
O plano dos cientistas � extrair poeira da Lua e lan��-la em dire��o ao Sol. A poeira ficaria entre o Sol e a Terra por cerca de uma semana, reduzindo a luz solar na superf�cie terrestre em cerca de 2%. Depois, ela se dispersaria e n�s lan�ar�amos mais poeira lunar.
A proposta envolve o lan�amento de cerca de 10 milh�es de toneladas de poeira lunar no espa�o todos os anos. De certa forma, � uma ideia criativa. Se funcionar como anunciado do ponto de vista t�cnico, ela poder� fazer com que o mundo ganhe um tempo vital para controlar as emiss�es de carbono.
Mas, infelizmente, n�o � surpresa para ningu�m que essa hist�ria de reflex�o da poeira lunar n�o � t�o simples quanto parece.
Por que a poeira da Lua?
As medidas propostas para resfriar a Terra reduzindo a quantidade de luz solar que atinge a superf�cie do nosso planeta costumam ser chamadas de “geoengenharia solar” ou “gest�o da radia��o solar”.
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O m�todo mais discutido envolve a inje��o de uma fina camada de part�culas de aerossol na atmosfera superior da Terra. Mas mexer com a atmosfera desta forma provavelmente ir� afetar os padr�es de chuva e seca e pode ter outras consequ�ncias inesperadas, como danos � camada de oz�nio. A poeira lunar no espa�o deveria eliminar essas armadilhas, j� que nossa atmosfera permaneceria intocada.
Outros sugeriram refletir a luz solar com espelhos ou filtros gigantescos no espa�o, ou com enormes grupos de sat�lites artificiais.
A poeira lunar parece uma boa solu��o em compara��o com essas ideias. Ela existe em grande quantidade e o lan�amento de nuvens de poeira com a menor gravidade da Lua exigiria muito menos energia do que os lan�amentos similares na Terra.
Mas, ent�o, qual � o problema?
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Lento e complicado demais
Um dos principais pontos dos defensores da geoengenharia solar � a sua suposta rapidez.
Refletir a luz solar, na melhor das hip�teses, � uma forma de evitar rapidamente os catastr�ficos impactos de curto prazo do aquecimento global, ganhando tempo para a transi��o para energias renov�veis e a remo��o de gases do efeito estufa da atmosfera.
A inje��o global de aeross�is na atmosfera, por exemplo, pode precisar do desenvolvimento de aeronaves especiais. Esta certamente n�o � uma tarefa simples, mas pode definitivamente ser realizada na pr�xima d�cada.
J� as ambi��es lunares seriam muito mais lentas. Existem diversas barreiras log�sticas e de engenharia importantes que precisariam ser transpostas.

Precisar�amos, pelo menos, de bases na Lua, infraestrutura de minera��o lunar, armazenagem em larga escala e de uma forma de lan�ar a poeira no espa�o.
Nenhum ser humano coloca os p�s na Lua h� mais de 50 anos. A China pretende construir uma base lunar at� 2028, seguida pelos Estados Unidos em 2034. Um sistema operativo de minera��o e lan�amento de poeira provavelmente ainda est� a d�cadas de dist�ncia.
Outra vantagem da geoengenharia solar seria a possibilidade de ajustes.
A inje��o de aeross�is na atmosfera, em tese, pode ser ajustada para reduzir os efeitos negativos. Mudar os locais onde ocorrem as inje��es de aeross�is, por exemplo, pode alterar drasticamente os poss�veis efeitos colaterais e seu perfil de risco.
J� uma nuvem gigante no espa�o n�o oferece este n�vel de precis�o.
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V�cuo legal e pol�tico
Para piorar ainda mais as coisas, o mundo disp�e atualmente de pouca governan�a ou pol�ticas abrangentes sobre o espa�o e a Lua.
Muitas quest�es fundamentais sobre as atividades humanas no espa�o, como o gerenciamento da quantidade crescente de lixo espacial que orbita a Terra em alt�ssima velocidade, permanecem sem resposta.
Tamb�m segue sem resposta outra quest�o fundamental: a lei permite minerar na Lua? Quem � o “dono” do espa�o e dos seus recursos?
O que temos atualmente � uma colcha de retalhos de pol�ticas contradit�rias.
