(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas HOJE � UM DAQUELES DIAS...

Como a ci�ncia explica a embriaguez e a ressaca

Como diversas outras drogas e medicamentos ansiol�ticos, principal a��o do �lcool et�lico ou etanol � a inibir o sistema nervoso central, explica pesquisador


31/12/2021 16:10 - atualizado 01/01/2022 09:34


brinde com espumante
Principal a��o do �lcool et�lico ou etanol � a inibi��o do sistema nervoso central, diz pesquisador (foto: Getty Images)

Desde o alvorecer das primeiras civiliza��es, a humanidade consome �lcool, na forma de diferentes bebidas, seja em comemora��es ou cerim�nias religiosas ou em momentos de lazer e descontra��o.

Isso se explica, em parte, pelos efeitos que sua ingest�o provoca, como diminui��o da ansiedade, descontra��o, aumento da autoestima e da sociabilidade.

Mas o consumo exagerado revela o outro lado do etanol, como causador de sonol�ncia, seda��o, falhas da mem�ria, lentid�o da fala e dos movimentos e, em casos extremos, coma e at� morte - sem falar na ressaca no dia seguinte.

Mas por que isso ocorre?

No livro A hist�ria e a qu�mica da cacha�a (Athena Editora, 2021), que publicou recentemente, o pesquisador Leinig Antonio Perazolli, do Instituto de Qu�mica do campus de Araraquara da Universidade Estadual Paulista (Unesp), explica que, assim como diversas outras drogas e medicamentos ansiol�ticos, a principal a��o do �lcool et�lico ou etanol � a inibi��o do sistema nervoso central.

De acordo com ele, ap�s ser consumido, sua metaboliza��o se d� pela a��o de duas enzimas, a �lcool desidrogenase e a alde�do desidrogenase. A primeira, explica no livro, converte o etanol em acetalde�do, que tamb�m � uma subst�ncia t�xica para o organismo. Por isso, a segunda enzima entra em a��o, convertendo esse composto em �cido ac�tico.

O qu�mico Carlos Alberto da Silva Riehl, coordenador do Laborat�rio de Qu�mica Forense, do Instituto de Qu�mica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), explica por que ocorre a embriaguez.

De acordo com ele, quando consumido o �lcool entra na corrente sangu�nea, se difundindo por todo o corpo, chegando at� o c�rebro.

"Como � uma mol�cula menos polar que a �gua, por�m muito sol�vel neste meio, ao chegar nas fendas sin�pticas (local onde um neur�nio troca informa��es qu�micas com outro), ele dificulta que os neurotransmissores se desloquem entre eles, causando uma certa lentid�o em nossas a��es, o que gera assim o que chamamos de embriaguez", diz.

Riehl tamb�m explica por que, num primeiro momento, as pessoas ficam desinibidas e com sensa��o de bem-estar geral. Depois de absorvido pelo est�mago, o etanol entra na corrente sangu�nea, indo rapidamente para o f�gado, onde � metabolizado.

"Inicialmente, esse �rg�o o transforma em �cido ac�tico, que � utilizado para gerar energia nas c�lulas, o que nos confere inicialmente uma sensa��o de bem-estar", diz. "Aos poucos, ele chega aos neur�nios e inibe de forma sutil a troca de alguns neurotransmissores, o que gera a desinibi��o, a euforia e, consequentemente, uma maior sociabilidade (normalmente a pessoa fica muito falante)."

O tamb�m qu�mico e doutorando em Ci�ncias Farmac�uticas, Diego Defferrari, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), acrescenta que o �lcool � um sedativo e um anest�sico leve.

"Ao ser ingerido, ele libera no c�rebro neurotransmissores como dopamina e serotonina, que est�o relacionados com a ativa��o dos centros de prazer e recompensa", diz. "Devido a essa libera��o exacerbada, ocorrem mudan�as fisiol�gicas no organismo, como sensa��o de bem-estar, relaxamento, desinibi��o e euforia."

'Inibir a inibi��o'

Segundo o farmac�utico bioqu�mico e doutor em Toxicologia, Maur�cio Yonamine, do Departamento de An�lises Cl�nicas e Toxicol�gicas da Faculdade de Ci�ncias Farmac�uticas da Universidade de S�o Paulo (USP), a a��o do etanol no c�rebro � complexa.

