
Meu marido � quem cuida do jardim da nossa casa. Cabe a mim uma tarefa menos nobre, mas leve. Sou capaz de passar horas distra�da, brincando de arrancar os matinhos que nascem entre os canteiros de flores. Sigo limpando o terreno, sem pensar em nada.
Me sinto bem desfazendo das folhas secas – talvez essa seja uma met�fora da vida, mas esse n�o � o assunto da nossa cr�nica. O caso � que paralisei diante de uma estranha folhagem, que se intrometeu no nobre territ�rio das orqu�deas.
Me sinto bem desfazendo das folhas secas – talvez essa seja uma met�fora da vida, mas esse n�o � o assunto da nossa cr�nica. O caso � que paralisei diante de uma estranha folhagem, que se intrometeu no nobre territ�rio das orqu�deas.
A invasora n�o parecia fr�gil como os falsos trevos de quatro folhas, que se alastram pelos vasos de plantas, praticamente pedindo para ir embora.

A criatura apresentava um caule forte, que impunha presen�a. Para usar uma palavra atual, era empoderada. Folhas firmes, verde-escuras, pura fotoss�ntese. Parei diante dela, pensando em que atitude tomar em rela��o ao problema. Naquela pausa da indecis�o, nos poucos segundos de d�vida, surgiu a figura da nossa diarista. “N�o mexe nessa da� n�o, pelo amor de Deus!”, pediu.
Deu tempo de frear o �mpeto da minha luva de borracha amarela, que adora passar sobre as ervas daninhas feito um trator. Perguntei � funcion�ria sobre qual seria o motivo pela qual deveria poup�-la do mesmo destino das outras. O saco de lixo preto j� estava cheio at� a borda dos esp�cimes indesejados.
Abre par�nteses. N�o consigo estabelecer um racioc�nio coerente sobre o porqu� de pedir licen�a antes de colher uma flor, mas, ao mesmo tempo, ser implac�vel com os matinhos. Seria preconceito?
Anotei a d�vida no meu bloco de notas mental para resolver depois. Uma quest�o mais urgente se apresentava. Era necess�rio tomar uma decis�o r�pida. Arrancar ou n�o arrancar, era a pergunta. “Essa da� � uma mudinha que eu trouxe de casa. D� um ch� maravilhoso, que � bom para os rins, anti-inflamat�rio, um mont�o de coisas. O pessoal a conhece pelo nome de caninha-de-macaco”, defendeu Gigi.
Deu tempo. Fui salva da culpa de assassinar um medicamento natural, que provavelmente n�o teria vindo morar � toa aqui em casa. As pedras nos rins s�o heredit�rias na minha fam�lia. Inclusive, tenho uma delas habitando dentro de mim. Convivemos juntas h� alguns anos, pacificamente. Ela estacionou em cerca de tr�s mil�metros e nunca saiu do lugar. Ainda bem.
Custou, mas agora caiu a ficha. Lembrei-me da conversa antiga com a minha colega de muro, que � bi�loga e atenta aos rem�dios naturais. Naquela tarde, aproveitei o bate-papo com a vizinha para ir limpando o canteiro, que estava lotado de umas mini�rvores, boas de arrancar pela raiz. Ela comentou que aquelas folhinhas, que pareciam confetes verdes, eram popularmente conhecidas como quebra-pedra.
Com a pulga atr�s da orelha, catei uma amostra do mato e confirmei a suspeita no aplicativo do celular, capaz de identificar as esp�cies de planta pela foto. Conferiu. Al�m de ter o quintal lotado de quebra-pedra, passo a conviver com um ser de nome ex�tico, fonte de nova beberagem para dor nos rins. Seria um sinal de que as pedras v�o rolar?
Para ser justa, tem tamb�m o p� de hibisco, indicado para a perda de peso, e a amoreira, que ajuda a amenizar os efeitos da menopausa. Sem falar no p� de acerola. Cada unidade � quase uma c�psula de vitamina C. Resumindo, tenho uma Araujo no quintal.