� no pronunciamento de domingo.

Do ponto de vista de hoje, muito em face do calor de sua vit�ria pol�tica no domingo, � Bolsonaro que est� com mais bala na agulha.

Minha hist�ria na despedida

Meu filho de nove anos costuma acordar falante como dorme, querendo discutir antes do caf� da manh� alguma grande ideia que teve pela madrugada sobre animes, mitologia grega ou, como neste domingo, Revolu��o Francesa, que anda estudando na escola.

Me pergunta qual meu her�i preferido da Hist�ria real. Digo sem pensar muito em Winston Churchil, tento explicar mais ou menos sua import�ncia contra Hitler, mas ele j� se adianta e diz que prefere Napole�o Bonaparte e, em segundo lugar, dom Pedro. 

— Os dois Pedros, para dizer a verdade. Prefiro o da Independ�ncia ou Morte.

Teve pela madrugada um insight revolucion�rio  de que a Hist�ria pode ser t�o emocionante, com a vantagem de ser real, quanto seus jogos eletr�nicos, a que dedica boa parte do dia. J� criou enredos, her�is e uma s�rie para os quais considerou contratar colegas na dublagem.

Digo que hist�ria, a real, � de fato muito legal, e aproveito para ensinar que, no domingo, por acaso, est�vamos vivendo uma que ele viria a ver um dia em seus livros escolares. Que ela, quando est� sendo vivida, tende a n�o parecer ser t�o extraordin�ria quanto nos livros e nos filmes.

E que assim � at� melhor. A dist�ncia do tempo ajuda a aparar os excessos de amor e �dio que atrapalham o julgamento honesto de nossos contempor�neos. L� na frente, quando ele tiver condi��es de entender, ver� que os dois principais protagonistas da mais concorrida elei��o de todos os tempos de nossa hist�ria deram, cada um a seu modo, sua contribui��o ao pa�s.

— N�o � s� que Lula rouba e que Bolsonaro mata, n�, pai?

— Isso.

— Voc� quer ir votar comigo?

— N�o.

Aproveito para fazer minha propaganda pessoal. Que os escritores e jornalistas vocacionados a historiadores como eu s�o t�o importantes quanto os que a fazem. E que um dia ele poder� ler um livro meu a respeito ou consultar os artigos da coluna que mantive aqui no Estado de Minas, at� essa ter�a-feira, de que me despe�o.

N�o sem um bom pesar, estou me desligando desse compromisso para, entre outras coisas, me desintoxicar de pol�tica e me dedicar a projetos liter�rios e de historiografia que vinha adiando, lutando contra a urg�ncia que o avan�o da idade imp�e. 

Entre outras coisas que a idade tamb�m explica, pesou tamb�m o fato de que, dez anos depois de colabora��o por aqui, em dois per�odos, sinto que nada mais tenho a acrescentar. 

Tenho alta perspectiva de que continuaria me repetindo sobre temas, a��es e posturas de nossos pol�ticos, como a rela��o inevit�vel com o Centr�o, que tendem a se repetir tediosamente, desde sempre e por todo o sempre.

Fa�o minhas despedidas com esse artigo, agradecendo de cora��o sua paci�ncia, sua aten��o e seu respeito, mesmo quando divergindo de minhas opini�es.

Um agradecimento eterno especial a meu editor e anfitri�o master, Benny Cohen, na lideran�a da equipe que sempre tratou minha produ��o com o cuidado, o carinho e o respeito profissional que me devotam. Muito obrigado de novo a todos e at�.

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