
"COVID longa", "COVID persistente", "COVID-19 p�s-aguda" ou a "s�ndrome p�s-COVID" s�o alguns nomes que v�m batizando um conjunto de resqu�cios da doen�a causada pelo novo coronav�rus ou novos problemas de sa�de que uma pessoa pode ter semanas ou meses depois da fase aguda da COVID-19 — quando a replica��o viral � mais ativa, resultando normalmente em testes positivos e sintomas t�picos dessa fase, como febre e tosse seca.
O Centro de Controle e Preven��o de Doen�as dos Estados Unidos (CDC, na sigla em ingl�s, uma ag�ncia de sa�de p�blica) definiu que prefere o termo "condi��es p�s-COVID", que consistem em problemas de sa�de manifestados a partir de quatro semanas ap�s a primeira infec��o.
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Um estudo que acompanhou 1.733 pessoas por seis meses ap�s a infec��o por COVID-19 em Wuhan, na China, mostrou que a maioria (76%) relatou pelo menos um sintoma nesse per�odo posterior � fase aguda. Os mais relatados foram cansa�o e fraqueza muscular (63%); dificuldades para dormir (26%); e ansiedade e depress�o (23%).
Al�m dos frequentes sintomas de fundo neurol�gico e ps�quico, autoridades alertam tamb�m para consequ�ncias graves da COVID-19 no pulm�o e cora��o.
Ent�o, depois de lidar com a fase aguda, como uma pessoa pode monitorar as consequ�ncias da doen�a? A BBC News consultou m�dicos, pesquisas cient�ficas e recomenda��es de autoridades para responder, a partir do que se sabe sobre a doen�a hoje.
Exames quando houver sinais
Os entrevistados afirmaram que, em linhas gerais, ter tido COVID-19 por si s� n�o deve motivar uma corrida por exames e consultas m�dicas posteriores, ainda mais considerando-se a necessidade do isolamento social — a n�o ser que existam sintomas inc�modos e persistentes.
"A maioria dos casos de COVID-19 afeta apenas as vias a�reas (como no nariz e na garganta), h� muitos casos assintom�ticos ou apenas ambulatoriais (onde acontecem atendimentos menos graves). N�o tem necessidade de fazer exames em todas as pessoas que tiveram COVID-19, n�o tem necessidade de elas serem rotineiramente acompanhadas (por m�dicos)", diz o infectologista Moacyr Silva Junior, do Hospital Israelita Albert Einstein.
Silva Junior conta que a pr�tica no seu hospital � fazer exames de retorno presenciais, cerca de sete a dez dias ap�s a alta, apenas em pessoas que ficaram internadas.
"Os casos que precisam de mais aten��o s�o os internados. Dias depois, fazemos exames de rotina, como de sangue", explica, detalhando que a equipe busca nos exames de sangue indicadores sobre o rim, o f�gado, a coagula��o e a normaliza��o de c�lulas do sistema de defesa, entre outros.
Em janeiro, em uma nova edi��o de suas recomenda��es para a pr�tica m�dica envolvendo a COVID-19, a Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) incluiu um cap�tulo dedicado apenas ao cuidado de pacientes posterior � doen�a aguda, defendendo que "pesquisas sobre sequelas de m�dio e longo prazo da COVID-19 s�o priorit�rias".
Na publica��o, a OMS ratificou que "pacientes internados em UTIs t�m maior preval�ncia de sintomas em quase todos os dom�nios" da COVID-19 persistente. Uma exce��o para a rela��o entre gravidade na doen�a aguda e efeitos posteriores s�o os sintomas neurol�gicos e ps�quicos, como ser� detalhado abaixo.

Mas a organiza��o reconhece na publica��o que, independentemente da gravidade na doen�a aguda, qualquer pessoa que teve COVID-19 pode apresentar sintomas posteriores que necessitam de acompanhamento — e alguns podem n�o ser t�o aparentes, como altera��es cognitivas, o que exige aten��o tamb�m de parentes e cuidadores.
Por outro lado, h� consequ�ncias de COVID-19 que colocam a vida em risco e exigem atendimento emergencial, como embolia pulmonar, infarto do mioc�rdio, arritmias, miopericardite, insufici�ncia card�aca, acidente vascular cerebral (AVC), convuls�es e encefalite, completa a OMS.
Consequ�ncias nos pulm�es e no cora��o
Um artigo que fez uma revis�o de pesquisas cient�ficas j� feitas sobre o tema, publicado em mar�o na revista Nature, mostrou que, em v�rias partes do mundo, a falta de ar foi relatada em m�dia por 30% dos pacientes acompanhados nos meses seguintes � fase aguda.
A pr�pria OMS tem uma cartilha (em ingl�s) com exerc�cios a serem realizados pelas pr�prias pessoas que venham a sentir falta de ar em casa.
Mas, quando essas t�cnicas n�o resolvem o problema e h� sinais como falta de ar insuport�vel e desmaios, � hora de procurar ajuda m�dica.
"Quando a pessoa est� se recuperando em casa, mas sente desconforto durante atividades di�rias, sejam elas cotidianas ou pr�ticas esportivas, quando percebe um cansa�o desproporcional, � importante ser avaliada", explica Gustavo Prado, pneumologista do Hospital Alem�o Oswaldo Cruz.
Prado explica que o paciente com sintomas respirat�rios prolongados costuma passar por exames de imagem, como uma radiografia ou tomografia de t�rax, por provas da fun��o pulmonar, como a espirometria, e por uma avalia��o do desempenho f�sico, como teste de esfor�o com caminhada.