"Em pequenas concentra��es (por exemplo, no in�cio da ingest�o de bebida alco�lica), o �lcool inibe regi�es do c�rebro que naturalmente inibem sensa��es de euforia", explica. "� o que chamamos de 'inibir a inibi��o', ou seja, provoca euforia."


Mulher com ressaca
Ressaca ocorre devido, principalmente, ao ac�mulo de acetalde�do n�o convertido em �cido ac�tico (foto: Getty Images)

Mas nem tudo � alegria e felicidade. O doutor em bioqu�mica Guilherme Andrade Marson, do Instituto de Qu�mica da USP, alerta que, nessa fase de euforia e desinibi��o, tamb�m podem ocorrer comportamento violento, imprud�ncia e dificuldade de avaliar riscos.

"Al�m disso, em alguns indiv�duos, pode disparar crises de ansiedade, del�rio persecut�rio, depress�o ou ataque epil�tico, entre outros problemas", diz.

Em seu livro, Perazolli usa uma linguagem mais t�cnica para explicar esse processo, que tem a ver com os neurotransmissores, que s�o mol�culas relativamente simples, como a serotonina, dopamina, glutamato e o �cido gama-aminobut�rico (GABA). "Esses transmissores interagem com os receptores e estimulam ou inibem fun��es e sensa��es do corpo", explica na obra.

Ainda de acordo com ele, diferentes tipos de receptores podem interagir com um transmissor para gerar sensa��es espec�ficas, uma vez que cada �rea do sistema nervoso central regula diferentes fun��es e percep��es.

"Ao entrar em contato com os receptores, esses transmissores exercer�o um efeito excitat�rio ou inibit�rio, de acordo com a carga do transmissor enviado", escreve. Tanto um como o outro s�o determinados pelo tipo de intera��o i�nica que ocorre nos receptores, que podem interagir com os �ons de s�dio (Na+) ou de cloreto (Cl-).

O efeito excitat�rio, explica Perazolli no livro, � provocado por neurotransmissores como a acetilcolina, o glutamato, a serotonina e a adrenalina, que abrem os canais seletivos de s�dio e entram na membrana, o que por sua vez leva o s�tio receptor a ficar com uma carga positiva em rela��o ao exterior. "Assim, o neur�nio fica mais prop�cio a gerar um potencial de a��o devido ao aumento da neurotransmiss�o", diz. � a fase de euforia.

Em contrapartida, "os efeitos inibit�rios provocados pela abertura dos receptores do GABA est�o relacionados com a dos canais i�nicos seletivos dos �ons Cl-".

Neste caso, o cloreto est� mais concentrado fora do neur�nio, "at� que com a abertura dos s�tios receptores, os �ons entram e tornam o interior mais negativo em rela��o ao exterior, reduzindo a neurotransmiss�o e o potencial de a��o naquela regi�o". � a hora da sonol�ncia e lentid�o.

Segundo o m�dico Andr� Brooking Negr�o, do Programa de Estudos sobre �lcool e Drogas (GREA) do Instituo de Psiquiatria do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da USP, isso ocorre na medida em que vai aumentando a concentra��o de etanol no sangue. "Inicialmente, doses baixas desinibem o comportamento, a tens�o e a ansiedade", explica.

"Na medida que se bebe mais, somam-se os efeitos que chamamos de depressores do �lcool. Depressor no sentido de anular a atividade dos neur�nios. Da�, teremos sinais iniciais de sonol�ncia (tend�ncia a dormir), seda��o (tirar a excita��o), lentid�o do pensamento e das atividade cognitivas de aten��o e mem�ria."

Se a ingest�o continuar, poder� ocorrer at� um "apag�o neural", ou seja, a dose ser� t�o alta que atingir� uma grande parcela dos neur�nios. "O resultado final � de intensa seda��o ou pr�-coma, que se sobrep�e aos efeitos inicias de desinibi��o ou euforia", diz Negr�o. "Num grau mais extremo, o �lcool reduz a atividade de neur�nios que controlam a respira��o e a pessoa pode ter uma parada respirat�rio, que pode ser fatal."

Se o sujeito que abusou da bebida superar todos esses efeitos e chegar vivo ao outro dia, poder� ainda se ver �s voltas com outra consequ�ncia nefasta do etanol - que poder� fazer alguns jurar nunca mais beber: a ressaca.