O Tratado do Espa�o Sideral de 1967 pro�be a “apropria��o” dos recursos espaciais, o que pressup�e a proibi��o da minera��o. J� o Artigo 11.3 do Tratado da Lua de 1979 afirma que os recursos lunares n�o podem ser propriedade de um pa�s, grupo ou pessoa.
Mas os Estados Unidos, a R�ssia e a China n�o assinaram o Tratado da Lua. Na verdade, os Estados Unidos t�m uma lei da �poca do presidente Obama, um decreto do governo Trump e um acordo internacional n�o compuls�rio – o Acordo Artemis. Todos eles tratam da extra��o de recursos comerciais.
Esta pol�tica contradit�ria em vigor faz com que a minera��o lunar seja uma zona cinzenta do potno de vista jur�dico. Lan�ar a poeira da Lua no espa�o � outro dilema jur�dico que ainda est� v�rios degraus � frente.
Problemas no c�u e na terra
Essa colcha de retalhos jur�dica s� existe devido a barreiras pol�ticas mais abrangentes. Da mesma forma que a corrida espacial do s�culo 20 refletia a geopol�tica da Guerra Fria, a governan�a espacial contempor�nea � moldada pelas diverg�ncias pol�ticas atuais.
A R�ssia e a China n�o assinaram o Acordo Artemis e decidiram (ironicamente, juntos) permanecer sozinhos. Mas os conflitos sobre um acordo n�o obrigat�rio s�o apenas a ponta do iceberg.
As diverg�ncias pol�ticas sobre a extra��o de poeira da Lua podem ser muito mais perigosas. Diferentes pa�ses podem preferir diferentes graus de resfriamento ou discordar se o resfriamento com a poeira lunar deve realmente ser adotado.

At� o “sistema de lan�amento” de poeira proposto – essencialmente, um canh�o eletromagn�tico gigante do tipo usado atualmente para lan�ar ca�as de combate – pode despertar preocupa��es com a seguran�a e armamentos.
Estas diverg�ncias podem infiltrar-se na pol�tica terrestre, exacerbando ainda mais as divis�es pol�ticas. E, o que � pior, elas podem resultar em conflitos armados ou sabotagem da infraestrutura lunar.
O espa�o � outra fronteira para os conflitos pol�ticos, que podem ser agravados pelo sistema de reflex�o da poeira lunar. Esses conflitos tamb�m comprometem o desenvolvimento cooperativo e altru�sta do projeto.
Local nobre do espa�o sideral
Mesmo se as quest�es pol�ticas e de implementa��o fossem resolvidas, existem ainda muitas outras barreiras a serem transpostas.
A poeira da Lua ficaria no chamado “ponto de Lagrange” entre a Terra e o Sol, onde as for�as gravitacionais do planeta e da estrela se equilibram.
Infelizmente, esse trecho valioso do espa�o sideral j� est� ocupado por sat�lites, como o Observat�rio Solar e Heliosf�rico e o Observat�rio do Clima do Espa�o Sideral. Eles talvez pudessem ser deslocados ou desativados, mas o processo seria caro e criaria novos riscos.
Em resumo, a proposta da poeira lunar, de fato, resolve alguns dos problemas da geoengenharia solar centralizada na Terra. Mas provavelmente seria um processo lento demais para atenuar os impactos de curto prazo das mudan�as clim�ticas e, de qualquer forma, enfrentaria obst�culos diplom�ticos que podem ser intranspon�veis.
� preciso ressaltar que os autores, de fato, reconhecem que seu trabalho tem limita��es. No seu comunicado � imprensa, eles dizem:
“N�o somos especialistas em mudan�as clim�ticas, nem na ci�ncia de foguetes necess�ria para movimentar massa de um lugar para outro. Estamos apenas explorando diferentes tipos de poeira em uma s�rie de �rbitas diferentes para ver qual seria a efic�cia desta abordagem.”
Por isso, em vez de nos preocuparmos em deslocar sat�lites, � melhor nos concentrarmos na substitui��o dos combust�veis f�sseis. As solu��es para as mudan�as clim�ticas est�o bem � nossa frente, n�o nas estrelas.
* Aaron Tang � estudante de PhD em governan�a do clima da Universidade Nacional da Austr�lia.
Este artigo foi publicado originalmente no site de not�cias acad�micas The Conversation e republicado sob licen�a Creative Commons. Leia aqui a vers�o original em ingl�s.