
Mesmo com tudo isto, o voto para presidente pode se revelar um grande equ�voco, como tem sido muitas vezes o caso. A causa, no entanto, n�o ter� sido nunca defeito do sistema eleitoral ou a falta de informa��o do eleitor e sim a imperfei��o do seu ju�zo pol�tico, este um problema derivado da natureza humana e sem rem�dio conhecido. As boas democracias s�o aquelas em que as institui��es pol�ticas s�o desenhadas para lidar com as imperfei��es humanas, atenuando os seus efeitos, sem suprimir as liberdades e sem submeter as pessoas ao jugo de uns poucos.
Como o poder n�o � exercido autocraticamente pelo governante, mas compartilhado com o Parlamento, nas democracias que funcionam as escolhas do presidente e dos parlamentares est�o solidamente articuladas. Nos regimes parlamentaristas, o governo � a maioria parlamentar, ambos originados de uma s� vontade majorit�ria. Nos regimes presidencialistas mais importantes, como o dos Estados Unidos e o da Fran�a, a elei��o do Parlamento � realizada de forma tal que a vontade popular de fortalecer ou limitar o governo � inteiramente clara para o eleitor.
Na Fran�a, s� ap�s a escolha do presidente da Rep�blica a popula��o � convocada para eleger um Parlamento, oportunidade em que o povo pode definir sem ambiguidades se deseja dar ao governo uma maioria para governar livremente, ou uma minoria que o obrigue a negocia��o e a modera��o dos seus projetos e de suas ideias.
Nos Estados Unidos, a C�mara e parte do Senado s�o eleitos em meio ao mandato presidencial, para que a popula��o decida favorecer o governo com uma maioria ou, ao contr�rio, limit�-lo, elegendo uma maioria de oposi��o. Em ambos os casos, a escolha dos parlamentares se d� por elei��o majorit�ria, no �mbito de distritos circunscritos regionalmente, onde cada eleitor conhece os candidatos e sabe qual o real significado do seu voto.
No Brasil, as coisas s�o totalmente diferentes. As elei��es para a C�mara dos Deputados, vitais para o dimensionamento do poder de fato do presidente, transcorrem na maior invisibilidade e por meio de um processo que oculta do eleitor a consequ�ncia do seu voto. A quantidade de candidatos e de partidos torna imposs�vel qualquer avalia��o.
Na elei��o presidencial, o eleitor exprime com clareza sua vontade e suas expectativas. Entre n�s, na elei��o dos deputados o voto raramente tem um sentido, em termos de vis�o do pa�s ou de alternativas de pol�ticas p�blicas, sendo de um modo geral uma escolha aleat�ria e inconsequente. Por esta raz�o, nossas elei��es parlamentares, embora ocorrendo no mesmo dia da elei��o presidencial, s�o na verdade um evento paralelo e n�o um processo de forma��o de maiorias pol�ticas, como deveria ser e como � em todo o mundo democr�tico.
Ao final, carregando dezenas de milh�es de votos e expressando sem d�vida a vontade majorit�ria do pa�s, o governo para funcionar tem que formar, por conta pr�pria, a maioria parlamentar que a popula��o n�o pode eleger, por arte de um sistema eleitoral sem equivalente no mundo e concebido para iludir a vontade pol�tica da popula��o. A forma como se constroem estas maiorias artificiais tem sido a maldi��o de muitos governos e uma causa da corrup��o que tem ferido o Estado brasileiro e que resiste a todas as tentativas de combate.
No dia 2 de outubro, seria importante que cada brasileiro meditasse um instante sobre estas tristes realidades e come�asse a sonhar como uma verdadeira reforma do sistema com que elegemos os nossos deputados.