
A maternidade � uma dos s�mbolos mais intensos que uma mulher pode experimentar durante sua vida. “Ser m�e � a minha melhor parte. Percebo que minha vida come�ou na hora em que outro cora��o bateu dentro de mim”, afirma a administradora Renata Moraes, de 44 anos. A primeira gesta��o da administradora foi em 2006, por meio de fertiliza��o, do pequeno Elias. Depois veio a Sarah, em 2009, que n�o precisou de indu��o, mas ela n�o imaginaria que a terceira seria a mais desafiadora de todas.
Em setembro de 2011, aos 36, recebeu o diagn�stico de c�ncer de mama. Mesmo com o baque, desafiou a doen�a e seguiu em frente. Passou pela cirurgia de retirada do quadrante, pela quimioterapia, radioterapia e iniciou a hormonoterapia. Renata foi ao ginecologista conversar sobre algum m�todo contraceptivo, mas ele explicou que n�o seria necess�rio, pois no caso dela a fertilidade teria sido afetada, inclusive ela j� n�o menstruava. At� que fez um teste e descobriu que estava gr�vida, em 2012, entrando na d�cima segunda semana de gesta��o.
A confirma��o da gravidez foi um misto de medo e alegria, pois Renata acreditava que se havia engravidado � porque estava com sa�de e curada. “Mas, ao mesmo tempo, vinha a inseguran�a em suspender a medica��o que estava utilizando. N�o conseguia entender como que um tratamento t�o complexo teria que ser interrompido. Percebi que tinha que descansar meu cora��o e viver aquele momento”, frisa.
Saber que estava gr�vida a encheu de esperan�as. “Quando fui diagnosticada, meus filhos tinham 5 e 2 anos. Seria muita crueldade eu morrer e deix�-los. Meus filhos foram essenciais no meu tratamento. Fortaleceram-me e apoiaram muito. N�o me deixaram desanimar”, conta.
PROCESSO O oncologista Bruno Ferrari comenta que receber o diagn�stico de c�ncer � complicado e vem cercado de incertezas. Quando colocamos a vari�vel gravidez se torna mais complexo ainda. “Hoje, sabe-se que ter c�ncer, como o de mama, interfere pouco nas decis�es e tratamentos”, explica. Ele ainda aponta que ap�s superado um c�ncer, as mulheres podem engravidar sem medo de novos problemas. “A gravidez n�o aumenta a incid�ncia de um c�ncer futuro”, diz.
Segundo Ferrari, nessas situa��es, a primeira coisa � fazer uma avalia��o adequada e multidisciplinar, com a presen�a de oncologista, mastologista, geneticista, obstetra e nutricionistas, por exemplo. “� preciso dar essa tranquilidade. Mostrar para a paciente que estar gravida e ter c�ncer � fact�vel e que n�o � necess�rio interromper a gravidez”, frisa. Por isso, � importante o apoio da equipe m�dica para sempre estar bem informada e saber quais as melhores op��es terap�uticas. “H� v�rios caminhos que n�o prejudicam nem a futura mam�e nem o beb�.”
O oncologista Alexandre Chiari garante que � totalmente poss�vel sonhar com a gravidez ap�s o c�ncer. E diz que tudo depender� do tipo de c�ncer, da gravidade, das chances de recidiva da doen�a e quais medicamentos foram utilizados durante o tratamento. “Se a paciente continuar f�rtil ela pode engravidar ap�s o t�rmino do tratamento, logicamente discutindo as particularidades do caso com seu oncologista e ginecologista.”
F� Para Renata Moraes, ser m�e ap�s toda a luta contra o c�ncer significa a certeza de uma linda miss�o e caminhada. “Meus filhos me inspiram, me apoiam, me amam. Tenho convic��o de que se passei por todo o processo com leveza foram eles que me ajudaram”, frisa a administradora. Ela ainda diz que fechar o tratamento com a chegada de mais um filho foi fechar com chave de ouro. “Lucas veio para comprovar que nada estava perdido. Era o recome�o, vida nova. Lucas est� muito bem, � uma crian�a saud�vel, inteligente e muito esperto. � uma linda crian�a que sorri com os olhos. N�o vejo minha vida sem ele. Ele � a comprova��o de que nada � imposs�vel”, conclui.
Palavra de especialista
Renata Ribeiro, Psic�loga
Lidar com a dualidade
A presen�a de c�ncer em gr�vidas gera impacto emocional em todos os envolvidos, especialmente nas jovens mulheres que t�m que lidar com a dualidade de vivenciar o c�ncer que remete ao medo da finitude e a gravidez que evoca a vida. Essa associa��o, embora n�o seja frequente, torna-se inquietante, levando a muitos questionamentos importantes. O medo do diagn�stico e a demora do tratamento s� aumentam a ansiedade e os riscos para a m�e e o beb�. Portanto, quanto mais informada e confiante na equipe m�dica a gestante estiver, maiores as chances de superar esse momento. Para isso, al�m do tratamento m�dico, � importante o acompanhamento psico-oncol�gico bem direcionado para dar suporte emocional � paciente, ao longo das fases da doen�a e do tratamento, com uma rede de apoio que deve focar no otimismo e no acolhimento dessa mulher. Cabe ressaltar que cada paciente vivencia de forma pessoal a experi�ncia do adoecimento e os aspectos psicossociais envolvidos nesse processo. Alguns pacientes utilizam-se da nega��o da doen�a como mecanismo de defesa, o que em alguns casos pode ser perigoso e prejudicar na ades�o ao tratamento, mas sempre se imp�e uma escuta terap�utica bem direcionada para dar suporte emocional e buscar estrat�gias para a melhora do ajustamento psicossocial frente a doen�a. Assim, em geral, o diagn�stico de c�ncer � vivenciado tanto pelo paciente quanto pela fam�lia como um momento de intensa ang�stia, em que a possibilidade de mutila��o e morte se fazem presentes.”
