
Logo que come�ou a guerra da Ucr�nia e o mundo ainda mal digeria a impot�ncia dos organismos multilaterais para frear a monstruosidade de Vladimir Putin, Lula fez saber em discurso vibrante que bastaria uma roda de bar, com caixas de cerveja, para resolv�-la.
N�o duvido de nada de Lula, para o bem ou para o mal, desde que foi ao fundo do po�o e dele ressuscitou para dar uma das mais extraordin�rias voltas por cima da hist�ria pol�tica mundial, como se tivesse tomando um chope com os velhos amigos.
Entre tantas informa��es valiosas e excitantes das primeiras p�ginas de sua �ltima biografia, Lula, de Fernando de Morais, vi o retrato acabado do homem que envelheceu jovem sem perder a serenidade em meio �s mais terr�veis tormentas.
A seu jeito montanha russa de emo��es, o autor conta como ele ia conspirando calmamente ao celular na traseira do �nix que o levava para o sindicatos dos metal�rgicos de Diadema, em fuga da senten�a de pris�o de Sergio Moro, enquanto comboios de carros, motocicletas e helic�pteros, de pol�ticos, jornalistas, r�dios e tv, aceleravam e sobrevoavam embaixo e em cima para conseguir o melhor �ngulo.
At� o momento cl�max do final do primeiro dia de vig�lia no sindicato, a sexta-feira cercada por uma multid�o furiosa pronta para emparedar a pol�cia, em que vencia o prazo de 24 horas dado por Moro para que se entregasse. Todos desesperados para criar uma sa�da e ele sentado calmamente com um dos grupos que passaria consolando noite adentro. N�o era com ele.
Ent�o Gleisi Hoffmann ouviu de uma copeira a sugest�o de que se inventasse uma missa pela passagem de um ano e pouco da morte de sua mulher Marisa Let�cia, no s�bado pela manh�, de forma a adiar por mais um dia — e sabe-se l� at� quando — a obedi�ncia � ordem de Moro.
Excitada com a ideia, a presidente do PT interrompeu sua conversa para oferecer-lhe a estrat�gia como a descoberta da pedra filosofal, apesar do alto grau de risco de afrontar uma decis�o judicial que estava nas bocas e nos jornais das mais altas autoridades do pa�s e da imprensa. Ele mal se virou e s� respondeu apenas um:
— Ok, tudo bem, pode providenciar.
Assim, com o mundo desabando l� fora, o prazo da justi�a, dos homens e de deus se esgotando, e ele se virando para os amigos, para continuar a conversa, como se aquilo tudo fizesse parte normal do percurso da vida. Que h� um tempo para tudo e que, na hora certa, quando for preciso, ele agir�.
Quem assistiu seu discurso de reden��o, cercado de todos os amigos que j� fez na pol�tica e diante da multid�o encarcerada como ele, j� no s�bado � noite da rendi��o, viu que tinha bebido al�m da conta. E que caminhava para o cadafalso de Moro, como caminhou ao final protegido por seu pr�prio povo, com a certeza feliz e son�mbula dos b�bados.
� poss�vel que Putin e Zelenski acabassem vencidos pelo cansa�o e at� deixassem a vodka pela cerveja barata de boteco, diante da capacidade de convencimento de tal interlocutor sem no��o de tempo e perigo. De absoluto controle da situa��o quando saboreia o prazer de estar a uma mesa de negocia��o, desde os tempos de macac�o no sindicato.
N�o duvido por isso que alguma coisa ele vai fazer por esse pa�s, para o bem ou para o mal. � t�o obcecado e focado para perseguir em suas escolhas, sem parecer que est� correndo, que pode nos levar para o para�so ou para o buraco, com a mesma intensidade e a mesma tranquilidade.
Se der errado, vai dizer que n�o foi com ele e vai nos convencer, embora saberemos que foi. Com umas caixas de cerveja, de prefer�ncia, antes, durante e depois das reuni�es com os ministros e os pol�ticos do Centr�o, que tamb�m levar� no gole.
Como j� vem levando, antes mesmo de tomar posse. N�o sofre nem um pouco e ri como ria na coletiva da �ltima sexta-feira em que negou sorrindo um Minist�rio para a companheira de lutas Gleisi. Mesmo sabendo que tem na mesa uma lista de 417 pretendentes a ministros.
J� tomou umas virtualmente com Arthur Lira e outras com Rodrigo Pacheco, rindo do PT que queria formar uma frente contra o primeiro. Fechou apoio a ambos na elei��o para as presid�ncias da C�mara e do Senado e vai arrastar mais da metade de quem importa em Bras�lia, em menos tempo do que se espera. No tempo de consumir mais umas caixas.
S� recomendo que acrescente torresmo, que comp�e com a cerveja — depois da cacha�a — uma das combina��es mais extraordin�rias j� descobertas pela humanidade depois do caf� com queijo curado, a goiabada casc�o com queijo fresco e banana caramelizada com sorvete de creme. Inven��o que nos meus del�rios de bar s� tem compara��o com a do Iphone e a do aparelho descart�vel de l�minas duplas.
Com ele e uma tulipa limpa — ou preferencialmente um copo lagoinha no boteco mais sujo dessa cidade dos botecos e dos torresmos premiados —, certamente ele ser� mais bem-sucedido e vamos comemorar se der certo ou comemorar assim mesmo se der errado. At� porque, como a gente sabe, ele vai nos convencer de que foi bom, mesmo que n�o.
At� porque tamb�m n�o perco a impress�o de que esse pa�s � mesmo um boteco copo-sujo, com uma n�voa de irracionalidade pairando sobre son�mbulos entre as cadeiras de pl�stico e o banheiro imundo trancado a tramela. Onde s� ficamos porque a cerveja � gelada, o torresmo � crocante e a conversa inebriada por eles resolve todos os problemas.
At� fazer quem n�o queria escrever mais voltar a produzir mais um artigo, nem que fosse son�mbulo como esse, nem que fosse para escrever sobre torresmo. Est� escrito, amigos. Tim-tim.