
Como temos dito por aqui, a popula��o mundial est� em franco processo de envelhecimento. Em pa�ses como o Jap�o, Su��a, Espanha, Austr�lia e It�lia, a expectativa de vida j� passa dos 80 anos. No Brasil, at� o ano de 2060 teremos mais de 19 milh�es de pessoas com mais de 80 anos. Tal situa��o ocorre muito em raz�o da melhora das condi��es de sa�de da popula��o em geral, mas, em um futuro muito pr�ximo, isto tamb�m ser� em raz�o de aparatos tecnol�gicos que ser�o colocados � disposi��o daqueles que poder�o pagar por eles.
Dentre as possiblidades de melhoramento da vida humana por meio do uso de tecnologias, h� uma controversa linha de pesquisa do ramo da engenharia gen�tica denominada transumanismo. Trata-se de um movimento que se autodenomina como sendo filos�fico e cultural que tem por finalidade buscar aprimorar a condi��o humana por meio do uso da tecnologia, especialmente a biotecnologia, a intelig�ncia artificial, a nanotecnologia e a neuroci�ncia.
Seus adeptos trabalham com temas instigantes e que j� s�o correntes em filmes e, alguns, at� mesmo na vida pr�tica dos mais afortunados, tais como implantes cibern�ticos para restaurar a audi��o; implantes de retina para recuperar a vis�o; cria��o de interfaces entre o c�rebro e o computador, permitindo o controle de dispositivos externos, tudo por meio do pensamento; realidade virtual e realidade aumentada, de onde vem a ideia de metaverso; intelig�ncia artificial, dentre outros.
No que diz respeito especificamente ao processo de envelhecimento, podemos citar como exemplo de t�cnicas transuman�sticas, as terapias gen�ticas para retardar ou reverter o processo de envelhecimento, que envolvem a manipula��o de genes e das vias gen�ticas relacionadas ao processo de envelhecimento. H� tamb�m a Medicina Regenerativa, que busca desenvolver t�cnicas para regenera��o de tecidos e at� mesmo de sistemas inteiros do corpo humano, o que ocorre por meio da manipula��o de c�lulas-tronco com o objetivo de substituir as c�lulas danificadas ou envelhecidas o que, potencialmente, poderia reverter os efeitos do envelhecimento nos �rg�os e tecidos.
Embora os avan�os da Medicina Regenerativa e das Terapias Gen�ticas, por exemplo, sejam motivo de celebra��o, devemos estar atentos aos caminhos que estamos trilhando. Se por um lado � maravilhoso pensar em manipula��o de c�lulas-tronco para fazer com que um cadeirante deixe tal condi��o, nos causa espanto pensar em manipula��o gen�tica para melhoramento de performance, por exemplo, j� que tal possibilidade s� estaria dispon�vel para aqueles que pudessem pagar por elas, o que aumentaria ainda mais o fosso entre ricos e pobres, acarretando ainda mais desigualdade entre as pessoas.
As consequ�ncias de algumas manipula��es propostas pelo transumanismo podem levar a um florescimento humano como nunca visto antes na hist�ria da humanidade, e tal fato � inquestion�vel; mas tamb�m podem acarretar efeitos colaterais imprevis�veis ou consequ�ncias n�o intencionais, mas potencialmente capazes de afetar a nossa pr�pria compreens�o do que pode ser entendido como ser humano, bem como gerar disparidades econ�micas ainda mais excludentes e discriminat�rias, ou criar uma depend�ncia tecnol�gica excessiva, que nos coloque em risco de sobreviv�ncia em caso de falha.
Ser� que haver� o dia em que teremos dificuldade para diferenciar o que � humano daquilo que foi constru�do pela engenharia gen�tica? Para evitarmos esse problema que, diga-se de passagem, � grav�ssimo, devemos refletir que os riscos ligados ao transumanismo n�o devem ser negligenciados, sendo necess�rio um debate �tico aprofundado e uma reflex�o sobre os valores e princ�pios que orientam a buscar pelo aprimoramento humano e de que esp�cie de aprimoramento estamos falando.
Francis Fukuyama, em seu livro Nosso Futuro P�s-Humano: consequ�ncias da Revolu��o da Biotecnologia, nos ensina que o transumanismo levanta quest�es profundas sobre o verdadeiro significado da vida humana e o nosso futuro como esp�cie e, por essa raz�o, precisamos estar muito atentos �s implica��es sociais dessas tecnologias, de modo que elas sejam usadas para o bem de toda a humanidade – e n�o apenas de alguns.
Somos coro aos que pensam que devemos abra�ar os avan�os cient�ficos e tecnol�gicos para o aprimoramento da vida humana, mas com cautela e responsabilidade, considerando os impactos sociais, a privacidade, a seguran�a e os valores sociais fundantes. Ao explorar o potencial do transumanismo devemos nos perguntar: at� onde estamos dispostos – como sociedade – a ir em busca de melhorias sem comprometer nossa ess�ncia humana? N�o se trata de apenas n�o envelhecer ou n�o morrer, admitir o transumanismo sem an�lise cr�tica e �tica, � mudar completamente nossa compreens�o sobre o que deve ser entendido como sendo um ser humano e isto � complexo.