Perazolli explica em seu livro, em termos cient�ficos, que ela ocorre devido, principalmente, ao ac�mulo de acetalde�do n�o convertido em �cido ac�tico. Indiv�duos que possuam alguma defici�ncia na atividade da enzima alde�do desidrogenase "est�o mais suscet�veis a estes efeitos e costumam exibir alguns sintomas caracter�sticos, como vermelhid�o no rosto, dor de cabe�a, enjoo e taquicardia".


Vinho e cerveja
Efeitos e consequ�ncias da ingest�o de �lcool variam de pessoa para pessoa (foto: Getty Images)

Segundo Yonamine, al�m do ac�mulo de acetalde�do, a ressaca pode ter v�rias outras causas. "Os mecanismos f�sicos pelos quais ela ocorre ainda n�o est�o completamente entendidos cientificamente", diz.

"M�ltiplos fatores devem estar envolvidos, como a pr�pria a��o direta do etanol na produ��o de urina (aumentando a diurese e provocando desidrata��o); como irritante da mucosa g�strica (aumentando a secre��o de suco g�strico e secre��es intestinais, provocando sensa��o de queima��o, n�useas e diarreia) e o seu efeito de diminuir a concentra��o de glicose no sangue (podendo gerar hipoglicemia)."

O que se sabe com certeza � que os efeitos e as consequ�ncias da ingest�o de �lcool variam de pessoa para pessoa. "Antes de mais nada, � importante ressaltar que a qu�mica do etanol no organismo � complexa e envolve duas �reas da ci�ncia: bioqu�mica e enzimologia", diz Defferrari.

"Lembrando tamb�m, que estamos tratando do organismo humano, que � extremante complexo, gerando respostas diferentes em cada pessoa. Caracter�sticas como massa corporal, sexo biol�gico e idade, tamb�m s�o fatores que devem ser levados em conta."

No caso da ressaca, por exemplo, h� uma outra peculiaridade. "Embora as explica��es potenciais sejam numerosas, as diferen�as gen�ticas podem explicar grande parte da varia��o nas ressacas entre os indiv�duos", diz o pesquisador Jemmyson Rom�rio de Jesus, da Universidade Federal de Vi�osa (UFV).

"Por exemplo, muitas pessoas de ascend�ncia chinesa, japonesa e coreana t�m uma muta��o que impede seus corpos de efetivamente metabolizar o etanol, levando ao ac�mulo de acetalde�do, e, por consequ�ncia, a ressacas piores."

Mas, segundo Jesus, h� uma recompensa para essa popula��o: ela apresenta menor chance de transtorno por uso de �lcool (alcoolismo), devido � avers�o que ela pode criar em rela��o � bebida. Independentemente da etnia, tamb�m existem outros fatores que podem potencializar a ressaca ou n�o, tais como, alimenta��o, idade, massa corp�rea, toler�ncia alco�lica e n�vel de consumo, por exemplo", acrescenta.


Jemmyson Romário de Jesus
Alimenta��o, idade, massa corp�rea, toler�ncia alco�lica e n�vel de consumo podem potencializar ou n�o a ressaca , diz o pesquisador Jemmyson Rom�rio de Jesus (foto: Arquivo pessoal)

Os efeitos e consequ�ncias do consumo abusivo do �lcool n�o afetam apenas quem bebe, no entanto. O problema � coletivo. Segundo a Organiza��o Pan-americana da Sa�de (OPAS), o bra�o da Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) para as Am�ricas, o seu uso abusivo tamb�m pode resultar em danos a outras pessoas, como membros da fam�lia, amigos, colegas de trabalho ou estranhos. Al�m disso, resulta em um fardo significativo em termos sociais, econ�micos e de sa�de para toda a sociedade.

Ainda de acordo com a OPAS, o uso abusivo de �lcool � respons�vel por 3 milh�es de mortes por ano em todo o mundo, o que representa 5,3% de todas as mortes. Al�m disso, � a causa de cerca de 200 doen�as e les�es. Em geral, 5,1% do total delas s�o atribu�das � bebida, conforme calculado em termos de Anos de Vida Perdidos Ajustados por Incapacidade (DALY, sigla em ingl�s).

O consumo de etanol tamb�m causa morte e incapacidade relativamente cedo na vida, de acordo com a OPAS. Na faixa et�ria de 20 a 39 anos, aproximadamente 13,5% do total de �bitos s�o atribu�veis � bebida. Al�m disso, existe uma rela��o causal entre o uso abusivo do �lcool e uma s�rie de transtornos mentais e comportamentais, al�m de doen�as n�o transmiss�veis e les�es.

J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)