Acolhendo dor com amor
A vendedora Tatiana Ferreira dos Santos, de 26 anos, moradora de Mateus Leme, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte, ‘perdeu’ momentos preciosos dos dois primeiros anos de vida do pequeno Miguel, em 2017. A falta de conv�vio ocorreu por causa do tumor de Ewing – que se forma nos ossos ou nos tecidos moles –, diagnosticado ap�s dar � luz ao filho. “Como tive que iniciar o tratamento, quase n�o ficava em casa, devido �s in�meras sess�es de quimio e radioterapia. Portanto, n�o vivi aquela fase importante e gostosa da vida do beb�, na qual a m�e precisa dar aten��o em tempo integral”, relembra. Tatiana teve, inclusive, que interromper a amamenta��o ap�s o terceiro m�s de vida da crian�a pois come�ou a tomar os rem�dios contra o c�ncer e perder os movimentos do bra�o esquerdo. Mas a pior consequ�ncia de todas essas priva��es foram os problemas emocionais que a nova mam�e come�ou a enfrentar, incluindo sintomas de depress�o.
A psico-oncologista Adriane Pedrosa, da Cetus Oncologia, percebeu a necessidade de Tatiane em resgatar a pr�pria hist�ria de vida com o filho. “Em seus relatos, ela (Tatiana) desabafou que, pelo fato de o tratamento ter ‘roubado’ sua conviv�ncia com Miguel, nunca teve a oportunidade, por exemplo, de ser fotografada com o menino, uma lembran�a comum para qualquer mulher que se torna m�e”, conta.
Adriane prop�s � paciente que ela posasse para uma sess�o de fotos acompanhada do beb� e do pai. Para a psic�loga, a maior li��o com essa iniciativa, aparentemente simples, mas de uma grandeza incalcul�vel, � a possibilidade de fazer com que a paciente pudesse superar um trauma do passado e resgatar um momento t�o precioso, em fam�lia. “� necess�rio que todos aqueles que estejam ao seu redor possam enxerg�-lo com profundidade, carinho e afeto, destaca.
Tatiana atualmente aguarda o resultado de uma tomografia para verificar, junto a seu m�dico, se houve a redu��o ou elimina��o do tumor. A �nica certeza que ela tem neste momento � a de ficar cada vez mais perto do pequeno Miguel. “Os contratempos dessa doen�a j� tiraram bastante o tempo de conviv�ncia com meu filho. Quero ter for�as suficientes para, a partir de agora, aproveit�-lo em cada segundo. Saber que ele existe �, sem d�vida, o principal motivo para me manter forte e perseverante no tratamento”, finaliza.
* Estagi�rio sob a supervis�o da editora Teresa Caram
Duas perguntas para...
CARLOS HENRIQUE MASCARENHAS
PRESIDENTE DA ASSOCIA��O DOS GINECOLOGISTAS E OBSTETRAS DE MINAS GERAIS (SOGIMIG)
Qual a import�ncia de saber que � poss�vel continuar uma gravidez mesmo com o tratamento de um c�ncer?
A manuten��o da gravidez quando a m�e apresenta uma neoplasia vai depender de alguns fatores, como a idade gestacional quando o tumor foi descoberto, o local onde o mesmo ocorre, o tipo de tratamento que ser� necess�rio para esse c�ncer e mesmo se ele � local ou j� se espalhou. E sabemos que s�o defini��es e decis�es muito dif�ceis, tanto para a m�e quando para a equipe m�dica. Alguns tratamentos cir�rgicos e com a quimioterapia podem ser realizados com seguran�a para a m�e e o feto. A radioterapia ou mesmo a quimioterapia muito ampla geralmente n�o s�o utilizadas devido ao grande risco para a integridade do feto. Por outro lado, a falta de tratamento durante a gravidez amea�a a vida da m�e. Durante um tratamento oncol�gico, � recomendado evitar a gravidez com m�todos discutidos e indicados pelo m�dico ginecologista, pois sabemos que alguns tipos de horm�nios podem interferir no tratamento oncol�gico.
Como deve ser o planejamento desse processo (a gravidez)?
O ginecologista/obstetra deve ser procurado para os devidos cuidados, podendo em alguns casos se buscar a criopreserva��o. � uma tecnologia por meio da qual c�lulas, tecidos ou embri�es s�o preservados em baix�ssimas temperaturas. C�lulas como os �vulos e os espermatozoides, tecidos como o da parede do ov�rio e embri�es. Ou seja, � poss�vel colher �vulos, espermatozoides e embri�es enquanto estiverem saud�veis, antes da quimioterapia e da radioterapia, para depois reimplant�-los, atrav�s da fertiliza��o in vitro, gerando a desejada gravidez.