
A obesidade, representada por IMC maior que 30, atinge 22,8% dos homens e 30,2% das mulheres no pa�s. Esses dados s�o preocupantes, j� que a condi��o pode estar relacionada a uma maior predisposi��o a doen�as cardiovasculares e a outros problemas de sa�de.
Para tentar entender melhor como a obesidade se manifesta nos brasileiros, um grupo de pesquisadores da UFMG acaba de publicar um artigo sobre o tema. No trabalho, o grupo liderado pelo professor Eduardo Tarazona Santos, do Departamento de Gen�tica, Ecologia e Evolu��o do Instituto de Ci�ncias Biol�gicas (ICB), decidiu investigar os genomas dos brasileiros miscigenados que t�m tend�ncia � obesidade.
“Como o genoma brasileiro � um mosaico de fragmentos de origens africanas, ind�genas e europeias, decidimos explorar os genomas para entender se algumas de suas partes poderiam estar associadas � obesidade”, conta.
As amostras analisadas foram coletadas em 6.487 pessoas dos munic�pios de Salvador, na Bahia, Bambu�, em Minas Gerais, e Pelotas, no Rio Grande do Sul, por meio do Projeto Epidemiologia Gen�mica de Coortes Brasileiras (Epigen-Brasil). Esta � a maior iniciativa em gen�mica populacional e epidemiologia gen�tica da Am�rica Latina.
Variante gen�tica africana
Ao analisar as amostras, o grupo da UFMG encontrou uma variante gen�tica de origem africana que contribui para um aumento consider�vel do IMC. Chamada de rs114066381, a variante foi observada em homens e mulheres adultos miscigenados. Ficou constatado, por�m, que ela s� apresenta efeito no �ndice de massa corporal das mulheres.
“Essa muta��o � uma das que mais influencia o �ndice de massa corporal entre as mais de 200 atualmente conhecidas. Como a maior parte das variantes gen�ticas que favorecem a obesidade foram descobertas em indiv�duos de origem europeia, que j� s�o os mais estudados pelos cientistas, � muito relevante a descoberta de uma variante africana presente em nossa popula��o”, diz Tarazona.
Segundo o professor, o estudo gerou algumas descobertas inesperadas. A primeira � que a variante gen�tica mais presente em fragmentos dos indiv�duos de origem africana foi encontrada primeiro no Sul do Brasil. Esta � a regi�o que apresenta mulheres miscigenadas, mas predominantemente europeias.
“A popula��o do sul do Brasil estudada tem uma contribui��o europeia de aproximadamente 70%, mas, mesmo assim, o gene africano aparece por l�, ou seja, os brancos brasileiros de origem europ�ia t�m esses peda�os do genoma africano. Isso mostra que mesmo esses indiv�duos podem fornecer informa��es importantes sobre a gen�tica de doen�as nas popula��es africanas ou naquelas miscigenadas com popula��es africanas", argumenta.
O segundo fator de destaque da pesquisa, segundo o professor, � que a variante gen�tica descoberta atua somente em mulheres adultas miscigenadas.
“Isso pode ter rela��o com a evolu��o biol�gica das mulheres, uma vez que j� s�o conhecidas outras variantes gen�ticas que fazem as mulheres acumular mais gordura que os homens. Apesar de sabermos que a obesidade est� relacionada � alimenta��o e aos h�bitos das pessoas, j� s�o conhecidas mais de 200 variantes gen�ticas que influenciam na predisposi��o gen�tica para obesidade. Por isso, o fator gen�tico precisa ser levado em conta na formula��o de pol�ticas p�blicas que visam combater a obesidade.”
Ca�adores de genes
Os geneticistas que se dedicam � identifica��o de genes que podem ser associados �s doen�as costumam ser chamados de gene-hunters (ca�adores de genes). A descoberta da variante africana da obesidade foi feita por meio do mapeamento por miscigena��o.
“Inicialmente, descobrimos a origem africana, europeia e ind�gena de cada fragmento do genoma de cada pessoa. Depois, observamos que algumas regi�es do genoma, como uma do cromossomo 13, tendiam a ser africanas nas mulheres mais obesas. Na �ltima etapa dos estudos, investigamos as variantes gen�ticas que estavam nesses pedacinhos africanos”, explica a pesquisadora Mar�lia Scliar.
No artigo, o grupo mostra que a variante tem � encontrada em aproximadamente 1% na popula��o geral, mas entre as mulheres com obesidade m�rbida (o maior n�vel de obesidade) do Sul e Sudeste do Brasil ela chega a 10%.

Segundo Mar�lia, a descoberta ressalta a import�ncia de estudos sobre popula��es n�o europeias. “Grande parte dos estudos gen�micos mundiais ocorre em popula��es europeias, o que � muito restritivo. � importante que tenhamos descoberto uma variante de origem africana com grande efeito sobre a obesidade em popula��es n�o muito estudadas.”
A pesquisadora salienta ainda que a sequ�ncia de passos da pesquisa desenvolvida pelo grupo vai favorecer o estudo de outras doen�as associadas aos genomas. “O passo a passo que criamos pode ser usado em pesquisas sobre como diversas variantes gen�ticas predisp�em os indiv�duos a um n�mero grande de doen�as”, conclui.
Parcerias
O estudo liderado pelos pesquisadores da UFMG integra o trabalho de grupos de 22 institui��es, 11 brasileiras e 11 de Estados Unidos, Peru, �frica do Sul, Gana e Austr�lia. Houve ainda uma parceria com grupo da Universidade de S�o Paulo (USP), liderado pelas professoras Mayana Zatz e Yeda Duarte, que acabavam de fazer o sequenciamento completo de 1,2 mil genomas de idosas de S�o Paulo do estudo Sa�de, Bem-estar e Envelhecimento (SABE), o que possibilitou replicar o resultado obtido no estudo inicial.
O Projeto Epidemiologia Gen�mica de Coortes Brasileiras (Epigen-Brasil), financiado pelo Minist�rio de Sa�de, investiga como a miscigena��o e a ancestralidade dos brasileiros influenciam a epidemiologia de v�rias doen�as, como a hipertens�o e a asma, por exemplo.
Os estudos incluem a epidemiologia gen�mica de tr�s das principais coortes brasileiras: Salvador, coordenada pelo professor Maur�cio Barreto, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Bambu�, coordenada pela professora Maria Fernanda Lima-Costa, do Instituto Ren� Rachou (Fiocruz Minas), e Pelotas, coordenada pelo professor Bernardo Horta, da Universidade Federal de Pelotas (Ufpel).
*Estagi�ria sob supervis�o do subeditor Eduardo Oliveira