Estes exames podem ajudar tamb�m a detectar a fibrose pulmonar, uma das duas complica��es cr�nicas no �rg�o mais graves da COVID-19, de acordo com o pneumologista — a outra � a hipoxemia, a baixa oxigena��o decorrente de problemas nas trocas gasosas nos alv�olos pulmonares, em que o oxig�nio do ar � captado pelo sangue e o CO2 � liberado.
"Nos pacientes que tiveram comprometimento pulmonar mais extenso, a troca gasosa � diminu�da, e a possibilidade de evolu��o para fibrose � maior. A fibrose � aquela altera��o cr�nica do pulm�o que se preenche de cicatrizes, onde antes tinha inflama��o. Em qualquer lugar onde a cicatriz se instala, a funcionalidade do tecido diminui. Ele fica mais r�gido e n�o executa normalmente suas fun��es", explica Prado.
"� incomum a gente observar fibrose em quem teve quadros leves. Ela vai ser mais percept�vel nos pacientes que apresentaram formas graves, interna��es prolongadas, normalmente necessidade de uso de oxig�nio e at� intuba��o e ventila��o mec�nica durante a interna��o. � improv�vel a fibrose aparecer tardiamente como uma surpresa, ela normalmente � um quadro progressivo que instala a partir dessa primeira agress�o pulmonar pela infec��o."
O cora��o tamb�m � um dos alvos do coronav�rus, ainda mais em casos graves na fase aguda, e como consequ�ncia persistente pode levar � falta de ar, assim como ocorre em problemas envolvendo o pulm�o — coincid�ncias que mostram a import�ncia da consulta m�dica.
"� muito dif�cil para o pr�prio paciente identificar se uma dificuldade de realizar um determinado esfor�o, ou uma atividade que eles antes fazia sem nenhum comprometimento, � por uma limita��o respirat�ria, por uma fraqueza muscular ou por um problema cardiovascular", exemplifica Prado.
Segundo o artigo publicado na Nature, outros sintomas persistentes da COVID-19 no cora��o s�o a palpita��o e a dor no peito, que podem indicar sequelas de longo prazo, como a fibrose mioc�rdica, arritmias, e miocardite, problemas constatados, al�m da consulta m�dica, por exames como ecocardiograma e eletrocardiograma.
Efeitos no c�rebro

"Praticamente todo campo da neurologia parece ter efeitos, a gama de sintomas � muito grande", diz Clarissa Yasuda, m�dica e professora do Departamento de Neurologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Ela e uma equipe de pesquisadores da universidade est�o acompanhando as consequ�ncias no c�rebro de pessoas que tiveram COVID-19 no levantamento Neuro-COVID. H� um question�rio online aberto para pessoas contribuirem com a pesquisa.
Em outubro de 2020, a equipe publicou um estudo do tipo pr�-print (sem a chamada revis�o dos pares, etapa padr�o em que outros especialistas analisam um estudo e decidem se ele ser� publicado ou n�o em uma revista cient�fica) com dados sobre 81 pessoas que tiveram COVID-19 leve e se recuperaram.
Elas passaram por exames de resson�ncia magn�tica, question�rios e testes cognitivos, que mostraram que, em m�dia 60 dias ap�s o diagn�stico da COVID-19, os pacientes ainda apresentavam dor de cabe�a (40%), fadiga (40%), altera��o de mem�ria (30%), ansiedade (28%), depress�o (20%), perda de olfato (28%) e paladar (16%), entre outros.
"Existem muitas manifesta��es. A pessoa deve ficar atenta se as coisas n�o est�o iguais a antes da infec��o — no sono, nas lembran�as, no desempenho de atividades di�rias, se h� dor de cabe�a, redu��o da sensibilidade, altera��o dos sentidos… Com a persist�ncia dos sintomas, sugiro buscar um neurologista", recomenda Yasuda.
A m�dica explica que exames como o de resson�ncia magn�tica, que est�o sendo aplicados em volunt�rios, podem ajudar no diagn�stico. Mas nem sempre.
"A maioria das disfun��es neurol�gicas mais sutis, que afetam a vida di�ria — mem�ria, altera��o no sono… —, n�o levam a altera��es na resson�ncia. Colher sangue, fazer exame de resson�ncia vai resolver? Muitas vezes n�o. Na suspeita de persist�ncia de problema neurol�gico, a pessoa tem que ser examinada e entrevistada por um neurologista."
Em suas recomenda��es sobre efeitos neurol�gicos e ps�quicos de m�dio e longo prazo da COVID-19, a OMS sugere a aplica��o de question�rios referendados por cientistas, como a Avalia��o Cognitiva de Montreal e a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depress�o.
Segundo Yasuda, alguns question�rios s�o por padr�o aplicados pelo m�dico, enquanto outros podem ser feitos pelo pr�prio paciente sozinho. De todo modo, ela lembra que tais avali��es s�o mais um instrumento e n�o o diagn�stico final — esse um papel do m�dico, que chega a tal resultado combinando informa��es dos question�rios, exames, consultas presenciais e hist�rico do paciente.
Diferente dos efeitos persistentes no cora��o e no pulm�o, a professora da Unicamp diz que as consequ�ncias no c�rebro chamam a aten��o por afetar muitas pessoas que tiveram uma COVID-19 leve.
"Desde janeiro, milhares de pessoas responderam nosso formul�rio. E, agora, a cada dia aparece mais gente com queixas neurol�gicas. � muito angustiante. A maior implica��o disso ser� a volta dessas pessoas ao trabalho. A consequ�ncia ser� imensa", diz, referindo-se �s dificuldades de concentra��o, bem-estar, mem�ria, entre outras, com que milhares de pessoas j� est�o vivendo, e muitas mais viver�o, no p�s-COVID.
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